sexta-feira, 10 de junho de 2016

Cunha esposa e re na lava jato moro aceita denuncia nao conheco nao tem esposa prove

Antes autoritário que corrupto

Tenho dito aqui que o tipo de populismo característico do governo do PT –como o de alguns outros países latino-americanos– nasceu como uma alternativa ao regime comunista que acabou antes que chegassem ao poder pela revolução. Não chegariam, é claro, mas em face das novas circunstâncias, tiveram que mudar de tática.

Esse populismo, que se valeu dos recursos públicos para ganhar a adesão das camadas mais pobres da população, adotou naturalmente uma política econômica que, para mostrar-se anticapitalista, levou o país à bancarrota. Por outro lado, apropriou-se das empresas estatais e saqueou-as em aliança com empresários capitalistas, que diziam combater.

O resultado de tudo isso foi o que se viu: o processo político-econômico do petismo e os escândalos que culminaram com o impeachment de Dilma Rousseff. A cara abatida de Lula, no dia em que ela foi afastada do governo, não deixou dúvida quanto à realidade dos fatos: o populismo petista chega ao fim.

Pois bem, mas não é que, exatamente nessa ocasião, a direção do Partido dos Trabalhadores trouxe a público uma "Resolução sobre a Conjuntura" que pôs todo mundo perplexo? É que, nesse documento, os dirigentes petistas deixam claro que, de fato, seu projeto era instaurar no país um regime antidemocrático.

Vejamos o que diz o inusitado documento: "Fomos igualmente descuidados com a necessidade de reformar o Estado, o que implicaria impedir a sabotagem conservadora nas estruturas de mando da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, modificar os currículos das academias militares, promover oficiais com compromisso democrático e nacionalista; fortalecer a ala mais avançada do Itamaraty e redimensionar sensivelmente a distribuição de verbas publicitárias para os monopólios da informação".

Noutras palavras, o que está dito nessa resolução é que o projeto de poder do partido era substituir o Estado democrático por outro, controlado pelo PT, à semelhança das ditaduras de esquerda. Como isso seria feito?

Conforme está claro no documento, os petistas deveriam manter sob seu controle a polícia e a promotoria federais, mudar a formação ideológica das academias militares, assumir o comando das forças armadas, submeter as decisões do Itamaraty e comprar a opinião dos jornais e estações de televisão. Enfim, instaurar no país um regime totalitário.

Devo admitir que semelhante declaração me deixa surpreso. É que, embora saibamos que o propósito desse populismo sempre tenha sido usar a máquina estatal e os programas assistencialistas para perpetuar-se no poder, sempre procuraram mostrar-se como representantes da vontade popular, ou seja, como intérpretes da autêntica democracia.

Agora mesmo, neste episódio do impeachment da Dilma Rousseff, procuram caracterizá-lo como um golpe, ou seja, uma ação contra a democracia, de que seriam eles os verdadeiros defensores. Como se explica, então, que, contrariando suas próprias palavras de ordem e sua atitude em face do impeachment, tragam a público um documento em que deixam explícito o seu projeto de instaurar no país um regime autoritário? E veja bem, propósito esse que sempre foi veementemente negado por eles, toda vez que alguém os acusava se tal intenção.

E não era de se esperar outra coisa, uma vez que o PT se caracteriza com o partido da mentira. Por isso mesmo, ainda é mais surpreendente a sinceridade dessa resolução, na qual lamenta não ter conseguido instaurar no país o seu projeto autoritário. Diante disso, é inevitável perguntar: por que então essa inusitada sinceridade?

Vou arriscar um palpite. Como disse antes –e todo mundo sabe–, não só o impeachment de Dilma Rousseff mas também a participação do PT nas falcatruas denunciadas pelo mensalão e pela Lava Jato desmontaram a imagem do partido "que não rouba nem deixa roubar".

Este seria, portanto, o momento de fazer uma autocrítica. E é isso que essa resolução pretende ser, mas não é, pois, em vez de arrepender-se das falcatruas que praticou, culpa-se de não ter posto em prática um projeto revolucionário que não passava de conversa fiada. 

Militância petista: doença em perversão?

Ignorando os alertas feitos por economistas, por aliados e pelo TCU, Dilma assinou a política econômica que causou um rombo de mais de R$ 170 bilhões, gerando a maior recessão da história, duplicando os índices de desemprego, fazendo até o número de pobres aumentar no Brasil. Apesar disso, assistimos todos os dias um exército de pessoas pedindo que Dilma volte à presidência.


No dia seguinte ao afastamento de Dilma, Nelson Motta escreveu no O Globo: “Será honesto mentir, esconder dívidas, prometer o que não poderia cumprir, acusar os adversários do que depois ela faria, permitir que uma organização criminosa tomasse a Petrobras e outras estatais para financiar um projeto de poder?”. Sim. Eleitores do PT, do PSOL, do PCdoB e da Rede acreditam que pelo simples fato de Dilma representar a extrema-esquerda, ela está acima de quaisquer julgamentos e críticas. Dilma tem o direito de mentir, fraudar e acolher corruptos aliados.

Notícias apenas entre os dias 2 e 3 de junho:

1 – Em depoimento à justiça, o ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró reafirma que Dilma, quando presidia o conselho administrativo da estatal, sabia de todos os detalhes da compra da refinaria de Pasadena. Sabia que o valor estava muito acima do mercado. Sabia dos esquemas de propina que o negócio viabilizaria.

2 – Documentos indicam que Dilma teve gastos pessoais pagos com dinheiro roubado da Petrobrás. Cabelereiro ao custo de R$ 5 mil por sessão, pago com dinheiro roubado.

3 – O empresário Marcelo Odebrecht afirmará, em depoimento de delação premiada, que Dilma em pessoa pediu a ele R$ 12 milhões “por fora” para sua campanha de 2014.

4 – Bené, o operador do PT, afirma que o então assessor direto de Dilma, Giles Azevedo, forjou contratos da Presidência da República para pagar contas do partido.

Soma-se a isso as gravações das conversas de Delcídio do Amaral e de Aloisio Mercadante, ambos agindo em nome da presidente para obstruir a Lava Jato. Soma-se também as delações que afirmam que Dilma nomeou Marcelo Navarro como ministro do STJ com a missão de soltar Marcelo Odebrecht, evitando assim sua delação premiada. Anteontem, o executivo Zwi Skornicki, também em depoimento à justiça, afirmou que pagou R$ 4,5 milhões à campanha de Dilma em 2014, dinheiro de propina oriundo de contas na Suíça.

Nada disso sequer constrange os eleitores de partidos de extrema-esquerda − Dilma mentiu, mas é mulher; Dilma foi irresponsável, mas é guerreira; Dilma foi complacente com a corrupção; mas é comunista. Dilma é inocente e ponto final.

Foram centenas de milhões de reais desviados da Petrobrás para bancar as campanhas de Dilma. Quem se importa?

Antes de ser afastada, Dilma cortou verbas de programas sociais, da saúde, da educação e da Polícia Federal, mas o que se escuta é: “Temer está destruindo os avanços sociais promovidos pelo PT, está acabando com a educação, com a saúde e até com a Lava Jato. Fora Temer!”.

Três delatores diferentes informaram em depoimento que Dilma nomeou Marcelo Navarro para o STJ com o objetivo de mandar soltar Marcelo Odebrecht, mas o que se escuta? “Fora Temer! Fora Temer! Fora Temer!”.

Desde o afastamento de Dilma, toda manifestação, sobre qualquer assunto, leva consigo os gritos de “Fora Temer”.

Dois dias atrás, os professores da UNB aprovaram um indicativo de greve dizendo que só voltarão a trabalhar quando Dilma voltar à presidência.

A economia foi dilapidada ao longo de 13 anos sob total complacência dos eleitores de partidos de extrema-esquerda, mas essas mesmas pessoas condenam Michel Temer − que ainda não completou um mês no cargo − por não ter resolvido todos os problemas do Brasil de forma imediata e indolor.

Depois de 13 anos de tantos absurdos, muitas pessoas ainda defendem Lula e Dilma por livre e espontânea vontade.

Qual o nome disso? Doença? Perversão?

O atual momento brasileiro comprova definitivamente a razão de a esquerda sempre ser a pior alternativa. Quanto mais à esquerda é um governo, maior será o exército de militantes prontos para defendê-lo, a despeito de qualquer absurdo que cometa. O país pode desmoronar, as pessoas podem ser reduzidas à miséria, que a grande maioria dos artistas, dos estudantes, dos sindicalistas e dos intelectuais estarão firmes e fortes em defesa do governo socialista. Seja lá o que um governo socialista faça de errado, a grande mídia sempre terá extrema cuidado ao criticá-lo.

Os venezuelanos estão passando fome, sofrendo com falta de energia e com a epidemia de sarna que se alastra por falta de produtos de higiene pessoal. A despeito disso, Nicolás Maduro conta com um exército de militantes profissionais e voluntários fazendo plantão em sua defesa. Indiferente ao sofrimento da população, a quase totalidade dos jornais mais importantes do mundo ainda reluta em dizer com clareza e objetividade que o socialismo destruiu a Venezuela.
O Brasil estava ótimo até o dia 12 de maio de 2016. Então as elites deram um golpe, depuseram a presidenta eleita democraticamente e destruíram todos os avanços sociais, levando milhões de brasileiros ao desemprego, à fome e o Brasil a maior crise econômica de sua história.
Eis a narrativa que ouviremos pelos próximos 50 anos.
João Cesar de Melo

Perdas salariais levam 1 milhão de famílias à queda na escala social

Reportagem de Marcia De Chiara, O Estado de São Paulo, edição de 29 de maio passado, com base em levantamento da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisas, revela que de 2015 para 2016 um milhão de famílias (4 milhões de pessoas) desceram de classe social. Uma parte que se encontrava na classe C1 passou para a C2. Uma outra fração desceu da C2 para os grupos D/E.

É consequência do congelamento salarial e do desemprego que atingiram em cheio os padrões no poder aquisitivo. Daí, claro, a recessão. Menos consumo, menos receita de impostos. Um círculo vicioso. Uma corrente negativa que abala a população brasileira.

A inflação de 10,6%, em 2015, como reconhece o próprio IBGE, não foi resposta, na grande maioria dos casos, nos vencimentos dos regidos pela CLT e dos funcionários públicos.


Somem-se a esse resultado os índices inflacionários mensais de janeiro a maio deste ano. O aumento do custo de vida verificado em 2015 somente foi reposto para os 29% da mão de obra ativa brasileira que ganham o salário mínimo e para os aposentados e pensionistas do INSS. Neste caso, com base em lei existente. No mais, as perdas salariais se acumularam e continuam se acumulando.

Qualquer reajuste (não aumento) é considerado um absurdo por parte da equipe econômica do governo. Os mesmos personagens veem com naturalidade absoluta a incidência dos juros anuais de 14,25% sobre o montante da dívida pública, que está na escala de 2,9 trilhões de reais, como revela o Banco Central. Uma contradição flagrante. Dois olhares diversos sobre o panorama socioeconômico de nosso país.

Márcia de Chiara revela a divisão da mão de obra ativa (100 milhões de homens e mulheres) por classes de renda. Vamos a elas.

O Brasil tem aproximadamente 57 milhões de famílias. A classe A é formada por 3% da população. A classe B1 por 5%. A B2 pela percentagem de 15. A C1 por 23%. A C2 por 27. Finalmente o grupo relativamente majoritário, classes D/E, faixa na qual se encontram 29% dos brasileiros.

Na classe A estão as famílias (não pessoas, mas o conjunto de 4 pessoas) cuja renda mensal é de 20,9 mil reais. Na B1 as famílias de rendimentos mensais de 9,2 Mil. Em seguida a B2 juntando grupos familiares que percebem 4,8 mil mensais. Depois a classe C1 os que ganham 2,7 mil. Abaixo a C2 com 1 mil e 600 reais. Finalmente os grupos D/E, cujos rendimentos estão contidos na faixa do salário mínimo.

A reportagem de O Estado de São Paulo produziu uma plena transparência da realidade social e salarial brasileira.

Verifica-se que 56% dos grupos familiares têm rendimento de 1 a 2 salários mínimos. Se incluirmos a escala de 1 a 3 SM, observamos que tal grupamento nada menos que 79% dos que trabalham num país chamado Brasil. E que somente 8% têm rendimento que pode ser classificado como classe média. Reitero que se trata de renda média familiar.

Resultado da soma dos salários de 4 pessoas em média. A parcela dos que ganham acima de 9,2 mil reais não chega a 10%. Se alongarmos a faixa de renda, neste caso individual, para englobar aqueles cujos rendimentos passam de 20 salários mínimos, encontraremos apenas 0,8% da população.

É fácil defender congelamento dos salários para assegurar a contenção dos gastos públicos. Difícil é viver com a compressão salarial, uma característica brasileira.

Bancando sempre um deus'

O mimimi de Dilma

Quem já passou pela experiência de encolher seu padrão de vida, apertar o cinto, mudar-se para imóvel menor, em bairro pior, vender o carro novo para comprar um usado, entenderá bem o que vou escrever. Nos últimos dias tenho conversado com muita gente vivendo concretamente essas experiências. Muitos deles eram jovens com bons postos de trabalho, colhidos pela tesoura determinada pela recessão. Profissionais bem sucedidos em diversas áreas, assumiram a direção de seus carros e se tornaram motoristas do Uber, por exemplo. Tenho ouvido suas histórias e seu esforço de adaptação a uma nova realidade. Tenho lhes conferido, principalmente pelas histórias de vida, a desejada nota cinco que os credencia a continuar no serviço. É nota dada ao cidadão, ao chefe de família, ao estudante bolsista no exterior, que precisou retornar porque o programa secou. Era um programa para crescer até a eleição e minguar depois, sabe como é. O mandato presidencial de Dilma tinha que ser "legitimamente conquistado".

Pois eis que a tesoura, uma outra tesoura, acabou atingindo a própria presidente. Ela foi afastada segundo o rito constitucional e aguarda o julgamento do Senado. Enquanto isso, salário integral, curte as comodidades do Palácio da Alvorada, com um séquito de fazer inveja à qualquer família real europeia. No entanto, para a Dilma, ela está nas masmorras de uma espécie de Coliseu, onde aguarda algumas semanas pela decisão final. Naquele dia precisará que mais de 27 entre os 81 senadores ergam o polegar e a restituam à vida antiga, que tão mal levava o Brasil e tanto bem lhe fazia viver.

Tivesse fé, Dilma deveria subir de joelhos as escadarias da Penha. Deveria lavar o átrio da Igreja de Nosso Senhor do Bom Fim. Foi-lhe dado o privilégio de presidir a república e ela fez mau uso dessa ventura conduzindo o país a uma situação que se torna desnecessário descrever porque seria falar sobre a vida de cada um. No entanto, em vez de agradecer e penitenciar-se, Dilma reclama. Reclama de tudo, como se estivesse nas masmorras do Coliseu Romano.
Reclama de não ter jato da FAB à disposição para viajar quando e para onde bem entenda. Reclama da reduzida equipe. Reclama do cartão de alimentação. E no entanto, de uma ponta a outra, a lista de suas efetivas disponibilidades é feita de privilégios! São regalias negadas aos trabalhadores. E ainda mais recusadas aos milhões de brasileiros desempregados por sua incompetente condução da política econômica. A estes, desempregados pela corrupção, desempregados pelos gastos durante o estelionato eleitoral de 2014 e pelo dinheiro despejado no totalitarismo dos camaradas bolivarianos, ela não dedica uma única palavra.

O dedo acusador de Dilma volta-se contra tudo e todos. Só não encontra o rumo do próprio peito.

Percival Puggina

Os 'pais da pátria' estão chegando?

Volta a perturbar a paciência nacional a proposta da convocação de uma “Constituinte exclusiva” como parte da reforma política que todo mundo quer mas ninguém faz. Madame, sem ter o que fazer, saiu na frente da sugestão. Em plena crise institucional, num país com dois presidentes da República e nenhum cérebro pensante, só faltava mais essa. Imagine-se a eleição de quarenta ou sessenta “exclusivos” com obrigações especiais, votados sabe-se lá por quem ou onde, com prazo fixo para redigir uma nova Constituição tirada da imaginação da maioria. Estariam fora senadores e deputados com mandato, sem perder suas atribuições constitucionais, podendo, assim, emendar a Constituição vigente, mesmo batendo de frente com a nova?


Quem se candidataria a “constituinte exclusivo”? Tudo indica que os candidatos derrotados na última eleição para deputado ou senador, mais uns tantos desocupados provenientes do “ócio sem dignidade” verificado na periferia de tribunais e bancas de advocacia. Poderiam votar neles apenas os bacharéis? Ou quantos soubessem ler e escrever? Deveriam pertencer a partidos políticos? Ou ser sabatinados pelas Faculdades de Direito?

Toda Constituição começa a ser redigida a partir de um anteprojeto, mas já que existe uma completa em vigência, o que fazer com ela? Considerá-la revogada por inteiro ou que capítulos preservar?

E a nova, inspirada ou copiada da atual? Teria o Congresso poderes para alterar o texto dos “exclusivos”? Por falar nestes, onde se reuniriam? Em Brasília, nos plenários da Câmara ou do Senado? No Mané Garrincha sobraria lugar, excelente sugestão para aumentar seu número de frequentadores. Os paulistas reivindicariam as Arcadas, mas os baianos?

Na hora da promulgação, não seria preferível a outorga? Os “exclusivos” exigiriam mandatos eternos, como os “pais da pátria”?

ONU aflita com espaços urbanos

A questão já está presente em toda parte, a ponto de o próprio Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat) ter, agora (Mobilize, 30/5), colocado o tema do espaço público no centro do debate no encontro que precedeu a Conferência para o Desenvolvimento Urbano Sustentável que se realizou em Barcelona. O alerta da ONU é para a gravidade do problema da diminuição dos espaços públicos nas cidades: estas tendem a ficar sem praças, sem calçadas largas para pedestres nem transporte público para todos os habitantes.

O espaço público, diz a ONU, deve ser o centro de todas as atividades sociais, de forma gratuita e digna. E isso inclui ruas, espaços abertos e instalações públicas – além de exigir que sejam mais bem planejados para pedestres e moradias. Propõe a ONU uma política urbana participativa, tanto para bairros antigos quanto novos, que receba mais recursos das administrações. Mas atualmente acontece o contrário: na média, o espaço público ocupa apenas 21% do espaço total da superfície, segundo estudos da própria ONU; e apenas 37% das áreas de desenvolvimento têm planos urbanísticos que gerem espaços públicos, hierarquias em usos e facilitem a coesão social.


Há muitas formas possíveis. Para citar apenas uma, o distrito de Mendoza, na Argentina, implantou – utilizando águas que escorrem de montanhas geladas para canais construídos – uma agricultura muito fértil; na cidade, abriu valas junto de calçadas (no lugar de sarjetas) e nelas plantou árvores em toda a extensão; e plantou e mantém um parque público extenso, no meio de um bosque nascido também do plantio de milhares de árvores. Com tudo isso, a cidade, com mais de 120 mil habitantes, é admirada e procurada como refúgio de turistas.

A ONU considera muito preocupante que a população mundial já tenha superado 7,3 bilhões de pessoas em 2015 e vá chegar a 10 bilhões em 2050. Índia, China e Nigéria terão 37% do aumento populacional. E a população urbana já ultrapassou 3,9 bilhões em 2014, mais de 50% dos quais na Ásia, na Europa, na América Latina e no Caribe.

Este é o grande desafio do século 21: a gestão urbana, seja nas megacidades, com mais de 10 milhões de pessoas cada (como Tóquio, com 38 milhões; e Délhi, com 25 milhões), seja nas pequenas ou médias cidades. Isso porque falta planejamento rígido, que crie normas para todo o espaço e para a verticalização, preservação das áreas públicas e dos espaços “verdes”, o que pode e não pode ser feito em cada lugar, disciplina do trânsito e proteção de pedestres (um terço das pessoas nas cidades maiores, hoje, só se desloca a pé, e parte chega a consumir quase duas horas diárias para ir ao trabalho e voltar). Sem falar nos sistemas de drenagem, recolhimento e tratamento de esgotos (cada pessoa gera, em média, 200 gramas diários de fezes no Brasil – mais de 40 mil toneladas por dia, das quais só 40% recebem algum tratamento). E isso vale também para cidades com menos de 500 mil habitantes. Não é preciso esperar que elas cresçam e tenham também megaproblemas.

Não deve surpreender a informação de que nas últimas três décadas a Região Metropolitana de São Paulo (hoje com mais de 20 milhões de habitantes) vem perdendo população para seu entorno e outros lugares – 300 mil, na década de 1980, e outras 300 mil entre 1980 e 2010. De cada 10 habitantes, 7 gostariam de mudar-se da cidade, como informou este jornal (20/1/2016). Mas os migrantes encontrarão em outros lugares a mesma falta de planejamento e disciplina urbana. Na capital paulista, em março, aprovou-se nova Lei de Zoneamento que “exclui a região central e deixa margem para reduzir as áreas verdes da cidade” (Folhapress, 5/5). Ela poderá ser aplicada em 50% da cidade, segundo alguns estudiosos. E poderá deixar de ser aplicada em 70% a 80% das áreas formadas por lotes com menos de 500 metros quadrados de área. Lei em análise na Câmara paulistana dobra de 8 andares para 16 andares a altura permitida em 8% da cidade de São Paulo.

Quem pensa em fazer como Oslo, a capital norueguesa, que está planejando (Corporate Knights, 19/11/2015) eliminar todos os veículos motorizados da sua área central e abrir mais espaço para pedestres e bicicletas – mesmo sabendo que apenas 1 mil dos 600 mil habitantes morem nesse espaço central? Para a cidade toda, planeja-se uma redução de 20% no trânsito de veículos em toda a área urbana e de 30%, em 2030. Em Santander, na Espanha, com 180 mil habitantes, o chão, as luminárias, os ônibus e as lixeiras públicas têm sensores que identificam o nível de poluição do ar, as vagas livres em estacionamentos, as lâmpadas danificadas ou as lixeiras que precisam ser esvaziadas – e tudo é transmitido em tempo real para o órgão municipal responsável, segundo Mariana Lima (Estado, 7/3).

A falta de planejamento e de controle por aqui é de tal ordem que “áreas de tragédia em São Paulo têm boom de habitantes : 141% mais em Caieiras e 127% em Mairiporã, desde a década de 1990, ante 41% no Estado” (Folha de S.Paulo, 19/3). O jornal acrescenta: “Juntas, cidades mais afetadas pelas chuvas cresceram 99%” – um tema para meditação nestes dias em que graves problemas dessa natureza nos rondam. Quem estará pensando no nível obrigatório de impermeabilização do solo, que, desrespeitado, reduz a possibilidade de infiltração de água e aumenta a possibilidade de inundações? Quem se lembra de que essa mesma impermeabilização, junto com a refração da energia solar pelos altos edifícios, ajuda a formar as ilhas de calor localizadas, que atraem chuvas fortes e dramas para as populações? Ao contrário, a nova Lei de Zoneamento vai alterar dois itens do atual Plano Diretor e atrair mais veículos, ao permitir apartamentos maiores e com mais de uma vaga de garagem (25/2).

Quem vai se preocupar com isso tudo, sabendo que “até 2030 o mundo deve chegar a 41 megacidades com mais de 10 milhões de pessoas” (Estado, 20/3)?

Washington Novaes