Em 6 de agosto de 2020, o bolsonarismo baniu o termo “quarentena”.
A ata de uma reunião no Ministério da Saúde, realizada naquele dia, é explícita:
“Os termos quarentena e auto-isolamento não serão mais utilizados nos documentos técnicos”.
Àquela altura, os responsáveis pela chacina bolsonarista sabiam perfeitamente que quarentena e auto-isolamento eram o único instrumento seguro para reduzir o número de mortes. De fato, numa reunião anterior, em 25 de maio, os técnicos de Eduardo Pazuello discutiram abertamente sobre o assunto, em documento reproduzido pelo Estadão:
“Toda pesquisa leva a acreditar que medidas sociais drásticas dão resultados positivos; que, sem intervenções, esgotamos UTIs, os picos vão aumentar descontroladamente; que, sem isolamento, levará um tempo muito grande, de um a dois anos, para controlarmos a situação”.
O bolsonarismo, portanto, não desconhecia a ciência; ele a ignorou de maneira premeditada, sabotando a quarentena e o isolamento social. A lorota de que Jair Bolsonaro acredita em Terra Plana é, na verdade, um álibi para acobertar seus crimes. Ele foi informado sobre o que deveria ser feito para diminuir a mortandade e, mesmo assim, preferiu praticar seu assassinato em massa. O sociopata eliminou o termo “quarentena” e, junto com ele, eliminou também 500 mil pessoas.
terça-feira, 15 de junho de 2021
2022: 'Quem' ou 'Para Quê'?
Há uma longa e danosa tradição em eleições no Brasil: discutimos “quem”, e não “para quê?” Enquanto for assim, o vencedor tomará posse compromissado apenas com o grupo que financiou sua campanha e “vendeu” seu nome à população. Nenhum compromisso com o País!
É preciso romper essa tradição; não discutir “quem”, mas “para quê”. Ou seja, definir objetivos claros, quantificáveis, repisados e detalhados durante a campanha, e que, por serem percebidos como melhorias sensíveis em sua qualidade de vida, atraiam os eleitores. Isso seria um primeiro passo de uma tão necessária reforma política. Eleito defendendo objetivos claros, será difícil para o ungido cometer mais um estelionato eleitoral.
Debater “o quê”, e não “quem”, ajudará a definir um rumo para este país à deriva; evitará lutar contra inimigos de ocasião; tenderá a dar coerência às ações dos vários órgãos e níveis de governo, gerando sinergia e minimizando os efeitos danosos da inevitável partilha do controle da máquina pública; será possível construir uma coalisão em prol daqueles fins. Sabendo os objetivos, ficará mais fácil identificar experiências exitosas e multiplicá-las.
Precisamos de algo que seja uma versão século XXI do mote de JK, “cinquenta anos em cinco”, que, é bom lembrar, baseava-se em metas claras e quantificadas.
Se falamos em eleger A ou B, ao invés de “para quê”, o eleito terá uma agenda sua e dos seus, não do Brasil. Fatiará o controle da máquina pública para “comprar” apoio, terá dificuldades de fazer convergir as ações dos órgãos públicos e lançará programas vazios, tirados da cartola. O caos da pandemia demonstrou, mais uma vez, a importância da coordenação nacional para enfrentar os muitos e difíceis problemas que nos afligem.
Os verdadeiros inimigos são as desigualdades, a péssima qualidade da educação, da saúde, da Justiça, da mobilidade, da alimentação, da segurança; o desemprego, o desalento, os preconceitos, a violência. Para esses males, interligados e que se realimentam, quais seriam metas alcançáveis em quatro anos? E em oito ou dez? E para outros males que, embora urgentes e centrais ao século XXI, não estão na agenda política brasileira?
É necessário, ainda, romper outra tradição política danosa e levantar propostas para problemas reais embora não apontados, nas pesquisas de opinião, como prioridades. Por exemplo, gerar menos lixo, cidades mais humanas, defesas contra os algoritmos, tornar progressiva a estrutura tributária, etc.
Enquanto discutimos se A ou B, nada sabemos sobre como o eleito tratará esses temas. Daremos a ele carta branca, e adiaremos por mais quatro, oito ou mais anos qualquer possibilidade de sairmos do pântano em que nos colocaram aqueles que se elegeram mais pelo seu nome e imagem que por suas propostas.
Eduardo Fernandez Silva. ex-Diretor da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados
É preciso romper essa tradição; não discutir “quem”, mas “para quê”. Ou seja, definir objetivos claros, quantificáveis, repisados e detalhados durante a campanha, e que, por serem percebidos como melhorias sensíveis em sua qualidade de vida, atraiam os eleitores. Isso seria um primeiro passo de uma tão necessária reforma política. Eleito defendendo objetivos claros, será difícil para o ungido cometer mais um estelionato eleitoral.
Debater “o quê”, e não “quem”, ajudará a definir um rumo para este país à deriva; evitará lutar contra inimigos de ocasião; tenderá a dar coerência às ações dos vários órgãos e níveis de governo, gerando sinergia e minimizando os efeitos danosos da inevitável partilha do controle da máquina pública; será possível construir uma coalisão em prol daqueles fins. Sabendo os objetivos, ficará mais fácil identificar experiências exitosas e multiplicá-las.
Precisamos de algo que seja uma versão século XXI do mote de JK, “cinquenta anos em cinco”, que, é bom lembrar, baseava-se em metas claras e quantificadas.
Se falamos em eleger A ou B, ao invés de “para quê”, o eleito terá uma agenda sua e dos seus, não do Brasil. Fatiará o controle da máquina pública para “comprar” apoio, terá dificuldades de fazer convergir as ações dos órgãos públicos e lançará programas vazios, tirados da cartola. O caos da pandemia demonstrou, mais uma vez, a importância da coordenação nacional para enfrentar os muitos e difíceis problemas que nos afligem.
Os verdadeiros inimigos são as desigualdades, a péssima qualidade da educação, da saúde, da Justiça, da mobilidade, da alimentação, da segurança; o desemprego, o desalento, os preconceitos, a violência. Para esses males, interligados e que se realimentam, quais seriam metas alcançáveis em quatro anos? E em oito ou dez? E para outros males que, embora urgentes e centrais ao século XXI, não estão na agenda política brasileira?
É necessário, ainda, romper outra tradição política danosa e levantar propostas para problemas reais embora não apontados, nas pesquisas de opinião, como prioridades. Por exemplo, gerar menos lixo, cidades mais humanas, defesas contra os algoritmos, tornar progressiva a estrutura tributária, etc.
Enquanto discutimos se A ou B, nada sabemos sobre como o eleito tratará esses temas. Daremos a ele carta branca, e adiaremos por mais quatro, oito ou mais anos qualquer possibilidade de sairmos do pântano em que nos colocaram aqueles que se elegeram mais pelo seu nome e imagem que por suas propostas.
Eduardo Fernandez Silva. ex-Diretor da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados
Militares dos EUA e da França mostram por que o Brasil é a vanguarda mundial do atraso
Um marciano que descesse à Terra entre 21 de abril e 10 de maio chegaria à conclusão de que o Brasil nada mais é do que a vanguarda mundial do atraso. Nesse espaço de tempo, dois berços da democracia mundial, a França e os Estados Unidos, assistiram a demonstrações de engajamento político de militares da reserva e uns poucos da ativa.
Primeiro veio a carta assinada por 1.200 oficiais reformados, entre os quais 24 generais, com a adesão, anônima, de duas dezenas de militares da ativa das Forças Armadas francesas. Eles escolheram o aniversário de 60 anos da tentativa de golpe contra a independência da Argélia no governo do general Charles De Gaulle.
No texto, os oficiais dizem que foram o antirracismo, o indigenismo e as políticas de descolonização que semearam o ódio no país. Citam, para isso, a decapitação de um professor, no ano passado, por um aluno que não gostara de uma caricatura de Maomé mostrada na sala de aula de uma escola da região metropolitana de Paris. A carta aberta define o islamismo como um “dogma” contrário à Constituição nacional e ainda diz que a tolerância religiosa levará a França à guerra civil.
O chefe do Estado-Maior das Forças Armadas francesas, o general François Lecointre, instou os signatários da ativa a passar para a reserva. Já a líder da extrema direita francesa, Marine Le Pen, saudou a carta e pediu o apoio dos signatários para sua candidatura à Presidência em 2022. Entre aqueles identificados na publicação do artigo pela revista “Valeurs Actuelles” (valores atuais, em francês), há oficiais reformados e saudosistas do império colonial francês. Um verdadeiro exército de Brancaleone.
Pipocaram pesquisas mostrando apoio a uma intervenção militar por até metade dos franceses, mas as sondagens acabaram desacreditadas por terem sido feitas poucos dias depois de dois eventos que comoveram o país: uma manifestação de rua pelo julgamento do assassino de uma judia ortodoxa, internado numa instituição de doentes mentais, e uma condenação, branda na visão dos manifestantes, de uma gangue que ateou fogo em um carro de polícia.
Dezenove dias depois, do outro lado do Atlântico, veio a público uma carta aberta de 124 generais e almirantes da reserva americanos. Mais parecia ter sido escrita pelo ex-presidente Donald Trump, tamanha a semelhança dos argumentos. O texto afirma que a eleição de Joe Biden foi roubada, que a liberdade do país está sob a ameaça e que o viés “politicamente correto” do presidente divide as Forças Armadas e ameaça a prontidão para a guerra. “Sob um Congresso democrata e o corrente governo, nosso país deu uma guinada à esquerda rumo ao socialismo e o marxismo”, afirma o texto.
A carta ainda diz que a integridade das eleições depende de medidas restritivas ao voto de grandes comunidades de negros e latinos em todo o país. Também questiona as condições físicas e mentais de Biden como comandante-em-chefe. Entre os signatários estão oficiais veteranos da guerra do Vietnã, um condenado na operação Irã-Contras, do governo Ronald Reagan, militantes antimuçulmanos e antiLGBT.
No dia seguinte, os franceses de extrema direita voltaram a se manifestar. Desta vez, a carta não esteve restrita à assinatura de militares, mas ao público em geral. O site da revista “Valeurs Actuelles” contabiliza 299 mil signatários até o fechamento desta edição. Este segundo texto acresce aos argumentos já apresentados em abril a menção à “Operação Sentinela”. Convocada pelo presidente Emmanuel Macron, em 2015, foi uma reação a uma série de atentados deflagrados concomitantemente no estádio de futebol de Saint-Denis, na região do Canal Saint-Martin e na casa de shows Bataclan, na capital francesa, que deixaram 130 mortos. Os ataques, que foram os mais letais na cidade desde a Segunda Guerra Mundial, acabaram reivindicados por grupos terroristas de origem islâmica.
É este o fio que Vinícius de Carvalho, estudioso do tema, professor do Departamento de Estudos de Guerra e diretor do Brazil Institute do King’s College, de Londres, puxa para colocar o país de Jair Bolsonaro na roda. Para além das contingências históricas de cada uma dessas nações, diz, é a atribuição de funções civis aos militares que age como um precedente de seu envolvimento político - na França, nos Estados Unidos, no Brasil e em muitos dos vizinhos da América Latina.
No Brasil, a atuação na “lei e ordem”, concessão dos constituintes ao finado regime militar, ampliou-se com a adoção, há quase 30 anos, das Operações de Garantia da Lei e da Ordem, inauguradas com o uso das Forças Armadas na segurança da Conferência das Nações Unidas Rio-92. Não é coincidência que a candidatura Jair Bolsonaro tenha decolado no ano em que o Rio, onde o presidente colheu uma de suas mais espetaculares votações, abrigou uma das maiores GLOs da história, a da intervenção na segurança pública do Estado.
No primeiro mandato do governo Luiz Inácio Lula da Silva, às GLOs se somou a liderança do Brasil na missão das Nações Unidas no Haiti, onde os militares brasileiros atuaram no combate às gangues e no controle da violência urbana. Foi uma prévia das grandes intervenções militares em comunidades. Dos 11 generais que comandaram a missão no Haiti, cinco acabaram se imiscuindo na vida civil brasileira e um tornou-se o primeiro comandante do Exército no governo Bolsonaro: Heleno Ribeiro (Gabinete de Segurança Institucional), Carlos Alberto dos Santos Cruz (ex-Secretaria de Governo), Luis Eduardo Ramos (Casa Civil), Floriano Peixoto (ex-Secretaria-Geral da Presidência), Ajax Pinheiro (assessor especial da Presidência do Supremo) e Edson Leal Pujol.
Se as operações militares no Brasil foram marcadas pela intervenção durante eventos internacionais, greves policiais, crises na segurança pública, incêndios florestais e eleições, no resto no mundo, na avaliação de Vinícius de Carvalho, a inserção foi desencadeada pelo terrorismo. O momento de inflexão foram os ataques da Al-Qaeda às torres gêmeas em Nova York, em 11 de setembro de 2001.
Acionadas pelo terrorismo, as intervenções acabaram naturalizadas contra sublevações sociais e imigração ilegal. Quando o chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas, Mark Milley, pediu desculpas ao povo americano no ano passado, os sinais de tensão na política interna já eram evidentes com a convocação da Guarda Nacional. A presença de Milley ao lado ex-presidente Donald Trump em caminhada da Casa Branca até uma igreja próxima durante a ocupação de Washington pelos protestos “Vidas Negras Importam” foi vista como um endosso à repressão contra os negros. Daí os esclarecimentos.
Mesmo num país em que é comum os presidentes ostentarem, em algum momento de suas carreiras, patentes militares, a entrega, por Donald Trump, do cargo de secretário de Defesa para um militar reformado foi recebida com reservas. Apesar disso, a prática foi mantida pelo atual presidente Joe Biden, que nomeou o general da reserva Lloyd Austin, primeiro afro-americano a comandar tropas americanas no exterior (Iraque). A nomeação exigiu que o Congresso americano aceitasse a redução da quarentena de sete para quatro anos para oficiais das Forças Armadas. É o equivalente, diz o professor do King’s College, à militarização do Ministério da Defesa no Brasil.
A pasta foi criada em 1999, no governo Fernando Henrique Cardoso, para ser ocupada por um civil que representaria politicamente as três Forças. Foi um marco num continente que, ao longo das últimas décadas, vide Colômbia e México, tem cedido à pressão americana no combate ao narcotrático pela militarização da segurança nacional. Acabou, porém, sendo ocupada por generais da reserva nos governos Michel Temer e Jair Bolsonaro.
A reocupação da pasta por civis, na visão de Vinícius de Carvalho, é o eixo a partir do qual deveriam se estruturar as mudanças necessárias. Mas não apenas. As esquecidas Comissão de Defesa do Senado e da Câmara também merecem sua lupa. “São as instâncias que o Parlamento brasileiro tem para participar na formatação do modelo de Forças Armadas que se quer para o país", diz. A primeira distinção a ser feita é entre defesa, tema militar por excelência, e segurança nacional, atribuição das múltiplas e desfuncionais polícias do país.
O professor do King’s College não vê, por exemplo, razão para o país, que não tem conflitos com seus vizinhos, manter o 14º efetivo mundial de militares do mundo, com batalhões em áreas que não são de fronteira. Na última vez em que um comandante do Exército se manifestou sobre o tema, o general Pujol, em 2020, disse que os efetivos da Força eram necessários para garantir a soberania da Amazônia. “Se uma potência nuclear quiser dominar a floresta, não será simplesmente com presença de grandes efetivos militares na região que o Brasil impedirá que isso aconteça”, diz Carvalho, alertando para os riscos advindos dos flancos na defesa cibernética, cuja expertise não é exclusividade militar.
Este efetivo faz com que os soldos e pensões das Forças Armadas consumam quase 80% de seus gastos. A reforma realizada no governo Bolsonaro, que recompôs gastos com a folha que haviam sido reduzidos no governo Fernando Henrique, foi um dos primeiros degraus da escalada de políticas para atrelar as Forças Armadas ao destino do presidente da República. A entrega do Ministério da Saúde para um general da ativa levar a cabo o negacionismo do presidente foi o ápice desse atrelamento. E a possível punição que envolve a ida do ex-ministro da Saúde e general Eduardo Pazuello a seu palanque, no Rio de Janeiro, a mais recente das tensões.
Ainda que não haja parâmetro nos Estados Unidos ou na França para a agitação dos quartéis pretendida por Bolsonaro, os movimentos políticos da caserna nos dois países dão repertório ao presidente brasileiro. Isolado depois da derrota de Trump e, principalmente, depois do negacionismo ímpar na pandemia, Bolsonaro peleja para conseguir seu segundo mandato sob o escudo militar. É como pretende se manter na crista da onda do novo viés da extrema-direita mundial.
Primeiro veio a carta assinada por 1.200 oficiais reformados, entre os quais 24 generais, com a adesão, anônima, de duas dezenas de militares da ativa das Forças Armadas francesas. Eles escolheram o aniversário de 60 anos da tentativa de golpe contra a independência da Argélia no governo do general Charles De Gaulle.
No texto, os oficiais dizem que foram o antirracismo, o indigenismo e as políticas de descolonização que semearam o ódio no país. Citam, para isso, a decapitação de um professor, no ano passado, por um aluno que não gostara de uma caricatura de Maomé mostrada na sala de aula de uma escola da região metropolitana de Paris. A carta aberta define o islamismo como um “dogma” contrário à Constituição nacional e ainda diz que a tolerância religiosa levará a França à guerra civil.
O chefe do Estado-Maior das Forças Armadas francesas, o general François Lecointre, instou os signatários da ativa a passar para a reserva. Já a líder da extrema direita francesa, Marine Le Pen, saudou a carta e pediu o apoio dos signatários para sua candidatura à Presidência em 2022. Entre aqueles identificados na publicação do artigo pela revista “Valeurs Actuelles” (valores atuais, em francês), há oficiais reformados e saudosistas do império colonial francês. Um verdadeiro exército de Brancaleone.
Pipocaram pesquisas mostrando apoio a uma intervenção militar por até metade dos franceses, mas as sondagens acabaram desacreditadas por terem sido feitas poucos dias depois de dois eventos que comoveram o país: uma manifestação de rua pelo julgamento do assassino de uma judia ortodoxa, internado numa instituição de doentes mentais, e uma condenação, branda na visão dos manifestantes, de uma gangue que ateou fogo em um carro de polícia.
Dezenove dias depois, do outro lado do Atlântico, veio a público uma carta aberta de 124 generais e almirantes da reserva americanos. Mais parecia ter sido escrita pelo ex-presidente Donald Trump, tamanha a semelhança dos argumentos. O texto afirma que a eleição de Joe Biden foi roubada, que a liberdade do país está sob a ameaça e que o viés “politicamente correto” do presidente divide as Forças Armadas e ameaça a prontidão para a guerra. “Sob um Congresso democrata e o corrente governo, nosso país deu uma guinada à esquerda rumo ao socialismo e o marxismo”, afirma o texto.
A carta ainda diz que a integridade das eleições depende de medidas restritivas ao voto de grandes comunidades de negros e latinos em todo o país. Também questiona as condições físicas e mentais de Biden como comandante-em-chefe. Entre os signatários estão oficiais veteranos da guerra do Vietnã, um condenado na operação Irã-Contras, do governo Ronald Reagan, militantes antimuçulmanos e antiLGBT.
No dia seguinte, os franceses de extrema direita voltaram a se manifestar. Desta vez, a carta não esteve restrita à assinatura de militares, mas ao público em geral. O site da revista “Valeurs Actuelles” contabiliza 299 mil signatários até o fechamento desta edição. Este segundo texto acresce aos argumentos já apresentados em abril a menção à “Operação Sentinela”. Convocada pelo presidente Emmanuel Macron, em 2015, foi uma reação a uma série de atentados deflagrados concomitantemente no estádio de futebol de Saint-Denis, na região do Canal Saint-Martin e na casa de shows Bataclan, na capital francesa, que deixaram 130 mortos. Os ataques, que foram os mais letais na cidade desde a Segunda Guerra Mundial, acabaram reivindicados por grupos terroristas de origem islâmica.
É este o fio que Vinícius de Carvalho, estudioso do tema, professor do Departamento de Estudos de Guerra e diretor do Brazil Institute do King’s College, de Londres, puxa para colocar o país de Jair Bolsonaro na roda. Para além das contingências históricas de cada uma dessas nações, diz, é a atribuição de funções civis aos militares que age como um precedente de seu envolvimento político - na França, nos Estados Unidos, no Brasil e em muitos dos vizinhos da América Latina.
No Brasil, a atuação na “lei e ordem”, concessão dos constituintes ao finado regime militar, ampliou-se com a adoção, há quase 30 anos, das Operações de Garantia da Lei e da Ordem, inauguradas com o uso das Forças Armadas na segurança da Conferência das Nações Unidas Rio-92. Não é coincidência que a candidatura Jair Bolsonaro tenha decolado no ano em que o Rio, onde o presidente colheu uma de suas mais espetaculares votações, abrigou uma das maiores GLOs da história, a da intervenção na segurança pública do Estado.
No primeiro mandato do governo Luiz Inácio Lula da Silva, às GLOs se somou a liderança do Brasil na missão das Nações Unidas no Haiti, onde os militares brasileiros atuaram no combate às gangues e no controle da violência urbana. Foi uma prévia das grandes intervenções militares em comunidades. Dos 11 generais que comandaram a missão no Haiti, cinco acabaram se imiscuindo na vida civil brasileira e um tornou-se o primeiro comandante do Exército no governo Bolsonaro: Heleno Ribeiro (Gabinete de Segurança Institucional), Carlos Alberto dos Santos Cruz (ex-Secretaria de Governo), Luis Eduardo Ramos (Casa Civil), Floriano Peixoto (ex-Secretaria-Geral da Presidência), Ajax Pinheiro (assessor especial da Presidência do Supremo) e Edson Leal Pujol.
Se as operações militares no Brasil foram marcadas pela intervenção durante eventos internacionais, greves policiais, crises na segurança pública, incêndios florestais e eleições, no resto no mundo, na avaliação de Vinícius de Carvalho, a inserção foi desencadeada pelo terrorismo. O momento de inflexão foram os ataques da Al-Qaeda às torres gêmeas em Nova York, em 11 de setembro de 2001.
Acionadas pelo terrorismo, as intervenções acabaram naturalizadas contra sublevações sociais e imigração ilegal. Quando o chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas, Mark Milley, pediu desculpas ao povo americano no ano passado, os sinais de tensão na política interna já eram evidentes com a convocação da Guarda Nacional. A presença de Milley ao lado ex-presidente Donald Trump em caminhada da Casa Branca até uma igreja próxima durante a ocupação de Washington pelos protestos “Vidas Negras Importam” foi vista como um endosso à repressão contra os negros. Daí os esclarecimentos.
Mesmo num país em que é comum os presidentes ostentarem, em algum momento de suas carreiras, patentes militares, a entrega, por Donald Trump, do cargo de secretário de Defesa para um militar reformado foi recebida com reservas. Apesar disso, a prática foi mantida pelo atual presidente Joe Biden, que nomeou o general da reserva Lloyd Austin, primeiro afro-americano a comandar tropas americanas no exterior (Iraque). A nomeação exigiu que o Congresso americano aceitasse a redução da quarentena de sete para quatro anos para oficiais das Forças Armadas. É o equivalente, diz o professor do King’s College, à militarização do Ministério da Defesa no Brasil.
A pasta foi criada em 1999, no governo Fernando Henrique Cardoso, para ser ocupada por um civil que representaria politicamente as três Forças. Foi um marco num continente que, ao longo das últimas décadas, vide Colômbia e México, tem cedido à pressão americana no combate ao narcotrático pela militarização da segurança nacional. Acabou, porém, sendo ocupada por generais da reserva nos governos Michel Temer e Jair Bolsonaro.
A reocupação da pasta por civis, na visão de Vinícius de Carvalho, é o eixo a partir do qual deveriam se estruturar as mudanças necessárias. Mas não apenas. As esquecidas Comissão de Defesa do Senado e da Câmara também merecem sua lupa. “São as instâncias que o Parlamento brasileiro tem para participar na formatação do modelo de Forças Armadas que se quer para o país", diz. A primeira distinção a ser feita é entre defesa, tema militar por excelência, e segurança nacional, atribuição das múltiplas e desfuncionais polícias do país.
O professor do King’s College não vê, por exemplo, razão para o país, que não tem conflitos com seus vizinhos, manter o 14º efetivo mundial de militares do mundo, com batalhões em áreas que não são de fronteira. Na última vez em que um comandante do Exército se manifestou sobre o tema, o general Pujol, em 2020, disse que os efetivos da Força eram necessários para garantir a soberania da Amazônia. “Se uma potência nuclear quiser dominar a floresta, não será simplesmente com presença de grandes efetivos militares na região que o Brasil impedirá que isso aconteça”, diz Carvalho, alertando para os riscos advindos dos flancos na defesa cibernética, cuja expertise não é exclusividade militar.
Este efetivo faz com que os soldos e pensões das Forças Armadas consumam quase 80% de seus gastos. A reforma realizada no governo Bolsonaro, que recompôs gastos com a folha que haviam sido reduzidos no governo Fernando Henrique, foi um dos primeiros degraus da escalada de políticas para atrelar as Forças Armadas ao destino do presidente da República. A entrega do Ministério da Saúde para um general da ativa levar a cabo o negacionismo do presidente foi o ápice desse atrelamento. E a possível punição que envolve a ida do ex-ministro da Saúde e general Eduardo Pazuello a seu palanque, no Rio de Janeiro, a mais recente das tensões.
Ainda que não haja parâmetro nos Estados Unidos ou na França para a agitação dos quartéis pretendida por Bolsonaro, os movimentos políticos da caserna nos dois países dão repertório ao presidente brasileiro. Isolado depois da derrota de Trump e, principalmente, depois do negacionismo ímpar na pandemia, Bolsonaro peleja para conseguir seu segundo mandato sob o escudo militar. É como pretende se manter na crista da onda do novo viés da extrema-direita mundial.
O 'evangelho' segundo Bolsonaro
O oitavo Mandamento diz que não se deve dar falso testemunho. No “evangelho” do presidente Jair Bolsonaro, contudo, esse mandamento caducou.
Ao discursar numa igreja evangélica em Anápolis (GO), na quarta-feira passada, Bolsonaro fez um sermão repleto de mentiras, tão evidentes que nem era preciso ser onisciente para perceber.
Bolsonaro voltou a afirmar que houve “fraude” na eleição de 2018, que ele venceu. “Eu fui eleito no primeiro turno. Eu tenho provas materiais, mas o sistema, a fraude existiu sim, me jogou para o segundo turno”, disse Bolsonaro.
A primeira vez em que o presidente alegou ter sido vítima de fraude na eleição foi em março de 2020. Na ocasião, disse que tinha “provas” e que as mostraria “brevemente”. Bolsonaro nunca o fez, porque não existem. Mas isso não tem importância: no “evangelho” bolsonarista, a verdade não é aquilo que encontra correspondência na realidade, e sim aquilo que Bolsonaro enuncia como tal. É questão de fé.
No mesmo sermão, Bolsonaro tornou a acusar governadores e prefeitos de “utilizar politicamente o vírus” da covid-19. Sem qualquer respaldo nos fatos, o presidente disse que as medidas de isolamento social para conter a pandemia se prestam a derrubá-lo: “Vamos fechar tudo, lockdown, toque de recolher, que a gente pela economia tira esse cara daí”. Bolsonaro disse que o querem fora porque “fez com que as estatais não dessem mais prejuízo”, “está começando a arrumar a economia”, “acredita em Deus”, “respeita seus militares” e “acredita na família”.
Em seguida, disse que “gente que estava ao meu lado” fez contas, a partir de um “acórdão do Tribunal de Contas da União”, e chegou à “constatação da supernotificação de casos de covid” por parte de Estados interessados em ter “mais recursos” federais. Segundo Bolsonaro, “se nós retirarmos as possíveis fraudes” da contabilidade de mortos por covid-19, “o nosso Brasil” será “aquele com menor número de mortes por milhão de habitantes por causa da covid”. Ou seja, o presidente está dizendo, em outras palavras, que milhares de médicos em todo o Brasil integram uma máfia dedicada a fraudar atestados de óbito para favorecer os planos de governadores corruptos.
Uma vez eliminada a “fraude”, disse o presidente, ficará claro que o Brasil teve poucas mortes por covid-19 porque adotou o “tratamento precoce”, com cloroquina e ivermectina, cuja ineficácia contra o coronavírus já foi amplamente atestada. Bolsonaro disse que não se investe nesse “tratamento” porque “interessa viver em cima de mortes, para se ganhar mais recursos”.
Para o presidente, é irrelevante se o tal “tratamento precoce” não tem comprovação científica. “Eu pergunto: a vacina tem comprovação científica ou está em estado experimental ainda? Está experimental”, disse Bolsonaro, naquela que talvez seja a mais nociva das tantas mentiras que contou no seu sermão. Ao questionar a segurança da vacina, já atestada pelas autoridades sanitárias regulatórias, Bolsonaro sabota todos os esforços para incentivar os brasileiros a tomar o imunizante.
Mas a epifania bolsonarista em Anápolis, malgrado suas repetidas referências a “milagres” e “Deus”, teve objetivos bem mais mundanos. Conforme a já manjada tática bolsonarista, era preciso inventar variadas polêmicas, em grande quantidade, para tirar a atenção do mais importante: a forte alta da inflação, anunciada no mesmo dia do sermão de Bolsonaro.
Se por um lado a inflação aumentou a arrecadação do governo, pois os tributos são cobrados em cima de preços mais altos, por outro a alta dos preços corrói a renda dos brasileiros, especialmente a dos mais pobres, que já convivem com forte desemprego. Ante o risco de insatisfação popular, muito concreto, Bolsonaro recorreu a quase todo o seu repertório de falsidades para que o País mude de assunto.
Em sua prédica mendaz, foi honesto uma única vez, quando disse que, ao ser eleito, “não sabia o que fazer”. Hoje, contudo, sabe muito bem: mentir dia e noite para ser reeleito. Se vai conseguir ou não, depende da credulidade dos eleitores.
Ao discursar numa igreja evangélica em Anápolis (GO), na quarta-feira passada, Bolsonaro fez um sermão repleto de mentiras, tão evidentes que nem era preciso ser onisciente para perceber.
Bolsonaro voltou a afirmar que houve “fraude” na eleição de 2018, que ele venceu. “Eu fui eleito no primeiro turno. Eu tenho provas materiais, mas o sistema, a fraude existiu sim, me jogou para o segundo turno”, disse Bolsonaro.
A primeira vez em que o presidente alegou ter sido vítima de fraude na eleição foi em março de 2020. Na ocasião, disse que tinha “provas” e que as mostraria “brevemente”. Bolsonaro nunca o fez, porque não existem. Mas isso não tem importância: no “evangelho” bolsonarista, a verdade não é aquilo que encontra correspondência na realidade, e sim aquilo que Bolsonaro enuncia como tal. É questão de fé.
No mesmo sermão, Bolsonaro tornou a acusar governadores e prefeitos de “utilizar politicamente o vírus” da covid-19. Sem qualquer respaldo nos fatos, o presidente disse que as medidas de isolamento social para conter a pandemia se prestam a derrubá-lo: “Vamos fechar tudo, lockdown, toque de recolher, que a gente pela economia tira esse cara daí”. Bolsonaro disse que o querem fora porque “fez com que as estatais não dessem mais prejuízo”, “está começando a arrumar a economia”, “acredita em Deus”, “respeita seus militares” e “acredita na família”.
Em seguida, disse que “gente que estava ao meu lado” fez contas, a partir de um “acórdão do Tribunal de Contas da União”, e chegou à “constatação da supernotificação de casos de covid” por parte de Estados interessados em ter “mais recursos” federais. Segundo Bolsonaro, “se nós retirarmos as possíveis fraudes” da contabilidade de mortos por covid-19, “o nosso Brasil” será “aquele com menor número de mortes por milhão de habitantes por causa da covid”. Ou seja, o presidente está dizendo, em outras palavras, que milhares de médicos em todo o Brasil integram uma máfia dedicada a fraudar atestados de óbito para favorecer os planos de governadores corruptos.
Uma vez eliminada a “fraude”, disse o presidente, ficará claro que o Brasil teve poucas mortes por covid-19 porque adotou o “tratamento precoce”, com cloroquina e ivermectina, cuja ineficácia contra o coronavírus já foi amplamente atestada. Bolsonaro disse que não se investe nesse “tratamento” porque “interessa viver em cima de mortes, para se ganhar mais recursos”.
Para o presidente, é irrelevante se o tal “tratamento precoce” não tem comprovação científica. “Eu pergunto: a vacina tem comprovação científica ou está em estado experimental ainda? Está experimental”, disse Bolsonaro, naquela que talvez seja a mais nociva das tantas mentiras que contou no seu sermão. Ao questionar a segurança da vacina, já atestada pelas autoridades sanitárias regulatórias, Bolsonaro sabota todos os esforços para incentivar os brasileiros a tomar o imunizante.
Mas a epifania bolsonarista em Anápolis, malgrado suas repetidas referências a “milagres” e “Deus”, teve objetivos bem mais mundanos. Conforme a já manjada tática bolsonarista, era preciso inventar variadas polêmicas, em grande quantidade, para tirar a atenção do mais importante: a forte alta da inflação, anunciada no mesmo dia do sermão de Bolsonaro.
Se por um lado a inflação aumentou a arrecadação do governo, pois os tributos são cobrados em cima de preços mais altos, por outro a alta dos preços corrói a renda dos brasileiros, especialmente a dos mais pobres, que já convivem com forte desemprego. Ante o risco de insatisfação popular, muito concreto, Bolsonaro recorreu a quase todo o seu repertório de falsidades para que o País mude de assunto.
Em sua prédica mendaz, foi honesto uma única vez, quando disse que, ao ser eleito, “não sabia o que fazer”. Hoje, contudo, sabe muito bem: mentir dia e noite para ser reeleito. Se vai conseguir ou não, depende da credulidade dos eleitores.
Exemplo assassino
Todo e qualquer o líder que não percebe o valor do exemplo não tem a mais pequena vocação para a função. O exemplo é o mais poderoso instrumento de motivação: capaz de ajudar a elevar homens a heróis ou descer a vilões
A pátria em chuteiras calça as pantufas dos isentões
A Conmenbol, confederação sul-americana de futebol, abriu a Copa América em Brasília apenas com uma lembrança tímida, quase protocolar, a respeito de uma pandemia que já matou quase 500.000 brasileiros. O principal avalista do torneio, o presidente Jair Bolsonaro festejou ao seu estilo fanfarrão: com uma foto nas redes sociais apontando para a logomarca do SBT, emissora dona dos direitos de transmissão dos jogos. O líder negacionista vestia uma camiseta do time do Brusque (SC) com propaganda da Havan, firma do empresário e apoiador Luciano Hang, um dos patrocinadores da transmissão na TV de Silvio Santos.
O Brasil venceu por 3×0 uma Venezuela alvejada por um surto de Covid-19 às vésperas da partida —onze atletas testaram positivo e não puderam atuar neste domingo. A pátria em chuteiras, como o cronista Nelson Rodrigues batizou a seleção nacional, tampouco promoveu qualquer manifestação além do minuto de silêncio no início da partida.
Ao contrário das jogadoras da seleção feminina, que na semana passada, antes do amistoso com a Rússia, exibiram uma faixa de protesto contra o assédio de Rogério Caboclo —o presidente afastado da CBF—, os homens apenas jogaram bola, mantendo a marca histórica masculina da falta de pronunciamento. A pátria em chuteiras calçou as pantufas dos isentões.
Nem mesmo a gravidade da peste provocada pelo coronavírus comoveu até agora os atletas e a comissão técnica da equipe. Mesmo na singela cartinha publicada no story do Instagram dos boleiros, não houve a menor sensibilidade para defender a vacina ou o SUS, por exemplo. Nada. No jogo de abertura da Copa América, idem, nem mesmo um gesto que pudesse ajudar os brasileiros vítimas da Covid. Uma omissão histórica bem superior à vergonha moral do 7×1 para a Alemanha na Copa de 2014.
Na breve cerimônia de abertura, um médico e um enfermeiro, representando a turma da linha de frente dos hospitais, entrou no estádio Mané Garrincha com a taça da competição. Muito pouco, dona Conmebol. A melhor homenagem, porém, seria ter evitado a realização do torneio, como defenderam dezenas de infectologistas e autoridades em saúde pública. Não foi em vão que grandes patrocinadores oficiais, como Ambev e Mastercard, retiraram suas marcas do evento. Essa Copa América, também chamada de Cepa América, queima o filme. Não serve à imagem de ninguém, a não ser para redundar a frieza e o negacionismo presidencial.
O Brasil venceu por 3×0 uma Venezuela alvejada por um surto de Covid-19 às vésperas da partida —onze atletas testaram positivo e não puderam atuar neste domingo. A pátria em chuteiras, como o cronista Nelson Rodrigues batizou a seleção nacional, tampouco promoveu qualquer manifestação além do minuto de silêncio no início da partida.
Ao contrário das jogadoras da seleção feminina, que na semana passada, antes do amistoso com a Rússia, exibiram uma faixa de protesto contra o assédio de Rogério Caboclo —o presidente afastado da CBF—, os homens apenas jogaram bola, mantendo a marca histórica masculina da falta de pronunciamento. A pátria em chuteiras calçou as pantufas dos isentões.
Nem mesmo a gravidade da peste provocada pelo coronavírus comoveu até agora os atletas e a comissão técnica da equipe. Mesmo na singela cartinha publicada no story do Instagram dos boleiros, não houve a menor sensibilidade para defender a vacina ou o SUS, por exemplo. Nada. No jogo de abertura da Copa América, idem, nem mesmo um gesto que pudesse ajudar os brasileiros vítimas da Covid. Uma omissão histórica bem superior à vergonha moral do 7×1 para a Alemanha na Copa de 2014.
Na breve cerimônia de abertura, um médico e um enfermeiro, representando a turma da linha de frente dos hospitais, entrou no estádio Mané Garrincha com a taça da competição. Muito pouco, dona Conmebol. A melhor homenagem, porém, seria ter evitado a realização do torneio, como defenderam dezenas de infectologistas e autoridades em saúde pública. Não foi em vão que grandes patrocinadores oficiais, como Ambev e Mastercard, retiraram suas marcas do evento. Essa Copa América, também chamada de Cepa América, queima o filme. Não serve à imagem de ninguém, a não ser para redundar a frieza e o negacionismo presidencial.
O anticristo Bolsolini prega, mata e mente
O lema da motociata de sábado, expediente cênico inventado por Benito Mussolini nos anos 1930 para atestar vigor do Partido Nacional Fascista italiano e já encenado antes no ato político que lançou o general da ativa Eduardo Pazuello na política, foi “Acelera para Cristo”. Ninguém precisa ter frequentado uma aula de teologia para defini-lo como uma blasfêmia. Afinal, os louvores não eram para Jesus, mas para Jair Messias, numa grosseira falsificação tratada como ato de fé. Bulsolini é o anticristo.
O versículo 6 do capítulo 14 do texto canônico do evangelista João, homenageado pelos bisavós deste articulista no nome do pai de seu pai, atesta sem direito a dúvidas: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”. O trajeto entre São Paulo e Jundiaí (seguido por cerca de 12 mil motoqueiros) não tinha como justificativa nenhuma confirmação da fé cristã, muito menos a afirmação de cumprimento desses três pilares básicos da cristandade. Explícito ofício eleitoral ilícito, não punido pelo leniente Tribunal Superior Eleitoral (TSE) (alô, alô, ministro Barroso), de afirmação pública da crendice negacionista do bolsonarismo, a procissão sobre duas rodas foi a forma mais radical da desumanidade de comemorar previamente o massacre de meio milhão de brasileiros pela covid-19. A estrada não levava a Aparecida, Lourdes, Fátima, ou ao Muro das Lamentações, nem a Meca, mas ao recorde obtido com desonra absoluta pelo capitão terrorista que, sem dar um tiro, levou centenas de milhares de uma só vez à cova.
A verdade foi ofendida em todas as estações do sepulcro caiado do qual ressurge a candidatura em desmanche do titular do desgoverno que ora nos desgraça, aflige e amaldiçoa.
As estações iniciais da marcha da negação ocorreram em depoimentos dos bolsonaristas Eduardo Pazuello, Ernesto Araújo, Fábio Wajngarten, Elcio Franco, Mayra Pinheiro, Nise Yamaguchi e Marcelo Queiroga na comissão parlamentar de inquérito (CPI) da covid-19 no Senado. Confrontados com as próprias declarações dadas ao longo de 14 meses, esses obscurantistas as negaram, como se a mentira anulasse os fatos e as próprias palavras. Assim que tentativas de evitar a quebra de sigilo decretada pela CPI começaram a cair no Supremo Tribunal Federal (STF), documentos das embaixadas brasileiras em Washington e Pequim desmancharam os castelos de areia de suas versões absurdas com a constatação singela de que a imunização foi atrasada deliberadamente para anabolizar o total de óbitos na pandemia, de tal dimensão que se torna impossível contar o feito em marcas na coronha do fuzil do artilheiro despojado de farda, armas e coturno por indisciplina crônica e terrorismo.
O mentiroso-mor já havia protagonizado cena de que só não se envergonha quem nunca teve pudor algum. A um punhado de adoradores que chama inadequadamente de “povo” Messias Bolsolini atribuiu a um órgão de controle do Poder Legislativo, o Tribunal de Contas da União (TCU), a afirmação de que haveria supernotificação de mortes por covid, o que pressupunha uma conspiração sigilosa inviável de todos os profissionais da saúde envolvidos no combate do acreditado Sistema Único de Saúde (SUS) nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) do País. O TCU desmentiu e o reincidente voltou à claque para dizer que tinha “errado”, porque não houvera “relatório” e, sim, “acórdão”. Nada disso, esclareceram a presidente Ana Arraes e o corregedor Bruno Dantas, que decidiram pelo afastamento do responsável pela patranha, o auditor bolsonarista e filho de militar bolsonarista Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques, cujos sobrenomes reúnem dragonas e faixas presidenciais da recente ditadura.
O bloco dos sujos com capacete e sem máscara foi encerrado com um discurso em que o anticristo insistiu na sua originalidade ao combater ao novo coronavírus aderindo à tese, mais infame do que o próprio agente da pandemia, de que para salvar alguns urge matar milhões. Expressões impróprias como “tratamento precoce” ou nobres como “liberdade de ir e vir” foram mais uma vez misturadas de maneira farisaica para enganar não tolos, mas espertinhos de espartilho que se beneficiam do saque ao erário. Este inclui o custo informado do falso cristianismo do culto à “imunidade de rebanho”, de R$1,2 milhão, da motociata de corpo presente.
A direita estúpida perdeu as eleições nos Estados Unidos e no Peru e acaba de sucumbir a uma esdrúxula aliança em que a extrema direita se uniu à esquerda e ao centro para derrubar do poder o aliado do capetão sem noção em Israel. Bibi Netanyahu, cuja ausência isola ainda mais o preferido dos corruptos do Centrão, da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e da Conmebol, que, ainda assim, se aferra à pílula do câncer, à cloroquina e ao agora batizado de “atendimento precoce”, apelando para o eufemismo.
A distância semântica entre “tratamento” e “atendimento” pode ser quiçá medida em milímetros. Não é o caso da diferença entre 1,3 milhão de motos da motociata da morte e as prováveis 12 mil. Não há ainda uma unidade capaz de medir o cinismo de Allan dos Santos, que, do exterior, disparou a mentira de que a síncope sofrida pelo craque dinamarquês Eriksen em campo na Eurocopa tenha resultado de vacina anticovid. A Internazionale de Milão já denunciou o delírio bolsonarista. Mas não basta para deter o tsunami de terraplanismo, obscurantismo, desumanidade e, sobretudo, absoluto cinismo do pastor que nem sequer se traveste de ovelha para pregar o massacre dos inocentes. E, assim, garantir o patrimônio imobiliário de uma família que só negocia com dinheiro vivo. E é garantido no poder, entre outros segmentos sociais, pelo ser abstrato mercado de capitais, que não precisa recorrer a moedas impressas para enriquecer.
O versículo 6 do capítulo 14 do texto canônico do evangelista João, homenageado pelos bisavós deste articulista no nome do pai de seu pai, atesta sem direito a dúvidas: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”. O trajeto entre São Paulo e Jundiaí (seguido por cerca de 12 mil motoqueiros) não tinha como justificativa nenhuma confirmação da fé cristã, muito menos a afirmação de cumprimento desses três pilares básicos da cristandade. Explícito ofício eleitoral ilícito, não punido pelo leniente Tribunal Superior Eleitoral (TSE) (alô, alô, ministro Barroso), de afirmação pública da crendice negacionista do bolsonarismo, a procissão sobre duas rodas foi a forma mais radical da desumanidade de comemorar previamente o massacre de meio milhão de brasileiros pela covid-19. A estrada não levava a Aparecida, Lourdes, Fátima, ou ao Muro das Lamentações, nem a Meca, mas ao recorde obtido com desonra absoluta pelo capitão terrorista que, sem dar um tiro, levou centenas de milhares de uma só vez à cova.
A verdade foi ofendida em todas as estações do sepulcro caiado do qual ressurge a candidatura em desmanche do titular do desgoverno que ora nos desgraça, aflige e amaldiçoa.
As estações iniciais da marcha da negação ocorreram em depoimentos dos bolsonaristas Eduardo Pazuello, Ernesto Araújo, Fábio Wajngarten, Elcio Franco, Mayra Pinheiro, Nise Yamaguchi e Marcelo Queiroga na comissão parlamentar de inquérito (CPI) da covid-19 no Senado. Confrontados com as próprias declarações dadas ao longo de 14 meses, esses obscurantistas as negaram, como se a mentira anulasse os fatos e as próprias palavras. Assim que tentativas de evitar a quebra de sigilo decretada pela CPI começaram a cair no Supremo Tribunal Federal (STF), documentos das embaixadas brasileiras em Washington e Pequim desmancharam os castelos de areia de suas versões absurdas com a constatação singela de que a imunização foi atrasada deliberadamente para anabolizar o total de óbitos na pandemia, de tal dimensão que se torna impossível contar o feito em marcas na coronha do fuzil do artilheiro despojado de farda, armas e coturno por indisciplina crônica e terrorismo.
O mentiroso-mor já havia protagonizado cena de que só não se envergonha quem nunca teve pudor algum. A um punhado de adoradores que chama inadequadamente de “povo” Messias Bolsolini atribuiu a um órgão de controle do Poder Legislativo, o Tribunal de Contas da União (TCU), a afirmação de que haveria supernotificação de mortes por covid, o que pressupunha uma conspiração sigilosa inviável de todos os profissionais da saúde envolvidos no combate do acreditado Sistema Único de Saúde (SUS) nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) do País. O TCU desmentiu e o reincidente voltou à claque para dizer que tinha “errado”, porque não houvera “relatório” e, sim, “acórdão”. Nada disso, esclareceram a presidente Ana Arraes e o corregedor Bruno Dantas, que decidiram pelo afastamento do responsável pela patranha, o auditor bolsonarista e filho de militar bolsonarista Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques, cujos sobrenomes reúnem dragonas e faixas presidenciais da recente ditadura.
O bloco dos sujos com capacete e sem máscara foi encerrado com um discurso em que o anticristo insistiu na sua originalidade ao combater ao novo coronavírus aderindo à tese, mais infame do que o próprio agente da pandemia, de que para salvar alguns urge matar milhões. Expressões impróprias como “tratamento precoce” ou nobres como “liberdade de ir e vir” foram mais uma vez misturadas de maneira farisaica para enganar não tolos, mas espertinhos de espartilho que se beneficiam do saque ao erário. Este inclui o custo informado do falso cristianismo do culto à “imunidade de rebanho”, de R$1,2 milhão, da motociata de corpo presente.
A direita estúpida perdeu as eleições nos Estados Unidos e no Peru e acaba de sucumbir a uma esdrúxula aliança em que a extrema direita se uniu à esquerda e ao centro para derrubar do poder o aliado do capetão sem noção em Israel. Bibi Netanyahu, cuja ausência isola ainda mais o preferido dos corruptos do Centrão, da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e da Conmebol, que, ainda assim, se aferra à pílula do câncer, à cloroquina e ao agora batizado de “atendimento precoce”, apelando para o eufemismo.
A distância semântica entre “tratamento” e “atendimento” pode ser quiçá medida em milímetros. Não é o caso da diferença entre 1,3 milhão de motos da motociata da morte e as prováveis 12 mil. Não há ainda uma unidade capaz de medir o cinismo de Allan dos Santos, que, do exterior, disparou a mentira de que a síncope sofrida pelo craque dinamarquês Eriksen em campo na Eurocopa tenha resultado de vacina anticovid. A Internazionale de Milão já denunciou o delírio bolsonarista. Mas não basta para deter o tsunami de terraplanismo, obscurantismo, desumanidade e, sobretudo, absoluto cinismo do pastor que nem sequer se traveste de ovelha para pregar o massacre dos inocentes. E, assim, garantir o patrimônio imobiliário de uma família que só negocia com dinheiro vivo. E é garantido no poder, entre outros segmentos sociais, pelo ser abstrato mercado de capitais, que não precisa recorrer a moedas impressas para enriquecer.
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