João mora em uma de nossas 3.100 favelas. Lá não saneamento básico. Por conta disso ele sofre de disenteria e hepatite. No Brasil morrem cerca de 20 crianças por dia vítimas da falta de esgoto - foi assim que João viu morrer, no corredor lotado e sujo de um hospital, seu único filho. Bem, como políticas de saneamento nunca foram feitas pelo Zé-Povinho, João não tem culpa por este horror.
João é viúvo: o ônibus no qual estava sua esposa foi desviar de um buraco e bateu em uma carreta. João nunca reparou que o Brasil tem a mesma quantidade de ferrovias que o pequenino Japão - e que 40% delas estão quase inutilizáveis. Assim, 70% das cargas vão de caminhão um absurdo sem paralelo. Como o Zé-Povinho nunca palpitou sobre transportes, tarefa reservada aos doutos, João não tem culpa alguma.
Com freqüência a Polícia sobe o morro no qual João sobrevive, troca tiros com alguns, prende outros, mas logo todos retornam e tudo volta ao normal - e ele vai levando a vida, sem desconfiar que no Brasil apenas 2% dos crimes são punidos. Ainda aqui, como o Zé-Povinho sequer de leis entende, João é inocente.
João leu que o Brasil perde anualmente R$ 100 bilhões com a corrupção. Bom, como o Zé-Povinho dificilmente ocupa cargos públicos, quero crer que ele não tenha culpa alguma por mais esta mazela.
Fica claro, pois, que quem está falhando na construção do Brasil não é o povo. Se este mais não faz, é porque serviços públicos administrados por uma elite instruída não proporcionam às nossas crianças saúde, educação e condições dignas de vida - nossa culpa, nossa tão grande culpa!
Pedro Valls Feu Rosa
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