segunda-feira, 30 de julho de 2018

Paisagem brasileira

Rua Direita em Grão Mogol (MG)

Caciques continuam tratando eleitor como gado

Quase tudo na sucessão de 2018 se parece com eleições anteriores, menos o eleitor. Os caciques fazem política com os pés no mundo da Lua, onde não há corrupção nem desemprego. Promovem os mesmos cambalachos de sempre. O feitiço pode virar urucubaca, pois o brasileiro amarga uma descida pelos nove círculos do inferno. E acha que não merece a excursão. Agora, às vésperas de uma nova eleição, a cabine de votação se confunde com uma visão do purgatório. O voto parece instrumento de purificação. Em órbita, candidatos e dirigentes partidários não se deram conta de que um pedaço do eleitorado está desconfortável no papel de gado.

Geraldo Alckmin acredita que seu desempenho pífio como presidenciável mudará a partir de 31 de agosto, quando começa o horário eleitoral na televisão. Por isso, vendeu a prataria para juntar cerca de 40% da propaganda eletrônica. Parte da plutocracia torce para que ele alce voo. Mas não há ricos suficientes no Brasil para eleger um presidente. E o discurso de Alckmin, por ora, mal convence os crédulos. A plateia corre o risco de ouvir o candidato durante vários minutos para chegar à conclusão de que ele não tem nada a dizer. Ou pior: se o voo for artificial, o tucano será confundido com um drone guiado por controle remoto pela marquetagem.

Ao atrair todo o centrão para o seu colo, Alckmin impediu que seus rivais capturassem nacos do tempo de propaganda dos partidos que integram o grupo. Com isso, deu a Ciro Gomes e Jair Bolsonaro a oportunidade de cuspir no prato em que não conseguiram comer. De quebra, ofereceu aos cerca de 40% de eleitores que ainda se declaram sem candidato o direito continuar repetindo que “são todos farinha do mesmo pacote”. Sem perceber, os contendores podem estar jogando um jogo de soma zero, em que nenhum deles amplia sua base de eleitores.

A ruína de Dilma Rousseff e o fiasco de Michel Temer pareciam tornar as coisas mais fáceis. Tão fáceis que qualquer espertalhão poderia passar a campanha trombeteando que, eleito, restauraria a moralidade e traria de volta a prosperidade. O vaivém do centrão e o balé de elefantes em que se converteu a escolha dos vices estimulou na banda desconfiada do eleitorado a crença de que não se deve confundir muitos com pluralidade, adesão com habilidade, pernóstico com sumidade, pose com dignidade, lero-lero com honestidade…

Campeão do horário eleitoral, Alckmin é uma nulidade nas redes sociais —um território em que Ciro e, sobretudo, Bolsonaro utilizam para cavalgar o desalento do eleitor. O problema é que a dupla exagera na raiva. Se Deus oferecesse temperança a Ciro, o candidato se empenharia para provar que Deus não existe. Quanto a Bolsonaro, tornou-se líder de intenção de votos e de rejeição. Conquistou eleitores misturando Deus à defesa de teses esdrúxulas. E acabou convencendo o naco do eleitorado que o rejeita de que Deus não merece existir.

Uma campanha que começa com as marcas da polêmica e da ferocidade, poderia fazer muito bem à candidatura de Marina Silva. Ela exala serenidade, não precisa fingir que veio de baixo, abomina “as megaestruturas” e conserva a biografia longe dos pesticidas da Lava Jato. Entretanto, tomada pelo desempenho, Marina vai se consolidando como uma personagem admiravelmente indecifrável para a maioria da plateia. A liderança e as concepções “marineiras” já afugentam até os correligionários da Rede. Marina costuma dizer que prefere “perder ganhando a ganhar perdendo.” Pode voltar para casa com 20 milhões de votos pela terceira vez.

Na galeria dos vitoriosos perdedores, Marina só não conseguirá superar Lula. Preso em Curitiba, o pajé do PT leva sua candidatura cenográfica às fronteiras do paroxismo. Lidera as pesquisas. Mas sabe que a ficha suja levará a Justiça Eleitoral a excluir sua foto da urna. Se tudo correr como planejado, deflagrará o Plano B do PT em meados de setembro. É como pedisse aos brasileiros para esquecer que Dilma, seu último poste, resultou num inesquecível curto-circuito.

É grande o prestígio do presidiário do PT. Entretanto, segundo a mais recente pesquisa do Datafolha, divulgada no mês passado, 51% dos eleitores informam que não entregariam o seu voto a um candidato indicado por Lula. Impossível prever quem será o próximo presidente. Mas já é possível constatar que o curral diminuiu.

Paraíso do privilégio

O Brasil hoje não funciona porque é um país de privilégios. Para vários grupos. Para políticos, funcionários públicos, grupos empresariais, Judiciário
João Amoêdo, pré-candidato e Fundador do NOVO

Ninguém segura!

Olho pela janela. Contemplo uma procissão de retirantes. Fogem dos tiroteios de um morro próximo. De cabeça baixa, retratando uma humilhação que nos atinge a todos, seguem pela rua afora carregando suas trouxas. Muitos terão como casa a vida e como endereço o mundo.

Mas há algo errado na cena: a procissão segue em silêncio! Eis o que falta: uma trilha sonora adequada ao quadro! Talvez o “Requiem” de Wolfgang Amadeus Mozart. Ou o de Gabriel Fauré. Surpreendentemente, no entanto, ela surge, pelas mãos de torcedores reunidos em um prédio próximo! Agitando bandeiras do Brasil, celebrando a Copa do Mundo realizada na Rússia, começam a cantar e exclamar um sonoro “Viva o Brasil”!

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Animadamente, chegam ao refrão da música, uma certa “Eu te amo meu Brasil”, atribuída aos “Incríveis” (e nunca tão oportuna a referência). Cantam, a plenos pulmões, “Eu te amo, meu Brasil, eu te amo. Ninguém segura a juventude do Brasil”. Deve ser verdade – que o digam os retirantes.

A triste procissão segue seu curso. Passa diante de reluzentes prédios públicos – muitos deles abrigando importantes instituições, daquelas simbolizadas por vetustos brasões e símbolos magnos da república. À porta, tremulam os pavilhões nacional e estadual. E prossegue o fundo musical: “Eu vou ficar aqui, porque existe amor”.

Converso com um dos retirantes, meu conhecido de longa data. Com o olhar sem brilho e a voz embargada, me descreve o horror da noite anterior, entrecortada por disparos de revólver e metralhadora. Ao nosso lado, a música continua: “As noites do Brasil tem mais beleza, lá, lá, lá, lá”.

Sou apresentado, por intermédio de uma senhora, às lágrimas de sua neta, traumatizada pela cena dos meliantes portando armas pesadas ostensivamente, à luz do dia, e dos cadáveres que produzem impunemente. Com o coração apertado pela desesperança que testemunho na face daquela criança, mais música chega aos meus ouvidos: “Mulatas brotam cheias de calor. No Carnaval, os gringos querem vê-las”.

Vejo a procissão dobrando a esquina da rua e da vida. Ouço a música ao fundo. Passa-me pela mente a orquestra do tristemente célebre navio Titanic, embalando, com seus acordes, um naufrágio de proporções dantescas. Mas logo afasto qualquer associação com o quadro que vejo – afinal, lá a música traduzia compaixão.
Pedro Valls Feu Rosa

Pensamento do Dia


A pomba e o corvo do almanaque eleitoral

Uma lenda talmúdica que li em Eça de Queiroz conta que, às vésperas do Dilúvio, dois videntes, sabendo das malévolas intenções de Deus, resolveram fazer um almanaque.

Temerosos de que depois daquela primeira Humanidade, os novos homens teriam que partir outra vez do zero, que, aliás, ainda não existia, pois a própria Arca de Noé foi calculada sem o zero, os dois anciãos pretendiam reunir os saberes já acumulados, com o fim de garantir que a nova Humanidade tivesse por onde começar de novo.

Também a palavra almanaque ainda não existia. Ela designará, muito mais tarde, o verbo que identifica o ato do camelo se ajoelhar. Ora, os camelos não se ajoelham onde querem, mas onde os viajantes das caravanas mandam. Porque, para os homens como para os animais, manda quem pode e obedece quem precisa.


Cultores do bom estilo, dizendo muito com poucas palavras, os dois anciãos precisaram de apenas três dias para reunir o saber epocal, fazendo em rochas, pedras e tijolos os registros imperecíveis de uma enciclopédia cujo título foi Livro de Todo-o-Saber.

As primeiras estiletadas marcaram a data do começo do mundo, as jornadas dos astros no Céu, vistas pelo Zodíaco, especialmente do Sol, da Lua e de algumas estrelas referenciais, como Vênus ou Estrela D’Alva, que, sendo a mesma, pela manhã deu nome ao Amor e ao Demônio, e ao entardecer tornou-se Vésper.

Os dois velhos reuniram o que já se sabia: a melhor época de plantar e de colher, como e quando tosquiar as ovelhas, como aproveitar a lã, forjar o ferro, amassar o barro, atrair e domesticar abelhas e lobos, tornando-os produtores de mel e guardiães da casa; que ervas usar como chás para isso ou aquilo, que substâncias pôr nos ferimentos, como entender registros que tinham permanecido, como as tábuas de pesos e medidas, alguns códigos de direito primitivo, que prescreviam como examinar e julgar os conflitos, que castigos e que penas impor etc.

Certamente não faltariam nestes registros alguns versos ou frases que resumiriam, às vezes de forma poética, a arte de viver, em paz ou em guerra, conforme fosse necessário.

Terão os brasileiros que fazer o que fizeram os dois velhos da lenda talmúdica? Como estão se desenhando as próximas eleições presidenciais, parece que sim. Deixemos, pois, registrado em algum lugar, como se faz orçamento, como se combate a inflação (sim, é preciso combatê-la), como se cuida da saúde, da educação, dos transportes, da segurança e de outros temas fundamentais para que o eleito não resolva inventar a roda.

E, assim, depois da longa quarentena do Dilúvio e de outras destruições que se avizinham, alguns corvos que ora adejam por aí, da mesma família daquele que Noé soltou, voltarão a sobrevoar, mas não encontrarão onde pousar e voltarão a seus galhos.

Será então a vez de soltar a pomba. Como aprendemos em outro almanaque, ela fará três viagens. Na primeira, voltará à Arca sem nada. Na segunda, voltará com um ramo verde no bico. E da terceira viagem ela não voltará e só então poderemos descer para recomeçar.
Deonísio da Silva

Bico, o grande empregador

Entre janeiro e junho deste ano, 64,4% dos trabalhadores brasileiros fizeram bico para pagar as contas. Entre as classes de menor renda, a fatia salta para 70% em busca de trabalhos informais para complementar a renda
O Estado de S.Paulo 

Sabichões a brincar aos pobrezinhos (ou Em Portugal como aqui)

Era uma vez um paraíso à beira-mar que poucos sabiam que existia. Nesse paraíso, havia praias de areia branca a perder de vista, mar quente e transparente, casinhas de paredes caiadas e tetos de colmo, mesmo ali junto à costa. Um cenário idílico para quem queria fugir dos luxos da cidade e descansar no meio da Natureza, pouco importavam os mosquitos. As casinhas, tão românticas, pertenciam aos agricultores, que rapidamente foram sendo empurrados para paragens mais distantes e menos interessantes, deixando as zonas nobres para os endinheirados que tinham descoberto um paraíso chamado Comporta. Vieram os administradores da herdade e a família Espírito Santo, vieram os amigos deles e ainda os amigos dos amigos, tão simpáticos.

Em poucos anos, o espaço virou um condomínio privado de luxo com portões trancados a código, e com uma praia praticamente privativa de tão inacessível. As casinhas de colmo mantiveram o charme inicial, mas conquistaram espaço, piscinas e terrenos circundantes, fazendo deste um sítio perfeito para, já se sabe, brincar aos pobrezinhos. Foram galinheiros transformados em residências charmosas, foram anexos transformados em moradias de 400 metros quadrados, foram tanques transformados em piscinas azuis infinitas – porque isso de brincar aos pobrezinhos tem piada, mas há mínimos.

Tudo foi feito, já se sabe, meio à  socapa, meio à descarada, passando  nos intervalos da chuva das regras da zona de paisagem protegida e contando com a benesse das autoridades – toda a gente sabia que aquela era a coutada dos Espírito Santo e dos amigos e que  as coisas se iam ajustando à sua vontade.

Num país servil aos poderosos, preferimos andar atrás dos anexos e das marquises em bairros de classe baixa  do que afrontar interesses instalados. Depois da queda do BES e da desgraça de Ricardo Salgado é que a festa acabou e tudo se complicou. Como relata a VISÃO nesta edição, dos quatro inquéritos-crime abertos entre 2014 e 2017, três estão no Departamento de Investigação e Ação Penal e já foram constituídos dez arguidos, tendo sido encontrados fortes indícios de corrupção, tráfico de influências, recebimento indevido, falsificação de documentos e violação das regras de construção. Estima-se que foram feitas mais de 100 obras ilegais, 74 sem qualquer licença ou autorização camarária. À auditoria demolidora não escapou sequer o príncipe Louis-Albert de Broglie, que fez em abril capa da VISÃO – a primeira vez que veio a público dar conta da sua intenção de comprar a herdade. O Ministério Público acredita que três construções que fez nos seus terrenos foram ilegalmente aprovadas pela câmara, um imbróglio legal que será complexo de resolver.

Abrem-se agora pudicamente várias bocas de espanto para o que toda a gente sabia que vinha a acontecer há décadas. Entre os arguidos contam--se administradores da herdade, mas sobretudo autarcas e arquitetos da câmara que, alegadamente, foram coniventes com estes processos. Como é óbvio, dificilmente poderia ser de outra maneira...

Tudo isto se sabe literalmente em vésperas de ser decidida a compra daqueles cobiçados (e preciosos) terrenos, para os quais concorrem o dito príncipe francês (que subiu a parada à ultima hora), a Oakvest e o consórcio de Paula Amorim e Claude Breda. É uma boa oportunidade para arrumar com a pouca-vergonha

e emendar a mão a décadas de compadrios, facilitismos e conivências. Tal como dissemos na semana passada quando reportámos os esquemas suspeitos na reconstrução de Pedrógão, está na hora de acabar de vez com a tolerância em relação à chico-espertice nacional.

Mafalda AnjosEditorial da VISÃO 

Jornalismo, alma da democracia

Não existe um único assunto relevante que não tenha nascido numa pauta do jornalismo de qualidade. Os temas das nossas conversas são, frequentemente, determinados pelo noticiário e pela opinião dos jornais. A imprensa é, de fato, o oxigênio da sociedade. Sem ela as sociedades sucumbem às recorrentes aventuras populistas e autoritárias.

As redes sociais reverberam, multiplicam, agitam. Mas o pontapé inicial é sempre das empresas de conteúdo independentes. Sem elas a democracia não funciona.


O jornalismo não é antinada. Mas também não é neutro. É um espaço de contraponto. Seu compromisso não está vinculado aos ventos passageiros da política e dos partidarismos. Sua agenda é, ou deveria ser, determinada por valores perenes: liberdade, dignidade humana, respeito às minorias, promoção da livre-iniciativa, abertura ao contraditório. Por isso os jornais são fustigados pelos que, à esquerda e à direita, desenham projetos autoritários de poder.

O jornalismo sustenta a democracia não com engajamentos espúrios, mas com a força informativa da reportagem e com o farol de uma opinião firme, mas equilibrada e magnânima. A reportagem é, sem dúvida, o coração da mídia.

As redes sociais e o jornalismo cidadão têm contribuído de forma singular para o processo comunicativo e propiciado novas formas de participação, de construção da esfera pública, de mobilização do cidadão. Suscitam debates, geram polêmicas, algumas com forte radicalização, exercem pressão. Mas as notícias que realmente importam, aquelas que são capazes de alterar os rumos de um país, são fruto não de boatos ou meias-verdades disseminadas de forma irresponsável ou ingênua, mas resultam de um trabalho investigativo feito dentro de rígidos padrões de qualidade, algo que está na essência dos bons jornais.

A confiança da população na qualidade ética dos seus jornais tem sido um inestimável apoio para o desenvolvimento de um verdadeiro jornalismo de buldogues. O combate à corrupção e o enquadramento de históricos caciques da política nacional, alguns acertando suas contas na prisão e outros sofrendo o ostracismo do poder, só são possíveis graças à força do binômio que sustenta a democracia: imprensa livre e opinião pública informada.

Poucas coisas podem ter o mesmo impacto que o jornal tem sobre os funcionários públicos corruptos, sobre os políticos que se ligam ao crime, que abusam do seu poder, que traem os valores e os princípios democráticos. Políticos e governantes com desvios de conduta odeiam os jornais. Mas estes são, de longe, os grandes parceiros da sociedade, a alma da democracia.

Navega-se freneticamente no espaço virtual. Uma enxurrada de estímulos dispersa a inteligência. Fica-se refém da superficialidade e do vazio. Perdem-se contexto e sensibilidade crítica. A fragmentação dos conteúdos pode transmitir certa sensação de liberdade. Não dependemos, aparentemente, de ninguém. Somos os editores do nosso diário personalizado. Será?

Não creio, sinceramente. Penso que existe uma crescente demanda de jornalismo puro, de conteúdos editados com rigor, critério e qualidade técnica e ética. Há uma nostalgia de reportagem. É preciso recuperar, num contexto muito mais transparente e interativo, as competências e o fascínio do jornalismo de sempre.

Jornalismo sem brilho e sem alma é uma perigosa doença que pode contaminar redações. O leitor não sente o pulsar da vida. As reportagens não têm cheiro do asfalto. As empresas precisam repensar os seus modelos e investir poderosamente no coração. É preciso dar novo vigor à reportagem e ao conteúdo bem editado, sério, preciso, ético.

É preciso contar boas histórias. E apurar com verdadeiro empenho de isenção. A apuração de mentira representa uma das mais graves agressões à ética e à qualidade informativa. Matérias previamente decididas em guetos sectários buscam a cumplicidade da imparcialidade aparente. A decisão de ouvir o outro lado não é honesta, não se apoia na busca da verdade, mas num artifício que transmite um simulacro de isenção, uma ficção de imparcialidade. O assalto à verdade culmina com uma estratégia exemplar: repercussão seletiva. O pluralismo de fachada, hermético e dogmático, convoca pretensos especialistas para declarar o que o repórter quer ouvir. Mata-se a notícia. Cria-se a versão.

Frequentemente, também se sucumbe ao politicamente correto. Certas matérias, prisioneiras de chavões inconsistentes que há muito deveriam ter sido banidos das redações, mostram o flagrante descompasso entre essas interpretações e a força eloquente dos números e dos fatos. Resultado: a credibilidade, verdadeiro capital de um veículo, se esvai pelo ralo dos preconceitos.

A precipitação e a falta de rigor são outros vírus que ameaçam a qualidade. A incompetência foge dos bancos de dados. Na falta de pergunta inteligente, a ditadura das aspas ocupa o lugar da informação. O jornalismo de registro, burocrático e insosso, é o resultado acabado de uma perversa patologia: a falta de planejamento e a obsessão de editores com o fechamento. Quando editores não formam os seus repórteres, quando a qualidade é expulsa pela ditadura do deadline, quando as pautas não nascem da vida real, mas de pauteiros anestesiados pelo clima rarefeito das redações, é preciso ter a coragem de repensar todos os processos.

Estamos em ano eleitoral. Os leitores esperam algo mais do que aspas, fofoca, intriga política e marketing superficial. Querem bons perfis dos candidatos, análise aprofundada das suas propostas, desconstrução de miragens demagógicas e populistas.

A fortaleza do jornal não é dar notícia, é se adiantar e investir em análise, interpretação e se valer de sua credibilidade. Não é verdade que o público não goste de ler. Não lê o que não lhe interessa, o que não tem substância. Um bom texto, para um público que adquire a imprensa de qualidade, sempre vai ter interessados.