Infelizmente, o trono de “alguns” encontra-se virado de costas para o desafio hercúleo que se faz presente. E o detentor, da janela de seu castelo, só tem olhos para a estrada que conduz à arena dos embates eleitorais futuros.
Repiquem os sinos, toquem os clarins, batam tambores, despertem todos deste pesadelo. O caminho está ficando intransitável com os corpos de vítimas da pandemia. Breve as palavras irrefletidas de nada servirão em defesa dos que as evocam.
Os caminhantes, mesmo os mais humildes, se negarão a trilhar a vereda, exigindo mais segurança, serenidade e estabilidade emocional dos gestores.
E se eles permanecerem insensíveis? Justiça neles (civil, penal, eleitoral, política)! É preciso fazê-los revelar-se fora de suas zonas de conforto.
sexta-feira, 5 de março de 2021
Palavras irrefletidas de nada servirão
O mundo de Bolsonaro está cheio de rachaduras e pode desabar
Ainda bem que o presidente Jair Bolsonaro cancelou as assinaturas de jornais dos dois palácios à sua disposição, o Alvorada onde mora, e o Planalto onde despacha, e estendeu a medida aos ministérios e demais órgãos da administração pública. Ainda bem, como disse outro dia, que já não assiste aos telejornais da Rede Globo.
Talvez se informe pelo SBT – o sistema bolsonarista de televisão que o poupa de críticas. Do contrário, com a mania de perseguição que o atordoa a bater nos píncaros, a essa altura teria concluído que o mundo inteiro, e um pouco além, está de sacanagem com ele, e que ele tem mais é que ignorá-lo para preservar sua saúde.
Por falar em saúde… Nas últimas 24 horas, o Brasil registrou 1.786 mortes. Morreram até ontem 261.188 vítimas da Covid. São, em média, 1.361 mortes por dia. É o sexto recorde seguido, um aumento de 30% em duas semanas. É a média de mortes mais alta desde o início da pandemia há um ano.
Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central, fez a seguinte conta quando o número de mortos era de 259.271: o Brasil tem 2,7% da população mundial; como o total global de mortes desde o início da pandemia foi 2.580.000, deveriam ter morrido 69.660 pessoas no Brasil. Só que foram 259.271 – 189.611 mortes a mais.
Atualizando a conta de Franco: 191.528 mortes a mais. E logo no dia em que, exasperado, Bolsonaro foi a Uberlândia, no Triangulo Mineiro, e descontrolou-se quando perguntado sobre a compra de vacinas. “Tem idiota que a gente vê nas redes sociais, na imprensa: ‘Vai comprar vacina’. Só se for na casa da tua mãe”, respondeu.
E completou: “Não tem para vender no mundo”. De fato, não tem. Ou melhor: não tem para governantes que desprezaram a compra de vacinas, duvidaram da sua eficácia, esperaram ser procurados por vendedores aflitos e estimularam seus governados a acreditar em tratamento preventivo à base de outras drogas.
Foi o caso dele. Ainda ontem, no interior de Goiás à caça de votos para se reeleger porque só pensa nisso, Bolsonaro esbravejou: “Chega de frescura e de mimimi. Vão ficar chorando até quando?” No passado, ele chamou o Brasil de “país de maricas” e aconselhou as pessoas a enfrentarem o vírus “como homem”.
Por que não enfrentam o vírus como mulher? Bolsonaro dá preferência aos homens em suas mensagens. Trai certo desconforto diante das mulheres. Talvez porque elas, há dois anos, resistiram a votar nele. Bolsonaro deve sua vitória aos homens. E é na companhia deles que se sente à vontade.
Desligar-se da realidade ou negá-la é a maneira que encontrou para driblar tudo que o contrarie. A Fiocruz fez um alerta sobre o avanço de variantes da Covid no Brasil. Pesquisadores analisaram dados de oito estados. Em seis deles, mais da metade das amostras apresentou vírus que sofreram mutação. (Te liga, Bolsonaro!)
Ao menos 13 milhões de doses da vacina da AstraZeneca esperadas para este mês não deverão ser entregues, indica um cronograma do Ministério da Saúde. Um levantamento de sete organizações da sociedade civil denunciou a falta de transparência na divulgação de dados sobre a vacinação. (Te liga, Bolsonaro!)
A Confederação Nacional de Municípios cobrou a compra e a distribuição rápida dos 350 milhões de doses anunciados pelo Ministério da Saúde na última quarta-feira. Se isso não acontecer, municípios e Estados partirão para a aquisição suplementar dos imunizantes. Não podem mais esperar. (Te liga, Bolsonaro!)
Catorze governadores estaduais divulgaram uma carta ao presidente em que pedem providências para obter novas doses de imunizantes de modo a controlar o aumento exponencial de casos de infecção e mortes pelo coronavírus. Dizem que estão no limite de suas forças e possibilidades. (Te liga, Bolsonaro!)
A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal, determinou que o Ministério da Saúde reative imediatamente os leitos de UTI para Covid que foram fechados no Piauí. Ela já acolheu pedidos semelhantes dos governos de São Paulo, Bahia e Maranhão. O Ministério da Saúde nada disse. (Te liga, Bolsonaro!)
O ministro da Economia, Paulo Guedes, defendeu a vacinação em massa e destacou que, sem saúde, não há economia: “Precisamos de saúde, emprego e renda. Primeiro a saúde, sem saúde não há economia. Da mesma forma, a vacinação em massa é que vai permitir manter a economia em funcionamento”.
Até tu, Guedes? Te liga, Bolsonaro! Um dia a casa cai.
Talvez se informe pelo SBT – o sistema bolsonarista de televisão que o poupa de críticas. Do contrário, com a mania de perseguição que o atordoa a bater nos píncaros, a essa altura teria concluído que o mundo inteiro, e um pouco além, está de sacanagem com ele, e que ele tem mais é que ignorá-lo para preservar sua saúde.
Por falar em saúde… Nas últimas 24 horas, o Brasil registrou 1.786 mortes. Morreram até ontem 261.188 vítimas da Covid. São, em média, 1.361 mortes por dia. É o sexto recorde seguido, um aumento de 30% em duas semanas. É a média de mortes mais alta desde o início da pandemia há um ano.
Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central, fez a seguinte conta quando o número de mortos era de 259.271: o Brasil tem 2,7% da população mundial; como o total global de mortes desde o início da pandemia foi 2.580.000, deveriam ter morrido 69.660 pessoas no Brasil. Só que foram 259.271 – 189.611 mortes a mais.
Atualizando a conta de Franco: 191.528 mortes a mais. E logo no dia em que, exasperado, Bolsonaro foi a Uberlândia, no Triangulo Mineiro, e descontrolou-se quando perguntado sobre a compra de vacinas. “Tem idiota que a gente vê nas redes sociais, na imprensa: ‘Vai comprar vacina’. Só se for na casa da tua mãe”, respondeu.
E completou: “Não tem para vender no mundo”. De fato, não tem. Ou melhor: não tem para governantes que desprezaram a compra de vacinas, duvidaram da sua eficácia, esperaram ser procurados por vendedores aflitos e estimularam seus governados a acreditar em tratamento preventivo à base de outras drogas.
Foi o caso dele. Ainda ontem, no interior de Goiás à caça de votos para se reeleger porque só pensa nisso, Bolsonaro esbravejou: “Chega de frescura e de mimimi. Vão ficar chorando até quando?” No passado, ele chamou o Brasil de “país de maricas” e aconselhou as pessoas a enfrentarem o vírus “como homem”.
Por que não enfrentam o vírus como mulher? Bolsonaro dá preferência aos homens em suas mensagens. Trai certo desconforto diante das mulheres. Talvez porque elas, há dois anos, resistiram a votar nele. Bolsonaro deve sua vitória aos homens. E é na companhia deles que se sente à vontade.
Desligar-se da realidade ou negá-la é a maneira que encontrou para driblar tudo que o contrarie. A Fiocruz fez um alerta sobre o avanço de variantes da Covid no Brasil. Pesquisadores analisaram dados de oito estados. Em seis deles, mais da metade das amostras apresentou vírus que sofreram mutação. (Te liga, Bolsonaro!)
Ao menos 13 milhões de doses da vacina da AstraZeneca esperadas para este mês não deverão ser entregues, indica um cronograma do Ministério da Saúde. Um levantamento de sete organizações da sociedade civil denunciou a falta de transparência na divulgação de dados sobre a vacinação. (Te liga, Bolsonaro!)
A Confederação Nacional de Municípios cobrou a compra e a distribuição rápida dos 350 milhões de doses anunciados pelo Ministério da Saúde na última quarta-feira. Se isso não acontecer, municípios e Estados partirão para a aquisição suplementar dos imunizantes. Não podem mais esperar. (Te liga, Bolsonaro!)
Catorze governadores estaduais divulgaram uma carta ao presidente em que pedem providências para obter novas doses de imunizantes de modo a controlar o aumento exponencial de casos de infecção e mortes pelo coronavírus. Dizem que estão no limite de suas forças e possibilidades. (Te liga, Bolsonaro!)
A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal, determinou que o Ministério da Saúde reative imediatamente os leitos de UTI para Covid que foram fechados no Piauí. Ela já acolheu pedidos semelhantes dos governos de São Paulo, Bahia e Maranhão. O Ministério da Saúde nada disse. (Te liga, Bolsonaro!)
O ministro da Economia, Paulo Guedes, defendeu a vacinação em massa e destacou que, sem saúde, não há economia: “Precisamos de saúde, emprego e renda. Primeiro a saúde, sem saúde não há economia. Da mesma forma, a vacinação em massa é que vai permitir manter a economia em funcionamento”.
Até tu, Guedes? Te liga, Bolsonaro! Um dia a casa cai.
Pobreza extrema na América Latina será a mais alta em 20 anos por causa do coronavírus
A pandemia da covid-19 aprofundou as já enormes desigualdades estruturais da América Latina e do Caribe. Num momento de “elevada incerteza, em que ainda não estão delineadas nem a forma nem a velocidade de saída da crise”, a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) calcula que a pobreza extrema, a forma mais intensa de escassez, na qual nem as necessidades básicas são cobertas, terá chegado ao nível mais alto desde 2000. Um em cada oito latino-americanos (12,5%) vive agora nessa situação, mais de um ponto percentual a mais que há um ano, quando a crise de saúde era uma opção remota, e quase cinco pontos a mais que em 2014, quando a cifra atingiu seu ponto histórico mais baixo (7,8% da população). Antes da covid-19, a porcentagem de pessoas nessa situação já vinha crescendo de forma contínua havia cinco anos. O vírus, no entanto, foi a gota d’água para desatar essa preocupante tendência.
As medidas de proteção social de emergência adotadas em praticamente toda a região contribuíram para aliviar o duríssimo golpe do coronavírus sobre as sempre voláteis estruturas econômicas e sociais latino-americanas. Mas não impediu um aumento igualmente notável da pobreza moderada, que no final de 2020 afetava um em cada três habitantes da região (33,7%), mais de três pontos percentuais a mais que um ano antes. É preciso voltar a 2006, auge do “superciclo” das matérias-primas, que permitiu que vários Governos latino-americanos implementassem uma inédita série de medidas sociais, possibilitando uma drástica melhora na qualidade de vida para milhões de pessoas, que ampliaram a base da classe média.
A região da América Latina e Caribe é uma das mais afetadas pelo coronavírus, tanto em número de casos como de mortes. Com pouco mais de 8% da população mundial, contabilizava até dezembro de 2020 quase 20% dos contágios e mais de 25% de mortes em escala global. Cifras “tremendas”, nas palavras da secretária-executiva do organismo, Alicia Bárcena. A tragédia levou a uma crise econômica e social sem precedentes, agravada por problemas históricos como a inequidade (a região continua sendo a mais desigual do mundo), a informalidade no trabalho (indicador em que também é líder global), a desproteção social e a vulnerabilidade. Um terreno fértil que amplifica qualquer choque e seus efeitos negativos sobre as camadas menos favorecidas da sociedade, como afirma o Panorama Social 2020, apresentado nesta quinta-feira em Santiago (Chile) pelo braço das Nações Unidas para o desenvolvimento latino-americano.
Com uma curva demográfica que ainda esboça uma inclinação positiva, em termos absolutos as cifras são ainda mais impactantes. Segundo a CEPAL, o número total de pessoas pobres chegou a 209 milhões no final de 2020, 22 milhões a mais que no final do ano anterior. Desse total, 78 milhões estavam em situação de extrema pobreza, oito milhões a mais que em 2019.
Oito em cada 10 latino-americanos vivem hoje em situação de vulnerabilidade, com renda equivalente a três ou menos de três salários mínimos. Todas essas tendências se intensificam nas zonas rurais e nas de maior prevalência de população indígena.
A maioria dos países latino-americanos enfrentará forte deterioração distributiva, um flanco sempre sensível na região: os que mais sofreram estão sofrendo ou sofrerão as devastações da pandemia serão os que partiram de uma situação pior. “Como sempre, os grandes perdedores são os pobres”, resumiu a chefa da CEPAL na coletiva em que o relatório foi apresentado.
A perda de postos de trabalho e a redução de renda serão maiores nas camadas de renda baixa, assim como no setor informal e na população mais jovem. Já as camadas de renda média sofrerão o sempre temido processo de mobilidade descendente: retornar ao ponto de partida nunca é tão rápido quanto ser deslocado dele. O relatório tem uma explicação para esse fenômeno: na América Latina e no Caribe, as famílias das camadas médias e da parte superior das camadas baixas não costumam ser destinatárias das políticas e dos programas de proteção social, e a maior parte de sua renda vem do trabalho, um dos flancos mais atingidos.
A CEPAL estima que, entre 2019 e 2020, as camadas de baixa renda aumentaram 4,5 pontos percentuais (cerca de 28 milhões de pessoas a mais) e as de renda média se contraíram numa proporção similar (-4,1 pontos percentuais, ou seja, 25 milhões de pessoas a menos).
Ao contrário de outras regiões, a porcentagem de trabalhadores latino-americanos que podem realizar trabalho remoto é muito baixa: para a maior parte dos empregados, o teletrabalho simplesmente não é uma opção.
“A região já vinha com sete anos de baixo crescimento”, afirmou Bárcena, um ano após a identificação do “paciente zero” de coronavírus nesta parte do mundo. “Precisamos de políticas públicas para enfrentar essa emergência e conectá-la com uma recuperação que seja diferente: não queremos chegar aonde estávamos, e sim transformar nossa sociedade. E isso só se faz com políticas públicas.” A urgência em avançar rumo a um verdadeiro Estado de bem-estar, disse ela, é hoje “maior do que nunca”. Segundo seus dados, um terço das famílias com crianças ou adolescentes não conta com nenhum tipo de proteção social. E quase uma em cada três mulheres —sobretudo nas camadas mais pobres da população— não participa do mercado de trabalho para sustentar sua família, ampliando e aprofundando as diferenças iniciais.
Além de prever que a desigualdade de renda total por pessoa aumentará com a pandemia, a CEPAL adverte que o vírus ameaça aprofundar o mal-estar que havia se tornado visível em diversos países da região antes da crise sanitária. “Abordar os fatores que originam o mal-estar, avançando rumo a políticas sociais centradas no gozo de direitos, na igualdade, no reconhecimento e no tratamento digno, juntamente com a construção de acordos sociais destinados à construção de sociedades mais justas, inclusivas e coesas, é fundamental para evitar níveis crescentes de conflito, expressões de violência e crises de representação e legitimidade democrática que impedem o desempenho econômico”, afirmam os técnicos da CEPAL.
As medidas de proteção social de emergência adotadas em praticamente toda a região contribuíram para aliviar o duríssimo golpe do coronavírus sobre as sempre voláteis estruturas econômicas e sociais latino-americanas. Mas não impediu um aumento igualmente notável da pobreza moderada, que no final de 2020 afetava um em cada três habitantes da região (33,7%), mais de três pontos percentuais a mais que um ano antes. É preciso voltar a 2006, auge do “superciclo” das matérias-primas, que permitiu que vários Governos latino-americanos implementassem uma inédita série de medidas sociais, possibilitando uma drástica melhora na qualidade de vida para milhões de pessoas, que ampliaram a base da classe média.
, Sem teto em Buenos Aires, em agosto de 2020 |
Com uma curva demográfica que ainda esboça uma inclinação positiva, em termos absolutos as cifras são ainda mais impactantes. Segundo a CEPAL, o número total de pessoas pobres chegou a 209 milhões no final de 2020, 22 milhões a mais que no final do ano anterior. Desse total, 78 milhões estavam em situação de extrema pobreza, oito milhões a mais que em 2019.
Oito em cada 10 latino-americanos vivem hoje em situação de vulnerabilidade, com renda equivalente a três ou menos de três salários mínimos. Todas essas tendências se intensificam nas zonas rurais e nas de maior prevalência de população indígena.
A maioria dos países latino-americanos enfrentará forte deterioração distributiva, um flanco sempre sensível na região: os que mais sofreram estão sofrendo ou sofrerão as devastações da pandemia serão os que partiram de uma situação pior. “Como sempre, os grandes perdedores são os pobres”, resumiu a chefa da CEPAL na coletiva em que o relatório foi apresentado.
A perda de postos de trabalho e a redução de renda serão maiores nas camadas de renda baixa, assim como no setor informal e na população mais jovem. Já as camadas de renda média sofrerão o sempre temido processo de mobilidade descendente: retornar ao ponto de partida nunca é tão rápido quanto ser deslocado dele. O relatório tem uma explicação para esse fenômeno: na América Latina e no Caribe, as famílias das camadas médias e da parte superior das camadas baixas não costumam ser destinatárias das políticas e dos programas de proteção social, e a maior parte de sua renda vem do trabalho, um dos flancos mais atingidos.
A CEPAL estima que, entre 2019 e 2020, as camadas de baixa renda aumentaram 4,5 pontos percentuais (cerca de 28 milhões de pessoas a mais) e as de renda média se contraíram numa proporção similar (-4,1 pontos percentuais, ou seja, 25 milhões de pessoas a menos).
Ao contrário de outras regiões, a porcentagem de trabalhadores latino-americanos que podem realizar trabalho remoto é muito baixa: para a maior parte dos empregados, o teletrabalho simplesmente não é uma opção.
“A região já vinha com sete anos de baixo crescimento”, afirmou Bárcena, um ano após a identificação do “paciente zero” de coronavírus nesta parte do mundo. “Precisamos de políticas públicas para enfrentar essa emergência e conectá-la com uma recuperação que seja diferente: não queremos chegar aonde estávamos, e sim transformar nossa sociedade. E isso só se faz com políticas públicas.” A urgência em avançar rumo a um verdadeiro Estado de bem-estar, disse ela, é hoje “maior do que nunca”. Segundo seus dados, um terço das famílias com crianças ou adolescentes não conta com nenhum tipo de proteção social. E quase uma em cada três mulheres —sobretudo nas camadas mais pobres da população— não participa do mercado de trabalho para sustentar sua família, ampliando e aprofundando as diferenças iniciais.
Além de prever que a desigualdade de renda total por pessoa aumentará com a pandemia, a CEPAL adverte que o vírus ameaça aprofundar o mal-estar que havia se tornado visível em diversos países da região antes da crise sanitária. “Abordar os fatores que originam o mal-estar, avançando rumo a políticas sociais centradas no gozo de direitos, na igualdade, no reconhecimento e no tratamento digno, juntamente com a construção de acordos sociais destinados à construção de sociedades mais justas, inclusivas e coesas, é fundamental para evitar níveis crescentes de conflito, expressões de violência e crises de representação e legitimidade democrática que impedem o desempenho econômico”, afirmam os técnicos da CEPAL.
A vitória parcial do coronavírus
Ainda não é hora do balanço final, mas já é possível afirmar que o Brasil foi devastado pelo coronavírus, com possibilidade de se tornar o país que mais sofreu com a pandemia. Sem mencionar as outras razões que nos isolam no mundo, o território brasileiro tornou-se um campo de observação para a humanidade, pois aqui surgiram perigosas mutações do vírus e nada garante que outras variantes não estejam em curso.
Com todo o respeito aos médicos e demais trabalhadores da saúde que batalham na linha de frente, comunicadores que tentam transmitir a dimensão do drama sanitário e grupos que se dedicam diuturnamente à solidariedade, todos combateram o bom combate, mas o saldo nacional é um grande fracasso.
Como é possível que um vírus triunfe sobre uma comunidade humana, neste momento de fácil comunicação e avanço da ciência? O que torna o Brasil tão vulnerável a um vírus mutante? Uma das razões é exatamente a nossa incapacidade de mudar com rapidez para enfrentar a nova situação.
Nenhum país teve um negacionista tão ativo na Presidência como o Brasil de Bolsonaro. Ele imaginou que o vírus seria uma grande ameaça ao seu governo, o impacto econômico poderia derrubá-lo. Daí seu esforço em negá-lo. E não apenas quanto à gravidade da contaminação, mas, sobretudo, no tocante às medidas necessárias para combatê-lo, como isolamento social e suspensão de algumas atividades.
Quando o novo coronavírus apareceu em Wuhan, na China, escrevi que ao chegar ao Brasil a única forma de combatê-lo seria uma resposta nacional e solidária. O comportamento de Bolsonaro mandou para o espaço a esperança de uma resposta nacional. Um passo importante nessa direção foi decapitar ministros da Saúde que reconheciam a importância do vírus e buscavam uma resposta articulada.
Graças ao STF, governadores e prefeitos tiveram reconhecido seu papel constitucional no combate ao vírus. Mas as constantes denúncias de corrupção enfraqueceram sua liderança em muitos Estados do País. No Rio, Witzel perdeu o cargo. A Polícia Federal fez incursões no Pará e no Amazonas. Respiradores foram comprados em lojas que vendem vinho. Em Santa Catarina o escândalo abalou o governo.
Esse processo na cúpula fortaleceu o ceticismo na base. O comportamento coletivo para atenuar os efeitos da pandemia não foi conseguido. Faltaram estímulos. Poucas foram as iniciativas de oferecer lugar para a quarentena, ou para levar água e facilitar a higiene. Poucas também para estabelecer conexão e facilitar aulas para as crianças, diversão para os adultos.
O negacionismo de Bolsonaro desarmou grande parte das iniciativas que a ciência aconselha. Testes foram esquecidos num depósito em Guarulhos. Para que testar? Não houve intenso esforço tanto para sequenciar o vírus quanto no caso das vacinas. Então o Brasil ocupou um lugar único: o presidente se opunha a elas, seja por ignorância científica ou por ignorância política, bloqueando os melhores produtos ocidentais e ironizando os do Oriente vermelho.
A luta contra o coronavírus numa população como a do Brasil é difícil. O vírus é invisível. Mesmo na Europa, os problemas radioativos provocados pelo desastre de Chernobyl encontraram muito ceticismo precisamente porque não eram visíveis.
Mas a ignorância de Bolsonaro não influencia apenas os 30% que o apoiam. Ela se estende por uma faixa da população que não se interessa por ele nem por nenhum outro político. Uma faixa que não vê benefícios em se ter um governo, muito menos em se sacrificar por um coletivo.
Quando Bolsonaro, na sua campanha obscurantista contra a vacina, insinuou que ela poderia transformar pessoas em jacarés, não estava pregando no vazio. Ele conta com a superstição popular. E não está totalmente equivocado. A ideia de pessoas se transformarem em bichos é presente no Brasil. A mula sem cabeça, por exemplo, é um mito que percorreu a nossa infância. Diziam que era uma linda mulher que virou animal porque transou com um padre. E quem se dedicar a estudar a religião tupi verá que os caraíbas, espécie de sacerdotes, difundiam suas crenças contra a religião colonial, mas se diziam capazes de transformar gente em bicho.
O Brasil perdeu a guerra contra o vírus porque ela dependia não só de disciplina, mas de conhecimento. Não somos disciplinados como os vietnamitas, por exemplo.
Mas, para além do individualismo, o desprezo pelo conhecimento fez do Brasil um campo fértil para a devastação. O governo subestimou remédios consagrados, como a vacinação em massa, e optou por falsas saídas, como a hidroxicloroquina.
Em todos os momentos o conhecimento foi espancado. Até mesmo na batida musical das festas clandestinas o Brasil celebrou a ignorância.
Pode ser que no balanço final alguns desses termos se alterem. Mas vista de agora, nossa derrota para o vírus foi a derrota de nossas lacunas educacionais, entendidas em sentido mais amplo, desde o estudo convencional, que nos faça acreditar no invisível, até o flagelo do obscurantismo oficial, a corrupção e uma incipiente cidadania que não acredita na ideia de um país.
Com todo o respeito aos médicos e demais trabalhadores da saúde que batalham na linha de frente, comunicadores que tentam transmitir a dimensão do drama sanitário e grupos que se dedicam diuturnamente à solidariedade, todos combateram o bom combate, mas o saldo nacional é um grande fracasso.
Como é possível que um vírus triunfe sobre uma comunidade humana, neste momento de fácil comunicação e avanço da ciência? O que torna o Brasil tão vulnerável a um vírus mutante? Uma das razões é exatamente a nossa incapacidade de mudar com rapidez para enfrentar a nova situação.
Nenhum país teve um negacionista tão ativo na Presidência como o Brasil de Bolsonaro. Ele imaginou que o vírus seria uma grande ameaça ao seu governo, o impacto econômico poderia derrubá-lo. Daí seu esforço em negá-lo. E não apenas quanto à gravidade da contaminação, mas, sobretudo, no tocante às medidas necessárias para combatê-lo, como isolamento social e suspensão de algumas atividades.
Quando o novo coronavírus apareceu em Wuhan, na China, escrevi que ao chegar ao Brasil a única forma de combatê-lo seria uma resposta nacional e solidária. O comportamento de Bolsonaro mandou para o espaço a esperança de uma resposta nacional. Um passo importante nessa direção foi decapitar ministros da Saúde que reconheciam a importância do vírus e buscavam uma resposta articulada.
Graças ao STF, governadores e prefeitos tiveram reconhecido seu papel constitucional no combate ao vírus. Mas as constantes denúncias de corrupção enfraqueceram sua liderança em muitos Estados do País. No Rio, Witzel perdeu o cargo. A Polícia Federal fez incursões no Pará e no Amazonas. Respiradores foram comprados em lojas que vendem vinho. Em Santa Catarina o escândalo abalou o governo.
Esse processo na cúpula fortaleceu o ceticismo na base. O comportamento coletivo para atenuar os efeitos da pandemia não foi conseguido. Faltaram estímulos. Poucas foram as iniciativas de oferecer lugar para a quarentena, ou para levar água e facilitar a higiene. Poucas também para estabelecer conexão e facilitar aulas para as crianças, diversão para os adultos.
O negacionismo de Bolsonaro desarmou grande parte das iniciativas que a ciência aconselha. Testes foram esquecidos num depósito em Guarulhos. Para que testar? Não houve intenso esforço tanto para sequenciar o vírus quanto no caso das vacinas. Então o Brasil ocupou um lugar único: o presidente se opunha a elas, seja por ignorância científica ou por ignorância política, bloqueando os melhores produtos ocidentais e ironizando os do Oriente vermelho.
A luta contra o coronavírus numa população como a do Brasil é difícil. O vírus é invisível. Mesmo na Europa, os problemas radioativos provocados pelo desastre de Chernobyl encontraram muito ceticismo precisamente porque não eram visíveis.
Mas a ignorância de Bolsonaro não influencia apenas os 30% que o apoiam. Ela se estende por uma faixa da população que não se interessa por ele nem por nenhum outro político. Uma faixa que não vê benefícios em se ter um governo, muito menos em se sacrificar por um coletivo.
Quando Bolsonaro, na sua campanha obscurantista contra a vacina, insinuou que ela poderia transformar pessoas em jacarés, não estava pregando no vazio. Ele conta com a superstição popular. E não está totalmente equivocado. A ideia de pessoas se transformarem em bichos é presente no Brasil. A mula sem cabeça, por exemplo, é um mito que percorreu a nossa infância. Diziam que era uma linda mulher que virou animal porque transou com um padre. E quem se dedicar a estudar a religião tupi verá que os caraíbas, espécie de sacerdotes, difundiam suas crenças contra a religião colonial, mas se diziam capazes de transformar gente em bicho.
O Brasil perdeu a guerra contra o vírus porque ela dependia não só de disciplina, mas de conhecimento. Não somos disciplinados como os vietnamitas, por exemplo.
Mas, para além do individualismo, o desprezo pelo conhecimento fez do Brasil um campo fértil para a devastação. O governo subestimou remédios consagrados, como a vacinação em massa, e optou por falsas saídas, como a hidroxicloroquina.
Em todos os momentos o conhecimento foi espancado. Até mesmo na batida musical das festas clandestinas o Brasil celebrou a ignorância.
Pode ser que no balanço final alguns desses termos se alterem. Mas vista de agora, nossa derrota para o vírus foi a derrota de nossas lacunas educacionais, entendidas em sentido mais amplo, desde o estudo convencional, que nos faça acreditar no invisível, até o flagelo do obscurantismo oficial, a corrupção e uma incipiente cidadania que não acredita na ideia de um país.
Agente da morte
Jair Bolsonaro parece ter alergia ao mundo real. Em que mundo vive Jair Bolsonaro? Qual é o seu mundo? Não é o nosso; o mundo daqueles que combatem o vírus e tentam preservar a vida. O mundo do Bolsonaro não é este. Bolsonaro prefere encher os hospitais e lotar os cemitériosJoão Doria,. governador de São Paulo
Bolsonaro é nosso e ninguém tasca
Ele é nosso e ninguém tasca. Em Jair Bolsonaro temos o único governante no mundo que, ao estimular a pandemia e desacreditar a vacina, está mais preocupado com o remédio do que com a doença. Outra de suas inversões da lógica, esta executada pelo boneco inflável que ele escalou para comandar a saúde, foi a de impor um tratamento "preventivo", a cloroquina, numa região, a Amazônia, em que o flagelo já se instalara. As mortes provocadas por essa decisão só poderão ser contabilizadas por alto --mas, mesmo por baixo, deveriam justificar uma prisão perpétua.
Bolsonaro prepara-se agora para nova farsa: promover um spray nasal fabricado em Israel chamado EXO-CD24, ainda em fase experimental, como um elixir mágico contra a Covid. Por enquanto, os israelenses estão testando a droga somente em animais. Talvez por isso, dez homens de Bolsonaro, inclusive o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, viajarão neste sábado para Tel-Aviv, a fim de tomar uma prise.
A comitiva bolsonarista faz bem em aproveitar a oportunidade. Em breve, dificilmente um brasileiro, mesmo em missão oficial, poderá entrar em qualquer país. Neste momento, já estamos barrados em 17 e, com certeza, sendo olhados com repulsa e medo nas ruas de outros tantos. Os líderes mundiais despertaram para o fato de que nos tornamos uma bomba de 213 milhões de habitantes —um laboratório de mutações a céu aberto—, de que seus cidadãos, adeptos da vida, precisam manter o máximo de distância.
As fronteiras fechadas para nós significarão o mesmo para eles, donde ninguém virá tão cedo por aqui —quem vai querer se aventurar num viveiro de vírus?— e não será surpresa se isso incluir o cancelamento de negócios, da troca de manufaturados e da importação de grãos e alimentos. Quem vai querer comer um frango infectado vindo do Brasil?
Sim, Bolsonaro é nosso e ninguém tasca. Nem merece.
Bolsonaro prepara-se agora para nova farsa: promover um spray nasal fabricado em Israel chamado EXO-CD24, ainda em fase experimental, como um elixir mágico contra a Covid. Por enquanto, os israelenses estão testando a droga somente em animais. Talvez por isso, dez homens de Bolsonaro, inclusive o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, viajarão neste sábado para Tel-Aviv, a fim de tomar uma prise.
A comitiva bolsonarista faz bem em aproveitar a oportunidade. Em breve, dificilmente um brasileiro, mesmo em missão oficial, poderá entrar em qualquer país. Neste momento, já estamos barrados em 17 e, com certeza, sendo olhados com repulsa e medo nas ruas de outros tantos. Os líderes mundiais despertaram para o fato de que nos tornamos uma bomba de 213 milhões de habitantes —um laboratório de mutações a céu aberto—, de que seus cidadãos, adeptos da vida, precisam manter o máximo de distância.
As fronteiras fechadas para nós significarão o mesmo para eles, donde ninguém virá tão cedo por aqui —quem vai querer se aventurar num viveiro de vírus?— e não será surpresa se isso incluir o cancelamento de negócios, da troca de manufaturados e da importação de grãos e alimentos. Quem vai querer comer um frango infectado vindo do Brasil?
Sim, Bolsonaro é nosso e ninguém tasca. Nem merece.
Quanto vale uma vida?
Para as famílias e os amigos, não tem preço. Mas, para a economia, a política e o Estado, tem, em reais ou em dólares.
Quanto custa ao Estado, ao contribuinte, manter, do berço à universidade, um cidadão brasileiro? Qual o valor contábil de uma vida inteira usando maternidades, creches, escolas e universidades públicas, serviços públicos de saúde, tudo bancado pelo Estado? Algum economista amigo por favor me ofereça um cálculo aproximado. Só se sabe que é um custo monstruoso, mas não o seu exato tamanho. Quanto custou o cidadão até entrar no mercado de trabalho e começar a produzir e pagar impostos? Quanto vale uma vida, em reais ou dólares, no Brasil ?
Muitas vezes viajando pela Europa me impressionava o valor que davam a vidas humanas, os cuidados, a proteção. Aos poucos entendi que não era só por humanismo, mas pelo que cada um custava ao Estado do bem-estar social, até se tornar um pagador de impostos em tudo que trabalha, produz e consome.
Enquanto isso, no Brasil, sempre me horrorizou o desprezo que o Estado e a sociedade têm pela vida humana (a imagem-símbolo é um corpo estirado chão coberto por um jornal ), que foi explicitado e exacerbado na pandemia pelo negacionismo e a impiedade do presidente da República. Na falta de coração, deveria ao menos pensar no bolso do cidadão, mas o cara ignora o prejuízo real, em reais, que os mortos e contaminados dão a um Estado que gasta R$ 40 mil por ano com cada preso e R$ 15 mil por estudante do ensino superior. Imaginem com internações hospitalares.
Quanto custa ao Estado, ao contribuinte, manter, do berço à universidade, um cidadão brasileiro? Qual o valor contábil de uma vida inteira usando maternidades, creches, escolas e universidades públicas, serviços públicos de saúde, tudo bancado pelo Estado? Algum economista amigo por favor me ofereça um cálculo aproximado. Só se sabe que é um custo monstruoso, mas não o seu exato tamanho. Quanto custou o cidadão até entrar no mercado de trabalho e começar a produzir e pagar impostos? Quanto vale uma vida, em reais ou dólares, no Brasil ?
Enquanto as famílias choram a perda de seus 250 mil mortos, o Estado sequer lamenta a diminuição na força de trabalho e nos consumidores e pagadores de impostos, um baita prejuízo que será pago por todos que sobreviverem.
Ainda me lembro de Bolsonaro dizendo, colérico, no início da pandemia: “Se todo mundo ficar em casa, a economia acaba, e, se a economia acabar, acaba o meu governo.”
O “Axioma de Jair” é incontestável e está sendo provado todo dia por suas palavras e ações. Criou um chavismo de direita, fez uma aliança pelo atraso com o Centrão, e também com o PT, unidos pelo nacionalismo estatizante e pelo fim da Lava-Jato, gerando um inimaginável bolsopetismo, que exclui qualquer possibilidade de uma frente de esquerda, de centro e de centro-esquerda capaz de derrotá-lo.
Para ir ao segundo turno lhe bastam seus 30% de fanáticos. Os restantes 60% que o desaprovam só unidos podem vencer a eleição com Ciro, Dória, Moro, Mandetta ou Haddad.
Para ir ao segundo turno lhe bastam seus 30% de fanáticos. Os restantes 60% que o desaprovam só unidos podem vencer a eleição com Ciro, Dória, Moro, Mandetta ou Haddad.
Outro exercício de futurologia: como Flávio Bolsonaro vai pagar as prestações de R$ 18 mil a R$ 21 mil da mansão com seu salário liquido de R$ 25 mil do Senado? Como vai manter uma casa imensa que exige muitos empregados, todos com carteira assinada e direitos trabalhistas? Como não vai ser senador para sempre, quando sair, como não sabe fazer nada, vai pagar como? Ah, tem a mulher dentista, que vai começar a buscar clientes em Brasília.
Investimento no caos
O presidente Jair Bolsonaro não governa; afronta. Já chamou de “maricas” seus concidadãos que respeitam as medidas de isolamento social para se proteger da covid-19; já sugeriu que os brasileiros forçados a trabalhar em home office, como o presidente da Petrobrás que ele demitiu, são ociosos; já se disse favorável a “retirar de circulação” os veículos de imprensa que não o bajulam, pois são “fábricas de fake news”. A lista de ofensas está longe de se esgotar aí: o presidente vive de inventar inimigos, aos quais atribui todos os problemas que lhe cabe administrar.
Nos últimos dias, em meio ao recrudescimento da pandemia e seu consequente ônus político, Bolsonaro apontou seus canhões contra os governadores de Estado. Não é de hoje que os governadores são tratados a pontapés pelo presidente, ávido por lhes transferir a culpa por tudo de ruim que acontece no Brasil – do aumento dos preços dos combustíveis à decepcionante recuperação da economia. Agora, diante da catástrofe econômica e social da pandemia, Bolsonaro dobrou a aposta nesse confronto.
Usando dados distorcidos ou simplesmente inventados, o presidente acusou os governadores de desperdiçar recursos repassados pela União aos Estados. Tratou esse dinheiro como se fosse um favor seu, pessoal, aos governadores, e não fruto de obrigações previstas na Constituição. E ainda insinuou que o dinheiro foi mal aproveitado pelos governadores, o que teria colaborado para o colapso do sistema de saúde em vários Estados.
Os governadores reagiram com uma nota dura, assinada por 16 deles, em que rebatem ponto por ponto as patranhas do presidente. Acusam Bolsonaro de investir na “má informação” e na “promoção do conflito”. O fato de alguns dos signatários serem alinhados ao presidente é bastante significativo – pode indicar que, mesmo para seus aliados, Bolsonaro passou dos limites.
Ao contrário, o bolsonarismo é a expressão mais estridente do progressivo esgarçamento dos laços de solidariedade que sustentam a vida em sociedade e que são fundamentais especialmente em tempos de crise aguda, como a que ora atravessamos. Caso não seja derrotada, essa ideologia deletéria tornará muito mais difícil encontrar soluções duradouras para os grandes problemas da sociedade – que, assim sendo, continuará a se consumir em conflitos pelos mais banais motivos, tornando-se praticamente impossível alcançar consenso mesmo para questões comezinhas.
É nesse caos que Bolsonaro prospera – e, com ele, oportunistas de diversos quilates. Se é cada um por si, então não surpreende que, em vez de procurarem meios de viabilizar alguma forma de auxílio emergencial para quem perdeu renda na pandemia, os deputados estejam empenhados em aumentar em R$ 18,4 bilhões as emendas orçamentárias a que têm direito para asfaltar ruas e inaugurar pontes em seus currais eleitorais. Farinha pouca, o pirão de sempre primeiro.
Enquanto o presidente e seus aprendizes vivem no conforto da delirante mitologia bolsonarista, os gestores de saúde, obrigados a lidar com a realidade da pandemia, já informaram que é urgente ampliar as medidas de restrição para evitar uma tragédia ainda maior. Em seu apelo desesperado, propuseram um “pacto nacional pela vida” – que, no entanto, só será possível se o País superar o bolsonarismo, condição indispensável para recuperar o sentido de nação.
Nos últimos dias, em meio ao recrudescimento da pandemia e seu consequente ônus político, Bolsonaro apontou seus canhões contra os governadores de Estado. Não é de hoje que os governadores são tratados a pontapés pelo presidente, ávido por lhes transferir a culpa por tudo de ruim que acontece no Brasil – do aumento dos preços dos combustíveis à decepcionante recuperação da economia. Agora, diante da catástrofe econômica e social da pandemia, Bolsonaro dobrou a aposta nesse confronto.
Usando dados distorcidos ou simplesmente inventados, o presidente acusou os governadores de desperdiçar recursos repassados pela União aos Estados. Tratou esse dinheiro como se fosse um favor seu, pessoal, aos governadores, e não fruto de obrigações previstas na Constituição. E ainda insinuou que o dinheiro foi mal aproveitado pelos governadores, o que teria colaborado para o colapso do sistema de saúde em vários Estados.
Os governadores reagiram com uma nota dura, assinada por 16 deles, em que rebatem ponto por ponto as patranhas do presidente. Acusam Bolsonaro de investir na “má informação” e na “promoção do conflito”. O fato de alguns dos signatários serem alinhados ao presidente é bastante significativo – pode indicar que, mesmo para seus aliados, Bolsonaro passou dos limites.
Bolsonaro, contudo, está em seu habitat. O presidente partiu para mais um confronto não por seu tino estratégico, mas sim por sua natureza. Em toda a sua trajetória política, Bolsonaro jamais se apresentou como conciliador ou sequer interessado em dialogar. Sempre ganhou votos dos ressentidos ao regurgitar rancor contra a democracia – e é sintomático que nem partido tenha, depois de ter passado por quase uma dezena deles.
Bolsonaro, bem como seus seguidores extremistas, despreza profundamente a política, que é a conciliação de pontos de vista divergentes em favor dos interesses abrangentes da sociedade. A própria ideia de coletividade e de cooperação – com seus desdobramentos constitucionais, como o princípio federativo – inexiste no bolsonarismo.
Bolsonaro, bem como seus seguidores extremistas, despreza profundamente a política, que é a conciliação de pontos de vista divergentes em favor dos interesses abrangentes da sociedade. A própria ideia de coletividade e de cooperação – com seus desdobramentos constitucionais, como o princípio federativo – inexiste no bolsonarismo.
Ao contrário, o bolsonarismo é a expressão mais estridente do progressivo esgarçamento dos laços de solidariedade que sustentam a vida em sociedade e que são fundamentais especialmente em tempos de crise aguda, como a que ora atravessamos. Caso não seja derrotada, essa ideologia deletéria tornará muito mais difícil encontrar soluções duradouras para os grandes problemas da sociedade – que, assim sendo, continuará a se consumir em conflitos pelos mais banais motivos, tornando-se praticamente impossível alcançar consenso mesmo para questões comezinhas.
É nesse caos que Bolsonaro prospera – e, com ele, oportunistas de diversos quilates. Se é cada um por si, então não surpreende que, em vez de procurarem meios de viabilizar alguma forma de auxílio emergencial para quem perdeu renda na pandemia, os deputados estejam empenhados em aumentar em R$ 18,4 bilhões as emendas orçamentárias a que têm direito para asfaltar ruas e inaugurar pontes em seus currais eleitorais. Farinha pouca, o pirão de sempre primeiro.
Enquanto o presidente e seus aprendizes vivem no conforto da delirante mitologia bolsonarista, os gestores de saúde, obrigados a lidar com a realidade da pandemia, já informaram que é urgente ampliar as medidas de restrição para evitar uma tragédia ainda maior. Em seu apelo desesperado, propuseram um “pacto nacional pela vida” – que, no entanto, só será possível se o País superar o bolsonarismo, condição indispensável para recuperar o sentido de nação.
Mortos não votam
Quis uma cruza atroz do destino que a pandemia do século XXI apanhasse o Brasil nas mãos de um homem mau. Um presidente sem noção do que seja governar, desprovido de conhecimentos básicos sobre o funcionamento das coisas públicas, em estado de total privação de senso da urgência de prioridades, referido no voraz desleixo em relação ao bem-estar coletivo.
Um síndico de edifício zela pelo conjunto dos condôminos quando determina o uso de máscara aos funcionários, espalha recipientes com álcool em gel, restringe a circulação e fixa nas dependências do prédio comunicados aos moradores sobre a necessidade de cumprimento das regras, mas o atual presidente da República do Brasil nem como zelador seria bem-aceito. Não foi feito para a vida em comunidade.
Jair Bolsonaro condena qualquer tipo de proteção aos residentes da nação e ainda vilipendia quem trabalha em prol dos cuidados. Essa ausência de apreço pela vida alheia poderia ter explicação só na maldade, no desvio de caráter ou mesmo em algum tipo de dano psicológico grave, não carregasse junto doses oceânicas de cálculo político-eleitoral.
Não vejo, como apregoam alguns no afã de imprimir maior contundência ao exercício da oposição, que a ideia dele seja matar pessoas nem torcer para que morram. Isso dá dramaticidade à cena, mas cria um espaço de fantasia por onde transitam com muita habilidade o presidente e seus apoiadores, dando-lhes a oportunidade de exercer a reação com virulência igualmente irrealista. Nesse campo vicejam, por exemplo, as falácias sobre medicamentos inúteis, os malefícios do uso de máscara, o atraso na compra de vacinas e o alarde em torno de aludidos prejuízos, sem a correspondente serventia, do isolamento social.
O que há como fato incontestável é a insensibilidade presidencial ante a dizimação de vidas. Ao longo do último ano o presidente fez uma ou outra referência às vítimas e sempre de maneira protocolar. Enquanto rodopia com satisfação por aglomerações país afora e até Palácio do Planalto adentro, no decorrer deste ano de pandemia Bolsonaro não fez e continua não fazendo um gesto sequer de compaixão pelas vítimas do vírus com o qual desenvolveu uma relação afável.
“As vítimas do vírus não comovem Bolsonaro porque a ele importam mais os vivos aptos às urnas em 22”
Autoriza, assim, a suposição bastante plausível de que não se importa com elas porque estão mortas, e mortos não votam. Exagero na conclusão? Pode até ser, dependendo do ponto de vista, mas é o próprio presidente quem dá margem a esse raciocínio ao direcionar toda a sua atenção à conquista de novos públicos eleitorais e zero dedicação espiritual aos que se foram, além de mostrar-se indiferente aos que estão potencialmente condenados a ir.
E quem são esses novos públicos eleitorais? São os integrantes de uma massa que mistura ignorantes, insensatos e desesperados diante de perdas materiais agravadas pela incapacidade (agora e sempre) dos poderes públicos de lhes assegurar condições mínimas de suporte.
Perdido o mundo do dinheiro que não cairá em 2022 na mesma conversa de 2018, quebrada a fortaleza do universo político que em grande parte se afastou dele, derrubadas as bandeiras na nova política e do combate à corrupção, é para as camadas de desvalidos, de prisioneiros da crença de que tudo vai bem porque o presidente diz que está tudo bem, que Jair Bolsonaro dirige sua artilharia eleitoral.
É para eles que fala quando fustiga governadores e prefeitos divulgando dados distorcidos sobre repasses de recursos federais e ameaça não transferir dinheiro do auxílio de emergência para localidades onde autoridades imponham restrições mais severas à circulação de pessoas. É a eles que busca conquistar e fidelizar quando se jacta com frases do tipo “Não errei nenhuma até agora”, como disse dia desses em meio a uma aglomeração de fiéis.
É nesse alvo que o presidente mira quando enquadra governadores na categoria dos “maus” repressores da liberdade (seja de festejar ou de ganhar o pão), enquanto sobe no pódio do “bom” que baixa o preço do diesel e do gás de cozinha. É com os olhos voltados exclusivamente para si que mobiliza a máquina de propaganda do governo na produção de cenas de ajuntamentos cuidadosamente escolhidos para lhe referendar popularidade.
Assim, o presidente da nossa desafortunada, mas resistente, República busca (e consegue) intimidar ofensivas tão rigorosas quanto severos são os seus desmandos.
Um síndico de edifício zela pelo conjunto dos condôminos quando determina o uso de máscara aos funcionários, espalha recipientes com álcool em gel, restringe a circulação e fixa nas dependências do prédio comunicados aos moradores sobre a necessidade de cumprimento das regras, mas o atual presidente da República do Brasil nem como zelador seria bem-aceito. Não foi feito para a vida em comunidade.
Jair Bolsonaro condena qualquer tipo de proteção aos residentes da nação e ainda vilipendia quem trabalha em prol dos cuidados. Essa ausência de apreço pela vida alheia poderia ter explicação só na maldade, no desvio de caráter ou mesmo em algum tipo de dano psicológico grave, não carregasse junto doses oceânicas de cálculo político-eleitoral.
Não vejo, como apregoam alguns no afã de imprimir maior contundência ao exercício da oposição, que a ideia dele seja matar pessoas nem torcer para que morram. Isso dá dramaticidade à cena, mas cria um espaço de fantasia por onde transitam com muita habilidade o presidente e seus apoiadores, dando-lhes a oportunidade de exercer a reação com virulência igualmente irrealista. Nesse campo vicejam, por exemplo, as falácias sobre medicamentos inúteis, os malefícios do uso de máscara, o atraso na compra de vacinas e o alarde em torno de aludidos prejuízos, sem a correspondente serventia, do isolamento social.
O que há como fato incontestável é a insensibilidade presidencial ante a dizimação de vidas. Ao longo do último ano o presidente fez uma ou outra referência às vítimas e sempre de maneira protocolar. Enquanto rodopia com satisfação por aglomerações país afora e até Palácio do Planalto adentro, no decorrer deste ano de pandemia Bolsonaro não fez e continua não fazendo um gesto sequer de compaixão pelas vítimas do vírus com o qual desenvolveu uma relação afável.
“As vítimas do vírus não comovem Bolsonaro porque a ele importam mais os vivos aptos às urnas em 22”
Autoriza, assim, a suposição bastante plausível de que não se importa com elas porque estão mortas, e mortos não votam. Exagero na conclusão? Pode até ser, dependendo do ponto de vista, mas é o próprio presidente quem dá margem a esse raciocínio ao direcionar toda a sua atenção à conquista de novos públicos eleitorais e zero dedicação espiritual aos que se foram, além de mostrar-se indiferente aos que estão potencialmente condenados a ir.
E quem são esses novos públicos eleitorais? São os integrantes de uma massa que mistura ignorantes, insensatos e desesperados diante de perdas materiais agravadas pela incapacidade (agora e sempre) dos poderes públicos de lhes assegurar condições mínimas de suporte.
Perdido o mundo do dinheiro que não cairá em 2022 na mesma conversa de 2018, quebrada a fortaleza do universo político que em grande parte se afastou dele, derrubadas as bandeiras na nova política e do combate à corrupção, é para as camadas de desvalidos, de prisioneiros da crença de que tudo vai bem porque o presidente diz que está tudo bem, que Jair Bolsonaro dirige sua artilharia eleitoral.
É para eles que fala quando fustiga governadores e prefeitos divulgando dados distorcidos sobre repasses de recursos federais e ameaça não transferir dinheiro do auxílio de emergência para localidades onde autoridades imponham restrições mais severas à circulação de pessoas. É a eles que busca conquistar e fidelizar quando se jacta com frases do tipo “Não errei nenhuma até agora”, como disse dia desses em meio a uma aglomeração de fiéis.
É nesse alvo que o presidente mira quando enquadra governadores na categoria dos “maus” repressores da liberdade (seja de festejar ou de ganhar o pão), enquanto sobe no pódio do “bom” que baixa o preço do diesel e do gás de cozinha. É com os olhos voltados exclusivamente para si que mobiliza a máquina de propaganda do governo na produção de cenas de ajuntamentos cuidadosamente escolhidos para lhe referendar popularidade.
Assim, o presidente da nossa desafortunada, mas resistente, República busca (e consegue) intimidar ofensivas tão rigorosas quanto severos são os seus desmandos.
O Brasil está de luto
Com mais 1.699 mortes por covid-19 nas últimas 24 horas e 75.102 novos casos, o Brasil está de luto fechado. Já são 260 mil famílias que choram pela perda de entes queridos, mas o presidente Jair Bolsonaro conseguiu, ontem, bater o recorde da falta de respeito e empatia com as vítimas da pandemia do novo coronavírus, que já tem 10.793.732 de casos confirmados: “Chega de frescura, de mimimi. Vão ficar chorando até quando?”, disse, ao criticar medidas de restrição de circulação da população em meio a recorde de mortes pela doença.
Bolsonaro está irritado com governadores, que cobram mais empenho do governo na compra das vacinas, liberação de verbas para mais leitos e o endosso do Ministério da Saúde às recomendações dos seus sanitaristas. Os governadores, em documento encaminhado ao governo, alegam que estão no “limite” e que a vacinação em massa “é a alternativa que se afigura como a mais recomendável e, provavelmente, a única capaz de deter a pandemia”.
“Neste momento, há novas, reais e importantes justificativas para que o Brasil obtenha, com celeridade, novas remessas de imunizantes, a principal delas é a chegada e a rápida disseminação, já no estágio de transmissão comunitária, da nova variante P1, que tem se revelado ainda mais letal, prejudicando os esforços para proteger a vida de nossas cidadãs e cidadãos, bem como de suas famílias”, afirmam no documento.
Os governadores destacam que as preocupações das autoridades sanitárias de todo o mundo estão voltadas para o Brasil, por causa das nossas dimensões continentais e do grande número de casos, mas, sobretudo, devido à falta de controle sobre a expansão da pandemia e suas novas variantes, que podem pôr em risco todo o esforço feito para imunizar no mundo, se não houver igual empenho de vacinação no Brasil. “O mundo acompanha com preocupação o rápido avanço do contágio por essa variante no Brasil, o que torna o bloqueio da disseminação desse tipo de vírus matéria de interesse de diversas nações, inclusive porque outras variantes podem dela advir”, afirmam, com toda a razão.
O que está acontecendo no Brasil equivale à tragédia da Aids na África do Sul, que tem 5,7 milhões de infectados pela doença, ou seja, 11,8% dos 49,2 milhões de habitantes. A Aids virou uma endemia por causa do negativismo do ex-presidente Thabo Mvuyelwa Mbeki, que sustentava a tese de que era causada por falta de vitaminas e recomendava tratamento com ervas medicinais dos sacerdotes tribais. Não é uma interpretação muito diferente das ideias do presidente Jair Bolsonaro, que sabota todos os esforços feitos pelas demais autoridades para combater a pandemia.
O encontro de um vírus (que não é considerado um ser vivo) com uma bactéria é considerado pelos biólogos um dos fenômenos da criação. Esse encontro é que permite a reprodução do vírus e também possibilita mutações genéticas. A mutação E484K encontrada na variante brasileira P1 é uma das alterações já identificada no novo coronavírus: o Sars-Cov-2. Essa mutação também está presente em outras duas variantes que causam preocupação pelo mundo: a B.1.1.7, identificada no Reino Unido, e B.1.351, na África do Sul. Suspeita-se de que ela ajude a se tornar mais transmissível e enfraqueça os anticorpos humanos contra o vírus.
Pesquisadores da Fiocruz identificaram a E484K no Ceará, no Paraná, em Santa Catarina, no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul, em Pernambuco, em Alagoas e em Minas Gerais. No Paraná e no Ceará, o índice de prevalência da mutação superou os 70% nas amostras, o que é muito grave. Nada disso, porém, importa para o presidente Bolsonaro. Seu comportamento é o que pode ser chamado de darwinismo social, segundo o qual, os menos aptos deixariam de existir, porque não são capazes de se adaptar e acompanhar a linha evolutiva. Assim, entrariam em extinção, acompanhando o princípio de seleção natural.
Bolsonaro está irritado com governadores, que cobram mais empenho do governo na compra das vacinas, liberação de verbas para mais leitos e o endosso do Ministério da Saúde às recomendações dos seus sanitaristas. Os governadores, em documento encaminhado ao governo, alegam que estão no “limite” e que a vacinação em massa “é a alternativa que se afigura como a mais recomendável e, provavelmente, a única capaz de deter a pandemia”.
“Neste momento, há novas, reais e importantes justificativas para que o Brasil obtenha, com celeridade, novas remessas de imunizantes, a principal delas é a chegada e a rápida disseminação, já no estágio de transmissão comunitária, da nova variante P1, que tem se revelado ainda mais letal, prejudicando os esforços para proteger a vida de nossas cidadãs e cidadãos, bem como de suas famílias”, afirmam no documento.
Os governadores destacam que as preocupações das autoridades sanitárias de todo o mundo estão voltadas para o Brasil, por causa das nossas dimensões continentais e do grande número de casos, mas, sobretudo, devido à falta de controle sobre a expansão da pandemia e suas novas variantes, que podem pôr em risco todo o esforço feito para imunizar no mundo, se não houver igual empenho de vacinação no Brasil. “O mundo acompanha com preocupação o rápido avanço do contágio por essa variante no Brasil, o que torna o bloqueio da disseminação desse tipo de vírus matéria de interesse de diversas nações, inclusive porque outras variantes podem dela advir”, afirmam, com toda a razão.
O que está acontecendo no Brasil equivale à tragédia da Aids na África do Sul, que tem 5,7 milhões de infectados pela doença, ou seja, 11,8% dos 49,2 milhões de habitantes. A Aids virou uma endemia por causa do negativismo do ex-presidente Thabo Mvuyelwa Mbeki, que sustentava a tese de que era causada por falta de vitaminas e recomendava tratamento com ervas medicinais dos sacerdotes tribais. Não é uma interpretação muito diferente das ideias do presidente Jair Bolsonaro, que sabota todos os esforços feitos pelas demais autoridades para combater a pandemia.
O encontro de um vírus (que não é considerado um ser vivo) com uma bactéria é considerado pelos biólogos um dos fenômenos da criação. Esse encontro é que permite a reprodução do vírus e também possibilita mutações genéticas. A mutação E484K encontrada na variante brasileira P1 é uma das alterações já identificada no novo coronavírus: o Sars-Cov-2. Essa mutação também está presente em outras duas variantes que causam preocupação pelo mundo: a B.1.1.7, identificada no Reino Unido, e B.1.351, na África do Sul. Suspeita-se de que ela ajude a se tornar mais transmissível e enfraqueça os anticorpos humanos contra o vírus.
Pesquisadores da Fiocruz identificaram a E484K no Ceará, no Paraná, em Santa Catarina, no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul, em Pernambuco, em Alagoas e em Minas Gerais. No Paraná e no Ceará, o índice de prevalência da mutação superou os 70% nas amostras, o que é muito grave. Nada disso, porém, importa para o presidente Bolsonaro. Seu comportamento é o que pode ser chamado de darwinismo social, segundo o qual, os menos aptos deixariam de existir, porque não são capazes de se adaptar e acompanhar a linha evolutiva. Assim, entrariam em extinção, acompanhando o princípio de seleção natural.
Quanto custa Bolsonaro?
Demorou, mas a oposição parece começar a acertar o tom e o passo para combater o malefício que Jair Bolsonaro causa ao Brasil.
Recebi ontem, e postei no meu blog, um vídeo que abre com a pergunta que vai aí em cima, no título. Afinal, quanto este presidente custa ao país?
A descompostura pública não se atém ao chefe. Seus auxiliares também são expostos em todo o esplendor de sua incompetência e da constatação óbvia: nenhum deles seria ministro em qualquer governo minimamente normal.
Vale ver o vídeo, vale repassar para aqueles seus grupos de WhatsApp que, ainda hoje, 260 mil mortos depois, continuam dando eco a tanta maldade, tanta desinformação criminosa e tanto desprezo à vida cometidos pelo presidente, por seus auxiliares e puxa-sacos que usam microfones de empresas de comunicação antes sérias para cometer aleivosias da mesma natureza.
Não é só o vídeo do custo Bolsonaro que mostra que a chave da maioria dos brasileiros começou a virar, como, a muito custo, ocorreu na América capturada pelo trumpismo.
Os governadores, alvos de um dos mais recentes chiliques do capitão, responderam com uma nota elegante, concisa, também ela recheada de fatos, e deixando claro que, sim, o governo federal decidiu não comprar vacinas quando elas eram negociadas entre os fabricantes e os países, lá atrás, no início do segundo semestre de 2020 e que, por isso, agora, estamos no fim da fila para imunizar nossa população.
O que a cobrança dos governadores e o vídeo fazem é justamente aquilo que tira Bolsonaro do sério: acuá-lo, chamá-lo a sua responsabilidade, já que o presidente, além de tudo, não gosta de trabalhar e é, antes de tudo, medroso. Morre de medo de panelaço, se pela de pavor de impeachment e fica virado no Jiraya quando sua popularidade cai nas pesquisas.
Isso se deve ao fato de que, mesmo sendo intelectualmente prejudicado, ou justamente por isso, Bolsonaro sabe que chegou muito além de suas capacidades. Isso só se deu por uma série de circunstâncias de 2018 que, se espera, dificilmente se repetirão em 2022.
Bolsonaro sabe que sua única chance de se reeleger é repetir o segundo turno contra o PT.
Se, por outro lado, se consolidar a constatação de que Bolsonaro é um risco à vida dos brasileiros e à economia do país, como de fato é, pode se construir uma alternativa viável para que superemos o pesadelo, que dependerá, também, da união de várias forças políticas, em uma ou poucas candidaturas com lastro social e projeto de país.
Recebi ontem, e postei no meu blog, um vídeo que abre com a pergunta que vai aí em cima, no título. Afinal, quanto este presidente custa ao país?
Como parece ser esta, a do bolso, a única variável capaz de sensibilizar uma parcela do eleitorado e da elite empresarial e financeira brasileira, o vídeo mostra, com dados e números, quanto a gestão temerária de Bolsonaro prejudica a atração de investimentos, a permanência de empresas no país, a imagem do Brasil junto a governos e organismos multilaterais internacionais e o enfrentamento à pandemia de Covid-19.
O tom é frio, didático, sem adjetivos. A cada diatribe bolsonaresca, é contraposto um dano claro, tangível em moeda, ao bolso dos que ainda, apesar de tudo, apoiam o presidente.
Vale ver o vídeo, vale repassar para aqueles seus grupos de WhatsApp que, ainda hoje, 260 mil mortos depois, continuam dando eco a tanta maldade, tanta desinformação criminosa e tanto desprezo à vida cometidos pelo presidente, por seus auxiliares e puxa-sacos que usam microfones de empresas de comunicação antes sérias para cometer aleivosias da mesma natureza.
Não é só o vídeo do custo Bolsonaro que mostra que a chave da maioria dos brasileiros começou a virar, como, a muito custo, ocorreu na América capturada pelo trumpismo.
Os governadores, alvos de um dos mais recentes chiliques do capitão, responderam com uma nota elegante, concisa, também ela recheada de fatos, e deixando claro que, sim, o governo federal decidiu não comprar vacinas quando elas eram negociadas entre os fabricantes e os países, lá atrás, no início do segundo semestre de 2020 e que, por isso, agora, estamos no fim da fila para imunizar nossa população.
O que a cobrança dos governadores e o vídeo fazem é justamente aquilo que tira Bolsonaro do sério: acuá-lo, chamá-lo a sua responsabilidade, já que o presidente, além de tudo, não gosta de trabalhar e é, antes de tudo, medroso. Morre de medo de panelaço, se pela de pavor de impeachment e fica virado no Jiraya quando sua popularidade cai nas pesquisas.
Isso se deve ao fato de que, mesmo sendo intelectualmente prejudicado, ou justamente por isso, Bolsonaro sabe que chegou muito além de suas capacidades. Isso só se deu por uma série de circunstâncias de 2018 que, se espera, dificilmente se repetirão em 2022.
Mas podem, sim, se repetir. Esse é o sonho do capitão acuado. Por isso ele vocifera todos os dias e tenta transformar o enfrentamento da pandemia num Fla-Flu entre ele e os governadores, na tentativa de fazer uma cortina de fumaça para a compra de uma mansão de R$ 6 milhões por seu filho Flávio Bolsonaro, na cara da Justiça que investiga seu esquema de rachadinhas.
Bolsonaro sabe que sua única chance de se reeleger é repetir o segundo turno contra o PT.
Também nisso o vídeo cirúrgico e a reação dos governadores avançam: nos tiram dessa polarização burra, velha, segundo a qual é ou Bolsonaro ou o PT. Se for essa a lógica a prevalecer, o presidente vai se reeleger. Porque tem a máquina e porque as pesquisas mostram que o antipetismo não retrocedeu.
Se, por outro lado, se consolidar a constatação de que Bolsonaro é um risco à vida dos brasileiros e à economia do país, como de fato é, pode se construir uma alternativa viável para que superemos o pesadelo, que dependerá, também, da união de várias forças políticas, em uma ou poucas candidaturas com lastro social e projeto de país.
Brasil não tem presidente da República, Bolsonaro é que tem o Brasil
A pandemia revelou que dentro do governo de Jair Bolsonaro existem latifúndios improdutivos à espera de gestores que os ocupem. O Ministério da Saúde, por exemplo, é uma área não ocupada. Ou indevidamente ocupada. O Planalto é um espaço baldio onde crescem apenas ervas daninhas. Mas Bolsonaro não perde oportunidade para reafirmar seu direito de propriedade sobre o Brasil.
Nesta terça-feira, 2 de março do ano da graça de 2021, quando o país amargou o recorde de 1.726 mortos por covid num único dia, Bolsonaro disse ao seu rebanho: "Querem me culpar pelas 200 e tantas mil mortes. O Brasil é o 20º país do mundo em mortes por milhão de habitantes. A gente lamenta? Lamentamos. Mas tem outros países com IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), renda e orçamento melhor que o meu em que morre mais gente".
Em maio do ano passado, um dia depois de discursar para uma aglomeração em que seus devotos pediam o fechamento do Congresso e do Supremo em frente ao Quartel-General do Exército, Bolsonaro justificou-se: "Eu sou, realmente, a Constituição." Agora, lança sobre o Brasil um olhar de fazendeiro. Ou de um monarca.
Bolsonaro não é, evidentemente a Constituição. Tampouco dispõe de título de propriedade ou de soberano. Não está autorizado a tratar o Brasil como se fosse um fazendão de sua propriedade. Ou uma monarquia onde reina um vírus. Mas o linguajar do capitão ajuda a entender o drama psíquico-administrativo que o leva lidar com a maior crise sanitária da história com o ânimo de quem cultiva o insolúvel como uma flor.
O Brasil ocupa o segundo lugar do mundo em número absoluto de mortes por covid, atrás dos Estados Unidos. Aqui, desceram à cova 257 mil pessoas. Lá, 515 mil. Levando-se em conta o número de cadáveres por 100 mil habitantes, o Brasil ocupa o 12º lugar num ranking elaborado pela Universidade Johns Hopkins.
Entretanto, Bolsonaro se refere à hecatombe com certo alívio. Não encomendou vacinas com antecedência. Mas considera-se o benfeitor da cloroquina. "Por que está morrendo menos gente aqui? Tem que ter uma explicação. Seria o tratamento precoce? Se ficar em casa até sentir falta de ar, como dizia o sr. Mandetta, você vai para o hospital para ser intubado. E, se for intubado, você sabe, né? Em torno de 60% a 70% das pessoas infelizmente entram em óbito".
Outra fonte de alívio para Bolsonaro é a reinterpretação que ele faz de uma decisão do Supremo Tribunal Federal. A despeito de a Corte já ter emitido uma nota de desmentido, o capitão imagina ter recebido salvo-conduto para sempre botar a culpa em alguém pelas restrições que a pandemia impõe. "Segundo o STF, isso cabe a governadores e prefeitos. Lockdown não é culpa minha: é de governadores e alguns prefeitos".
O Brasil não merecia semelhante castigo. Depois de suportar a esquizogovernança de Dilma, de encarar a cleptoanálise de grupo de Temer e de descer ao manicômio prisional em que Lula se fingiu de preso político durante um ano e sete meses, o país atura mais uma presidência de miolo mole.
Quem se enxerga como uma espécie de personificação da Constituição não se sente obrigado a seguir o texto constitucional. Interpreta-o à sua maneira. O Brasil não tem um presidente da República, Bolsonaro é que tem o Brasil. Governadores, prefeitos e empresários começam a desligar o personagem da tomada, equipando-se para adquirir as vacinas que o governo negligencia.
Trancado em seus rancores, Bolsonaro cogita desperdiçar energias com um pronunciamento em rede nacional de rádio e TV. Nele, voltaria a esgrimir suas idiossincrasias anticientíficas, diria que fez a sua parte ao enviar verbas aos estados e exercitaria o hábito de colocar a culpa nos outros. Curiosamente, algo como 30% dos brasileiros sentem-se confortáveis vivendo numa manicomiocracia. Mas um pedaço expressivo do país cultiva o desejo de receber alta.
Nesta terça-feira, 2 de março do ano da graça de 2021, quando o país amargou o recorde de 1.726 mortos por covid num único dia, Bolsonaro disse ao seu rebanho: "Querem me culpar pelas 200 e tantas mil mortes. O Brasil é o 20º país do mundo em mortes por milhão de habitantes. A gente lamenta? Lamentamos. Mas tem outros países com IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), renda e orçamento melhor que o meu em que morre mais gente".
Em maio do ano passado, um dia depois de discursar para uma aglomeração em que seus devotos pediam o fechamento do Congresso e do Supremo em frente ao Quartel-General do Exército, Bolsonaro justificou-se: "Eu sou, realmente, a Constituição." Agora, lança sobre o Brasil um olhar de fazendeiro. Ou de um monarca.
Bolsonaro não é, evidentemente a Constituição. Tampouco dispõe de título de propriedade ou de soberano. Não está autorizado a tratar o Brasil como se fosse um fazendão de sua propriedade. Ou uma monarquia onde reina um vírus. Mas o linguajar do capitão ajuda a entender o drama psíquico-administrativo que o leva lidar com a maior crise sanitária da história com o ânimo de quem cultiva o insolúvel como uma flor.
O Brasil ocupa o segundo lugar do mundo em número absoluto de mortes por covid, atrás dos Estados Unidos. Aqui, desceram à cova 257 mil pessoas. Lá, 515 mil. Levando-se em conta o número de cadáveres por 100 mil habitantes, o Brasil ocupa o 12º lugar num ranking elaborado pela Universidade Johns Hopkins.
Entretanto, Bolsonaro se refere à hecatombe com certo alívio. Não encomendou vacinas com antecedência. Mas considera-se o benfeitor da cloroquina. "Por que está morrendo menos gente aqui? Tem que ter uma explicação. Seria o tratamento precoce? Se ficar em casa até sentir falta de ar, como dizia o sr. Mandetta, você vai para o hospital para ser intubado. E, se for intubado, você sabe, né? Em torno de 60% a 70% das pessoas infelizmente entram em óbito".
Outra fonte de alívio para Bolsonaro é a reinterpretação que ele faz de uma decisão do Supremo Tribunal Federal. A despeito de a Corte já ter emitido uma nota de desmentido, o capitão imagina ter recebido salvo-conduto para sempre botar a culpa em alguém pelas restrições que a pandemia impõe. "Segundo o STF, isso cabe a governadores e prefeitos. Lockdown não é culpa minha: é de governadores e alguns prefeitos".
O Brasil não merecia semelhante castigo. Depois de suportar a esquizogovernança de Dilma, de encarar a cleptoanálise de grupo de Temer e de descer ao manicômio prisional em que Lula se fingiu de preso político durante um ano e sete meses, o país atura mais uma presidência de miolo mole.
Quem se enxerga como uma espécie de personificação da Constituição não se sente obrigado a seguir o texto constitucional. Interpreta-o à sua maneira. O Brasil não tem um presidente da República, Bolsonaro é que tem o Brasil. Governadores, prefeitos e empresários começam a desligar o personagem da tomada, equipando-se para adquirir as vacinas que o governo negligencia.
Trancado em seus rancores, Bolsonaro cogita desperdiçar energias com um pronunciamento em rede nacional de rádio e TV. Nele, voltaria a esgrimir suas idiossincrasias anticientíficas, diria que fez a sua parte ao enviar verbas aos estados e exercitaria o hábito de colocar a culpa nos outros. Curiosamente, algo como 30% dos brasileiros sentem-se confortáveis vivendo numa manicomiocracia. Mas um pedaço expressivo do país cultiva o desejo de receber alta.
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