A despeito do esforço de alguns ministros em favor do ex-presidente – um deles, Marco Aurélio Mello, chegou a ser grosseiro com a presidente do Supremo, Cármen Lúcia, e com a ministra Rosa Weber quando percebeu para onde se encaminhava a votação –, a Corte não permitiu que se consumasse um casuísmo: a mudança de jurisprudência em relação à possibilidade de prisão após condenação em segunda instância tendo por base um pedido que não poderia ir além da pessoa do condenado Luiz Inácio. E, assim, o Supremo interrompeu uma série de despautérios. Não se curvou a Lula e preservou um mínimo de respeito pelas decisões tomadas no âmbito dos tribunais inferiores.
Era nisso que apostava o sr. Lula da Silva. O chefão petista tentou transformar seu processo em questão política, pois, no estrito âmbito judicial, não cabia mais nenhuma dúvida sobre sua culpa. O ex-presidente foi condenado em 12 de julho de 2017 pelo juiz federal Sérgio Moro a nove anos e seis meses de prisão, pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Posteriormente, em 24 de janeiro deste ano, ao analisar recurso da defesa, os três desembargadores da 8.ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4) não apenas confirmaram por unanimidade a condenação, como ainda ampliaram a pena para 12 anos e um mês de prisão. Em seguida, em 6 de março, os cinco ministros da 5.ª Turma do Superior Tribunal de Justiça rejeitaram pedido de habeas corpus preventivo impetrado pela defesa de Lula. A decisão teve como base a jurisprudência firmada pelo STF a respeito da possibilidade de prisão após condenação em segunda instância. Por fim, em 26 de março, os três desembargadores da 8.ª Turma do TRF-4 rejeitaram o derradeiro recurso dos advogados de Lula. Ou seja, em todo esse percurso, no qual todos os ritos processuais foram rigorosamente respeitados, em que o réu teve amplamente assegurada sua defesa, Lula não teve um único voto a seu favor. Portanto, não é possível, no terreno do direito, falar em presunção de inocência ou de cerceamento ao amplo direito de defesa.
É por esse motivo que Lula passou todo o processo a se dizer “perseguido político”, como se a incontestável unanimidade de sua condenação só pudesse ser explicada por uma colossal conspiração das “elites”, sempre indispostas com a dedicação desse grande brasileiro aos pobres e desvalidos do País, segundo a mitologia lulopetista.
Lula, corretamente, nunca acreditou que pudesse engabelar os juízes das instâncias inferiores, que julgaram seu caso exclusivamente conforme as provas. Ao politizar a questão, imaginava que pudesse contar, no Supremo, com os votos que lhe faltaram nos outros tribunais, pois aquela Corte vinha adotando estranhas decisões, algumas contra legem, outras de mera invasão de prerrogativas alheias.
O que se viu na sessão de ontem, contudo, foi a prevalência do respeito do Supremo à sua própria jurisprudência. Considerando-se a confusão institucional em que o País está metido, só isso já deve ser considerado um grande avanço.