domingo, 22 de agosto de 2021

Pensamento do Dia

 


E no país em que se anuncia com antecedência o dia do golpe…

Diálogo ouvido por este blog no fim da semana em um dos restaurantes mais badalados de Brasília:

– Você vai passar aonde o golpe de 7 de setembro? – perguntou um homem de meia idade a outro enquanto se serviam de uma picanha ao ponto.

– Aqui mesmo. Meus filhos e netos irão almoçar lá em casa.

– Eu estava pensando em passar na fazenda, mas aqui pode ser mais animado.

– Você acha que o golpe vai dar certo?

– Já deu.


A pouca distância dali, em outro restaurante e quase à mesma hora, Frederick Wassef, advogado do presidente Jair Bolsonaro e benfeitor de Queiroz a quem deu abrigo, saía em desabalada carreira em busca de proteção policial.

No seu encalço, com uma faca de mesa na mão, um homem, aos gritos, o acusava de ter assediado sua mulher à porta do banheiro feminino. Foi em um dos banheiros femininos do Senado que o advogado se escondeu recentemente.

Na delegacia, o depoente negou o assédio, disse que a mulher tinha idade para ser sua avó e que o homem da faca era antibolsonarista.

Se bem-sucedido o golpe tramado por Bolsonaro e seus devotos, especula-se que a República Federativa do Brasil dará lugar ao Califado do Pau Brasil que contará de início com os seguintes ministérios:

1) da Defesa do Califa; 2) Secretaria de Assuntos Milicianos Estratégicos; 3) da Economia e da Rachadinha; 4) da Falta de Educação; 5) dos Negócios da Saúde; 6) da Injustiça e da Insegurança Pública; 7) do Desmatamento; 8) das Fake News, ao qual se subordinará o Gabinete do Ódio; 9) das Aparências Exteriores; 10) o Banco do Centrão.

Necrofilia bolsonarista

Os militares têm um papel importante na defesa dos países, mas eles não devem entrar na política. A necrofilia ideológica (atração de políticos da América Latina por ideias que já se comprovaram um fracasso) é praticada tanto pela direita como pela esquerda, por políticos, empresários, professores universitários e jornalistas. Ninguém tem o monopólio da adoração por ideias fracassadas.
Moisés Naím, escritor e ex-ministro do Desenvolvimento de Carlos Andrés Pérez

Brasil naufraga no controle da pesca de arrasto

A pesca de arrasto está descontrolada há décadas no Brasil, denunciam órgãos públicos, pesquisadores e pescadores. Falta de estatísticas, de fiscalização e de manejo adequados ameaçam a vida marinha e a própria atividade no país. Ingerências políticas e do setor privado cresceram no Governo de extrema-direita de Jair Bolsonaro.

Para o Tribunal de Contas da União (TCU), o gerenciamento da pesca no Brasil enfrenta graves problemas de falta de informação, de planejamento e de policiamento. O órgão criado pela Constituição Federal de 1988 ajuda o Congresso Nacional a controlar a execução do orçamento e de outras políticas públicas federais.

A gestão da pesca está “fragilizada e inadequada diante da crítica ausência de informações essenciais, da grave deficiência de planejamento governamental e do danoso uso inadequado das poucas informações disponíveis, além da crítica obsolescência dos sistemas e da inaceitável falta de transparência das reduzidas informações disponíveis e dos processos decisórios”, declarou o ministro André Luís de Carvalho.

A auditoria publicada em julho foi solicitada pela Câmara dos Deputados e chegou a conclusões semelhantes às de uma análise feita em 2012, pelo mesmo Tribunal. À frente do manejo pesqueiro nacional, o Ministério da Agricultura tem até o fim do ano para reformar a gestão da atividade. As medidas serão monitoradas pelo TCU.

Enquanto isso, o descontrole amplia impactos da pesca de arrasto, reconhecida mundialmente como muito danosa à vida marinha. A técnica usa redes de malha fina puxadas por barcos para “raspar” o fundo do mar buscando camarões e outros animais. Capturam tudo por onde passam. Espécies de baixo valor comercial voltam às águas, quase sempre mortas.

“No mundo todo o arrasto leva à morte de cerca de 4,2 milhões de toneladas anuais de espécies não-alvo e diminui receitas ao interromper o crescimento de peixes juvenis. O arrasto ameaça os ecossistemas oceânicos em todo o planeta”, destacaram pesquisadores brasileiros em artigo na edição de abril da revista Science.

Gabriela Güllich

Os arrastões aportaram no Brasil junto com a pescaria industrial, no pós 2ª Guerra Mundial (1939 - 1945). Políticas internacionais da época queriam aquecer economias e combater a fome ampliando o consumo de produtos marinhos. Essa pesca ocorre hoje praticamente em todas as regiões onde não encontra barreiras legais.

Diretor científico da ONG Oceana, Martin Dias reforça que o ordenamento da pesca no Brasil segue um emaranhado de leis e de normas defasadas ou não aplicadas que, na prática, permitem o arrasto em qualquer época e em qualquer ponto dos 3,6 milhões de km² de mar sobre responsabilidade do país. A área é superior à da Índia.

“A gestão pesqueira não funciona. Nossa gestão é ineficiente, com regras soltas e desconexas. Praticamente nenhuma pescaria tem manejo adequado, não há planejamento de longo prazo e sempre temos mais normativas publicadas diante de crises sociais, ambientais ou econômicas. Tratamos dos sintomas e não das causas dos problemas”, ressaltou.

Não por acaso, o Brasil é um dos países onde a pesca em geral mais ameaça a vida marinha. Um estudo publicado em 2017 na revista Proceedings of the National Academy of Sciences coloca o país na 26ª posição num ranking com 28 grandes nações pesqueiras sobre a eficiência da atividade. O Brasil está à frente apenas de Myanmar e da Tailândia, ambos no sudeste asiático.
Olhos vendados

A falta de estatísticas produtivas do setor e o desprezo por informações técnicas relevantes emperram o controle das pescarias no Brasil. O Brasil desconhece o quê e o quanto retira do mar desde 2011. À época, a falta de recursos e a gestão alternando entre diferentes órgãos federais começaram a mascarar os números da pesca no país.

A captura de sardinha já caiu de 80 mil toneladas para cerca de 15 mil toneladas anuais. Estoques de tainha e de outras espécies também encolhem, apontam especialistas. Ignorar o tamanho das pescarias pode encobrir quedas nas populações de peixes e outros seres marinhos, reduzir a arrecadação de impostos federais e estaduais e até a renda de trabalhadores formais e informais.

“Isso impacta a ciência, o manejo e a conservação pesqueiras. Um país que não conhece o que pesca está sujeito a grandes incertezas na gestão, que deveria ser conduzida com base no princípio da precaução. A pesca não pode seguir numa ‘permissividade pelo otimismo’, ressaltou a doutora em Biologia Marinha Beatrice Padovani, da Universidade Federal de Pernambuco.

As estatísticas também ajudavam a definir quanto de vida marinha é ameaçada de extinção. Mas essa política não a tem protegido. As espécies comerciais que podem sumir do mapa saltaram de 17 para 64 (376%) entre 2004 e 2014. Os números são da Oceana. Uma nova “lista vermelha” deve ser apresentada este ano pelo governo. A entidade também aponta que o país desconhece a situação de 110 (94%) de 118 estoques pesqueiros comerciais.

“Muitos recursos perdem importância econômica pelo esgotamento. Vários estoques pesqueiros poderão estar dilapidados quando novas estatísticas de pesca e listas de animais ameaçados de extinção forem produzidas. A quem interessa a gente não ter essas informações?”, questionou o chefe do Departamento de Biologia Marinha da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Marcelo Vianna.

Nesse sentido, em abril de 2019 o Ministério da Agricultura alegou “grande repercussão negativa no setor pesqueiro e prejuízos econômicos” e tentou suspender a lista de peixes e invertebrados aquáticos ameaçados de extinção. No mês seguinte, o secretário de Aquicultura e Pesca, Jorge Seif Junior, afirmou que a lista de 2014 foi construída com dados “não confiáveis”.O balanço daquele ano trazia 475 espécies de peixes e invertebrados aquáticos ameaçados de extinção.

“A gestão pesqueira no Brasil é muito utilizada como moeda política. Então é difícil a (questão) técnica vencer”, afirmou um servidor federal que pediu para não ser identificado. Entrevistas de funcionários públicos da área ambiental foram vetadas pelo Governo federal. A realidade política reforça sua visão sobre a pesca no país.

Até ser nomeado por Jair Bolsonaro na Secretaria Nacional de Pesca e Aquicultura, no início de 2019, Jorge Seif Junior era empresário do setor pesqueiro, em Santa Catarina. Sua posse foi festejada pelo setor privado, mas criticada por ambientalistas e pesquisadores. Sua família segue ativa no ramo.

As fontes ouvidas pela reportagem afirmam que sua gestão conflita com uma lei federal que proíbe a ocupação de postos públicos por dirigentes ligados a interesses privados. Por meio da Lei de Acesso à Informação, a Secretaria de Aquicultura e Pesca comentou que Seif passou pelo crivo da legislação e que se dedica apenas ao cargo.

“Para dirimir eventuais conflitos de interesse, o atual Secretário Nacional de Aquicultura e Pesca se submeteu no início do exercício do cargo ao Comitê de Ética da Presidência da República, além de ter se afastado das empresas nas quais mantinha participação societária”, comentou a autarquia.

Justamente em Santa Catarina estão as maiores companhias pesqueiras do país, cujos barcos vasculham o litoral Sul e Sudeste (imagem abaixo). Há 236 barcos de arrasto registrados apenas no município catarinense de Itajaí. Pescadores, tripulantes e processadoras de pescado somam quase 6.400 empregos diretos e indiretos, conforme o sindicato regional de armadores (donos de barcos) e indústrias.

Já no final de 2020, o ministro Kassio Nunes, indicado por Jair Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal, atendeu a um pedido do governo e liberou com uma liminar o arrasto no Rio Grande do Sul. O Estado proibia essas pescarias em até 22 quilômetros da costa desde 2018. A “retomada sustentável” do arrasto na região depende de medidas a serem executadas pelo governo em até 18 meses.

“O arrasto é das práticas mais nocivas. Estamos numa luta titânica para manter nossa atividade porque 80% das capturas na costa gaúcha são de barcos de outros estados. E os estoques de peixes e camarões vêm caindo pela pesca abusiva e pelo desrespeito à lei”, destacou Alexandre Novo, do Sindicato dos Armadores da Pesca do Rio Grande do Sul.

A Secretaria de Aquicultura e Pesca respondeu via Lei de Acesso à Informação que agiu pelo retorno do arrasto no Rio Grande do Sul por “uma questão referente à soberania do Estado brasileiro em legislar no Mar Territorial Brasileiro” e que “qualquer atividade pesqueira que fosse proibida nessa região por qualquer estado do Brasil a SAP/MAPA agiria da mesma forma”.

Mas prática e discurso podem ser diferentes. Dez estados já restringem em lei o arrasto buscando manter e renovar estoques de peixes e outros animais ― Amapá, Rio de Janeiro, Alagoas, Rio Grande do Norte, Maranhão, Ceará, Pará, Rio Grande do Sul, São Paulo e Pernambuco. O plenário do Supremo Tribunal Federal ainda não julgou se eles podem regular as pescarias em seu litoral.

“Desconhecemos qualquer iniciativa do Governo federal em relação às medidas restritivas do arrasto em outros estados, além do Rio Grande do Sul”, alertou Gustavo Cardoso, doutor em Oceanografia e professor na Universidade Federal de Rio Grande.

A desregulamentação generalizada do setor também é alarmante. Nos dois primeiros anos de Governo foram publicadas 82 medidas provisórias, decretos e portarias interferindo na gestão da pesca e na conservação da vida marinha. O balanço é do Política por Inteiro, um projeto que monitora políticas públicas federais. A grande maioria das normativas afrouxou regras das pescarias.

Capturas estão permitidas no Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha ― um dos mais belos do país ―, águas públicas em terra e mar foram abertas à criação de peixes exóticos e sem análises técnicas, planos para recuperação de espécies ameaçadas estão congelados e a gestão da atividade foi centralizada de vez no Ministério da Agricultura. “O governo aprofundou um desmonte já em curso. Temos uma secretaria no ministério focada em produção e deixamos de ter uma gestão compartilhada. Hoje a pesca é tratada no país apenas como um setor produtivo, desprezando que se trata da extração de recursos naturais finitos. Enquanto isso, a pesca colapsa em todo o mundo”, concluiu Natalie Unterstell, coordenadora do Política por Inteiro.

Um debate sobre o que concordamos

As discordâncias estão ululantemente óbvias no Brasil. O único debate nacional a que me interessaria assistir é sobre aquilo com que as pessoas concordam. Não imaginem que seja uma conversa pacata, harmoniosa e fácil. Dá para trocar socos à vontade numa discussão sobre o que, afinal, nos une.

A ideia não é fazer um apelo ao bom senso e à razão. A ideia é colocar ainda mais gasolina na fogueira, pois calor e luz ajudam as coisas a mudar. Sugiro dez pontos para o acalorado debate sobre aquilo com que, acredito, estejamos todos de acordo:

Com 40% da riqueza do país em mãos da União e dos entes federados, os brasileiros que trabalham, dão empregos e empreendem são obrigados a ralar de janeiro a maio apenas para pagar impostos, taxas, contribuições compulsórias aos burocratas que se julgam mais capazes de gastar nosso dinheiro do que nós mesmos.


Nenhum presidente da República do Brasil, sejam quais forem ou tenham sido suas convicções ideológicas, conseguiu deter a marcha batida dos gastos públicos e, tampouco, garantir que os governos gastem apenas aquilo que arrecadam.

Ganha um ano extra de mandato o presidente da República que, em vez de aumentar impostos, consiga cortar despesas e diminuir o tamanho do Estado, sem prejuízo de sua eficiência, dessa forma garantindo um aumento consistente e sustentável no ritmo de crescimento da economia e de desenvolvimento social do país.

Governos não produzem riqueza. Governos imprimem dinheiro e, quanto mais acionam a maquininha impressora, menos valor as cédulas têm. Riqueza é gerada pelas classes produtoras — trabalhadores, empregadores e empreendedores.

No Brasil só existem, na verdade, duas classes de cidadãos: os pagadores de impostos e os consumidores de impostos. Os pagadores de impostos são sempre escalados para pagar os erros de boa-fé e as ações ruinosas de má-fé dos consumidores de impostos, a casta dominante do país.

Os burocratas estatais de alto escalão serão cobrados por seu desempenho, de modo que, se suas decisões produzirem resultados desastrosos, serão penalizados em seus vencimentos ou na progressão da carreira.

Uma maneira de minimizar as punições é obter uma tradução completa para o português do termo da língua inglesa accountability. A tradução mais aceitável é boa, mas muito longa. Accountability pode ser traduzido por responsabilidade com ética num ambiente de transparência. Imputabilidade é uma tradução curta, mas sem a força do original em inglês.

As burocracias estatais obedecem a uma única lei básica de conduta: manter e, sempre que possível, ampliar seus privilégios. Os tetos de gastos e salários existem apenas para os pagadores de impostos da planície. Os consumidores de impostos do planalto estão isentos de quaisquer sacrifícios.

A obra prioritária no país é a criação de mais vasos comunicantes entre Brasília e o Brasil. Isolados no Planalto Central, onde antes da criação da capital no Cerrado só existiam emas, lobos-guará, gabirobas e mandacarus, os consumidores de impostos sentem-se protegidos de qualquer insatisfação mais consequente de seus reféns, os pagadores de impostos.

 Os parlamentares só podem propor uma nova lei que implique aumento de despesas e maior inchaço do Estado depois de ter aprovado três leis de sua autoria que claramente favoreçam o aumento de produtividade e inovação tecnológica da economia.

Nenhum homem é uma ilha, mas o Brasil é quase. Somos um país de economia mais fechada do que a média mundial. A linguagem para o intercâmbio produtivo com o mundo é a competitividade, e ela não se obtém sem atenção total ao acrônimo em inglês STEM — ciência, tecnologia, engenharia e matemática.

STEM é parecido com o amor na filosofia indiana: quanto mais se dá, mais se recebe.