segunda-feira, 9 de novembro de 2015

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O que impede o Brasil de se modernizar de vez?

Com certeza o Brasil está retrocedendo em conquistas sociais e na defesa de alguns direitos humanos, o que indica que lhe pesa entrar no fluxo da modernidade das democracias mais avançadas. E isso apesar de o país estar em seu quarto governo progressista, presidido por um partido de esquerda, o PT, fundado pelo sindicalista Luís Inácio da Silva.

É grave para o Brasil que países irmãos deste continente o estejam ultrapassando no avanço para a modernidade, em questões de costumes e da defesa das liberdades civis.

Não é fácil a explicação para esta paralisia brasileira que impede que sua sociedade tome o caminho rumo à modernidade. Não é que faltem ao país movimentos, até de vanguarda, fortemente críticos aos poderes políticos retrógrados.

Há quem acuse os brasileiros, como sociedade, de ser mais conservadores que o Congresso, por exemplo, que hoje é um centro de resistência contra a modernidade. Os legisladores seriam apenas o espelho opaco e reacionário da sociedade.

Isso é verdade? Sem dúvida, o Legislativo e o próprio Governo não são um espigão que cutuque a sociedade e a sacuda de seu conservadorismo em termos de abertura nos costumes e nas liberdades, que hoje exigem, em especial, os jovens que vão à universidade, que leem e viajam.

E no país todo, a força da Igreja Católica, à qual pertence quase 65% da sociedade, e das igrejas evangélicas, mais alérgicas do que ela à mudança dos costumes, não contribui para apoiar a abertura da parte mais aberta e laica da sociedade, que deveria ser o fermento da conquista da modernidade.

Claro que há um elemento que talvez esteja por trás não só dessa dificuldade do país em avançar na defesa das conquistas sociais, mas também nesse retrocesso. Como sempre, o grande obstáculo é a maldita política das alianças para governar, baseadas numa espécie de compra e venda de apoios dos partidos para poder governar em paz.

Desde que, por exemplo, o PT de Lula, primeiro, e o de Dilma, depois, conquistaram o poder, já antes de chegar à Presidência da República tiveram que fazer acordos, e até firmar documentos de compromisso, para poder se eleger, com as forças mais reacionárias das igrejas – por exemplo, em relação à legislação sobre o aborto.

O ex-presidente Lula, que é agnóstico, confidenciou em entrevista a este jornal que não teria sido eleito “sem os votos dos católicos”, e Dilma teve que se comprometer, formalmente, durante reunião com várias confissões religiosas, a não legislar na questão de aborto, caso eleita.

Em outros países democráticos costuma acontecer o contrário: os Governos e os Parlamentos são, muitas vezes, mais abertos e progressistas que a massa conservadora da sociedade. Tornam-se, assim, um motor da mudança, e ao legislar se colocam ao lado da parte mais aberta e moderna da sociedade, e não o oposto.

Exemplo clássico é o da pena de morte. Sabe-se que, se depender, por exemplo, de um plebiscito nacional, em muitos países democráticos o voto seria a favor de sua adoção. Se tal lei não passa é porque, nesses casos, Governos e Congressos são mais abertos que sua sociedade.

O Brasil tem, hoje, a má sorte de contar com um Legislativo que é mais realista que o rei em matéria de conquistas sociais e de defesa dos direitos humanos. E seus presidentes da República, apesar da filiação a um partido progressista como o PT, estão algemados, ou se algemam, por interesse eleitoral, ao que exige um Legislativo dominado por forças retrógradas.

É um Congresso dominado por grupos de pressão que têm interesse na venda de armas, na defesa dos latifundiários, na rejeição, às vezes visceral, aos diferentes, assim como pouco adeptos à causa ambientalista, condicionado, simultaneamente, pelo conservadorismo medieval das forças religiosas.

Demência institucional

Se você procurar no YouTube por "Lula confessa estelionato eleitoral", vai encontrar um vídeo de pouco mais de um minuto no qual o ex-presidente afirma: "Nós tivemos um problema político sério, que nós ganhamos as eleições, sabe, com um discurso e, depois das eleições, nós tivemos, sabe, que mudar o nosso discurso e fazer aquilo que a gente dizia que não ia fazer...". Essa irretratável confissão foi proferida ao Diretório Nacional do PT, no último dia 30. Depois de haver mentido à beça, brincado de Alice no Brasil das maravilhas, raspado os cofres para sustentar farsas e feito o país regredir para indicadores de 2003 num mundo cuja economia crescerá 3% neste ano, o governo entrou em síndrome de autocomiseração. De culpado a vítima. Em deprê, só falta chorar pelos cantos.


Longe de mim apresentar o parlamentarismo como solução para a crise em curso. A razão, a racionalidade, não podem entrar pela saída de emergência para resolver crises de uma irracionalidade reiteradamente convidada pela porta dianteira. Resolvam, as instituições, essa tempestade de desgraças produzidas por um governo que tudo fez para ativá-la. Mas resolvam! Decidam até mesmo não decidir coisa alguma. Mas decidam!

Depois, por favor, desliguem os aparelhos que mantêm vivo esse modelo político moribundo e ficha suja. Ele vai na contramão de tudo que a mínima e a máxima racionalidade, em comum acordo, devem almejar. A quem serve colocar sob comando de uma só pessoa e seu partido o Estado, o governo e a administração pública? Governos partidários são normais nas democracias, mas - por favor! - partidarização do Estado? Da máquina burocrática? Graças a esse sistema ruinoso, quem comanda a política externa brasileira é a Secretaria de Relações Internacionais do PT. Faz sentido? Graças à partidarização do estamento burocrático, pela inserção de dezenas de milhares de militantes em cargos de confiança, funcionários transitórios podem inutilizar deliberações do Congresso Nacional. Podem colocar todo o material didático produzido para as escolas do país à serviço da ideologia do partido governante. Podem regulamentar para tornar má uma lei boa. Podem torcer informações, lubrificar as correias para pedaladas e podem se prestar para fins ainda mais escusos.

Quando cessar a tempestade, aconteça o que acontecer, tratemos de saber por que 95% das democracias estáveis separam Estado de governo e de administração, e têm mecanismos institucionais para substituição não traumática de maus governos. Reflitamos sobre o que o presidencialismo faz nesta pobre e autofágica América Ibérica, recordista da demência institucional.

Brincando com fogo

Já não é preciso dizer que o momento é delicado, que a crise vai engolindo tudo, a política, a economia, a segurança, que a corrupção vai mostrando seu alcance e sua força, que a coesão social está ameaçada.

Também não é mais preciso dizer que a vida institucional do país é uma geleia amorfa, que ninguém está certo de que os bons costumes prevalecerão sobre o interesse egoísta e ilegal.


O problema está em que o comportamento gelatinoso, que era subterrâneo e impessoal, passou a ocupar um espaço cada vez maior no comportamento ostensivo dos integrantes da classe política e dos segmentos mais ricos da classe empresarial. A geleia aflorou e provoca um efeito perverso sobre os que tentam entender, ou decifrar, o rumo das coisas. Hoje é muito difícil prever que atitude preferirão tomar os praticantes da política em todos os níveis – federal, estadual e municipal. Será que a maioria tomará o rumo da honestidade? Ou o rumo oposto?

O Presidente da Câmara, insofismavelmente apontado como detentor de contas não declaradas no exterior, conservará o seu mandato legislativo? Que rumo tomarão os que por conveniência o apoiavam e agora dizem que já não o apoiarão porque ele fez acordo com o partido rival? Que lugar têm a honradez, a ética e a correção nesse raciocínio? Que rumo tomarão os que foram escolhidos para relatar processos importantes e os juízes que ficaram a cargo dos casos de corrupção que não pertencem estritamente á órbita da Operação Lava-Jato?

Por favor, nós, os que ainda somos honestos, desejamos que se restaure um mínimo de decência no jogo político. Que se volte a pensar no interesse público, no bem comum, no futuro do nosso país.

O Brasil neste momento está brincando com fogo. O povo já não tem confiança nem respeito pelos políticos em geral – com poucas exceções (bons tempos aqueles em que os picaretas eram apenas 300) –; pela polícia, que, tal como nos Estados Unidos, especializa-se em matar jovens negros desarmados; pelos que há décadas fracassam em resolver os problemas da saúde e da educação; pelos Ministros dos quais já não se sabe o nome; pelos congressistas; pelo lobistas; pelos que marcam os preços das mercadorias e dos serviços. Que acontecerá se e quando ele perder o respeito pela Justiça e pela Lei?

Cenário para 2016

O déficit público é a mais perfeita armadilha para caçar raposas. Este animal é tido por ser muito esperto e atilado e cheio de manhas e artimanhas para alcançar seus objetivos. Não trabalha em linha reta e é imprevisível, quando menos se espera dá o bote. Por isso os espertos da política são apelidados de “raposas”, expressão que é mesmo elogiosa vista do ponto de vista da finalidade da política, mas não da ética. Em geral, os “raposas” são seres sem escrúpulos.

A esperteza da raposa, todavia, é relativa, visto que ela cai frequentemente em armadilhas. As armadilhas para pegar raposas são as que contam com a sua esperteza, pois ela entra no buraco sem saída para pegar a isca sem ao menos se dar conta e se torna vítima fatal dos caçadores. Sempre foi assim. As raposas do PT acharam que poderia dar um “pelé” na lei da escassez e fabricar uma prosperidade artificial praticando déficits. Durou o período pré-eleitoral, quando ninguém ainda tinha se dado conta da esperteza posta em prática. Ao se revelar a verdade, o que se viu foi a raposice inteira presa à armadilha. O déficit público é a corda que está enforcando os espertalhões que praticaram o estelionato eleitoral.

As leis econômicas são conhecidas até mesmo pelos economistas desenvolvimentistas, que insistem na esperteza de desconsidera-las. A raposice do PT morrerá vítima de dois tiros fatais: a disparada da inflação e a depreciação do câmbio. Esse momento que vivemos de escalada da inflação é particularmente doloroso, já temos duas gerações que se habituaram a taxas de inflação civilizadas. Os jovens não sabem o que é o desconforto de ter que gastar todo o dinheiro antes, para que ele não se deprecie. Melhor dizendo, para escapar à depreciação. A inflação empobrece violentamente os mais pobres, pois é altamente regressiva do ponto de vista da distribuição de renda. Na prática, a inflação é um imposto sobre os mais pobres, pois os mais ricos, e quanto mais rico isso é verdadeiro, têm como se proteger da moléstia.

Parcialmente, é verdade, pois nessa fase de aceleração normalmente verifica-se queda do PIB (está acontecendo agora), desorganizando os mercados e retraindo a demanda. Aqueles que têm atividade econômica, mesmo de grande porte, sofrem, perdem. Com a desordem que se instalou em 2015, quantos alugueres deixaram de ser pagos? Quantas vendas foram assassinadas? Quantos empréstimos deixaram de ser liquidados? Quantas empresas fecharam as portas? Estou vendo aqui da ótica dos patrões, não a dos desempregados, que ficaram à mercê da sorte. O drama dos mais pobres é exponencialmente agravado pelo desemprego. É o afundar na miséria atroz.

Os oligopólios, que tentam dolarizar os preços dos seus produtos, estão vendo suas participações de mercado despencarem. As marcas mais baratas estão sendo as preferidas pelos consumidores. O down tranding é a dura realidade que se encontra no mercado, que está sofrendo perda de renda. É bastante divertido, mas tétrico, ver esse teatro em ação. Os que inicialmente se locupletaram com a expansão artificial do consumo agora estão sofrendo a ressaca e dela não há como escapar.

Um tipo de gente está acima da crise e mesmo lucra com ela. São os rentistas, os portadores de capital aplicados em títulos do governo. Este paga os maiores juros do mundo, que se tornaram a rubrica orçamentária mais expressiva. Parte considerável da arrecadação está destinada a manter esses juros nas alturas, regiamente pagos. Por isso mesmo banqueiros e rentistas pleiteiam a estabilidade da relação dívida/PIB e, para tanto, não hesitam em propor coisas absurdas como a volta da CPMF. Os rentistas querem resolver o problema do déficit público sem que se olhe o lado da despesa, pois assim não colocam o eleitorado conta si. Eles também são raposas à sua moda, eles também caem em armadilhas. Vamos ver quais tiros lhes estão destinados pelo agravamento da crise. O caso grego foi bastante emblemático.

Os rentistas, junto com os funcionários públicos, são a classe mais conservadora do Brasil, pois detestam mudanças que possam ameaçar suas rendas e seu status quo. É uma espécie de conservadorismo revolucionário, que não hesita em pregar a igualdade econômica e social e praticar as maiores iniquidades em sentido contrário. Junto com os rentistas, os funcionários públicos são os maiores usufrutuários do iníquo arranjo social brasileiro, muito bem espelhado na peça orçamentária anual. Basta ver o que se gasta com ambos.

E o que esperar de 2016? Mais do mesmo. Mais inflação, mais desemprego, mais desvalorização do câmbio. Não se deve acreditar nos cenários dos economistas oficialistas, que sempre veem o cenário do futuro imediato melhor do que o atual. Nenhuma economia pode sair da crise sozinha, ou só o pode mediante uma catástrofe social. Como Dilma Rousseff nada está fazendo para enfrentar a crise, o que veremos é seu agravamento. Para meu uso particular estou trabalhando com queda de PIB de 3%, inflação de 12% e câmbio médio a 4,50. Certo, é meu otimismo particular, mas fazer o que? A realidade poderá se revelar bem pior.

Quem viver verá.

Quase Nação

O passado nos pertence, mas não nos prende. Futuro é coisa maleável. É coleção de possibilidades e probabilidades onde tudo, ou quase tudo é possível. Nele, o passado pode repetir-se e reproduzir-se. Mas também pode ser melhor. Diferente. Mais justo.
Basta que, na sequência finita de coincidências que caracteriza a existência, exista o desejo e a energia para se criar uma nação. E isto se faz com sonhos. Não com frustrações.
Elton Simões

Monumentos à empáfia e ao faturamento


Além de monumentos à própria empáfia e vaidade, os institutos criados por ex-presidentes da República constituem-se em arapucas destinadas ao seu enriquecimento. Prestam-se a amealhar dinheiro para o personagem empenhado em permanecer na mídia como se estivesse no poder.

Tome-se o nebuloso Instituto Fernando Henrique Cardoso, funcionando em São Paulo em luxuosas acomodações comerciais, apresentadas como colaboração à história e à memória nacional. Acobertado pelo sigilo bancário, ignora-se o total verdadeiro dos gastos e despesas dessa entidade, assim como seus lucros. Uma ponta do tapete levantou-se recentemente pela denúncia de que, entre 2011 e 2012, apenas uma empreiteira doou 975 mil reais à entidade que leva o nome do sociólogo. E as outras? Teria sido em pagamento por palestras relativas ao seu passado governo? Ou por consultorias a respeito dos rumos da social-democracia? Quem sabe por opiniões sobre como gerir a economia nacional?

Sempre existirá a hipótese de remuneração por intermediação junto a obras contratadas por governos estrangeiros amigos, mas essa é característica muito maior do Instituto Lula, acasalado com a empresa responsável por agenciar palestras do primeiro companheiro.

Porque a empresa que leva o nome do antecessor e mentor da Dilma dá a impressão de funcionar na caverna do Ali Babá. De 2010 a 2014, conforme levantamento feito nas proximidades da Operação Lava Jato, entraram em seus cofres 27 milhões de reais. Pagamento por palestras internacionais sugerindo as excelências de se investir no Brasil? Ou retribuição a favores concedidos por governantes africanos e latino-americanos que contrataram obras a cargo de empreiteiras brasileiras, com financiamento do BNDES, certamente por influência do ex-presidente?

Em português claro, essas operações de tráfico de influência e de enriquecimento ilícito denominam-se corrupção e suborno, que em boa hora a Polícia Federal e o Ministério Público investigam. Por isso encontram-se na cadeia alguns barões das empreiteiras e acólitos do serviço público, com ramificações no Congresso e nos partidos políticos.

Não se tem notícia de que, de Getúlio Vargas aos generais-presidentes e até a Itamar Franco, existiram institutos destinados gerar rendas para ex-presidentes. Não devem ser levados em conta pequenos museus que guardam a correspondência e as imagens dos antigos titulares, aliás, sempre inaugurados depois da morte de cada um deles. Não germinou a experiência tentada por José Sarney, ao adquirir o Convento das Mercês, em São Luís, como seu futuro mausoléu. Deu prejuízo, teve de ser vendido.

Foi com Fernando Henrique e Lula que surgiram essas empresas comerciais lideradas por eles, não apenas para inflar-lhes o ego, mas para ampliar suas contas bancárias. Tomara que Madame não esteja pensando nisso…

O Brasil e os 7x1

João Saldanha costumava dizer que o futebol é um reflexo da sociedade. Sendo assim, vamos analisar a assombração dos 7 x 1.

Segundo estudo da consultoria Tendências, dos 3,3 milhões de famílias que ascenderam à classe C entre 2006 e 2012, 3,1 milhões retrocederão durante os anos de crise. A política social fundada quase exclusivamente sobre transferências de renda, algo muito estranho em um governo com pretensões a ser de esquerda, pouco transformou na desigual e hierárquica sociedade brasileira. 1 x 0.

Desde 1991, as despesas dos governos crescem mais do que o PIB. Quando foi proposta a sugestão que José havia interpretado no sonho do faraó, no Antigo Testamento, ou seja, economizar nos períodos de vacas gordas para o período de vacas magras, a atual titular da Presidência da República matou a proposta, tachando-a de rudimentar. 2 x 0.

Com a grande recessão de 2008 ainda em curso, o governo reagiu, com intenções inegavelmente eleitorais, como se ainda vivêssemos na Crise de 1929, 86 anos atrás, com políticas “keynesianas” extremamente equivocadas sob dois aspectos: primeiro, focadas no consumo.
Segundo, desconsiderando que, diferentemente da década de 30 do século passado, a economia global não se desintegrou, de modo que qualquer tentativa nacional de escapar à disciplina fiscal dos mercados mundiais seria sempre penalizada para não abrir um precedente perigoso. Tivemos uma tragédia grega contemporânea para deixar esse ponto bem claro. 3 x 0.

O Brasil, que já foi admirado por sua política externa profissional, se envolveu em transações estranhas com ditadores mundo afora, isolou-se das principais negociações comerciais globais e, negando sua vocação de diversidade e pluralidade, acovardou-se frente às questões relativas aos direitos humanos. Submeteu a política externa ao personalismo do presidente Lula e paga hoje um preço elevado em reputação e posição comercial por isso. 4 x 0.

Meritocracia, aumento de produtividade, competitividade, redução do custo Brasil viraram “neoliberalismo”. Consequências: um mexicano vale por dois brasileiros em produtividade e o país se desindustrializou severamente. 5 x 0.

Em um mundo cuja agenda de médio prazo é definida pela transição para economias de baixo carbono, o Brasil, embora excepcionalmente posicionado para maximizar fontes renováveis de energia, deixou-se embriagar pelo pré sal. 6 x 0.

O presidencialismo de coalizão tornou-se de cooptação e, na crise, ficou disfuncional. Com a péssima “aula” dada pelos políticos no palco, os padrões éticos da sociedade decaíram. A permanência do atual presidente da Câmara no cargo, mesmo sem culpabilidade provada, é uma demonstração do fato. 7 x 0.

As instituições ainda funcionam. 7 x 1. Se bem que dizem que, se sacudirem os cabelos do David Luiz ou da Lava-Jato, tem mais gol contra nós escondido. 

Pastagem nas nuvens

Cavalos vivem a maior parte do ano nas águas rasas das zonas úmidas do parque
Durante 20 anos o fotógrafo espanhol Héctor Garrido registrou o Parque de Doñana no sul da Espanha em tomadas aéreas. O trabalho agora é exposto no Palácio de Moncloa, em Madri. 

A cultura do crime

O que há em comum entre a campanha racista, via rede social, contra Taís Araújo e o trabalho escravo no país, denunciado por Wagner Moura? E entre a violência que chega ao canibalismo em presídios brasileiros e o projeto de nossos deputados para dificultar e impedir o aborto das mulheres? Ou entre as mortes de PMs e crianças nas favelas, vítimas de tiros vindos dos dois lados, e a trapalhada aparentemente inocente do Simples Doméstico? E assim por diante.

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Não é só a necessidade que gera o crime. O Brasil e o Rio de Janeiro já foram muito mais pobres do que são agora, e nossas taxas de violência sempre foram relativamente humanas. Nem sempre o motivo do assaltante é a fome. Se fosse assim, a incidência de crimes seria dominante em outras áreas, longe das cidades afluentes do Sul e do Sudeste. Não sei se esta é a mesma reação das novas gerações, mas eu, que conheci de perto um pouco desse passado, tenho a nítida impressão de que o Brasil, em termos de convivência humana, muda de cara. Para muito pior.

O que comparamos no primeiro parágrafo deste texto são descasos, ilícitos, delitos, contravenções e crimes, malfeitos frutos de uma nova cultura que alimenta um comportamento sem generosidade, sem confiança no outro, sem projeto comum. Essa cultura é fundada num suposto direito individual de satisfazer o desejo sem restrições, produzindo prazer, lucro e poder às custas dos outros. Através dela, o capitalismo financeiro e consumista sequestra a nossa vontade atendendo a nossos desejos.

É impossível proibir o sentimento de um desejo por mais sórdido e repulsivo que ele seja, do estupro à pedofilia, passando por todas as formas imagináveis de violência. Os mistérios do inconsciente humano prevalecem, ninguém é conscientemente responsável por seu próprio desejo. A responsabilidade de cada um é pelo controle da prática do desejo segundo uma ética pessoal, o direito dos outros e princípios acordados em cada sociedade. A vontade consciente existe para impedir o desejo indesejável.

A criação do Estado é um momento importante na história da humanidade. Ele se responsabiliza pelo controle dos desejos criminosos, nem que para isso seja necessário usar a força da qual possui o monopólio. O Estado é o agente da sociedade em defesa da civilização. Quando ele perde o controle disso, quando seus representantes incentivam o mau comportamento pelos exemplos de violência que dão, o caos vence a justiça, a arma se torna mais poderosa que a fala, a civilização desfalece. Como deve agir o cidadão de um país onde, no Congresso Nacional, um grupo de eminentes parlamentares é conhecido e se reconhece como a “bancada da bala”?

Nossos homens públicos, em seus diferentes planos e poderes, estão viciados na cultura do pensamento mágico, criando argumentos e teses mirabolantes (às vezes simplesmente cínicas) que tentam justificar seus malfeitos provocados por desejos materiais. O deputado Luiz Sérgio, relator da CPI da Petrobras, jurou de mãos postas que nenhum homem público havia praticado qualquer ilícito contra a empresa estatal. E ainda aproveitou para atacar a colaboração premiada, a mais civilizada atenuação de pena para quem cometeu um crime. O deputado põe o pensamento mágico a seu serviço e, de tanto repeti-lo aos outros, acaba convencendo-se do que diz e vai dormir em paz. O juiz Sérgio Moro e seus companheiros são uns inventores de moda.

É esse pensamento mágico a serviço do crime que, em diversas dimensões (ele existe à direita e à esquerda), nos ajuda a esclarecer o que Kenneth Maxwell, brasilianista inglês, afirma sobre nós: a elite brasileira se comporta como se nada se passou e tudo é passado. Ou seja, a elite brasileira se nega a pensar que é culpada de alguma coisa, ela não se dá conta do real porque é incapaz de pensar no outro. Se tudo é passado, não há nada a fazer no presente.

Cacá Diegues 

Trabalhar pela democracia

A maioria das pessoas acredita que a democracia é a melhor forma de se escolher um governante. A maioria está errada, posto que alguns facínoras, como Hitler, foram eleitos democraticamente. A democracia não se justifica como um processo de escolha, mas sim como uma forma pacífica de se promover alternâncias no poder.

Como observou o filósofo Karl Popper, onde não há democracia os maus governantes ficam no trono até serem afastados de forma violenta, a um enorme custo social. Assim, a democracia é fundamental.

Além disso, a democracia incorpora a metodologia da ciência à atividade política. Nos países com partidos de ideologias claras, a população pode avaliar os resultados práticos das políticas públicas e votar ou não pela permanência desta ou daquela ideologia no poder. A repetição desse processo tende a selecionar a forma de governo mais adequada para determinada sociedade.

Em suma, a democracia confere vantagens competitivas significativas para quem sabe aplicá-la, e não é à toa que as sociedades mais desenvolvidas têm aparatos legais destinados a preservar seu bom funcionamento. Monopólios, oligopólios e leis inadequadas para o financiamento de campanhas desvirtuam o processo democrático. Concentração de mídia e riqueza promove distorções nas campanhas eleitorais.

A corrupção é especialmente danosa. Nos países em que grupos políticos hegemônicos a praticam de forma sistêmica, cria-se um círculo vicioso. O sucesso eleitoral garante o vilipêndio dos recursos públicos e o vilipêndio dos recursos públicos garante o sucesso eleitoral.

Nesses países ocorrem dois fenômenos. Em primeiro lugar, há pouca alternância de poder. Em segundo, as alternâncias acontecem depois de crises econômicas agudas, quando o estrago da corrupção chega a tal ponto que nem as vantagens conferidas por ela garantem mais as próximas eleições.

O custo social e institucional desse processo é elevado. Político que rouba para financiar campanha comete crime ainda mais grave do que o político que embolsa "pixuleco". Fraude à democracia não é atenuante, é agravante.

Existem ainda formas indiretas de fraudar a democracia. Um governante que frauda a Lei de Responsabilidade Fiscal de um país, seja pela emissão descontrolada de moeda ou por artifícios contábeis, para ganhar eleições imputa o custo de sua campanha a toda a população.

Além de viciar o processo eleitoral e de gerar crises econômicas agudas, a impede que a democracia promova a correta avaliação das políticas públicas.

Por exemplo: ao votar no PT, os brasileiros escolheram manter a estatização da exploração do petróleo. Hoje, apesar de monopolista, a Petrobras tem uma dívida de R$ 500 bilhões e suas ações se desvalorizaram incrivelmente. Isso significa que o petróleo não pode ser estatizado? Não necessariamente, posto que o PT promoveu um tal nível de corrupção na Petrobras que é difícil separar os efeitos da estatização dos efeitos negativos da corrupção.

Quando uma democracia se torna extremamente corrupta, como aconteceu no Brasil, o melhor que os agentes sociais podem fazer é colocar suas divergências ideológicas temporariamente de lado e unir forças para punir exemplarmente quem corrompeu o país e o processo eleitoral.

Defender políticos sabidamente corruptos por questões ideológicas, – ou para não dar o braço a torcer – é trabalhar contra a democracia. Aqueles que não têm a grandeza de espírito para colocar a lisura do jogo democrático à frente das preferências ideológicas lutam pela escravidão pensando estar lutando pela liberdade.

José Padilha

Os filhos do futuro


Como serão os seres humanos do século 21 ? Nas maternidades globalizadas de hoje, não há ultra-som ou pesquisa que nos ofereça resposta exata. Apesar disso, podemos concluir que os filhos do futuro terão traços de desencanto e pragmatismo. Recusarão, sem dúvida, o leite das ideologias, serão amamentados pelas mães, nunca pelos Estados. Exigirão comida saudável - de preferência, natural. Ainda assim, não serão capazes de resistir a uma Coca-Cola ou a um Big Mac.

Os habitantes do século 21 terão um discurso mais próximo da televisão do que do livro. Substituirão algumas formas de raciocínio e alguns sistemas de associação de idéias. Receberão da tecnologia presentes irrecusáveis. Não serão saudosistas nem preconceituosos, porque já não pensarão como as gerações atuais. Isso não será bom, nem mau. Será inevitável.

Os filhos do amanhã abandonarão de vez o maniqueísmo da finada Guerra Fria, a divisão do mundo entre anjos e demônios. Saberão que as ditaduras têm sua própria história e sua própria geografia. Não serão pessoas inocentes, porque a miséria e a informação instantânea terão acabado com a inocência. Mas talvez não percam a sensibilidade e a vontade de reagir diante da banalização da violência e da morte.

Na relação entre as nações, os habitantes do século que se inicia compreenderão que a destruição do meio ambiente não é fruto da riqueza, nem é resultado da pobreza. Ela nasce essencialmente da ignorância e da desinformação. Os filhos do futuro saberão, portanto, que o único caminho para a sobrevivência será substituir a retórica da confrontação pela busca da parceria, da cooperação e do entendimento entre os povos. 
Rodolfo Konder (1938-2014)