quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Feliz Natal


Vamos nos dar um descanso, como Papai Noel. para digerir nosso frango de padaria enquanto os Poderes se empanzinam com o nosso dinheiro.
Voltamos já!

O Natal no país da mistanásia

Em 1989, o bioeticista Marcio Fabri dos Anjos cunhou o termo mistanásia. Apesar de pouco utilizado ele não poderia ser mais atual em nosso país. Constitui a morte abreviada de muitos devido a pobreza, violência, falta de infraestrutura e de condições mínimas de se ter uma vida digna. Representa de fato a eutanásia social.

Em 2015, o direito de morrer foi debatido intensamente em sociedades que respeitam a vida. No Canadá, a eutanásia voluntária foi aprovada com amplo apoio da população. Embora rejeitada no Reino Unido, o debate reafirmou o direito à vida em um país que valoriza a qualidade da morte. Em nosso país, no ano que teima em não acabar, recuamos em mais um indicador que nos humilha como sociedade.

De um modo geral nos preocupamos com a qualidade de vida. Já a “qualidade da morte” não é valorizada em nossa cultura. Os avanços terapêuticos nos dão a impressão de que a morte é opcional e que a sua medicalização poderá retardá-la indefinidamente. No sentido de avaliar a qualidade da morte, a Fundação Lien, uma organização filantrópica em Cingapura, pesquisou os diversos aspectos que caracterizam a finitude. Estabeleceu um índice que permitiu a sua avaliação em diversos países do mundo. Gastos elevados e efetivos em sistemas públicos de saúde e acesso a cuidados paliativos de excelência foram avaliados.

Em 2010 e novamente em 2015 ficou claro que a qualidade da morte é superior no Reino Unido, que ocupa o primeiro lugar nas duas avaliações. Em 2010, entre 40 países, o Brasil ocupava a 38a posição. Superava apenas Índia e Uganda. Passados cinco anos, e agora em um grupo de 80 países, passamos para a 42a posição, superados inclusive por Uganda, que agora ocupa o 35o lugar.

No país do futuro, que em apenas um ano conseguiu perder mais de uma década, estes números não causam estranheza. Quando os promotores da saúde não valorizam a vida, por que se preocupariam com a morte? Uma pesquisa realizada pelo Datafolha em outubro passado concluiu que 50% dos brasileiros acham que “bandido bom é bandido morto". O sistema público de saúde brasileiro, pretensamente único e universal, parafraseia todos os dias a mesma pesquisa e indica que “paciente bom é paciente morto".

Sim, eutanásia involuntária é crime. E é uma vergonha nacional.

Atribui-se à falta de recursos tamanha irresponsabilidade. De fato, alguns dos verdadeiros responsáveis agora se encontram atrás das grades. Mas as leis benevolentes de nosso país, apesar das multas bilionárias, não conseguirão resgatar as vidas desperdiçadas pela ostentação dos poderosos.

Vemos ainda a hipocrisia atingir o seu grau mais extremo quando um gestor afirma, desavergonhadamente, que “mesmo não recebendo, o médico deve atender pacientes”. Como uma vestal, ele atribui aos médicos uma qualidade que não possui: a responsabilidade com o trabalho. Assim como os demais governantes, deveria abrir mão do seu salário em solidariedade àqueles que não conseguem nem mesmo enterrar os seus mortos.

No país do “nós contra eles”, a criminalização do médico constitui mais uma infâmia, uma inversão de papéis. São eles, os governantes, os responsáveis pela anomia, pela instalação de regras que promovem a predação e não a cooperação.

O Natal sempre nos traz a esperança do novo ano. Entretanto, em 2015, a ministra Cármen Lúcia nos ensinou que, no Brasil, escárnio e o cinismo superaram a esperança.

Pobre 2016!

Daniel Tabak

Trabalho temporário

Dilma dificilmente terá condições de conduzir o país a bom termo

Os defensores do governo da presidente Dilma, mas, sobretudo, os que se apegam às estatísticas como se fossem imbatíveis, estão por ora satisfeitos com algumas análises positivas sobre as manifestações do penúltimo domingo, em todos os Estados, em favor do pedido de impeachment. Argumentam que, em relação às manifestações anteriores, a do dia 13.12 contou com adesão menor de participantes. Isso, dizem, demonstra, claramente, que o movimento está perdendo a sua força. E estão mais satisfeitos ainda depois que o relatório do ministro Edson Fachin foi rejeitado, no STF, pela maioria dos seus pares.

A decepção com os políticos, a espera da decisão do STF sobre um novo rito para o pedido de impeachment e a sua aceitação pelo deputado Eduardo Cunha, que brevemente será processado pelo Conselho de Ética da Câmara e, com certeza, o será também pelo STF, podem ter contribuído para essa adesão menor no penúltimo domingo.

Ninguém de boa-fé ou de bom senso poderá dizer que o impeachment da presidente Dilma seria o melhor caminho para o Brasil. Por outro lado, porém, se prosperar e for aceito, depois da recente decisão do STF, ninguém poderá dizer que a sua adoção foi um golpe contra as instituições democráticas.

Não é necessário ser jurista para concluir que o governo Dilma desrespeitou o Orçamento da União. Qualquer leigo que se dispuser a ler a Constituição, as leis e as normas sobre os chamados “crimes de responsabilidade” facilmente chegará à conclusão de que ela foi (e é) a única responsável pelas pedaladas e, por essa razão, se ajusta à categoria como uma luva ou, no jargão jurídico, à tipificação legal.

O crime de responsabilidade não é objeto do Código Penal, pois não se trata de crime comum. Será submetido a juízo político, que poderá ser o senhor da cassação do mandato da presidente Dilma.

O ministro Edson Fachin, relator da ação do PCdoB contra o impeachment, provocou, em seu judicioso relatório, ratificando as decisões tomadas na véspera pela Câmara Federal, entre os que confiavam na confirmação do que propusera antes, uma expectativa que durou apenas 24 horas. Os ministros do STF, liderados por Luís Roberto Barroso, à exceção de Gilmar Mendes e Dias Toffoli, que fecharam com o relator, anularam a eleição secreta e estabeleceram um rito aparentemente favorável ao governo.

A decisão do STF (que, na verdade, ocupou o espaço vazio deixado pelo vazio Congresso) não muda a preocupante realidade do país. Com a presidente ameaçada pelo fantasma do impeachment e, ainda, de cassação de mandato pelo Superior Tribunal Eleitoral; com os presidentes da Câmara e do Senado premidos pela operação Lava Jato; com a economia à deriva; com a saída de Joaquim Levy; e, enfim, com a nomeação de Nelson Barbosa para a Fazenda (foi ele quem ajudou o governo a levar a economia para o buraco em que está), os horizontes, até onde divisamos, anunciam tempestades amedrontadoras em 2016.

Mesmo que não haja impeachment, ou que o TSE não conclua pela cassação do seu mandato e o do vice, a verdade, estampada nas pesquisas, não vai mudar: Dilma (Deus queira que eu esteja errado!) dificilmente terá condições, a partir de 2016, de conduzir o governo. Com horror à política, não se convence de que o país quer rapidez na indicação de um rumo que o retire da situação econômica e política a que ela o levou. Com a ajuda dos insensatos de plantão.

Feliz Natal, e que Deus vele pelo Brasil!

Eclipse da razão

Diversas vezes ao longo deste ano lastimei o "conforto das instituições", ou seja, aquela atitude que deixa tudo como está para ver como fica porque o modo como está não perturba os poderes da República. Foi exatamente o que, no julgamento da ADPF 378, motivou a inominável decisão da "suprema cortesã" sobre o rito do impeachment. Inominável? Sim, inominável. O STF não apenas decidiu que o voto secreto, usado por ele mesmo quando escolhe seus dirigentes e representantes, não vale para o parlamento. Ele estabeleceu, também, que a Câmara (representação do povo, dos cidadãos), num impeachment, pesa menos que o palito da azeitona do Martini. Qualquer pessoa alfabetizada sabe não ser isso o que a Constituição diz. Então, cabe perguntar: fosse o governo majoritário na Câmara e minoritário no Senado, não teria, a decisão, sentido inverso?

Em nosso país, quando se trata das questões políticas de fundo, vivemos sob eclipse da razão, convencidos de que "nossas instituições são boas mas não funcionam" e de que necessitamos de quem as faça funcionar. Mas é tudo ao contrário! Elas são péssimas e funcionam perfeitamente, obrigado. Mensaleiros, oportunistas, negocistas, corruptos e corruptores agradecem, de coração, o formato que demos ao modelo político em que eles se esbaldam. Não foi sem esforço organizacional que nos tornamos o 69º país mais corrupto do mundo, com nota 3,3 num máximo de 10, apenas um ponto e meio acima do pior da lista, e palco da maior bandalheira da história universal.

Sistemas políticos são como sementes. Postas na terra, germinam e brotam conforme o que foi plantado. Semeamos pimenteira e dela ninguém colherá morangos. O Brasil só começará a mudar se e quando compreendermos o quanto é vã a esperança de que um dia possamos obter frutos melhores desse modelo. O Brasil só mudará se e quando, de tanto “ver se agigantar o poder nas mãos dos maus” (como dizia Rui há quase um século), resolvermos promover uma correta reforma da ordem política.

Perdoe-me o leitor pelo desagradável resumo que farei de nossos males, mas ele é importante para compreensão do que escrevo. Tudo que se segue tem causa cultural, claro, e causa institucional que poderia ser evitada: a confusão entre coisas tão distintas entre si quanto Estado, Administração e Governo; a multiplicação dos cargos de confiança; o incessante aumento do Custo Brasil; a partidarização da Administração transformada em moeda de troca para manutenção da base parlamentar; o uso dos postos de mando como fonte de receita para as legendas; o fisiologismo; a infidelidade (dos partidos aos seus programas e dos políticos aos partidos); a escandalosa representação dos grupos de interesse no Congresso Nacional; a abusiva publicidade oficial; a decisiva importância da mentira e do populismo nos processos eleitorais; a partidarização dos tribunais superiores; os foros privilegiados; os labirintos recursais, as execuções penais misericordiosas. Arre! Tudo planta plantada produzindo os frutos que desaprovamos.

Reforma política tem que separar Estado, Governo e Administração e fazer com que a maioria parlamentar constitua o governo em vez de obrigar o governo a cooptar base de apoio. Precisa, também, adotar um sistema eleitoral que desestimule a representação política das corporações e grupos de interesse. Mas no Brasil, conforme ampla e longamente observado: está tudo errado, mas não mexe.

Percival Puggina

Natal triste num país alegre e que tem potencial incomparável

Os anos vão passando, as pessoas vão ganhando experiência, mesmo que não queiram, e podem dizer que jamais viram Natal como este. No Rio de Janeiro, uma das cidades mais ricas do país, as lojas praticamente vazias às vésperas do Natal indicavam que há alguma coisa de errado neste país, mas muito errado mesmo. No ano que se inicia, completarei 50 anos de jornalismo político e econômico. Sempre fui otimista com este país. Gostava de alardear que não interessa muito quem esteja à frente do governo, porque o país cresce à noite, quando os políticos estão dormindo. Esta divertida tese já teve seu valor, mas acaba de ser desmentida pelos fatos.

Eu costumava dizer que um país que é o quinto do mundo em território e população, com as mais extensas áreas agricultáveis do planeta, amplas possibilidades de irrigação, pois detém a maior reserva de água doce no solo e no subsolo, em condições ideais de luminosidade, que propiciam várias safras anuais, e tem riquezas minerais incomensuráveis e uma indústria sofisticada, que fabrica computadores e aviões de última geração, com todos os habitantes falando a mesma língua e sem problemas de separatismo, possuindo as maiores reservas florestais nativas do mundo, que nos possibilitam um potencial de biodiversidade sem comparação com qualquer outro país, por tudo isso eu apregoava que o Brasil é uma nação altamente viável.


No meu fraco modo de pensar, julgava que o grande problema era a inflação. Quando ela fosse contida e os brasileiros pudessem comprar bens duráveis em 10 vezes sem juros, no cartão de crédito, este país teria uma explosão de crescimento sustentável que nos transformaria numa potência mundial, chegando ao quinto lugar no ranking do PIB mundial, que deveria se nossa meta, já que temos a quinta população, o quinto território e o quinto maior mercado interno,.

Hoje, neste Natal triste para o país, faço uma reflexão para dizer que estava errado. Não poderia supor que um governo (qualquer governo) fosse capaz de impedir o desenvolvimento socioeconômico desta nação. E jamais esperaria que isso acontecesse num governo pretensamente popular, comandando por um partido que se diz dos trabalhadores e é liderado hoje por uma ex-guerrilheira que pegou em armas contra a ditadura militar.

É um pesadelo, um sonho ruim, nem parece realidade. Mas o fato é que Lula, o PT e Dilma Rousseff fizeram muito mal a este país. Não entenderam como funciona o jogo democrático e julgaram que a estratégia de aparelhar a máquina administrativa em proporção máxima seria capaz de manter o PT eternamente no Planalto.

Para manter a hegemonia do partido, se submeteram a tudo, inclusive à montagem do maior esquema de corrupção do universo. Assim conseguiram dominar Executivo e Legislativo. Só faltava o Judiciário, mas eles acabaram chegando lá.

Fazendo um retrospecto dos últimos 13 anos, vemos que não foi difícil aparelhar também o Judiciário, porque há juristas (juristas mesmo, de alta capacidade intelectual) que mostram serem altamente servis, fazem campanha e bajulam as autoridades do Executivo para serem nomeados aos tribunais superiores. Outros se mostram mais discretos, mas nos bastidores conseguem transformar as filhas em desembargadoras precoces, sem experiência nem notório saber, como foi o caso do ministro Marco Aurélio. E neste julgamento, seu genro era advogado da causa, deveria se declarar suspeito…

O que estava havendo no Supremo, no Tribunal Superior Eleitoral e em outras cortes é a desmoralização da Justiça. No julgamento do rito do impeachment, os ministros arrancaram as máscaras e mostram sua subserviência ao Planalto. Luís Roberto Barroso fez um voto sujo e ardiloso, aproveitou-se da inexperiência de Edson Fachin e Teori Zavascki. Outros ministros e ministras acompanharam Barroso, rasgaram o Regimento da Câmara, fazendo mudanças, embora não conseguissem apontar uma só ilegalidade em suas normas, que têm força de lei.

Com isso, rasgaram também a Constituição, que limita o Supremo ao julgamento de questões constitucionais. Extrapolaram em seu direito de “interpretar”, mancharam as togas com a seiva do servilismo, emitiram votos deploráveis e injustificáveis em abandono da lei que prometeram e juraram honrar.

Agora, é o Congresso que se prepara para rasgar a Lei de Responsabilidade Fiscal. O relator da Comissão Mista de Orçamento, senador Acir Gurgacz (PDT-RO), um dos maiores empresários de seu Estado e que ostenta um currículo que se confunde com folha corrida, apresentou seu parecer nesta terça-feira pedindo a aprovação das contas de 2014 da presidente Dilma Rousseff. Seu argumento é de que 14 governadores também não cumpriram a meta fiscal em 2014 e é preciso mudar a lei, sem punir quem a infringe, vejam como esses políticos são criativos.

Se as contas de Dilma foram aprovadas, derrogando a Lei de Responsabilidade Fiscal, poderemos constatar que o país está todo dominado e é melhor mudarmos para o Paraguai.

Mas o Congresso não pode nem deve aceitar essa desmoralização da lei e da ordem. ilma Vana Rousseff Linhares não é melhor nem pior do que cada um de nós. Precisa ser julgada na forma da lei, antes que arruíne este país para sempre. Em 2014, só tivemos desempenho melhor do que a Ucrânia, que está em guerra civil há anos. Todas as outras nações tiveram crescimento econômico melhor do que o Brasil, o que dá margem a reflexões neste Natal triste, comemorado num país alegre e que tem potencial incomparável, mas se encontra sob um governo altamente irresponsável, que está quebrando o país.

Os presentes de Papai Noel

Neste Natal, Papai Noel resolveu vingar-se. Na noite de hoje não trará os presentes rotineiros. Vai tirar o trenó da garage com sorrisos de vingança. Decidiu que como as coisas andam tão mal por aqui, distribuirá apenas fantasias para seus clientes, de forma a que se iludam imaginando-se os próprios personagens durante o próximo ano. Nada de contratos superfaturados com empreiteiras, muito menos obras públicas inexistentes. Sequer pixulecos para dirigentes de empresas estatais ou automóveis de luxo para ministros e senadores.

Sendo assim, Eduardo Cunha, presidente da Câmara, receberá a fantasia do Hood Robin, antagonista do Robin Hood, aquele que em vez de tirar dos ricos para dar aos pobres, faz exatamente o contrário.

Para Michel Temer, vai a pele do Lobo Mau, para explicar porque olhos tão grandes e boca ainda maior. Nem é preciso dizer que o vestidinho da Chapéuzinho Vermelho cairá na janela principal do palácio da Alvorada. A cestinha de guloseimas, porem, estará vazia.O chapéu da vovózinha, sem esquecer o bolso para presas e garras afiadas, irá para a deputada Jandira Feghali. A camisola da Bela Adormecida, para a senadora Martha Suplicy, e o cavalo do Príncipe Encantado, para o ministro Jacques Wagner.

Na porta do Instituto Lula cairá a farda do Ali Babá, junto com máscaras para os seus quarenta companheiros, ao tempo em que o presidente do Senado, Renan Calheiros, ficará feliz com as sete cabeças da Hidra de Lerna.

Fernando Henrique Cardoso agradecerá a armadura do Rei Arthur e Aécio Neves, a espada do Príncipe Valente, mas José Serra reclamará do camisolão do Mago Merlin, perseguido pelo governador Geraldo Alckmin, montado num corcel negro.

O governador Pezão será brindado com a roupa do Zorro, amigo do Tonto, e o prefeito Eduardo Paes, com a do Tonto, amigo do Zorro.

O ex-ministro Eliseu Padilha festejará o Natal com nariz e as orelhas do Pinóquio, e o senador Delcídio do Amaral, da máscara da Raposa Esperta. Na entrada da Câmara, 513 calções e bonés com direito a ingresso na Ilha dos Prazeres, sem esquecer os rabos de burro. Na porta do Senado, 81 coroas de Ramsés II.

Em cada palácio dos governadores dos Estados, pernas de pau e papagaios para ornamentar 27 irmãos de Long John Silver.

Para encerrar a relação de hoje, porque amanhã vai ter mais, todas as sedes do PT receberão montes de fantasias do Pateta, do Pluto, do Mickey, da Minnie e do Pato Donald. Em volta deles, as máscaras dos Irmãos Metralha.

Papai Noel vai ficar pouco tempo no céu, pois a distribuição de presentes será rápida. Junto a todos os pacotes e embrulhos virá um bilhete assinado pelo Bom Velhinho como uma espécie de alerta: “O Tiririca está errado! Vai ficar muito pior...”

Natal

Nasce mais uma vez,

Menino Deus!
Não faltes, que me faltas
Neste inverno gelado.
Nasce nu e sagrado
No meu poema,
Se não tens um presépio
Mais agasalhado.
Nasce e fica comigo
Secretamente,
Até que eu, infiel, te denuncie
Aos Herodes do mundo.
Até que eu, incapaz
De me calar,
Devasse os versos e destrua a paz
Que agora sinto, só de te sonhar.
Miguel Torga 

Natal Tropical

E eis que, num país muito longe da gelada Lapônia, Mamãe Noela assume o comando do Natal Tropical. Seu trenó voador, puxado por renans que ela sabe direitinho como domesticar, é extremamente seguro: entre um Natal e outro, os renans se mantêm treinados, voando para ir a casamentos de amigos, para visitar as bases, para transplante de pelos há muito perdidos. O peso do trenó é baixo: em vez de carga, transporta cargos, levíssimos papéis com nomeações, indicações, autorizações high-tech para fazer boas transações ─ documentos que, cumprida sua função de autorizar o negócio, se autodestroem em segundos. Pixuleco é coisa feia, fora do espírito de Natal, não deve e não pode deixar nem vestígios.


Confiabilíssimo, o trenó de Mamãe Noela. Pois precisa voar diuturnamente e noturnamente, enfrentando perigosos ventos estocados. Tem de ir da linha do Equador até a Terra do Fogo, no Extremo Sul da América. É lá que vive o líder de Mamãe Noela, o Grande Apreciador de Uma Boa Ideia e Supremo Cumpanhêro, um senhor gorducho de barbas brancas, sempre vestido de vermelho. Tem de ser lá, o encontro: o Supremo Cumpanhêro odeia sair da Terra do Fogo. Em outros tempos, até gostava de receber homenagens em países ricos e visitar a África com amigos de se guardar no bolso esquerdo do peito, mas sabe como é o Exterior, a história do Marin é preocupante. E na Terra do Fogo ele é o Brahma, o Número 1, Aquele que Iniciou Todas as Coisas, Pois Antes Dele Nada Existia.

Natal Tropical. Na ceia, por culpa da zelite, em vez peru só se come arroz.

Trenó em risco

O problema de Mamãe Noela está na oscilação de humor de quem cuida de sua segurança. Renans como os que puxam seu trenó voador têm variações súbitas de personalidade, conforme ações de terceiros sejam mais ou menos generosas. Precisam ser comandados por quem tenha personalidade, poder e perspectivas de futuro; ou se aborrecem rapidamente.

Fora isso, há quem queira alvejá-los atirando-lhes inquéritos e acusações. Se não forem protegidos, proteger não irão.

Mal-traçadas

Ah, sim: nunca mande seus pedidos a Mamãe Noela por carta. Uma que recebeu há pouco tempo a deixou traumatizada. Temer cartas é sua superstição.

Mas os pedidos podem ser bem encaminhados por quem conheça o duende certo.

O custo de Dilma

A Folha pediu à economista Zeida Latif, da XP Investimentos, que calculasse em dinheiro quanto o Brasil perdeu em 2015, por causa da recessão: R$ 240 bilhões, sem contabilizar a corrupção.
"São bens agrícolas e industriais que deixaram de ser produzidos e serviços que não foram prestados. Ou seja, uma grande quantidade de carros, máquinas, calçados, roupas etc. não foi feita, e muitas consultas médicas, idas ao salão de beleza e trocas bancárias não ocorreram".

Impeachment como manda a lei

Pelo bem de todos e felicidade temporária da Nação, seria desejável que os festejos do fim de ano servissem, quando nada, para arrefecer as paixões políticas desatadas pelo rol de mentiras que ajudou a presidente Dilma Rousseff a se reeleger, e também por seu desastrado primeiro ano do segundo governo. O ano de 2015 não deixará saudades. Deixará raiva.

Uma vez que cessem os festejos, arraste-se janeiro preguiçosamente e passe o carnaval que ninguém é de ferro, as paixões serão reaquecidas, e então que seja o que Deus quiser. Somos assim, afinal. E descobrimos, embora com atraso, que a política deve também ser o pão nosso de cada dia, e não só daqueles que a desfrutam e enriquecem às suas custas.

De cabeça mais fria (se beber não dirija!), talvez seja possível reconhecer que o Supremo Tribunal Federal (STF) não foi além dos seus chinelos quando decidiu na semana passada sobre o rito do impeachment do presidente da República, chame-se ele Dilma ou Tiririca. Havia um rito desenhado por Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados.

O STF desautorizou o rito. Preferiu resgatar pura e simplesmente o rito que valeu para o julgamento do pedido de impeachment do ex-presidente Fernando Collor, derrubado pelo Congresso em 1992. Poderia ter modificado o rito testado no único caso de impeachment de um presidente até aqui? Poderia, sim senhor. O STF tem esse poder.

Não só porque cabe a ele interpretar a Constituição, como também porque a Constituição prevê que o Congresso votará uma lei especial para regular o impeachment. Só que o Congresso nunca o fez. O STF evitou a tentação de legislar pelo Congresso. Preferiu fortalecer o rito existente, sem acrescentar nem tirar nada. Foi prudente. E sábio.

A Comissão Especial da Câmara que aprovou o impeachment de Collor foi formada por deputados escolhidos por meio do voto aberto, e assim será novamente. O impeachment de Collor só foi aprovado no plenário da Câmara porque dois terços dos deputados votaram favoravelmente – e assim será desta vez.

Se a Câmara aprovar o impeachment de Dilma, o Senado terá de decidir por maioria simples (metade mais um dos presentes à sessão) se concorda em julgar a presidente. Só então ela se afastará do cargo por três meses para preparar sua defesa. Foi assim no caso Collor. Por fim, para cassar o mandato dela, serão necessários os votos de dois terços dos senadores.

Os ministros Edson Fachin e Marco Aurélio de Mello chegaram a propor que o Senado só admitisse a hipótese de julgar a presidente se dois terços dos senadores concordassem de fato em julgá-la. Do contrário, ela sequer se afastaria do cargo e o pedido de impeachment morreria ali. Os outros ministros discordaram. E o rito permaneceu o mesmo.

Então por que tanto barulho em torno da decisão do STF? Porque Collor caiu rapidinho, e Dilma está demorando a cair, se é que cairá. E porque a queda de Collor não despertou tantas paixões. Havia uma acusação clara contra ele – roubou e deixou que roubassem. Dilma corre o risco de perder o mandato porque deu “pedaladas fiscais”.

Por “pedaladas fiscais”, entenda-se: desrespeitou a Lei de Responsabilidade Fiscal que proíbe um governante de gastar além do que pode, e de fazer despesas sem autorização do Congresso. Isso é crime de responsabilidade, capaz de custar o mandato de um presidente? É, sim. Foi cometido por presidentes que antecederam Dilma, e governadores.

Deve, por isso, ser esquecido, deixando-se Dilma em paz para que ela governe até o fim? Não acho que deve. Crime é crime. E não pode ser tolerado só porque o foi até hoje. Mas a resposta a essa pergunta será dada pelo Congresso possivelmente em março. Primeiro pela Câmara, depois pelo Senado. É o que manda a lei. Cumpra-se.

Quem não gostar da resposta do Congresso que vote em 2018 para preenchê-lo com políticos que representem melhor o seu pensamento. É assim que se faz em um país democrático.