sexta-feira, 12 de março de 2021
Acredite quem quiser
O ex-presidente Lula da Silva, que fez da polarização do “nós” contra “eles” a força motriz de sua seita, agora se apresenta disposto ao “diálogo”. O presidente Jair Bolsonaro, que passou toda a pandemia de covid-19 a maldizer vacinas e máscaras, quer ser reconhecido como campeão da imunização dos brasileiros. Formidáveis metamorfoses, nas quais acredita quem quer.
Que ninguém se engane: a única motivação de ambos, como sempre foi, é eleitoral. Nenhum deles sequer acorda pela manhã se não for por cálculo político. Os interesses nacionais e as aflições dos eleitores são sempre secundários, ou meramente instrumentais, em seus projetos de poder.
O presidente Bolsonaro, de uma hora para outra, protagonizou uma solenidade oficial usando máscara, bem como seus assessores. A imagem exótica espantou os brasileiros em geral, acostumados a ver Bolsonaro não somente sem máscara, mas promovendo aglomerações País afora e estimulando comportamento irresponsável da população em meio a uma pandemia mortal.
Mais do que isso: a solenidade se prestava à assinatura de leis que facilitam a compra de vacinas contra a covid-19. O presidente prometeu que, “até o final do ano, teremos mais de 400 milhões de doses (de imunizantes) disponíveis aos brasileiros”. Não se sabe de onde o presidente tirou esse número, uma vez que o Ministério da Saúde tem sido incapaz de determinar quantas vacinas estarão disponíveis para os brasileiros neste mês, que dirá no resto do ano.
Seja como for, trata-se de uma mudança drástica de atitude, que, se mantida, aliviará um País agoniado com a sabotagem promovida por Bolsonaro e seus camisas pardas contra a vacinação e as medidas de restrição para enfrentar o vírus, em meio à escalada de mortes e o colapso do sistema de saúde. Já não seria sem tempo.
Mas não se pense que Bolsonaro de repente se conscientizou de que não é possível superar a pandemia sem imunização em massa e sem adotar ações preventivas. Ainda está fresco, na memória dos brasileiros que prezam os valores morais, o horror provocado pelas reações grosseiras e desumanas de Bolsonaro sempre que cobrado a assumir suas responsabilidades como presidente. Na mais recente delas, apenas uma semana atrás, mandou o “idiota” que lhe pedia vacinas comprá-las “na casa da tua mãe”.
É evidente que esse é o verdadeiro Bolsonaro, e não o personagem contrito que agora prega a necessidade urgente de uma vacinação nacional. O verdadeiro Bolsonaro só se preocupa com sua reeleição – agora ameaçada pela escalada da crise causada pela pandemia e, principalmente, pela ressurreição de Lula da Silva.
Não parece ter sido um mero acaso o fato de o “novo” Bolsonaro se apresentar aos brasileiros momentos depois que o chefão petista fez seu primeiro pronunciamento após o restabelecimento de seus direitos políticos por decisão judicial. No discurso, Lula da Silva, que apareceu de máscara, atacou vigorosamente a irresponsabilidade do presidente diante da pandemia.
Para fazer o contraponto a Bolsonaro, Lula da Silva vestiu o figurino de estadista. Além de fazer uma defesa enfática da vacinação e das medidas de isolamento, o ex-presidente anunciou sua disposição de “dialogar com todos”, inclusive fora da esquerda, contrastando com a dificuldade de articulação política do presidente. “Não tenham medo de mim”, disse Lula.
Ninguém tem medo de Lula; o que se tem é enfado. O demiurgo de Garanhuns tornou-se previsível. O Lula que mais uma vez promete um amplo diálogo político é o mesmo que construiu sua base parlamentar na base do talão de cheques e é o mesmo que até na esquerda é visto como autoritário.
Ademais, a receita de Lula para a retomada do crescimento – fim das privatizações, freio nas reformas e aumento dos gastos públicos – é a mesma que foi responsável pela profunda crise produzida no governo de Dilma Rousseff, da qual o País ainda não saiu. Não por acaso, Lula esqueceu-se de citar sua criatura no discurso, talvez na expectativa de que os brasileiros não se lembrassem.
Mas os brasileiros lembram bem.
O povo não pode pagar com a própria vida!
Nós, entidades signatárias do Pacto pela Vida e pelo Brasil, sob o peso da dor e com sentido de máxima urgência, voltamos a nos dirigir à sociedade brasileira, diante do agravamento da pandemia e das suas consequências. Nossa primeira palavra é de solidariedade às famílias que perderam seus entes queridos .
Não há tempo a perder, negacionismo mata. O vírus circula de norte a sul do Brasil, replicando cepas, afetando diferentes grupos etários, castigando os mais vulneráveis. Doentes morrem agonizando por falta de recursos hospitalares. O Sistema Único de Saúde - SUS continua salvando vidas. No entanto, os profissionais da saúde, após um ano na linha de frente, estão à beira da exaustão. A eles, nosso reconhecimento.
É hora de estancar a escalada da morte! A população brasileira necessita de vacina agora. O vírus não será dissipado com obscurantismos, discursos raivosos ou frases ofensivas. Basta de insensatez e irresponsabilidade. Além de vacina já e para todos, o Brasil precisa urgentemente que o Ministério da Saúde cumpra o seu papel, sendo indutor eficaz das políticas de saúde em nível nacional, garantindo acesso rápido aos medicamentos e testes validados pela ciência, a rastreabilidade permanente do vírus e um mínimo de serenidade ao povo.
A ineficiência do Governo Federal, primeiro responsável pela tragédia que vivemos, é notória. Governadores e prefeitos não podem assumir o papel de cúmplices no desprezo pela vida. Assim, apoiamos seus esforços para garantir o cumprimento do rol de medidas sanitárias de proteção, paralelamente à imunização rápida e consistente da população. Que governadores e prefeitos ajam com olhos não só voltados para os seus estados e municípios, mas para o país, através de um grande pacto. Somos um só Brasil.
Ao Congresso Nacional, instamos que dê máxima prioridade a matérias relacionadas ao enfrentamento da COVID-19, uma vez que preservar vidas é o que há de mais urgente. Nesse sentido, o auxílio emergencial digno, e pelo tempo que for necessário, será imprescindível para salvar vidas e dinamizar a economia. Ao Poder Judiciário, sob a liderança do Supremo Tribunal Federal, pedimos que zele pelos direitos da cidadania e pela harmonia entre os entes federativos. Que a imprensa atue livre e vigorosamente, de forma ética, cumprindo sua missão de transmitir informações confiáveis e com base científica, sobre o que se passa. Enfim, que a voz das instituições soe muito firme na defesa do povo.
É hora de estancar a escalada da morte! A população brasileira necessita de vacina agora. O vírus não será dissipado com obscurantismos, discursos raivosos ou frases ofensivas. Basta de insensatez e irresponsabilidade. Além de vacina já e para todos, o Brasil precisa urgentemente que o Ministério da Saúde cumpra o seu papel, sendo indutor eficaz das políticas de saúde em nível nacional, garantindo acesso rápido aos medicamentos e testes validados pela ciência, a rastreabilidade permanente do vírus e um mínimo de serenidade ao povo.
A ineficiência do Governo Federal, primeiro responsável pela tragédia que vivemos, é notória. Governadores e prefeitos não podem assumir o papel de cúmplices no desprezo pela vida. Assim, apoiamos seus esforços para garantir o cumprimento do rol de medidas sanitárias de proteção, paralelamente à imunização rápida e consistente da população. Que governadores e prefeitos ajam com olhos não só voltados para os seus estados e municípios, mas para o país, através de um grande pacto. Somos um só Brasil.
Ao Congresso Nacional, instamos que dê máxima prioridade a matérias relacionadas ao enfrentamento da COVID-19, uma vez que preservar vidas é o que há de mais urgente. Nesse sentido, o auxílio emergencial digno, e pelo tempo que for necessário, será imprescindível para salvar vidas e dinamizar a economia. Ao Poder Judiciário, sob a liderança do Supremo Tribunal Federal, pedimos que zele pelos direitos da cidadania e pela harmonia entre os entes federativos. Que a imprensa atue livre e vigorosamente, de forma ética, cumprindo sua missão de transmitir informações confiáveis e com base científica, sobre o que se passa. Enfim, que a voz das instituições soe muito firme na defesa do povo.
Fazemos ainda um apelo particular à juventude. O vírus está infectando e matando os mais jovens e saudáveis, valendo-se deles como vetores de transmissão. Que a juventude brasileira assuma o seu protagonismo histórico na defesa da vida e do país, desconstruindo o negacionismo que agencia a morte.
Sabemos que a travessia é desafiadora, a oportunidade de reconstrução da sociedade brasileira é única e a esperança é a luz que nos guiará rumo a um novo tempo.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo, presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, Felipe Santa Cruz, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, José Carlos Dias, presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns, Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências, Paulo Jeronimo de Sousa, presidente da Associação Brasileira de Imprensa, Ildeu de Castro Moreira, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
Sabemos que a travessia é desafiadora, a oportunidade de reconstrução da sociedade brasileira é única e a esperança é a luz que nos guiará rumo a um novo tempo.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo, presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, Felipe Santa Cruz, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, José Carlos Dias, presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns, Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências, Paulo Jeronimo de Sousa, presidente da Associação Brasileira de Imprensa, Ildeu de Castro Moreira, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
Vírus que nos governa
A luta contra a covid-19 foi perdida em 2020 e não há a menor chance de reverter esta trágica circunstância no primeiro semestre de 2021. O melhor que podemos fazer é esperar o milagre da vacinação em massa ou uma mudança radical na gestão da pandemia. Hoje, o Brasil é uma ameaça à humanidade e um laboratório ao ar livre onde a impunidade (…) parece ser a regra.Jesem Orellana, epidemiologista da Fiocruz Amazônia
Lula não é santo mas fez milagre
Nenhum cientista, nenhuma manchete, nenhum general, nenhum empresário, nenhum pastor, nenhuma recessão e nem mesmo os recordes sucessivos de mortos por Covid, nada disso produziu o milagre testemunhado pelo país nesta quarta-feira. Foi Lula quem “obrigou” Bolsonaro a usar máscara, defender vacinas e pedir imunizantes à China.
Nem mesmo a vacinação da mãe, Olinda, com a comunista Coronavac provocou essa transmutação radical de Bolsonaro. Lembram outubro de 2020? “A da China nós não compraremos, é decisão minha, mesmo se for aprovada pela Anvisa”. “Eu não tomo vacina (contra Covid), não interessa se tem uma ordem, seja de quem for, eu não vou tomar a vacina”. Sempre desencorajou uso de máscaras, à revelia do mundo. Citava “efeitos colaterais”. Seu filho Eduardo foi mais grosso em vídeo nas redes: “Enfia (a máscara) no rabo, gente, porra!” Que vergonha, deputado. Que vergonha.
O discurso eleitoral de Lula no sindicato dos metalúrgicos, convocando a população a usar máscaras e se vacinar, mudou tudo. Bolsonaro se apresentou imediatamente depois em um bloco de mascarados. Disse que sempre foi a favor de se imunizar. O milagre estendeu-se aos filhos Flávio e Carlos, tocados com a anulação das condenações de Lula. “Nossa arma é a vacina” passou a ser o slogan da família. Cara de pau. A arma de Bolsonaro sempre foi o trabuco mesmo. Sua arma é a que cospe tiros, palavrões, bacilos e cloroquina. “Vacinaremos dezenas de milhões de brasileiros”. O verbo está no tempo errado. O futuro deveria ser pretérito. É imperfeito e condicional na voz de Pazuello, o general passivo da ativa. Pazuello não via o porquê de “tanta ansiedade e angústia” da nação em dezembro. E hoje? “O sistema de saúde não colapsou nem vai colapsar”. Que vergonha, ministro. Que vergonha.
Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, o vice-presidente Mourão afirma que “faltou uma campanha intensiva de conscientização da população”. Não, Mourão, faltou conscientizar Bolsonaro e seu ministro da Saúde. Olhe agora Joe Biden nos Estados Unidos. Cem milhões de doses serão aplicadas nos 50 primeiros dias de governo e quase toda a população adulta estará vacinada até julho. Uma questão de liderança.
O Brasil ficou sem hospitais de campanha, sem leitos, sem oxigênio, sem vacina, limitado a jogar corpos em frigoríficos. Deveríamos vacinar, dia e noite, ao menos 1 milhão de brasileiros. É inadmissível interromper a imunização por falta de doses.
Temos uma em cada quatro mortes por Covid no planeta. Somos o epicentro de uma calamidade sem controle. O STF precisa continuar a cobrar de Bolsonaro o repasse de recursos aos estados. O ministro Lewandowski deu prazo até o fim da semana. O STF precisa também cobrar explicações sem desculpas esfarrapadas. Qual é a culpa do Poder Executivo na tragédia, Supremo Tribunal Federal? Bolsonaro não quis ter vacinas já em dezembro. Semana passada, mandou comprar vacina na casa da tua mãe.
Nunca foi tão fácil fazer oposição. É só ter bom senso. Contra o destempero, recomenda-se cautela. Lula se comparou no discurso a um escravo que leva 100 chibatadas. Disse que foi vítima do maior erro jurídico em 500 anos de história. Menos, Lula. Inspire-se nos líderes autênticos que saíram da prisão com maior estatura e modéstia, como Mujica e Mandela, e não nos populistas que se gabam demais e derrapam em mentiras. Você criticou o fanatismo dos bolsonaristas. Não estimule o fanatismo dos petistas. Não precisamos de santos. Precisamos de presidente.
Nem mesmo a vacinação da mãe, Olinda, com a comunista Coronavac provocou essa transmutação radical de Bolsonaro. Lembram outubro de 2020? “A da China nós não compraremos, é decisão minha, mesmo se for aprovada pela Anvisa”. “Eu não tomo vacina (contra Covid), não interessa se tem uma ordem, seja de quem for, eu não vou tomar a vacina”. Sempre desencorajou uso de máscaras, à revelia do mundo. Citava “efeitos colaterais”. Seu filho Eduardo foi mais grosso em vídeo nas redes: “Enfia (a máscara) no rabo, gente, porra!” Que vergonha, deputado. Que vergonha.
O discurso eleitoral de Lula no sindicato dos metalúrgicos, convocando a população a usar máscaras e se vacinar, mudou tudo. Bolsonaro se apresentou imediatamente depois em um bloco de mascarados. Disse que sempre foi a favor de se imunizar. O milagre estendeu-se aos filhos Flávio e Carlos, tocados com a anulação das condenações de Lula. “Nossa arma é a vacina” passou a ser o slogan da família. Cara de pau. A arma de Bolsonaro sempre foi o trabuco mesmo. Sua arma é a que cospe tiros, palavrões, bacilos e cloroquina. “Vacinaremos dezenas de milhões de brasileiros”. O verbo está no tempo errado. O futuro deveria ser pretérito. É imperfeito e condicional na voz de Pazuello, o general passivo da ativa. Pazuello não via o porquê de “tanta ansiedade e angústia” da nação em dezembro. E hoje? “O sistema de saúde não colapsou nem vai colapsar”. Que vergonha, ministro. Que vergonha.
Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, o vice-presidente Mourão afirma que “faltou uma campanha intensiva de conscientização da população”. Não, Mourão, faltou conscientizar Bolsonaro e seu ministro da Saúde. Olhe agora Joe Biden nos Estados Unidos. Cem milhões de doses serão aplicadas nos 50 primeiros dias de governo e quase toda a população adulta estará vacinada até julho. Uma questão de liderança.
O Brasil ficou sem hospitais de campanha, sem leitos, sem oxigênio, sem vacina, limitado a jogar corpos em frigoríficos. Deveríamos vacinar, dia e noite, ao menos 1 milhão de brasileiros. É inadmissível interromper a imunização por falta de doses.
Temos uma em cada quatro mortes por Covid no planeta. Somos o epicentro de uma calamidade sem controle. O STF precisa continuar a cobrar de Bolsonaro o repasse de recursos aos estados. O ministro Lewandowski deu prazo até o fim da semana. O STF precisa também cobrar explicações sem desculpas esfarrapadas. Qual é a culpa do Poder Executivo na tragédia, Supremo Tribunal Federal? Bolsonaro não quis ter vacinas já em dezembro. Semana passada, mandou comprar vacina na casa da tua mãe.
Nunca foi tão fácil fazer oposição. É só ter bom senso. Contra o destempero, recomenda-se cautela. Lula se comparou no discurso a um escravo que leva 100 chibatadas. Disse que foi vítima do maior erro jurídico em 500 anos de história. Menos, Lula. Inspire-se nos líderes autênticos que saíram da prisão com maior estatura e modéstia, como Mujica e Mandela, e não nos populistas que se gabam demais e derrapam em mentiras. Você criticou o fanatismo dos bolsonaristas. Não estimule o fanatismo dos petistas. Não precisamos de santos. Precisamos de presidente.
Bolsonaro repete que é fácil implantar uma ditadura no país
Nunca se viu um presidente chamar de “estado de sítio” o que nem mesmo de lockdown pode ser chamado, e alertar que “estado de sítio” cabe a ele decretar, não a governador. Para completar, nunca se viu um presidente dizer que sua caneta está carregada de tinta e que é muito fácil implantar uma ditadura no país. Nem os presidentes da ditadura militar ameaçaram o país nesses termos.
Na última quarta-feira, o Brasil era o país onde mais pessoas morriam da Covid no mundo, com 190 mortes a mais por dia do que os Estados Unidos e à frente de México, Rússia e Itália. Era também o país onde o número de mortes mais subia. Apenas 4,39% da população foi vacinada. O Ministério da Saúde recalcula para baixo o número de doses de vacinas que espera receber.
Auxiliares de Bolsonaro deixaram de fingir que a volta à cena de Lula não abateu seu chefe. E que a eventual candidatura do ex-presidente no ano que vem acabaria por beneficiar Bolsonaro ao aumentar a polarização ideológica. Tanto quanto Bolsonaro, eles estão atarantados. Temem que o avanço da pandemia, a falta de vacinas, a inflação e o desemprego em alta favoreçam Lula.
Esse ser sem rosto e sem nome que a imprensa batizou de mercado teme que Bolsonaro rompa o pacto firmado com ele de fazer as reformas do Estado prometidas pelo ministro Paulo Guedes, da Economia, o ex-Posto Ipiranga cada vez mais vazio de combustível e de quinquilharias. Sempre que Guedes afirma que ruim com ele, pior sem ele, o mercado entende: não vai dar, emperrou.
O mundo era outro e bem mais esperançoso para Bolsonaro e seus apoiadores, entre eles o mercado, até que o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu as condenações de Lula e provocou o furacão que só ganha força. O efeito Lula tirou a centro-direita do seu berço esplêndido e, ao invés de enfraquecer candidaturas ainda adormecidas, poderá fortalecê-las.
Sérgio Moro parecia morto, mas não está. Luiz Henrique Mandetta, em pesquisas que simulam o segundo turno, bate Bolsonaro. Luciano Huck está mais assertivo em suas críticas ao presidente acidental. O PSDB assanhou-se para sair a campo. Esses nomes, ou um nome novo que apareça, só tomarão votos de Bolsonaro. Lula é o dono dos votos do seu pedaço.
O risco para todos é que Bolsonaro tente melar o jogo se concluir que não poderá vencê-lo. Em sua live das quintas-feiras no Facebook, novamente acusou os governadores de quererem quebrar a economia do país e incitou seus seguidores a saírem às ruas em desobediência às ordens de isolamento. Falou em possíveis ataques a supermercados. Tocou horror.
Por ora, os militares empregados no governo e os reclusos em quartéis estão calados. Nenhum se aventurou a lançar nota de advertência ao Supremo com a intenção de pressioná-lo a manter Lula como ficha suja. Mas não se descarte que isso possa ocorrer, é tudo o que Bolsonaro deseja. E aí veremos se a democracia brasileira continua sendo a plantinha tenra que já foi no passado.
Não durou 24 horas o ensaio de conversão de Bolsonaro ao uso de máscara e à defesa de providências que barrem o agravamento da pandemia que só faz bater recorde atrás de recorde em número de mortos e de infectados. Foram 2.207 novas mortes e 78.297 novos casos nesta quinta-feira, dia 11 de março. No total até aqui, 273.124 óbitos e 11.284.269 de infectados.
Na última quarta-feira, o Brasil era o país onde mais pessoas morriam da Covid no mundo, com 190 mortes a mais por dia do que os Estados Unidos e à frente de México, Rússia e Itália. Era também o país onde o número de mortes mais subia. Apenas 4,39% da população foi vacinada. O Ministério da Saúde recalcula para baixo o número de doses de vacinas que espera receber.
Auxiliares de Bolsonaro deixaram de fingir que a volta à cena de Lula não abateu seu chefe. E que a eventual candidatura do ex-presidente no ano que vem acabaria por beneficiar Bolsonaro ao aumentar a polarização ideológica. Tanto quanto Bolsonaro, eles estão atarantados. Temem que o avanço da pandemia, a falta de vacinas, a inflação e o desemprego em alta favoreçam Lula.
Esse ser sem rosto e sem nome que a imprensa batizou de mercado teme que Bolsonaro rompa o pacto firmado com ele de fazer as reformas do Estado prometidas pelo ministro Paulo Guedes, da Economia, o ex-Posto Ipiranga cada vez mais vazio de combustível e de quinquilharias. Sempre que Guedes afirma que ruim com ele, pior sem ele, o mercado entende: não vai dar, emperrou.
O mundo era outro e bem mais esperançoso para Bolsonaro e seus apoiadores, entre eles o mercado, até que o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu as condenações de Lula e provocou o furacão que só ganha força. O efeito Lula tirou a centro-direita do seu berço esplêndido e, ao invés de enfraquecer candidaturas ainda adormecidas, poderá fortalecê-las.
Sérgio Moro parecia morto, mas não está. Luiz Henrique Mandetta, em pesquisas que simulam o segundo turno, bate Bolsonaro. Luciano Huck está mais assertivo em suas críticas ao presidente acidental. O PSDB assanhou-se para sair a campo. Esses nomes, ou um nome novo que apareça, só tomarão votos de Bolsonaro. Lula é o dono dos votos do seu pedaço.
O risco para todos é que Bolsonaro tente melar o jogo se concluir que não poderá vencê-lo. Em sua live das quintas-feiras no Facebook, novamente acusou os governadores de quererem quebrar a economia do país e incitou seus seguidores a saírem às ruas em desobediência às ordens de isolamento. Falou em possíveis ataques a supermercados. Tocou horror.
Por ora, os militares empregados no governo e os reclusos em quartéis estão calados. Nenhum se aventurou a lançar nota de advertência ao Supremo com a intenção de pressioná-lo a manter Lula como ficha suja. Mas não se descarte que isso possa ocorrer, é tudo o que Bolsonaro deseja. E aí veremos se a democracia brasileira continua sendo a plantinha tenra que já foi no passado.
As mentiras da elite sobre polarização de Bolsonaro e Lula
Jair Bolsonaro tentou sabotar todas as providências de contenção de gastos da mudança “Emergencial” da Constituição, aquela que vai autorizar também o novo auxílio emergencial. De efeitos práticos maiores nas contas do governo, a PEC Emergencial vai impedir o aumento de gastos com servidores públicos por alguns anos e aumentar alguns impostos. Na verdade, a emenda vai exigir que se cancelem algumas reduções especiais de tributos para indivíduos e empresas, por meio de lei. Se a lei pegar, haverá um aumento de impostos de cerca de 0,2% do PIB por ano.
Bolsonaro queria cancelar tudo isso, mas até a noite desta terça-feira, os deputados haviam decidido deixar a PEC como foi aprovada no Senado (onde já havia sido amputada e lipoaspirada).
Esse é o presidente e futuro candidato à reeleição comprometido com as “reformas” e o “ajuste fiscal”? Esse que não fez abertura comercial. Nenhuma privatização. Quase nenhuma concessão de empreendimento à iniciativa privada que não tivesse sido já preparada no governo Michel Temer. No seu governo, fez-se uma reforma da Previdência (em parte sabotada por Bolsonaro) que era consenso do establishment e que não contou com oposição popular quase nenhuma, nem da esquerda semimorta.
Esse é o candidato de um dos extremos da “polarização” que haverá caso Lula da Silva seja candidato em 2022, diz o clichê de burrice sórdida que escorre da boca dos povos dos mercados desde a segunda-feira.
Bolsonaro não é coisa alguma além de um projeto de tirano. Não é um contraponto ao “esquerdismo” do PT porque, afora o horror, é um vazio. Quem o sustenta no poder, a elite econômica quase inteira, por colaboracionismo, outras ações e omissão, não tem mais desculpa alguma de desilusão quanto ao liberalismo do capitão da extrema direita, ideia que sempre foi grotesca. A elite colaboracionista ou omissa ora está na posição de ter contratado um capanga que saiu do controle, um dos capatazes que chamou para manter o PT longe do poder.
O lulismo-petismo, de resto, foi um projeto suave de incorporação de pobres ao universo do consumo, de chegada minoritária de algumas minorias ao poder, de imobilismo na reforma econômica e social de fundo, combinados a uma vasta distribuição de subsídios e outras proteções ao capital, fundos que financiaram a formação de conglomerados e oligopólios, fora a roubança, parte muito menor do jogo.
Ainda assim, boa parte da elite pagou e talvez ainda pague qualquer preço para manter o PT (ou equivalente) ao largo, mesmo que o custo seja Bolsonaro. Na melhor das hipóteses, gostaria de enfrentar o bolsonarismo com um vazio à esquerda, como se a vaga no segundo turno fosse conquistada por WO (ou por essas decisões escabrosas da Justiça). Mas mesmo quando Lula estava expulso de campo, mesmo a parte melhorzinha dessas elites foi incapaz de articular ou apoiar qualquer candidatura ou movimento político alternativo, o nome fantasia que tivesse, “centro”, “centro direita”. Agora mesmo dá corda para o interesse provisório do centrão, o que por ora dá corda para Bolsonaro.
A direita menos incivilizada do Brasil é incapaz de ganhar eleições nacionais desde 1998 —aliás, foi por isso que começou a apoiar o tumulto odiento em 2013 e, principalmente, depois da derrota de 2014. Desde então e até hoje, criou a situação que, de modo mendaz, chama de intolerável: alimenta o terror de Bolsonaro e faz o que pode para implodir qualquer esquerda.
Bolsonaro queria cancelar tudo isso, mas até a noite desta terça-feira, os deputados haviam decidido deixar a PEC como foi aprovada no Senado (onde já havia sido amputada e lipoaspirada).
Esse é o presidente e futuro candidato à reeleição comprometido com as “reformas” e o “ajuste fiscal”? Esse que não fez abertura comercial. Nenhuma privatização. Quase nenhuma concessão de empreendimento à iniciativa privada que não tivesse sido já preparada no governo Michel Temer. No seu governo, fez-se uma reforma da Previdência (em parte sabotada por Bolsonaro) que era consenso do establishment e que não contou com oposição popular quase nenhuma, nem da esquerda semimorta.
Esse é o candidato de um dos extremos da “polarização” que haverá caso Lula da Silva seja candidato em 2022, diz o clichê de burrice sórdida que escorre da boca dos povos dos mercados desde a segunda-feira.
Bolsonaro não é coisa alguma além de um projeto de tirano. Não é um contraponto ao “esquerdismo” do PT porque, afora o horror, é um vazio. Quem o sustenta no poder, a elite econômica quase inteira, por colaboracionismo, outras ações e omissão, não tem mais desculpa alguma de desilusão quanto ao liberalismo do capitão da extrema direita, ideia que sempre foi grotesca. A elite colaboracionista ou omissa ora está na posição de ter contratado um capanga que saiu do controle, um dos capatazes que chamou para manter o PT longe do poder.
O lulismo-petismo, de resto, foi um projeto suave de incorporação de pobres ao universo do consumo, de chegada minoritária de algumas minorias ao poder, de imobilismo na reforma econômica e social de fundo, combinados a uma vasta distribuição de subsídios e outras proteções ao capital, fundos que financiaram a formação de conglomerados e oligopólios, fora a roubança, parte muito menor do jogo.
Ainda assim, boa parte da elite pagou e talvez ainda pague qualquer preço para manter o PT (ou equivalente) ao largo, mesmo que o custo seja Bolsonaro. Na melhor das hipóteses, gostaria de enfrentar o bolsonarismo com um vazio à esquerda, como se a vaga no segundo turno fosse conquistada por WO (ou por essas decisões escabrosas da Justiça). Mas mesmo quando Lula estava expulso de campo, mesmo a parte melhorzinha dessas elites foi incapaz de articular ou apoiar qualquer candidatura ou movimento político alternativo, o nome fantasia que tivesse, “centro”, “centro direita”. Agora mesmo dá corda para o interesse provisório do centrão, o que por ora dá corda para Bolsonaro.
A direita menos incivilizada do Brasil é incapaz de ganhar eleições nacionais desde 1998 —aliás, foi por isso que começou a apoiar o tumulto odiento em 2013 e, principalmente, depois da derrota de 2014. Desde então e até hoje, criou a situação que, de modo mendaz, chama de intolerável: alimenta o terror de Bolsonaro e faz o que pode para implodir qualquer esquerda.
A falsa equivalência entre Lula e Bolsonaro
Comparações ajudam a um melhor entendimento do mundo. Podem ser usadas para determinar semelhanças e diferenças entre as coisas, que podem então ser melhor compreendidas em suas particularidades. Por exemplo, é possível comparar maçãs e peras. Ambas são pomos e crescem em árvores em climas temperados. Ambas são semelhantes em tamanho e são doces, embora maçãs ácidas também existam. As semelhanças acabam quando se trata de forma, cor e sabor específicos.
Embora nem todas as comparações sejam úteis – comparar uma maçã com um carro é de pouca utilidade –, elas são importantes para entender nosso mundo.
Infelizmente, a comparação analítica está fora de moda. Na discussão política de hoje, a analogia prevalece, ou seja, a equiparação. O nazismo e o comunismo são frequentemente igualados em vez de comparados, o que significa que nenhum dos dois sistemas totalitários pode ser compreendido de maneira adequada. Tudo se torna o mesmo mingau uniforme.
No Brasil, a tendência à analogia é particularmente pronunciada. O retorno de Lula da Silva ao cenário político mostra isso novamente com clareza. Esperando uma disputa pela presidência entre Jair Bolsonaro e Lula no próximo ano, os comentaristas já falam em uma batalha de extremos. "A extrema direita (Bolsonaro) compete com a extrema esquerda (Lula)". Insinua-se que os dois senhores são na verdade farinha do mesmo saco. Ambos são "populistas", diz-se – apequenando Lula e banalizando Bolsonaro.
É como ocorreu nas eleições de 2018. Na ocasião, o Estadão falava em uma "escolha muito difícil" entre o deputado Bolsonaro, que glorificava a violência, ("tem que matar 30 mil", "vamos fuzilar a petralhada", "ter filho gay é falta de porrada", etc.) e o professor universitário, ex-ministro da Educação e esquerdista moderado Fernando Haddad.
A grande mídia do Brasil e grande parte do establishment erraram no cálculo. O plano era derrubar Dilma Rousseff para obter um governo neoliberal de centro-direita. Mas o tiro saiu pela culatra. O golpe constitucional contra Dilma havia aberto a caixa de Pandora, e quem saltou dela foi Bolsonaro. Em vez de escolher a variante democrática, a decisão foi a favor de um homem que esteve no Parlamento por 30 anos e não fez nada além de produzir tiradas de efeito, insultar outras pessoas e colocar seus filhos na lucrativa política brasileira. Para justificar essa decisão fatal, lançaram mão da falsa analogia. "Bolsonaro e PT são iguais, mas Bolsonaro merece uma chance." Foi como oferecer o Brasil para um extremista experimentar.
Claramente, nada se aprendeu, apesar da catástrofe brasileira do coronavírus, com quase 300 mil mortos, que também pode ser atribuída ao maldoso presidente ("só se for na casa da tua mãe!"). Fingem que não há diferença entre a carreira de Lula, suas décadas de luta social e política, e a não exatamente notável carreira do capitão Bolsonaro, que por décadas empanturrou-se na gordura da política brasileira. Negam-se os avanços da área social e econômica no governo Lula e, ao mesmo tempo, fecham-se os olhos para as monstruosidades de Bolsonaro como, por exemplo, seu projeto armamentista ou suas fantasias totalitárias ("Se tudo tivesse que depender de mim, não seria esse o regime que nós estaríamos vivendo").
Logo Rodrigo Maia, o ex-presidente da Câmara dos Deputados, já reconheceu o absurdo dessa analogia. Ele tuitou: “Você não precisa gostar do Lula para entender a diferença dele para o Bolsonaro. Um tem visão de país; o outro só enxerga o próprio umbigo."
Maia fez, assim, algo que se tornou raro. Em vez de igualar, ele comparou. Porque ao comparar Lula e Bolsonaro, é impossível dizer que os dois são farinha do mesmo saco.
No entanto, na análise – e essa é a beleza das comparações –, chegamos às semelhanças. Por exemplo, que a política ambiental do Bolsonaro é uma catástrofe, mas a do PT também foi devastadora (Belo Monte!). Ou que a política de drogas do PT colocou muitos jovens negros atrás das grades por muitos anos devido a pequenas quantidades de maconha. Por último, mas não menos importante, o PT também criou um clima de intolerância para com as vozes críticas mais à esquerda.
No plano pessoal, Lula e Bolsonaro são semelhantes na medida em que são incapazes de admitir erros. Ambos se consideram infalíveis, e Lula continua a fingir que não houve corrupção em seu governo. Um pedido de desculpas e uma promessa de fazer melhor seriam muito mais convincentes.
Apesar dessas semelhanças parciais, não podemos negar as diferenças fundamentais entre Lula e Bolsonaro, como estão fazendo agora muitos meios de comunicação. É como se afirmassem não haver diferença entre a lenda do Vasco Roberto Dinamite e Ribamar, considerado o pior atacante do Vasco de todos os tempos. Porque ambos usavam a mesma camisa. Eles são comparáveis, mas não são similares. Um fez muitos gols, o outro perdia chances de gol.
Philipp Lichterbeck
Embora nem todas as comparações sejam úteis – comparar uma maçã com um carro é de pouca utilidade –, elas são importantes para entender nosso mundo.
Infelizmente, a comparação analítica está fora de moda. Na discussão política de hoje, a analogia prevalece, ou seja, a equiparação. O nazismo e o comunismo são frequentemente igualados em vez de comparados, o que significa que nenhum dos dois sistemas totalitários pode ser compreendido de maneira adequada. Tudo se torna o mesmo mingau uniforme.
No Brasil, a tendência à analogia é particularmente pronunciada. O retorno de Lula da Silva ao cenário político mostra isso novamente com clareza. Esperando uma disputa pela presidência entre Jair Bolsonaro e Lula no próximo ano, os comentaristas já falam em uma batalha de extremos. "A extrema direita (Bolsonaro) compete com a extrema esquerda (Lula)". Insinua-se que os dois senhores são na verdade farinha do mesmo saco. Ambos são "populistas", diz-se – apequenando Lula e banalizando Bolsonaro.
É como ocorreu nas eleições de 2018. Na ocasião, o Estadão falava em uma "escolha muito difícil" entre o deputado Bolsonaro, que glorificava a violência, ("tem que matar 30 mil", "vamos fuzilar a petralhada", "ter filho gay é falta de porrada", etc.) e o professor universitário, ex-ministro da Educação e esquerdista moderado Fernando Haddad.
A grande mídia do Brasil e grande parte do establishment erraram no cálculo. O plano era derrubar Dilma Rousseff para obter um governo neoliberal de centro-direita. Mas o tiro saiu pela culatra. O golpe constitucional contra Dilma havia aberto a caixa de Pandora, e quem saltou dela foi Bolsonaro. Em vez de escolher a variante democrática, a decisão foi a favor de um homem que esteve no Parlamento por 30 anos e não fez nada além de produzir tiradas de efeito, insultar outras pessoas e colocar seus filhos na lucrativa política brasileira. Para justificar essa decisão fatal, lançaram mão da falsa analogia. "Bolsonaro e PT são iguais, mas Bolsonaro merece uma chance." Foi como oferecer o Brasil para um extremista experimentar.
Claramente, nada se aprendeu, apesar da catástrofe brasileira do coronavírus, com quase 300 mil mortos, que também pode ser atribuída ao maldoso presidente ("só se for na casa da tua mãe!"). Fingem que não há diferença entre a carreira de Lula, suas décadas de luta social e política, e a não exatamente notável carreira do capitão Bolsonaro, que por décadas empanturrou-se na gordura da política brasileira. Negam-se os avanços da área social e econômica no governo Lula e, ao mesmo tempo, fecham-se os olhos para as monstruosidades de Bolsonaro como, por exemplo, seu projeto armamentista ou suas fantasias totalitárias ("Se tudo tivesse que depender de mim, não seria esse o regime que nós estaríamos vivendo").
Logo Rodrigo Maia, o ex-presidente da Câmara dos Deputados, já reconheceu o absurdo dessa analogia. Ele tuitou: “Você não precisa gostar do Lula para entender a diferença dele para o Bolsonaro. Um tem visão de país; o outro só enxerga o próprio umbigo."
Maia fez, assim, algo que se tornou raro. Em vez de igualar, ele comparou. Porque ao comparar Lula e Bolsonaro, é impossível dizer que os dois são farinha do mesmo saco.
No entanto, na análise – e essa é a beleza das comparações –, chegamos às semelhanças. Por exemplo, que a política ambiental do Bolsonaro é uma catástrofe, mas a do PT também foi devastadora (Belo Monte!). Ou que a política de drogas do PT colocou muitos jovens negros atrás das grades por muitos anos devido a pequenas quantidades de maconha. Por último, mas não menos importante, o PT também criou um clima de intolerância para com as vozes críticas mais à esquerda.
No plano pessoal, Lula e Bolsonaro são semelhantes na medida em que são incapazes de admitir erros. Ambos se consideram infalíveis, e Lula continua a fingir que não houve corrupção em seu governo. Um pedido de desculpas e uma promessa de fazer melhor seriam muito mais convincentes.
Apesar dessas semelhanças parciais, não podemos negar as diferenças fundamentais entre Lula e Bolsonaro, como estão fazendo agora muitos meios de comunicação. É como se afirmassem não haver diferença entre a lenda do Vasco Roberto Dinamite e Ribamar, considerado o pior atacante do Vasco de todos os tempos. Porque ambos usavam a mesma camisa. Eles são comparáveis, mas não são similares. Um fez muitos gols, o outro perdia chances de gol.
Philipp Lichterbeck
Lula candidato
O ministro Edson Fachin sacudiu o coreto das autoridades anulando as sentenças de Curitiba contra o ex-presidente Lula, devolvendo-lhe os direitos políticos. Hoje, Lula pode ser candidato a presidente no ano que vem.
O voto de Gilmar Mendes na Segunda Turma ilustrou a suspeição de Sergio Moro. Com a decisão de Fachin, o caroço migrou para a elegibilidade de Lula e para o previsível desconforto que isso provoca em quem o detesta. Numa frase: “Esse não pode”.
Lula poderá vir a ser condenado por um novo juiz, mas a sentença ficará com cheiro de gol feito durante o replay.
O “esse não pode” já custou caro ao Brasil. Em 1950, o jornalista Carlos Lacerda escreveu:
—O sr. Getúlio Vargas, senador, não deve ser candidato. Candidato, não deve ser eleito. Eleito, não deve tomar posse. Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar.
Getúlio foi eleito, tomou posse, governou até agosto de 1954, matou-se e entrou na História. A revolução que Lacerda queria só veio dez anos depois.
Lacerda tinha credenciais para vencer a eleição de 1965. Fazia um governo estelar no falecido Estado da Guanabara, mas deveria disputar com o ex-presidente Juscelino Kubitschek, que dera ao Brasil “50 anos em cinco”. Até os primeiros meses de 1964, circulavam dois tipos de “esse não pode”. A esquerda não queria uma vitória de Lacerda, e uma parte da direita não queria a volta de Kubitschek.
Depois da deposição de João Goulart, a base militar da nova ordem não admitia entregar o poder a JK. Lacerda gostou da ideia, e o ex-presidente foi cassado. Por quê? Corrupção. (A sinopse diária que a Central Intelligence Agency deu ao presidente Lyndon Johnson no dia 13 de junho de 1964 contou que o presidente Castello Branco via na proscrição de JK o caminho para um governo “democrático e honesto”. Ele já havia dito que mostrar as provas “seria embaraçoso para a Nação”.) Não era bem assim.
Dias antes, fritando JK, o general Golbery do Couto e Silva, conselheiro de Castello, dividiu uma folha de papel em colunas e listou as “vantagens” e “desvantagens” da cassação de Juscelino Kubitschek. Intitulou-a com a sinceridade que se dá aos papéis pessoais: “Motivação real — Impedir que JK, fortalecido pela campanha contrária, enfrente a Revolução”. E, assim, Juscelino foi banido da vida pública por dez anos. Quando ele morreu, num acidente de estrada, seu funeral se transformou na maior manifestação popular ocorrida no país desde 1968, quando as ruas foram esvaziadas pelo AI-5.
Sem o “esse não pode”, em 1965 os eleitores brasileiros teriam votado em Lacerda ou JK. Nunca na História republicana o Brasil teve dois candidatos tão qualificados. Nem antes, nem depois. Passados os anos, nas duas turmas do “esse não pode”, muita gente qualificada reconhecia que qualquer um dos dois teria feito melhor do que se fez. (Lacerda, que defendeu a cassação de JK, dormiu preso num jirau de quartel em dezembro de 1968 e tornou-se uma alma penada na política nacional.)
O “PT não” colocou Jair Bolsonaro na Presidência. Os eleitores podiam ter colocado Geraldo Alckmin, Ciro Gomes ou João Amôedo, mas quem teve mais votos foi o capitão.
Falta mais de um ano para a eleição do ano que vem. Bolsonaro quer um novo mandato, e as inscrições estão abertas.
O voto de Gilmar Mendes na Segunda Turma ilustrou a suspeição de Sergio Moro. Com a decisão de Fachin, o caroço migrou para a elegibilidade de Lula e para o previsível desconforto que isso provoca em quem o detesta. Numa frase: “Esse não pode”.
Lula poderá vir a ser condenado por um novo juiz, mas a sentença ficará com cheiro de gol feito durante o replay.
O “esse não pode” já custou caro ao Brasil. Em 1950, o jornalista Carlos Lacerda escreveu:
—O sr. Getúlio Vargas, senador, não deve ser candidato. Candidato, não deve ser eleito. Eleito, não deve tomar posse. Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar.
Getúlio foi eleito, tomou posse, governou até agosto de 1954, matou-se e entrou na História. A revolução que Lacerda queria só veio dez anos depois.
Lacerda tinha credenciais para vencer a eleição de 1965. Fazia um governo estelar no falecido Estado da Guanabara, mas deveria disputar com o ex-presidente Juscelino Kubitschek, que dera ao Brasil “50 anos em cinco”. Até os primeiros meses de 1964, circulavam dois tipos de “esse não pode”. A esquerda não queria uma vitória de Lacerda, e uma parte da direita não queria a volta de Kubitschek.
Depois da deposição de João Goulart, a base militar da nova ordem não admitia entregar o poder a JK. Lacerda gostou da ideia, e o ex-presidente foi cassado. Por quê? Corrupção. (A sinopse diária que a Central Intelligence Agency deu ao presidente Lyndon Johnson no dia 13 de junho de 1964 contou que o presidente Castello Branco via na proscrição de JK o caminho para um governo “democrático e honesto”. Ele já havia dito que mostrar as provas “seria embaraçoso para a Nação”.) Não era bem assim.
Dias antes, fritando JK, o general Golbery do Couto e Silva, conselheiro de Castello, dividiu uma folha de papel em colunas e listou as “vantagens” e “desvantagens” da cassação de Juscelino Kubitschek. Intitulou-a com a sinceridade que se dá aos papéis pessoais: “Motivação real — Impedir que JK, fortalecido pela campanha contrária, enfrente a Revolução”. E, assim, Juscelino foi banido da vida pública por dez anos. Quando ele morreu, num acidente de estrada, seu funeral se transformou na maior manifestação popular ocorrida no país desde 1968, quando as ruas foram esvaziadas pelo AI-5.
Sem o “esse não pode”, em 1965 os eleitores brasileiros teriam votado em Lacerda ou JK. Nunca na História republicana o Brasil teve dois candidatos tão qualificados. Nem antes, nem depois. Passados os anos, nas duas turmas do “esse não pode”, muita gente qualificada reconhecia que qualquer um dos dois teria feito melhor do que se fez. (Lacerda, que defendeu a cassação de JK, dormiu preso num jirau de quartel em dezembro de 1968 e tornou-se uma alma penada na política nacional.)
O “PT não” colocou Jair Bolsonaro na Presidência. Os eleitores podiam ter colocado Geraldo Alckmin, Ciro Gomes ou João Amôedo, mas quem teve mais votos foi o capitão.
Falta mais de um ano para a eleição do ano que vem. Bolsonaro quer um novo mandato, e as inscrições estão abertas.
Brazuela, avante!
Aquele Brasil quase civilizado acabou. Não tem volta. Vamos ter de inventar outro. O golpe bolivariano foi lá atrás, com a esculhambação geral do STF. Agora estão só colhendo o que plantaram. A 6ª economia do mundo corre célere e constitucionalmente … para o bolso da privilegiatura. Mas isso não dá manchete. Seremos nós a Índia que a Índia está deixando de ser.
A ameaça do estado de sítio
Ouvir a expressão estado de sítio da boca de Jair Bolsonaro causa calafrios. Como o presidente parece gostar de causar repulsa nos brasileiros, ele vira e mexe vem com essa de estado de sítio, sempre lembrando, como fez nesta terça-feira, que é sua prerrogativa decretá-lo.
Bolsonaro não fala disso à toa. A nova menção despropositada à medida extrema veio totalmente fora de contexto, como sempre: o presidente a comparou às medidas restritivas adotadas pelos governadores para conter o avanço da mortandade desenfreada da pandemia.
O presidente pode ter sido expulso cedo do Exército e não ser muito versado na Constituição, mas ele sabe muito bem que essas medidas não guardam qualquer semelhança com estado de sítio.
Ao lançar a expressão ao léu e ainda mencionar o artigo 141 da Constituição, que seus seguidores adoram evocar para pregar intervenção militar, distorcendo seu sentido, o presidente lança uma isca para esses fanáticos na linha “quem manda sou eu”, “eu que tenho a caneta Bic”, o tipo de bravata que adora lançar quando está acuado.
E motivos não faltam para que o capitão esteja acuado: ele está a cada dia ficando mais encurralado pela sua própria obra criminosa no curso de um ano de pandemia.
A redução diária do chute travestido de previsão de vacinas feito pelo general Pazuello quanto à quantidade de doses de vacinas que estará disponível neste mês de março de carnificina nacional, a insistência do STF em cobrar, de forma cada vez mais dura, que o governo federal aja na compra desses imunizantes e no suporte aos Estados para enfrentar o colapso iminente do sistema de saúde e a pressão pela CPI da covid-19, que envolve diversos partidos, movimentos de direita antes condescendentes com o bolsonarismo, como o Vem pra Rua, e que já desaguou no mesmo Supremo fazem o sinal de alerta de Bolsonaro pulsar.
Mas o que o atormenta de verdade, e isso está cada vez mais claro, é a volta de Lula ao cenário eleitoral. E aqui é que reside a gravidade da cartada de falar em estado de sítio neste momento.
Num governo coalhado de militares, e diante da indisposição da cúpula sobretudo do Exército com Lula e o PT, expressada em diversas ocasiões, como no tuíte do general Villas Boas advertindo o STF em 2018, esse tipo de exortação irresponsável pode resultar em uma movimentação da caserna em reação à anulação das condenações do petista.
Na mesma fala, Bolsonaro ainda incitou seus malucos, da forma como sempre faz, falando como que a título de preocupação, a promoverem quebra-quebra e saques. O bolsonarismo sempre funciona assim: o “mito" lança a ideia e sempre há malucos para executarem.
Foi assim nos atos antidemocráticos e também quando ele numa live mandou as pessoas invadirem hospitais de campanha para filmar. Parecia da boca para fora, mas sempre há pessoas dispostas a difundir e executar esse tipo de comando golpista que parte do presidente da República.
Os tais quebra-quebras e saques seriam o pretexto que ele quer para falar de estado de sítio de forma menos “teórica”? Ao falar em greve, o presidente também dá uma senha aos caminhoneiros, que têm sido adulados por ele justamente pelo poder que têm de tornar a população refém de seus motins.
Bolsonaro tem de ser levado a sério em seus arroubos, porque sua tendência autoritária não é apenas retórica, ela se manifesta em atos e decisões de governo e os exemplos são inúmeros.
Com espaços importantes do Congresso dominados por fanáticos bolsonaristas, como as comissões, esse tipo de menção a desordem e estado de sítio têm de receber reprimenda imediata, inequívoca e dura por parte dos ministros do STF, da OAB e de todos os que têm compromisso com a preservação da democracia.
Bolsonaro não fala disso à toa. A nova menção despropositada à medida extrema veio totalmente fora de contexto, como sempre: o presidente a comparou às medidas restritivas adotadas pelos governadores para conter o avanço da mortandade desenfreada da pandemia.
O presidente pode ter sido expulso cedo do Exército e não ser muito versado na Constituição, mas ele sabe muito bem que essas medidas não guardam qualquer semelhança com estado de sítio.
Ao lançar a expressão ao léu e ainda mencionar o artigo 141 da Constituição, que seus seguidores adoram evocar para pregar intervenção militar, distorcendo seu sentido, o presidente lança uma isca para esses fanáticos na linha “quem manda sou eu”, “eu que tenho a caneta Bic”, o tipo de bravata que adora lançar quando está acuado.
E motivos não faltam para que o capitão esteja acuado: ele está a cada dia ficando mais encurralado pela sua própria obra criminosa no curso de um ano de pandemia.
A redução diária do chute travestido de previsão de vacinas feito pelo general Pazuello quanto à quantidade de doses de vacinas que estará disponível neste mês de março de carnificina nacional, a insistência do STF em cobrar, de forma cada vez mais dura, que o governo federal aja na compra desses imunizantes e no suporte aos Estados para enfrentar o colapso iminente do sistema de saúde e a pressão pela CPI da covid-19, que envolve diversos partidos, movimentos de direita antes condescendentes com o bolsonarismo, como o Vem pra Rua, e que já desaguou no mesmo Supremo fazem o sinal de alerta de Bolsonaro pulsar.
Mas o que o atormenta de verdade, e isso está cada vez mais claro, é a volta de Lula ao cenário eleitoral. E aqui é que reside a gravidade da cartada de falar em estado de sítio neste momento.
Num governo coalhado de militares, e diante da indisposição da cúpula sobretudo do Exército com Lula e o PT, expressada em diversas ocasiões, como no tuíte do general Villas Boas advertindo o STF em 2018, esse tipo de exortação irresponsável pode resultar em uma movimentação da caserna em reação à anulação das condenações do petista.
Na mesma fala, Bolsonaro ainda incitou seus malucos, da forma como sempre faz, falando como que a título de preocupação, a promoverem quebra-quebra e saques. O bolsonarismo sempre funciona assim: o “mito" lança a ideia e sempre há malucos para executarem.
Foi assim nos atos antidemocráticos e também quando ele numa live mandou as pessoas invadirem hospitais de campanha para filmar. Parecia da boca para fora, mas sempre há pessoas dispostas a difundir e executar esse tipo de comando golpista que parte do presidente da República.
Os tais quebra-quebras e saques seriam o pretexto que ele quer para falar de estado de sítio de forma menos “teórica”? Ao falar em greve, o presidente também dá uma senha aos caminhoneiros, que têm sido adulados por ele justamente pelo poder que têm de tornar a população refém de seus motins.
Bolsonaro tem de ser levado a sério em seus arroubos, porque sua tendência autoritária não é apenas retórica, ela se manifesta em atos e decisões de governo e os exemplos são inúmeros.
Com espaços importantes do Congresso dominados por fanáticos bolsonaristas, como as comissões, esse tipo de menção a desordem e estado de sítio têm de receber reprimenda imediata, inequívoca e dura por parte dos ministros do STF, da OAB e de todos os que têm compromisso com a preservação da democracia.
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