quinta-feira, 15 de abril de 2021

Rumo ao pior governo da história

Em qualquer dimensão - saúde, educação ou economia, por exemplo - o desempenho do atual governo é catastrófico. A menos que se usem métricas ideológicas, caminha-se, ao final destes quatro anos, para um cenário de terra arrasada que será, provavelmente, o do pior governo de nossa história.

Na saúde os números falam por si só. Ultrapassamos 4 mil mortos diários, os hospitais estão sobrecarregados, há filas nas UTIs. Em diversos locais o sistema de saúde entrou em colapso. Parte grande da culpa é do governo central. Quando já estava claro que havia um problema grave, o presidente sistematicamente minimizava a gravidade da crise. E ainda hoje defende tratamentos ineficazes, combate o uso de máscaras e o distanciamento social, e sabota medidas de lockdown decretadas por Estados ou municípios. Sua hostilidade a vacinas só diminuiu quando ficou claro que isso o prejudicava politicamente. Sua liderança, até agora, foi instrumental para piorar, e não melhorar, a situação de calamidade.

A falta de coordenação do Ministério da Saúde - a primeira vez em uma grande crise - revelou-se mais danosa que o negacionismo do presidente. Sem uma diretriz única para o país, cada Estado ou cidade decide suas políticas isoladamente, o que reduz a eficácia das mesmas. No auge da crise, demitiu-se um ministro que fazia um bom trabalho junto às secretarias estaduais, trocando-o por um militar que nada conhecia da área e se mostrou péssimo em gestão. Finalmente, a demora em negociar vacinas - não esqueçamos da hostilidade à vacina chinesa e a negativa às vacinas da Pfizer -, e ainda por cima com poucos fornecedores (somente dois!), é de inteira responsabilidade do governo federal.


Uma outra dimensão de muitas frustrações está na área econômica. A aliança entre os conservadores bolsonaristas e os liberais prometia uma revolução na economia. Seria a primeira vez que supostamente “não teríamos um governo social democrata de esquerda”, mas um legitimamente liberal. Passados dois anos, muito pouco foi privatizado e o responsável, Salim Mattar, saiu porque o estavam sabotando.

Abertura comercial foi esquecida e a negociação de acordos de comércio, com a União Europeia por exemplo, empacou. A reforma tributária também não caminha, pois a proposta do Ministério da Economia (ME), ao incluir a volta da CPMF, vai na direção contrária à racionalidade econômica. Mesmo a grande vitória do governo, a reforma da previdência, deveu-se muito mais ao Congresso que ao ME, que apostava em um sistema de capitalização inviável politicamente.

Bolsonaro sempre foi um populista intervencionista e essa é a faceta que está prevalecendo na economia em detrimento das políticas liberais. A saída dos presidentes da Petrobras e do Banco do Brasil, por discordarem de intervenções presidenciais nas suas gestões, mostra que a instrumentalização das estatais com objetivos políticos iguala-se ao visto nos governos petistas. O apoio velado do presidente a uma negociação orçamentária que aprovou despesas muito acima do Teto de Gastos, ignorando despesas obrigatórias, evidencia que o ME é hoje muito mais um apagador de incêndios que um formulador de políticas. O sonho liberal acabou muito antes de começar. A conta, em termos de juros, câmbio e estagnação do produto, já está sendo cobrada.

Na educação, depois de dois ministros ideológicos e vocais, que pouco ou nada entendiam do assunto, atingiu-se uma certa calmaria. Mas infelizmente as prioridades continuam erradas. O Brasil apresenta problemas gravíssimos de qualidade da educação, de abandono precoce de ensino médio, de atraso escolar, e nenhum deles vem sendo enfrentado. Já não se fala tanto em combate à ideologia de gênero - um falso problema -, mas gasta-se energia com políticas inúteis, como “homeschooling”, ou de retorno duvidoso, como a ampliação da rede de escolas militares.

O MEC deveria enfrentar os impactos da pandemia sobre a educação básica, coordenando esforços (e liberando verbas) para levar banda larga e “tablets” aos alunos pobres, bem como dar condições para se abrir escolas fechadas há um ano. Como já registrado neste espaço, a pandemia terá um impacto permanente e negativo sobre a educação dos mais vulneráveis, mas o MEC nada faz para atenuar o problema.

Na área ambiental, o ministro incentiva queimadas, derrubada de matas e combate o monitoramento por satélite. A devastação da floresta amazônica, que vinha diminuindo, voltou a aumentar, um resultado esperado por quem se alia a garimpeiros, grileiros e madeireiros por motivos eleitorais. Nas relações exteriores, o país isolou-se completamente, devido a uma lunática agenda anti-globalista que hostiliza seus principais parceiros comerciais e ofende aliados estratégicos. Na área da cultura... Bem, não há cultura neste (des)governo.

Na Justiça, Bolsonaro foi eleito com uma agressiva campanha anti-corrupção. Nomeou como ministro o símbolo desse combate, Sérgio Moro. Entretanto, essa agenda foi abandonada ao primeiro sinal de que a família do presidente seria investigada devido às “rachadinhas”. O ministro demitiu-se, por não aceitar a instrumentalização da Polícia Federal, o que parece estar ocorrendo, e a força tarefa da Lava-Jato foi enfraquecida. Para garantir sua sobrevivência, o presidente se apoiou no Centrão, uma aliança fisiológica que ele atacara no passado, acusando seus membros de corrupção.

Este governo vai mal em todas as dimensões que podemos pensar, seja por erros básicos de gestão, seja por escolhas equivocadas, ou por implantar políticas ideológicas sem qualquer evidência que as ampare. Como também parece não aprender com os erros do passado, há pouca esperança que corrija seus rumos. O estrago não terminou, infelizmente.

Brasil negacionista

 


Bolsonaro está no limite de suas forças

Bolsonaro disse que não nasceu para ser presidente da República. Ninguém nasce. Presidência da República é destino. Até levar a facada em Juiz de Fora, ele ainda duvidava que se elegesse. Na noite da sua vitória, depois dos discursos de praxe, da confraternização com assessores e coisa e tal, na presença apenas dos filhos e de um amigo, ele chorou copiosamente.

Seu projeto inicial, uma vez cansado de quase 30 anos como deputado federal, era concorrer à presidência para alavancar a carreira política dos três filhos zero – Flávio, então deputado estadual no Rio, Carlos, vereador e Eduardo, deputado federal por São Paulo. Derrotado, iria curtir a vida com sua mulher, Michelle, e a filha. Não lhe faltaria dinheiro para isso.


Dois anos e pouco depois e em meio a uma pandemia que não soube combater, ou que apostou que passaria se morressem os que tivessem de morrer, está à beira da exaustão e não esconde os sinais disso. Era evidente o prazer que sentia nos encontros diários com grupos de devotos à saída do Palácio da Alvorada para ir trabalhar e à chegada. Nos últimos dias, não disfarça sua irritação.

Reclamou de perguntas que lhe fizeram. Reclamou de uma mulher que interrompeu a sua fala e de outra que lhe pediu uma foto. Reclamou de um homem que quis saber o que ele poderia fazer para tirar seu Estado, o Rio de Janeiro, da pobreza. Ontem, sem que ninguém o tivesse provocado para isso, renovou as ameaças que costuma fazer com as mesmas palavras de sempre.

"O Brasil está no limite. O pessoal fala que eu devo tomar providência, eu estou aguardando o povo dar uma sinalização. Porque a fome, a miséria e o desemprego estão aí", afirmou. “Tem um barril de pólvora aí e tem gente de paletó e gravata que não quer enxergar. Acho que em breve teremos um problema sério no Brasil.” E voltou a se queixar do Supremo Tribunal Federal.

Quem parece estar no limite é ele. Embora não admita, e jamais admitirá, é suficientemente inteligente para ver que seu governo é um fracasso, e que seu poder de mando só diminui. Montou um comitê para cuidar da pandemia, mas hoje é o ministro Ricardo Lewandowski quem dá as cartas como relator das ações sobre a crise sanitária que dão entrada no Supremo.

O ministro Luís Roberto Barroso empurrou por sua goela abaixo a CPI da Covid. Bolsonaro ainda luta para não digeri-la, mas pouco tem a fazer, salvo abrir os cofres para a compra futura de votos que se disponham a socorrê-lo. Os bolsonaristas radicais, esses continuam sob o jugo do ministro Alexandre de Moraes, presidente do inquérito que investiga seu mau comportamento.

O país segue sem Orçamento, o ministro Paulo Guedes, da Economia, capenga sob fogo amigo, e o Centrão não abre mão dos bilhões de reais reservados para o pagamento de emendas parlamentares e construção de obras em redutos eleitorais de deputados e senadores. O que Bolsonaro pode fazer? Pedalar a Lei de Responsabilidade Fiscal? Arriscar-se a ser pedalado?

Algo como um terço dos brasileiros eleitores ainda se dizem fiéis a ele, mas segundo a mais recente pesquisa do Poder Data, se o segundo turno da próxima eleição presidencial fosse agora, Lula derrotaria Bolsonaro por 52% dos votos a 34%, e ele também perderia para Luciano Huck por 48% a 35%. Contra João Doria, Ciro Gomes e Sérgio Moro, empataria.

O Supremo, logo mais à tarde, julgará ações que definirão o futuro de Lula. É certo que confirmará a suspensão de suas condenações, o que lhe assegura o direito de candidatar-se no ano que vem. É provável, apenas provável, que mantenha a decisão da Segunda Turma que considerou Moro suspeito na condução dos processos que envolveram o ex-presidente. A conferir.

A certa altura do ano passado, Bolsonaro torcia em silêncio para enfrentar Lula em 2022. Nos seus cálculos, seria reeleito com a ajuda do antipetismo. O agravamento da pandemia e da crise econômica obrigou Bolsonaro a refazer os cálculos. Lula é seu mais poderoso adversário. O antipetismo perdeu fôlego. E o centro está fragmentado, o que facilitará a vida de Lula.

Imunidade de extermínio

Se nós tívéssemos que chegar na imunidade coletiva, com cerca de 70% das pessoas tendo tido a doença, nós teríamos mais de 1 milhão de mortes. Então este é o projeto deste governo: alcançar 1 milhão de mortes e com isso alcançar a imunidade coletiva
Gonzalo Vecina Neto, fundador da Anvisa

#Basta!

Como um gigantesco navio sem capitão, singrando desgovernado por um oceano viral que rotineira e impiedosamente ceifa, num intervalo de 24 horas, perto de 4 mil vidas brasileiras — número equivalente ao total acumulado de mortes reportadas pela China em toda a pandemia —, a combalida nau chamada Brasil sofreu nos últimos dias mais uma série de golpes devastadores. Como se não bastasse ter de combater uma pandemia fora de controle, em meio a um colapso sem precedentes de todo seu sistema hospitalar e, no processo, ter se tornado um verdadeiro pária internacional, o Brasil assistiu atônito à escalada vertiginosa do pandemônio político que o assola. Rotulado de forma quase unânime pela imprensa internacional como inimigo público número 1 do combate à pandemia de Covid-19 em todo o mundo, o atual ocupante do Palácio do Planalto deu claras demonstrações públicas e notórias de estar perdendo qualquer tipo de controle — se algum dia o teve — do caos semeado por ele mesmo desde a ascensão ao maior cargo da República.

Acuado pela decisão do STF de obrigar o presidente do Senado Federal a instalar uma CPI para investigar a conduta do governo federal no combate ao coronavírus, isolado e demonizado pela comunidade internacional, e tendo sua tentativa de interferência nas Forças Armadas repudiada simultaneamente pelos comandantes das três Armas, o presidente da República parece ter achado um novo moinho de vento para chamar de seu inimigo preferido: os cientistas. Numa declaração proferida aos berros numa de suas aparições públicas em Brasília, o gestor e principal responsável pela maior catástrofe humanitária da história da República brasileira vociferou contra toda a comunidade científica brasileira (e mundial, presume-se) nos seguintes termos: “Cientistas canalhas, se não têm nenhum remédio para indicar, cale a boca e deixe (sic) o médico trabalhar”.

Ao indivíduo que transformou imagens de infindáveis fileiras de covas rasas, sendo abertas às pressas por todo o país, no mais visualizado “cartão-postal” do Brasil atual em todo o mundo, ao mandatário que selou o destino de centenas de milhares de brasileiros cujas mortes poderiam ter sido evitadas, levando o Brasil ao ponto em que as mortes em um mês podem superar os nascimentos pela primeira vez, ao gestor que impediu a compra de dezenas de milhões de vacinas quando elas ainda estavam disponíveis no mercado internacional, ao propagandista que estimulou a população a usar medicamentos sem nenhuma eficácia comprovada contra o coronavírus, ao presidente que nunca ofereceu uma palavra de consolo ou solidariedade a uma nação ferida e golpeada mortalmente como nunca antes na sua história, e que negou qualquer ajuda digna a milhões de brasileiros que diariamente convivem com a perda irreparável de seus entes amados, enquanto tendo de tomar a monstruosa decisão entre morrer de fome ou de Covid-19, a Ciência e os cientistas brasileiros só têm uma reposta a oferecer: Basta!

No momento em que todos nós, brasileiros, testemunhamos a manifestação de uma bifurcação trágica e decisiva, é preciso dar um “Basta!” definitivo, decisivo e inequívoco aos inúmeros crimes perpetrados contra os brasileiros de hoje e os que ainda hão de nascer, antes que seja tarde demais. Tarde demais para salvar centenas de milhares de vidas que ainda podem ser salvas; tarde demais para salvar o que resta das instituições e da democracia brasileira; tarde demais para evitar que o país cruze o limiar de um ponto de onde serão precisos anos ou décadas para que dele se possa retornar.

Em nome dos 362.180 brasileiros que pagaram com a própria vida pelo maior ato de incompetência e inépcia da nossa história, em nome de todas as famílias das vítimas desta que já é a maior tragédia nacional, em nome da preservação do Brasil como nação e, finalmente, em nome da garantia de um futuro digno para futuras gerações de brasileiros, chegou a hora de remover do posto o carcereiro inominável que nos transformou a todos em prisioneiros, potencialmente condenados à morte, seja de fome ou de asfixia; isolados de todo o mundo e vivendo diariamente à merce dos delírios e desmandos de alguém que, por atos e palavras, renunciou voluntariamente a suas responsabilidades constitucionais de proteger, a qualquer custo, o povo brasileiro de uma guerra de extermínio contra um inimigo letal.

Por que o Brasil se vende tão barato?

Supostamente o ministro brasileiro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, se achou muito esperto ao anunciar que pretende exigir "1 bilhão de dólares" na cúpula do Dia da Terra, em 22 de abril. Em troca, o Brasil desmataria 40% menos mata amazônica do que atualmente. Com isso, ele quer dizer: se os gringos estão exigindo que a gente preserve a Amazônia, então vão ter que pagar.

Salles está seguro do aplauso dos que apoiam sua "política ambiental". No gabinete, o presidente Jair Bolsonaro e alguns generais o teriam congratulado pela demonstração do tipo "Davi contra Golias". Até porque grande parte do dinheiro iria para os militares e unidades policiais que pretendem proteger a mata tropical. Como declarou, o ministro considera os órgãos ambientais existentes, como o Ibama e o ICMBio, burocráticos e engessados demais.


O problema é que, por 1 bilhão de dólares, o Brasil estará se vendendo mais barato do que nunca numa cúpula ambiental. A quantia é uma bagatela diante do que poderiam valer a Floresta Amazônica e sua preservação. Pouco refletida e mesquinha, a ideia mostra toda a miséria da atual política ambiental do país.

O presidente Bolsonaro indicou Salles como chefe de negociações da assim chamada Cúpula dos Líderes sobre o Clima, relegando a segundo plano todos os membros do gabinete que teriam algo para dizer sobre o assunto. E há muito em jogo: o novo presidente americano, Joe Biden, convidou para o encontro 40 chefes de Estado e de governo.

Trata-se de uma reunião preparatória para a cúpula do clima COP26 de novembro em Glasgow. Os Estados Unidos querem obter desde já, dos grandes causadores de gases do efeito estufa, comprometimentos quanto a suas emissões de CO2. Aí, na conferência na Escócia, seria possível finalmente aprimorar as metas do Acordo de Paris de 2015.

E agora, com sua exigência bilionária, Salles quer que a comunidade mundial pague ao Brasil antecipadamente pela floresta existente, ou seja, por dióxido de carbono capturado.

Pelo Fundo Amazônia, criado pela Noruega e também pela Alemanha para proteção da floresta, verbas fluiriam anualmente a posteriori caso o Brasil reduzisse comprovadamente o desmatamento. Como o governo Bolsonaro não pode ou não quer fazer isso, as transferências foram suspensas.

E no entanto o sistema "dinheiro em troca de proteção florestal" poderia funcionar bem: diversos Estados, conglomerados privados e doadores multilaterais, como o Banco Mundial, seguramente estariam dispostos a investir muito para apoiar o Brasil.

O país só teria que provar, ou assegurar de forma confiável, que pode e quer preservar a Floresta Amazônica. Em vez disso, o atual governo desmonta todas as instituições e corta verbas, de modo que a destruição da Amazônia se acelera cada vez mais.

Ao pedir 1 bilhão de dólares, é como se o ministro do Meio Ambiente quisesse que o corpo de bombeiros lhe desse uma gorjeta para que este apagasse o fogo na própria casa dele. O governo tenta lucrar com o impedimento da própria catástrofe: "A estratégia ambiental do governo é equivocada, míope e de curto prazo", criticou o ex-ministro da Agricultura Pedro de Camargo Neto, ao jornal O Estado de S. Paulo.

Pois, com sua matriz energética sustentável, de hidrelétricas e biocombustíveis, o Brasil poderia se apresentar de forma bem diferente no Dia da Terra, impondo condições, não como solicitante. O país deveria exigir dos Estados que mais produzem gases do efeito estufa – União Europeia, China, Rússia Índia – que reduzam suas emissões.

Camargo Neto aponta o caminho: "Nós, que podemos sofrer o desastre que eles estão provocando e podemos pagar o pato. Nós teríamos de estar numa posição de força, pressionando, não querendo passar o pires."

Acuado, Bolsonaro fornece a pólvora que pode explodir o seu próprio mandato

No papel de si mesmo, Bolsonaro protagoniza encenações regulares para sua plateia de devotos no cercadinho do Alvorada. Exibe-se em duas sessões diárias, na saída e na chegada. Na apresentação matutina desta quarta-feira, exagerou na teatralidade. Injetou um "barril de pólvora" na conjuntura. E insinuou que aguarda a "sinalização do povo" para riscar o fósforo.

No momento, o inquilino do Planalto enfrenta algo muito parecido com um cerco. Um ministro do Supremo, Luís Barroso, presenteou-o com uma CPI. A decisão foi avalizada pelo plenário. Uma ministra da Corte, Rosa Weber, promoveu uma lipoaspiração nos seus decretos armamentistas. Outra magistrada, Cármen Lúcia, pediu a inclusão na pauta de denúncia-crime que o acusa de genocídio contra indígenas na pandemia.


E Bolsonaro: "Amigos do STF, daqui a pouco vamos ter uma crise enorme aqui. Vi que um ministro baixou um processo para me julgar por genocídio... Olha, quem fechou tudo, quem está com a política na mão não sou eu. Agora, não quero brigar com ninguém, mas estamos na iminência de ter um problema sério no Brasil. O que nascerá disso tudo, onde vamos chegar? Parece que é um barril de pólvora que está aí. E tem gente, de paletó e gravata, que não quer enxergar isso."

A última vez que Bolsonaro falou em pólvora foi em novembro do ano passado. Insinuou na época que poderia usar a força para proteger a Amazônia de hipotéticas incursões patrocinadas pelos Estados Unidos, sob Joe Biden. Na diplomacia, lecionou o capitão, "quando acabar a saliva, tem que ter pólvora." Tudo o que o capitão conseguiu com sua piada belicosa foi potencializar a antipatia do novo presidente americano à sua belicosa figura.

Começou no último domingo e vai até esta quinta-feira, a primeira viagem de um representante do governo Biden à América do Sul. Chama-se Juan Gonzalez. Ocupa a função de diretor sênior para o Hemisfério Ocidental no Conselho de Segurança Nacional. Seu roteiro inclui Colômbia, Argentina e Uruguai. O Brasil foi excluído. De resto, a gestão Biden sinaliza a intenção de retirar o apoio da Casa Branca ao ingresso do Brasil na OCDE caso o Planalto não vire do avesso sua política antiambiental.

Bolsonaro ainda não notou. Mas sua valentia revela-se improdutiva também no ambiente interno. Com a popularidade em queda, tornou-se um presidente da cota do centrão. Com os cofres em ruínas, ensaia o rompimento do teto de gastos. Eleito por 58 milhões de brasileiros para presidir, informa que "o Brasil está no limite", pois "a fome, a miséria e o desemprego estão aí." E proclama, em timbre de ameaça, que está "aguardando o povo dar uma sinalização" para tomar as devidas "providências."

Todos estão em cima do mesmo barril de pólvora. O que Bolsonaro demora a perceber é que, graças ao instinto nacional de sobrevivência, suas metáforas apocalípticas podem ser usadas para explodir o que resta do mandato que ele se empenha em incendiar.