Meteora (Grécia) |
sábado, 13 de janeiro de 2018
A permanente precariedade das escolas brasileiras
Sebastião Nunes escreveu, em 2006, neste jornal, sobre a educação brasileira, citando Johann Jakob von Tschudi para analisar nossas escolas, que chocam quem se preocupa com a qualidade do ensino e suas implicações sociais.
Esse naturalista suíço manifestou, em meados do século XIX, preconceito sobre os habitantes deste país, mas registrou admiração quanto às proposições do Império, pois a Constituição de 1824 determinava, no inciso XXXII do artigo 179, que o ensino primário gratuito seria oferecido a todas as crianças. Era um avanço para aquela época, mesmo diante dos países europeus. Não tínhamos, entretanto, um sistema educacional consolidado, porque os portugueses não propiciavam acesso à instrução para preservar sua colônia mais importante. Mesmo assim, uma lei de 15 de outubro de 1827 exigia a criação de escola em qualquer cidade, vila e povoado para que o futuro fosse promissor para todos os súditos.
A tradição cartorial falou mais alto, nos anos seguintes, pois aquela prescrição compunha as seis Cartas subsequentes, mas o Estado não se mobilizou para universalizar o ensino até os anos 1960. Ele apenas iniciou a expansão das vagas escolares, sem oferecer, todavia, os recursos humanos e materiais correspondentes. Isso implicou perda na qualidade da educação, exceto pelo esforço fugaz de poucas prefeituras e alguns Estados. Colhemos, então, atualmente, os frutos desse descalabro, que aumentou com a ampliação da rede particular do ensino decorrente da equivocada política educacional de um expoente da intelectualidade brasileira, o presidente Fernando Henrique Cardoso, e com o acesso às universidades públicas pelo sistema de cotas para minorias sociais.
Há muitas evidências de que concluintes do ensino médio não interpretam nem redigem com propriedade, não dominam as operações matemáticas básicas e desconhecem conceitos básicos de geografia, história e ciências. Essas carências têm exigido que professores universitários criem cursos de nivelamento no ensino superior para desenvolver os programas do currículo mínimo; mesmo assim, muitos graduados saem da faculdade sem a preparação adequada ao mercado de trabalho. Há, a cada geração, uma “progressão para trás”, pois as mais importantes universidades têm recebido candidatos ao mestrado e ao doutorado que não se expressam com propriedade em sua área de conhecimento. Assim, muitos diplomados escancaram nossa tradição cartorial quanto à importância de certificados sem a correspondente qualificação de seus portadores, que não se mantêm em seu ofício, indo para ocupações inferiores.
Enquanto isso, as autoridades fazem discursos sobre seu compromisso com a educação e adquirem equipamentos ao gosto de fornecedores. Não tomam providências, entretanto, para que as escolas melhorem, mesmo quando têm notícias dos avanços obtidos pela Coreia do Sul, Finlândia e Irlanda. São os exemplos mais recentes de crescimento espetacular na economia e na qualidade de vida da coletividade.
Esse naturalista suíço manifestou, em meados do século XIX, preconceito sobre os habitantes deste país, mas registrou admiração quanto às proposições do Império, pois a Constituição de 1824 determinava, no inciso XXXII do artigo 179, que o ensino primário gratuito seria oferecido a todas as crianças. Era um avanço para aquela época, mesmo diante dos países europeus. Não tínhamos, entretanto, um sistema educacional consolidado, porque os portugueses não propiciavam acesso à instrução para preservar sua colônia mais importante. Mesmo assim, uma lei de 15 de outubro de 1827 exigia a criação de escola em qualquer cidade, vila e povoado para que o futuro fosse promissor para todos os súditos.
Há muitas evidências de que concluintes do ensino médio não interpretam nem redigem com propriedade, não dominam as operações matemáticas básicas e desconhecem conceitos básicos de geografia, história e ciências. Essas carências têm exigido que professores universitários criem cursos de nivelamento no ensino superior para desenvolver os programas do currículo mínimo; mesmo assim, muitos graduados saem da faculdade sem a preparação adequada ao mercado de trabalho. Há, a cada geração, uma “progressão para trás”, pois as mais importantes universidades têm recebido candidatos ao mestrado e ao doutorado que não se expressam com propriedade em sua área de conhecimento. Assim, muitos diplomados escancaram nossa tradição cartorial quanto à importância de certificados sem a correspondente qualificação de seus portadores, que não se mantêm em seu ofício, indo para ocupações inferiores.
Enquanto isso, as autoridades fazem discursos sobre seu compromisso com a educação e adquirem equipamentos ao gosto de fornecedores. Não tomam providências, entretanto, para que as escolas melhorem, mesmo quando têm notícias dos avanços obtidos pela Coreia do Sul, Finlândia e Irlanda. São os exemplos mais recentes de crescimento espetacular na economia e na qualidade de vida da coletividade.
O povo que não chora
Começava Patrocínio a ser hostilizado pelos propagandistas da República, que o acusavam de haver abandonado as suas fileiras, lisonjeado pelo beijo que a Princesa dera no seu filho pequeno, quando, num "meeting", o grande abolicionista tentou falar.
- O Brasil... - ia começando, quando se deteve.
Atribuindo aquela pausa a um estado de decadência, a multidão começou a rir. Patrocínio olhou-a, do alto, e continuou:
- O Brasil... que somos nós?
Silêncio absoluto.
- Sim; que somos nós? - tornou.
E formidável:
- Somos um povo que ri, quando devia chorar!
Coelho Neto, Discurso na Academia Brasileira de Letras
O ano das grandes mentiras
Prepare-se, caro leitor: estamos prestes a entrar em um disputado campeonato de mentiras. No plano político, naturalmente. Não bastassem os caudalosos esquemas de enganação com desvios bilionários, na surdina, do dinheiro público que foi parar no bolso de corjas de larápios partidários. Não fossem suficientes as promessas de campanha de 2014, jamais cumpridas e edulcoradas por filmes que mostravam o paraíso para depois entregar o inferno. Não sobrassem demonstrações de que alguns malfeitores do passado tentarão tudo de novo. Teremos agora talvez a maior e mais perigosa temporada eleitoral movida a “fake news” da história do País. A notícia falsa será desta vez uma arma letal, sem dúvida, e talvez determinante. Tal qual ocorreram nos EUA que produziram Trump e no Brexit da Inglaterra. Espalhar falsas informações para colher simpatizantes não é exatamente um expediente inédito. Mas deverá assumir proporções gigantescas e assustadoras nesta que já é chamada de “A era da pós-verdade”. Com o agravante de que, por aqui, ainda não entrou em vigor qualquer marco legal para coibir diretamente o fenômeno – verificado com maior frequência nas redes sociais. As fake news viraram uma praga.
Autoridades tentam controlar a moléstia a qualquer custo. Na Alemanha passou a valer, desde o início do ano, uma lei que obriga mídias digitais a retirarem imediatamente de seu ambiente conteúdos que pregam o ódio e trazem falsas informações, sob pena de multas pesadas. A França quer ir além. O presidente Emmanuel Macron fala inclusive em prisão daqueles que difundirem as chamadas fake news. Projeto de lei nesse sentido entrou no Parlamento e almeja também maior agilidade e eficiência no julgamento dos casos. No Brasil o faroeste da lorota segue em franca expansão. O ministro Luiz Fux, que assume o Tribunal Superior Eleitoral no mês que vem, tenta colocar ordem na casa. É favorável ao bloqueio de bens e a detenção dos infratores que propagam inverdades para angariar vantagens nas urnas. Medida que prevê cadeia por mais de dois anos aos autores de fake news chegou ao Congresso, mas ali se arrasta, sem votação, por motivo óbvio: falta disposição parlamentar para legislar contra o próprio interesse. Seria “prejudicial” a muitas campanhas dos políticos nativos um controle firme das fake news.
A despeito da resistência, a Polícia Federal arma uma força-tarefa com esse intuito. Já mobilizou um grupo comandado por três delegados e um perito que vai atrás de quem sucumbir ao crime. A erradicação total do problema só deverá ocorrer, de verdade, quando cada um dos internautas se precaver. Mudar hábitos. Para começar, é preciso ficar atento à cartilha de procedimentos: não aceitar e não disseminar a primeira notícia que lhe chegar às mãos de origem duvidosa. Mesmo que ela atenda a seus interesses ou desejos. Não se faz valer uma ideia dessa maneira, ludibriando. No plano da desinformação só existem equívocos. Erros que cobrarão seu preço lá na frente. No geral, diferentes pontos de vista não podem significar diferentes fatos. Viram versões. Evoluem para deturpações. É preciso consultar. Fazer checagem. Buscar fontes seguras. Tais cuidados teram de se tornar rotina. Do contrário iremos assistir mais e mais vítimas caindo no grande conto do vigário. Inclusive você. Nunca é demais lembrar que as eleições americanas ficaram seriamente comprometidas quando mais de 100 sites a favor de Trump foram criados na Macedônia, de onde eram disparados diariamente vídeos e notícias inventadas para dar corpo a sua candidatura. Na mais célebre das mentiras plantadas ali, veiculou-se que o Papa Francisco e o Vaticano apoiavam Trump. Foi o bastante para que uma penca de republicanos conservadores ainda hesitantes logo tomasse partido a favor do empresário. Deu no que deu. As fake news estão no ar e todo o cuidado é pouco.
Autoridades tentam controlar a moléstia a qualquer custo. Na Alemanha passou a valer, desde o início do ano, uma lei que obriga mídias digitais a retirarem imediatamente de seu ambiente conteúdos que pregam o ódio e trazem falsas informações, sob pena de multas pesadas. A França quer ir além. O presidente Emmanuel Macron fala inclusive em prisão daqueles que difundirem as chamadas fake news. Projeto de lei nesse sentido entrou no Parlamento e almeja também maior agilidade e eficiência no julgamento dos casos. No Brasil o faroeste da lorota segue em franca expansão. O ministro Luiz Fux, que assume o Tribunal Superior Eleitoral no mês que vem, tenta colocar ordem na casa. É favorável ao bloqueio de bens e a detenção dos infratores que propagam inverdades para angariar vantagens nas urnas. Medida que prevê cadeia por mais de dois anos aos autores de fake news chegou ao Congresso, mas ali se arrasta, sem votação, por motivo óbvio: falta disposição parlamentar para legislar contra o próprio interesse. Seria “prejudicial” a muitas campanhas dos políticos nativos um controle firme das fake news.
A despeito da resistência, a Polícia Federal arma uma força-tarefa com esse intuito. Já mobilizou um grupo comandado por três delegados e um perito que vai atrás de quem sucumbir ao crime. A erradicação total do problema só deverá ocorrer, de verdade, quando cada um dos internautas se precaver. Mudar hábitos. Para começar, é preciso ficar atento à cartilha de procedimentos: não aceitar e não disseminar a primeira notícia que lhe chegar às mãos de origem duvidosa. Mesmo que ela atenda a seus interesses ou desejos. Não se faz valer uma ideia dessa maneira, ludibriando. No plano da desinformação só existem equívocos. Erros que cobrarão seu preço lá na frente. No geral, diferentes pontos de vista não podem significar diferentes fatos. Viram versões. Evoluem para deturpações. É preciso consultar. Fazer checagem. Buscar fontes seguras. Tais cuidados teram de se tornar rotina. Do contrário iremos assistir mais e mais vítimas caindo no grande conto do vigário. Inclusive você. Nunca é demais lembrar que as eleições americanas ficaram seriamente comprometidas quando mais de 100 sites a favor de Trump foram criados na Macedônia, de onde eram disparados diariamente vídeos e notícias inventadas para dar corpo a sua candidatura. Na mais célebre das mentiras plantadas ali, veiculou-se que o Papa Francisco e o Vaticano apoiavam Trump. Foi o bastante para que uma penca de republicanos conservadores ainda hesitantes logo tomasse partido a favor do empresário. Deu no que deu. As fake news estão no ar e todo o cuidado é pouco.
Brasil: a imperfeita separação dos poderes
O grande autor austríaco Stefan Zweig, que se refugiou no Brasil — onde se suicidou — escreveu um belíssimo romance intitulado A Confusão dos Sentimentos em que conta a história de um rapaz desorientado que se sente atraído, ao mesmo tempo, por seu professor de literatura e por sua jovem mulher. O romance trata admiravelmente da ambiguidade do relacionamento nesse ménage à trois, e das alternâncias nas relações de dominação que os ligam.
A analogia do romance de Zweig com a situação no Brasil pode parecer um pouco forçada, pelo contexto, pelas diferenças entre situações individuais e situações coletivas, pelas consequências. Mas a semelhança, parece-me, não é tão absurda tendo em vista que, em ambos os casos, instaura-se o caos. No caso do romance de Zweig, trata-se de caos na vida e na alma de três pessoas, levando-as a extremo sofrimento. No caso do Brasil, o caos político, judiciário e econômico leva igualmente a extremo sofrimento, só que não mais para um único indivíduo, mas para toda uma sociedade.
A extrema “confusão” ora prevalecente no Brasil não deixa de vir também dos sentimentos. É, entre outros, fruto do total desrespeito ao princípio fundamental em que se apoiam as democracias, ou seja, o da separação dos três poderes. Por mais simbólica que seja a praça de Brasília que leva esse nome, rodeada que é pelo Palácio do Planalto, sede do Executivo, pelo Congresso, onde se deveria legislar, e pelo templo da justiça, o Supremo Tribunal Federal, é apenas um símbolo. Em nosso país, vivemos uma situação na qual o Judiciário legisla, o Executivo julga e o Legislativo executa. E onde, da mesma forma, o Executivo entra em choque com o Legislativo, que por sua vez, se acha competente para desfazer sentenças judiciais.
Há vários exemplos recentes dessa confusão. O que mais chamou a atenção talvez tenha sido o decreto de indulto que saiu do Palácio de Planalto às vésperas do Natal. Menos daninho porque menos abrangente, mas igualmente escandaloso, foi a interferência do legislativo carioca na ordem de prisão do seu presidente e de dois de seus comparsas. Há ainda o caso, desta vez dentro do mesmo poder mas em instâncias diferentes, do ministro do Supremo que manda soltar um amigo seu condenado em 1ª instância. Esses exemplos não esgotam os casos ocorridos. São apenas os que mais chamaram a atenção por sua ousadia e pelo descaso com a opinião pública.
Recorro ao pensador francês Charles de Montesquieu, cuja obra De l’Esprit des Lois (O Espírito das Leis) permanece, passados mais de 250 anos, o grande clássico sobre a separação dos poderes. O fundamento de sua ideia relativa aos três poderes, é o de que a separação é indispensável porque, se o legislador se confunde com o executor, está aberta a porta aos nepotismos, favoritismos e à corrupção, já que existe sério risco de que o legislador formule e aplique leis que lhe sejam mais favoráveis. Se o executivo se confunde com o juiz, como controlar as decisões que dele emanam?
Acredito que se Montesquieu pudesse ver o que está-se passando no Brasil do século XXI, felicitar-se-ia pela sua clarividência. Nossa situação é a prova contrario sensu da absoluta necessidade de se respeitar a separação e a independência dos três poderes. Nos Estados Unidos, exemplo de democracia por excelência, ora testada inclusive pelo atual governo que quer livrar-se dos constrangimentos da Constituição, observa-se rigorosamente o princípio da separação dos poderes, mas existe, para evitar os abusos de poder de cada setor, o mecanismo dos checks and balances, através do qual os poderes podem controlar-se uns aos outros, dentro de suas competências. É assim que o Judiciário pode e deve controlar a constitucionalidade das leis e das ações do Executivo, que o Executivo pode vetar leis (sendo que o Congresso pode cancelar o veto por uma maioria de dois terços) e que o Congresso é competente para decidir sobre o impeachment do Executivo e sobre a alocação de recursos proposta por ele. Longe de entrar em contradição com o princípio de Montesquieu, esses checks and balances asseguram a fiel observância do papel de cada um, sob pena de advertências e sanções.
Atualmente no Brasil, a separação dos poderes se dilui na prática: o controle de um sobre as ações de outro é relativo. Há vários casos, como o da nomeação de uma ministra do Trabalho condenada em ações trabalhistas e de um diretor do Detran que perdeu a carteira por repetidas infrações às leis do tráfego. Justificativas absurdas como, por um lado, que é constitucional que o presidente nomeie quem quiser, ou, por outro, dizer que um diretor de Detran não precisa ter carteira de motorista válida, demonstram a absoluta falta de decoro e de compostura dos nossos governantes.
Nos EUA, há uma prática denominada vetting, que bem poderia ser implantada no Brasil. Antes de anunciar nomes para altos cargos do Governo, o indivíduo é investigado para que se comprove que não está envolvido em situações duvidosas. Uma espécie de “atestado de bons antecedentes”. Só depois de receber uma avaliação positiva é que o presidente ou o ministro procede à nomeação. Esse mecanismo evita os constrangimentos que estamos testemunhando agora.
Infelizmente, enquanto imperarem no Brasil, como motores da vida política, os interesses particulares, a ganância, a corrupção; enquanto não se instaurar uma austeridade absolutamente necessária para evitar que realizações inúteis e mirabolantes, mas que oferecem oportunidades políticas e de enriquecimento ilícito, se sobreponham a projetos destinados a melhorar as condições de vida no país, como são os ligados a educação e saúde, enquanto, enfim, confundam-se meios e fins, e as ações de cada poder sejam guiadas exclusivamente pelos interesses de seus integrantes e não pelo interesse público, não há como mostrar-se otimista quanto a nosso futuro institucional.
Stefan Zweig é muito conhecido no Brasil pela autoria de um livro, ao que tudo indica subsidiado pela administração Vargas, denominado Brasil, País do Futuro. A julgar pelo andar da carruagem, sempre será.
A analogia do romance de Zweig com a situação no Brasil pode parecer um pouco forçada, pelo contexto, pelas diferenças entre situações individuais e situações coletivas, pelas consequências. Mas a semelhança, parece-me, não é tão absurda tendo em vista que, em ambos os casos, instaura-se o caos. No caso do romance de Zweig, trata-se de caos na vida e na alma de três pessoas, levando-as a extremo sofrimento. No caso do Brasil, o caos político, judiciário e econômico leva igualmente a extremo sofrimento, só que não mais para um único indivíduo, mas para toda uma sociedade.
A extrema “confusão” ora prevalecente no Brasil não deixa de vir também dos sentimentos. É, entre outros, fruto do total desrespeito ao princípio fundamental em que se apoiam as democracias, ou seja, o da separação dos três poderes. Por mais simbólica que seja a praça de Brasília que leva esse nome, rodeada que é pelo Palácio do Planalto, sede do Executivo, pelo Congresso, onde se deveria legislar, e pelo templo da justiça, o Supremo Tribunal Federal, é apenas um símbolo. Em nosso país, vivemos uma situação na qual o Judiciário legisla, o Executivo julga e o Legislativo executa. E onde, da mesma forma, o Executivo entra em choque com o Legislativo, que por sua vez, se acha competente para desfazer sentenças judiciais.
Há vários exemplos recentes dessa confusão. O que mais chamou a atenção talvez tenha sido o decreto de indulto que saiu do Palácio de Planalto às vésperas do Natal. Menos daninho porque menos abrangente, mas igualmente escandaloso, foi a interferência do legislativo carioca na ordem de prisão do seu presidente e de dois de seus comparsas. Há ainda o caso, desta vez dentro do mesmo poder mas em instâncias diferentes, do ministro do Supremo que manda soltar um amigo seu condenado em 1ª instância. Esses exemplos não esgotam os casos ocorridos. São apenas os que mais chamaram a atenção por sua ousadia e pelo descaso com a opinião pública.
Recorro ao pensador francês Charles de Montesquieu, cuja obra De l’Esprit des Lois (O Espírito das Leis) permanece, passados mais de 250 anos, o grande clássico sobre a separação dos poderes. O fundamento de sua ideia relativa aos três poderes, é o de que a separação é indispensável porque, se o legislador se confunde com o executor, está aberta a porta aos nepotismos, favoritismos e à corrupção, já que existe sério risco de que o legislador formule e aplique leis que lhe sejam mais favoráveis. Se o executivo se confunde com o juiz, como controlar as decisões que dele emanam?
Acredito que se Montesquieu pudesse ver o que está-se passando no Brasil do século XXI, felicitar-se-ia pela sua clarividência. Nossa situação é a prova contrario sensu da absoluta necessidade de se respeitar a separação e a independência dos três poderes. Nos Estados Unidos, exemplo de democracia por excelência, ora testada inclusive pelo atual governo que quer livrar-se dos constrangimentos da Constituição, observa-se rigorosamente o princípio da separação dos poderes, mas existe, para evitar os abusos de poder de cada setor, o mecanismo dos checks and balances, através do qual os poderes podem controlar-se uns aos outros, dentro de suas competências. É assim que o Judiciário pode e deve controlar a constitucionalidade das leis e das ações do Executivo, que o Executivo pode vetar leis (sendo que o Congresso pode cancelar o veto por uma maioria de dois terços) e que o Congresso é competente para decidir sobre o impeachment do Executivo e sobre a alocação de recursos proposta por ele. Longe de entrar em contradição com o princípio de Montesquieu, esses checks and balances asseguram a fiel observância do papel de cada um, sob pena de advertências e sanções.
Atualmente no Brasil, a separação dos poderes se dilui na prática: o controle de um sobre as ações de outro é relativo. Há vários casos, como o da nomeação de uma ministra do Trabalho condenada em ações trabalhistas e de um diretor do Detran que perdeu a carteira por repetidas infrações às leis do tráfego. Justificativas absurdas como, por um lado, que é constitucional que o presidente nomeie quem quiser, ou, por outro, dizer que um diretor de Detran não precisa ter carteira de motorista válida, demonstram a absoluta falta de decoro e de compostura dos nossos governantes.
Nos EUA, há uma prática denominada vetting, que bem poderia ser implantada no Brasil. Antes de anunciar nomes para altos cargos do Governo, o indivíduo é investigado para que se comprove que não está envolvido em situações duvidosas. Uma espécie de “atestado de bons antecedentes”. Só depois de receber uma avaliação positiva é que o presidente ou o ministro procede à nomeação. Esse mecanismo evita os constrangimentos que estamos testemunhando agora.
Infelizmente, enquanto imperarem no Brasil, como motores da vida política, os interesses particulares, a ganância, a corrupção; enquanto não se instaurar uma austeridade absolutamente necessária para evitar que realizações inúteis e mirabolantes, mas que oferecem oportunidades políticas e de enriquecimento ilícito, se sobreponham a projetos destinados a melhorar as condições de vida no país, como são os ligados a educação e saúde, enquanto, enfim, confundam-se meios e fins, e as ações de cada poder sejam guiadas exclusivamente pelos interesses de seus integrantes e não pelo interesse público, não há como mostrar-se otimista quanto a nosso futuro institucional.
Stefan Zweig é muito conhecido no Brasil pela autoria de um livro, ao que tudo indica subsidiado pela administração Vargas, denominado Brasil, País do Futuro. A julgar pelo andar da carruagem, sempre será.
A merreca do candidato
O par dialético
A esquerda brasileira tem uma forte tradição nacionalista, resultado da convergência de velhas concepções nacional-libertadoras e do populismo. Até o golpe de 1964, a luta contra o imperialismo era considerada mais importante do que a defesa da democracia. No governo João Goulart, por exemplo, a aliança entre comunistas, petebistas e pessedistas que levou Juscelino Kubitschek à Presidência foi rompida. A esquerda considerava um retrocesso político sua volta ao poder nas eleições marcadas para 1965, devido à sua “conciliação” com os Estados Unidos. Enquanto o líder petebista Leonel Brizola se lançava candidato a presidente (“cunhado não é parente”), o líder comunista Luís Carlos Prestes articulava a reeleição de João Goulart. A divisão do campo democrático por causa das ideias nacionalistas jogou os liberais nos braços dos setores conservadores liderados por Carlos Lacerda e Magalhães Pinto, que articulavam o golpe de Estado. Entre eles estavam, por exemplo, o próprio Juscelino e aquele que viria a liderar a campanha das Diretas Já, Ulysses Guimarães.
Com a deposição de Goulart, o então presidente da Câmara dos Deputados Ranieri Mazzilli assumiu interinamente a Presidência da República, mas a junta militar (general Artur da Costa e Silva, brigadeiro Francisco de Assis Correia de Melo e o almirante Augusto Rademaker), autodenominada “Comando Supremo da Revolução”, exigiu plenos poderes do Congresso para fazer cassações de mandatos e demitir servidores públicos. O historiador Hélio Silva conta que, em 8 de abril de 1964, um grupo de parlamentares, do qual fazia parte Ulysses, redigiu o ato constitucional a ser votado pelo Congresso para delegar esses poderes. No dia 9, porém, os militares editaram o Ato Institucional nº 1 (AI-1), que conferia poderes extraordinários ao Executivo e estipulava a eleição de um novo presidente e de um vice-presidente no prazo de dois dias. Em 11 de abril, foram eleitos indiretamente para a Presidência da República o general Humberto de Alencar Castelo Branco e, para a vice-presidência, José Maria Alkmin, indicado pela maioria do Congresso. Quatro dias depois, tomaram posse. Ulysses e outros pessedistas que apoiaram o golpe de 1964 logo romperam com os militares, sendo seguidos por políticos da antiga UDN. Juscelino e Lacerda foram cassados.
Uma parte da esquerda aprendeu a lição do golpe e passou a defender a democracia, mas outra optou pela luta armada, numa perspectiva de que a tomada de poder coincidiria com uma revolução, nos moldes da cubana. Tendo a guerra fria como pano de fundo, demorou para que os setores moderados da esquerda, como os antigos PCB, PTB e PSB, na ilegalidade, conseguissem convencer os demais de que o caminho da luta pela redemocratização do país passava pela disputa eleitoral e pelo apoio ao partido de oposição criado pelo próprio regime, o MDB, já então liderado pelo deputado Ulysses Guimarães e outros caciques pessedistas, como Amaral Peixoto e Tancredo Neves. Essa experiência de luta contra o regime militar levou a esquerda, na redemocratização, a inverter o chamado “par dialético”: a luta passou a ser democrática e nacional. Trocando em miúdos, subordinou-se o nacionalismo à defesa da democracia.
Quando a esquerda chegou ao poder no Brasil, o mundo já não era o mesmo da guerra fria. O velho colonialismo havia acabado, logo se viu o Muro de Berlim ser derrubado e a antiga União Soviética se desintegrar, enquanto a China fazia as pazes com o capitalismo. Entretanto, o nacional desenvolvimentismo continuou sendo o eixo de sua doutrina econômica, principalmente porque a nossa industrialização fora protagonizada pala presença do Estado na atividade produtiva, num acelerado processo de substituição de importações. Era uma economia autárquica, que entrou em colapso após a crise do petróleo dos anos 1970. O Estado perdeu a capacidade de financiamento e o país passou por um longo ciclo de crises e baixo crescimento, com hiperinflação no governo Sarney e recessão no governo Dilma. Somente agora a economia voltou a crescer, mas a crise de financiamento do Estado continua impondo um “voo de galinha”. Por trás da crise, há uma mudança de cenário na economia mundial, na qual o velho desenvolvimentismo não tem vez.
No governo de Fernando Henrique Cardoso, o permanente choque entre desenvolvimentistas e social-liberais na equipe econômica já havia mostrado a resiliência das ideias nacionalistas; mas foi nos governos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de Dilma Rousseff que elas dominaram a cena e demonstraram seu anacronismo em relação à globalização e às mudança tecnológicas que ocorrem no mundo. Quem acredita que o impeachment de Dilma Rousseff sepultou essas ideias está muito enganado. A recente entrevista do professor Luiz Gonzaga Beluzzo sobre a conjuntura política e econômica do país mostra bem isso. Entretanto, o nacionalismo é a bandeira das forças mais conservadoras e retrógradas da Europa e dos Estados Unidos. Aqui não é muito diferente: a aposta na democracia e na integração do Brasil à economia mundial corre perigo nas eleições de 2018.
Uma parte da esquerda aprendeu a lição do golpe e passou a defender a democracia, mas outra optou pela luta armada, numa perspectiva de que a tomada de poder coincidiria com uma revolução, nos moldes da cubana. Tendo a guerra fria como pano de fundo, demorou para que os setores moderados da esquerda, como os antigos PCB, PTB e PSB, na ilegalidade, conseguissem convencer os demais de que o caminho da luta pela redemocratização do país passava pela disputa eleitoral e pelo apoio ao partido de oposição criado pelo próprio regime, o MDB, já então liderado pelo deputado Ulysses Guimarães e outros caciques pessedistas, como Amaral Peixoto e Tancredo Neves. Essa experiência de luta contra o regime militar levou a esquerda, na redemocratização, a inverter o chamado “par dialético”: a luta passou a ser democrática e nacional. Trocando em miúdos, subordinou-se o nacionalismo à defesa da democracia.
Quando a esquerda chegou ao poder no Brasil, o mundo já não era o mesmo da guerra fria. O velho colonialismo havia acabado, logo se viu o Muro de Berlim ser derrubado e a antiga União Soviética se desintegrar, enquanto a China fazia as pazes com o capitalismo. Entretanto, o nacional desenvolvimentismo continuou sendo o eixo de sua doutrina econômica, principalmente porque a nossa industrialização fora protagonizada pala presença do Estado na atividade produtiva, num acelerado processo de substituição de importações. Era uma economia autárquica, que entrou em colapso após a crise do petróleo dos anos 1970. O Estado perdeu a capacidade de financiamento e o país passou por um longo ciclo de crises e baixo crescimento, com hiperinflação no governo Sarney e recessão no governo Dilma. Somente agora a economia voltou a crescer, mas a crise de financiamento do Estado continua impondo um “voo de galinha”. Por trás da crise, há uma mudança de cenário na economia mundial, na qual o velho desenvolvimentismo não tem vez.
No governo de Fernando Henrique Cardoso, o permanente choque entre desenvolvimentistas e social-liberais na equipe econômica já havia mostrado a resiliência das ideias nacionalistas; mas foi nos governos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de Dilma Rousseff que elas dominaram a cena e demonstraram seu anacronismo em relação à globalização e às mudança tecnológicas que ocorrem no mundo. Quem acredita que o impeachment de Dilma Rousseff sepultou essas ideias está muito enganado. A recente entrevista do professor Luiz Gonzaga Beluzzo sobre a conjuntura política e econômica do país mostra bem isso. Entretanto, o nacionalismo é a bandeira das forças mais conservadoras e retrógradas da Europa e dos Estados Unidos. Aqui não é muito diferente: a aposta na democracia e na integração do Brasil à economia mundial corre perigo nas eleições de 2018.
Medida de gente
No início de 2017, em uma das mais requintadas capitais da Europa, uma rica dama hospedou-se com o filho - ainda criança - e um senhor, definido como "amigo da família", em um luxuoso hotel.
Segundo consta, esta vetusta senhora atravessou toda a noite ingerindo bebidas alcoólicas - foi esta a conclusão dos funcionários do hotel, ao vê-la cambaleando pela portaria às 10h30 da manhã seguinte.
Preocupado com a segurança da criança que a acompanhava, o gerente do estabelecimento decidiu chamar a polícia. Tão logo chegaram, os agentes da lei foram exaustivamente desacatados após terem afirmado, à vista do bafo da distinta senhora, ainda trôpega, e das diversas taças de vinho vazias sobre a mesa, estar ela embriagada.
Chamada às falas em uma delegacia, ela confessou seu estado lamentável - fruto do seu inconformismo diante da notícia de que seu ex-parceiro engravidara sua melhor amiga. Disse ter ingerido nada menos que três garrafas de vinho, na companhia do amigo com o qual se hospedara.
Em função desta conduta deplorável, que expôs a risco uma inocente criança, esta rica senhora viu-se condenada por um juiz ao pagamento de uma multa em torno de R$ 2 mil. Inconformada, decidiu recorrer.
Diante de um tribunal, sustentou ter sido forçada a confessar uma embriaguez que jamais existira - afinal, não havia ingerido três garrafas de vinho, mas apenas duas taças. Esclareceu que seu andar trôpego, naquela ocasião, devia-se a um problema de contração muscular nos pés que, volta e meia, faz com que seu passo seja irregular.
Aclarou, ainda, que sua desorientação, com toda a certeza, era fruto da combinação daquelas duas taças de vinho com medicamentos antibióticos que havia ingerido. Finalmente, reforçou que seu forte bafo, digo, hálito intenso, devia-se apenas às duas taças de vinho - que a conduziram suavemente para a cama às 11 horas da noite. Seria impossível, assim, que tivesse sido surpreendida embriagada às 10h30 da manhã seguinte no saguão do hotel.
Diante de tão convincentes esclarecimentos, esta impoluta senhora foi absolvida das acusações que lhe foram imputadas - o tribunal deu-lhe razão e cancelou a pena de multa imposta.
Convicto de que o nível de uma civilização pode ser medido pelo que seus juízes decidem, fico a pensar sobre a quantas anda o da nossa.
Pedro Valls Feu Rosa
Segundo consta, esta vetusta senhora atravessou toda a noite ingerindo bebidas alcoólicas - foi esta a conclusão dos funcionários do hotel, ao vê-la cambaleando pela portaria às 10h30 da manhã seguinte.
Preocupado com a segurança da criança que a acompanhava, o gerente do estabelecimento decidiu chamar a polícia. Tão logo chegaram, os agentes da lei foram exaustivamente desacatados após terem afirmado, à vista do bafo da distinta senhora, ainda trôpega, e das diversas taças de vinho vazias sobre a mesa, estar ela embriagada.
Em função desta conduta deplorável, que expôs a risco uma inocente criança, esta rica senhora viu-se condenada por um juiz ao pagamento de uma multa em torno de R$ 2 mil. Inconformada, decidiu recorrer.
Diante de um tribunal, sustentou ter sido forçada a confessar uma embriaguez que jamais existira - afinal, não havia ingerido três garrafas de vinho, mas apenas duas taças. Esclareceu que seu andar trôpego, naquela ocasião, devia-se a um problema de contração muscular nos pés que, volta e meia, faz com que seu passo seja irregular.
Aclarou, ainda, que sua desorientação, com toda a certeza, era fruto da combinação daquelas duas taças de vinho com medicamentos antibióticos que havia ingerido. Finalmente, reforçou que seu forte bafo, digo, hálito intenso, devia-se apenas às duas taças de vinho - que a conduziram suavemente para a cama às 11 horas da noite. Seria impossível, assim, que tivesse sido surpreendida embriagada às 10h30 da manhã seguinte no saguão do hotel.
Diante de tão convincentes esclarecimentos, esta impoluta senhora foi absolvida das acusações que lhe foram imputadas - o tribunal deu-lhe razão e cancelou a pena de multa imposta.
Convicto de que o nível de uma civilização pode ser medido pelo que seus juízes decidem, fico a pensar sobre a quantas anda o da nossa.
Pedro Valls Feu Rosa
César, Lula e o Rubicão
Janeiro parece monótono. Parece, mas não é. E não será. Não gosto de abordar assuntos políticos, mas talvez se faça necessário este textinho, para alargar um pouco nosso pobre horizonte de povo com tão pobres escolhas.
O ex-presidente Lula vai atravessar o Rubicão em Porto Alegre (RS) no dia 24 de janeiro de 2018? Se sua condenação for confirmada pelo TRF4, estará proibido de concorrer?
Janeiro foi decisivo também para Júlio César. Em 49 a.C., portanto cinco anos antes de ser assassinado por seus inimigos do Senado, o famoso comandante militar e estadista romano voltava da campanha vitoriosa na Gália, mas estava proibido de atravessar o rio Rubicão, às portas de Roma.
Teve uma noite atormentada na véspera, dormiu pouco ou quase nada — a falta de sono lhe foi devastadora, ainda mais por ser epiléptico — perdeu-se à noite e no amanhecer do dia 11 viu que, seguindo um flautista que tocava uma linda música, alguns de seus homens já tinham atravessado o rio atrás do rapaz.
Num lance que definiu sua vida e a dos romanos, César reuniu suas tropas e atravessou o Rubicão citando em latim um verso de Menandro que ele tinha lido em grego: “Alea jacta est” (a sorte foi lançada). César gostava de resumir coisas complicadas a uma sentença. Na Gália dissera: “veni, vidi, vici” (vim, vi, venci). Era também muito supersticioso e viu no buliçoso movimento dos soldados um aviso para que rompesse a proibição e seguisse para conquistar o poder. Assim o fez.
Lula também o fará? Ele não lê nada e proclama não ser necessário ler nada. Mas tem uma formidável intuição, que raramente falha, como sabem aqueles que ele já derrotou. Mas inveja os saberes de FHC, que o derrotou duas vezes para a presidência da República. Entretanto FHC desejou a vitória de Lula, a quem passou a faixa, e não a de José Serra.
Deonísio da Silva:
O ex-presidente Lula vai atravessar o Rubicão em Porto Alegre (RS) no dia 24 de janeiro de 2018? Se sua condenação for confirmada pelo TRF4, estará proibido de concorrer?
Janeiro foi decisivo também para Júlio César. Em 49 a.C., portanto cinco anos antes de ser assassinado por seus inimigos do Senado, o famoso comandante militar e estadista romano voltava da campanha vitoriosa na Gália, mas estava proibido de atravessar o rio Rubicão, às portas de Roma.
Teve uma noite atormentada na véspera, dormiu pouco ou quase nada — a falta de sono lhe foi devastadora, ainda mais por ser epiléptico — perdeu-se à noite e no amanhecer do dia 11 viu que, seguindo um flautista que tocava uma linda música, alguns de seus homens já tinham atravessado o rio atrás do rapaz.
Num lance que definiu sua vida e a dos romanos, César reuniu suas tropas e atravessou o Rubicão citando em latim um verso de Menandro que ele tinha lido em grego: “Alea jacta est” (a sorte foi lançada). César gostava de resumir coisas complicadas a uma sentença. Na Gália dissera: “veni, vidi, vici” (vim, vi, venci). Era também muito supersticioso e viu no buliçoso movimento dos soldados um aviso para que rompesse a proibição e seguisse para conquistar o poder. Assim o fez.
Lula também o fará? Ele não lê nada e proclama não ser necessário ler nada. Mas tem uma formidável intuição, que raramente falha, como sabem aqueles que ele já derrotou. Mas inveja os saberes de FHC, que o derrotou duas vezes para a presidência da República. Entretanto FHC desejou a vitória de Lula, a quem passou a faixa, e não a de José Serra.
Deonísio da Silva:
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