quarta-feira, 20 de abril de 2016

dalcio

Onde está a certeza?

O certo — diz uma voz dentro de mim neste histórico domingo, 17 de abril, é uma coisa, a certeza é outra. Será preciso começar fazendo essa distinção.

O certo persegue a certeza, sendo a razão imperativa para que as certezas criem convicções e engendrem ações generosas e positivas para o Brasil.

O certo é simples: nenhuma coletividade de massa nesta era de simultaneidades planetárias e digitalização global as quais engendram uma absoluta transparência pode ser infantilizada pela negação de um claro plano de poder tocado a uma vergonhosa, e quase sempre quixotesca corrupção, a qual acabou por devastar economicamente o Brasil. Realmente, um plano de poder aliado a uma ética dos fins justificando os meios liquidou estatais e fundos de pensão, levou à bancarrota bancos oficiais e, pela ladroagem, transformou funcionários em milionários, ladrões e empresários em símbolos de vileza para seus ilustres clãs políticos e familiares.

Se o alvo era o demonizado capitalismo e um mundo igualmente cruel, o tiro saiu pela culatra, pois ao fim e ao cabo o que houve foi pretender legitimar ladrões como salvadores da pátria. O maior deles, o chefe, Lula da Silva, começou repetindo a imagem do pai dos pobres para ser mais do que a mãe dos ricos, pois é hoje o compadre de um rol de empresários cujo cartel virou um clube de propinas. Esse sinistro capitalismo foi usado para abrir abençoadas contas no exterior e promover financiamentos a países vizinhos reforçando seus governos autoritários.


O povo pode ser bobo, mas não é palhaço. O povo, como se viu domingo, não aceitou ser o filho bastardo de um governo lulopetista que se postava como pai e, depois, mãe, mas que dele abusava de modo incestuoso, roubando-lhe os recursos. A genitora inventada pelo pai-salvador revelou-se dona de mais impaciência e ausência de noção do seu papel do que de amor materno. Postava-se como mãe sem, entretanto, ter o coração materno da famosa canção imortalizada por Vicente Celestino.

Política tem muito de ética pessoal, mas não é família ou casa-grande. Um país é uma casa e senzala, embora seja moradia. Alugá-lo a incompetentes cínicos que admitem terem comido muito mel ao ponto de melarem-se todos é, mais do que uma realidade, é um insulto.

E o povo que usa expletivos como conceitos filosóficos — existe algo mais complexo que explicar o significado de f.d.p ou de um p.q.p? — revelou a sua vontade e o seu pensamento selvagem levi-straussiano, quando vimos a tribo que domingo podou o poder político lulopetista, dando o primeiro passo para afastá-lo do palácio e do imenso aparelho que ele cuidadosamente construiu.

Estou sendo golpista? Para alguns sim. Para quem sabe do meu caráter, não. Não tergiverso com minha honestidade e não vendo minha alma ao diabo na forma de pedidos, favores e dinheiro. Meu nariz está limpo porque jamais ajoelhei para lamber um traseiro ou solicitei um empenho. Quando, um dia, me perguntaram “O que você quer?”, disse sem tremer: “Nada!”

Nessa rede de elos familiares e de simpatias que o ritual de domingo deu provas contundentes, eu jamais entrei. Estudando Brasil eu vi o peso dos favores na condução de nossos projetos de modernização igualitária e encareço aos que desejam real e firmemente mudar o Brasil que prestem atenção a essa trama do dar-para-receber que não amadurece, mas infantiliza. Que não engendra cidadãos responsáveis, mas devedores e, no limite, subserviências. E o faz sem saber, mas sabendo — maldosa e inocentemente.

O que vi domingo foi um grito esperançoso de maturidade com todo o bom humor possível diante dos mais reacionários que, negando o real, recitavam o mantra do ilegal para um ritual que paradoxal e brasileiramente, pois era obviamente legítimo e certo, embora tivesse raízes nos dentes podres com os quais todos — todos! — comemos nossas carniças.

Foi um ritual do mesmo naipe dos estelionatos eleitorais, dos quartos neuroticamente secretos onde aquele sujeito da Petrobras guardava como um Ali Babá os tesouros roubados. Foi uma prova de como o ilegítimo é legal tal como as propriedades do ex-presidente Lula são dos seus amigos do coração.

Foi um passo para a maturidade e para o casamento do ético com o legal. Mas, como estou cansado de testemunhar tal movimento, pois fiz parte dos “conscientizados” da esquerda brasileira, posso ter certeza, mas não estar certo.

Roberto DaMatta 

Temer e a ditadura da corrupção

“Não entram na minha cabeça todos esses zeros da corrupção”, me diz o servente de pedreiro, Elton John, que trabalha em uma obra do Rio, mexendo com argamassa o dia inteiro, faça chuva faça sol.

Para ele, um milhão, que é troco para os políticos corruptos, já é uma cifra das galáxias.

Eu o entendo quando, depois de me informar quanto ganha por mês, lhe expliquei que um milhão de reais é o que ele receberia trabalhando durante oitenta anos. Olhou-me espantado e exclamou: “Tudo isso?”.


Se Temer chegar a assumir a Presidência da República vai logo precisar convencer a sociedade de que não só tentará boicotar, embora isso seja feito nos bastidores e nas sombras, a ditadura da corrupção, como a combaterá com maior rigor que seus antecessores.

Será possível para ele semelhante proeza com o respaldo que vai ter no Congresso dos deputados e senadores abertamente incriminados na Lava Jato?

Pode ser que até os mercados o perdoassem. É possível que forças importantes de poderes fáticos assim exijam. Os cidadãos seriam os únicos que nunca o perdoariam, a começar pelos que hoje abandonam, às vezes com um rompimento doloroso, o PT, acusado, mais do que ter quebrado a economia, de ter-se convertido em um partido tão corrupto ou mais que os outros.

Temer terá de prestar contas de como pensa combater a ditadura da corrupção implantada no Brasil e que a sociedade coloca nas pesquisas como sua maior preocupação.

Sim, a ditadura da corrupção, porque existem as ditaduras militares, de esquerda ou de direita, mas também as sociais e éticas.

As militares matam e torturam e despojam os cidadãos de suas liberdades. A ditadura da corrupção golpeia também não só simbolicamente, mas física e moralmente.

Quando os cidadãos que trabalham duro para levar adiante sua família e seus sonhos dão de cara com a ditadura da corrupção, abraçada pelos políticos, se sentem também moralmente torturados.

A ditadura da corrupção golpeia também fisicamente, já que esses bilhões de dólares roubados da sociedade são subtraídos da saúde, que acaba produzindo, nos hospitais sem recursos, dor e morte. Não por acaso os mais pobres são os mais indignados com os políticos corruptos.

A ditadura da corrupção fere e mata, física e psicologicamente, os milhões de pessoas golpeadas pelo drama do desemprego ou afogadas em dívidas. Ou as que ficarão culturalmente inválidos por toda a vida por terem sido castigados com um ensino que não os prepara para enfrentar o futuro.

Se Temer veio para dar o golpe fatal à luta contra a corrupção, melhor que, antes que seja tarde, diga também ele aos que o empurram a essa triste aventura: “Tchau, queridos”.

A sociedade lhe agradeceria.

Do ABC aos grotões

O mapa da votação na Câmara Federal aponta uma dessas ironias da História. No seu nascedouro, no ABC paulista, o lulopetismo pintou como produto da modernidade do desenvolvimento capitalista - a exemplo de outros partidos operários que se erigiram em poder em países capitalistas e, de fato, criaram um ordenamento social mais justo.

Treze anos depois de ser governo, e no momento mais dramático da crise terminal de seu projeto de poder, o lulopetismo tem suas casamatas nas unidades da federação menos desenvolvida, onde a dependência do Estado marca a ferro e fogo a população e seus representantes, os parlamentares.

A ironia é exatamente essa: o partido que se propunha ser a força transformadora da sociedade é hoje um partido não mudancista e atrasado, perpetuador da forma ossificada de se fazer política. Está de costas para o agronegócio, para a economia real e seus trabalhadores e para a classe média moderna - urbana e rural. Isto explica porque os melhores desempenhos eleitorais da presidente Dilma Rousseff foram no Nordeste e em Estados governados pelo PT.


Aonde o capitalismo chegou e se instalou plenamente, o Partido dos Trabalhadores perdeu substância. Hoje exerce influência nos movimentos sociais ainda não incorporados à economia moderna, como o MST, principalmente o do Nordeste e Norte, onde a bandeira da reforma agrária ainda tem apelo, e nos excluídos da modernização urbana; como o exército de subproletariado do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto.

Para entender este definhamento, essa transmutação em um “partido dos grotões” e dos “bolsões de miséria” há que se mergulhar no tempo.

Para chegar ao poder, Lula selou um contrato, através da Carta aos Brasileiros. Elegeu-se acenando com um jogo de ganha-ganha. Verdade que os de cima ganharam bem mais e aos de baixo sobrou a menor parte do bolo: a ampliação da rede social de proteção e dos programas sociais distributivistas.

A luz amarela acendeu para as classes médias urbanas, com o escândalo do mensalão. Ali trincou o cristal. As camadas médias começaram a perceber o engodo do discurso do “é diferente de tudo que está aí”. Descobriram que o PT fez coisa muito pior, inovou em matéria de assalto à coisa pública.

O boom das commodities permitiu Lula ir em frente. Tudo ia bem no país das maravilhas. Ali por 2010, as aparências, essa face enganosa das coisas, indicavam o Brasil como o grande país emergente, estável econômica e politicamente, com status de reivindicar um assento no Conselho de Segurança da ONU e futura sede de dois eventos mundiais: a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas 2016.

A autoestima do brasileiro estava lá em cima, como demonstra as palavras de um jovem, em uma entrevista de 2011: “O Brasil está muito mais posicionado no mundo do que estava há alguns anos. É uma valorização daquilo que é brasileiro, voltado para o Brasil. Isso faz com que essa geração tenha um sentimento muito maior de ser brasileiro”.

O gigante tinha pés de barro.

A bolha das commodities passou. O lulopetismo desperdiçou uma oportunidade de ouro para universalizar os direitos sociais básicos - saúde, educação e saneamento - e promover a cidadania dos excluídos. Em 2013, a sociedade deu seu recado quanto à sua insatisfação e seu cansaço com a baixa qualidade dos serviços públicos e com a forma de se fazer política no país, cujas mazelas foram elevadas ao infinito nos governos Lula-Dilma.

Nas eleições de 2014 já era visível o deslocamento de parte substantiva da sociedade, particularmente nos polos desenvolvidos do país. Dilma perdeu a eleição até mesmo no “cinturão vermelho” do entorno de São Paulo e na outrora cidadela do petismo, o ABC paulista.

O arrefecimento da crise ética, econômica e política destes dois últimos anos horizontalizou o fosso entre o lulopetismo e a sociedade. Ele não se resume apenas às camadas médias, perpassa todas as classes sociais e todas as regiões. Há uma coincidência interessante a ser observada. Em média, o governo Dilma é desaprovado por algo e m torno de 70% a 75% dos brasileiros. Pois bem, a presidente foi derrotada na Câmara por 73% dos deputados.

A conclusão do enrosco é que Lula e Dilma prestaram enorme desserviço à própria esquerda. Jogaram o pêndulo da sociedade para a direita, tiraram da toca a extrema direita, que estava sem espaço desde a democratização de 1985. Serão necessários v& aacute;rios anos para que um novo projeto de esquerda, mesmo de uma esquerda democrática, galvanize o conjunto da sociedade.

Não há dois Brasis, um avançado e outro atrasado. Não são dois rios distintos que jamais se encontram. Corremos todos no mesmo leito. E é impossível um “partido dos grotões” impedir o curso das águas.

Dilma critica impeachment sem olhar para o PT

A hipocrisia é uma característica comum na política. Mas algumas pessoas exageram. Em conversa com a imprensa estrangeira, Dilma atribuiu a um “veio golpista adormecido” o fato de o impeachment ter virado no Brasil “um instrumento contra os presidentes eleitos.”
Quando Dilma acrescentou ter “certeza de que não houve um único presidente depois da redemocratização do país que não tenha tido processos de impedimento no Congresso”, não mencionou que foi o seu partido, o PT, que banalizou o uso do impeachment como instrumento para puxar o tapete de presidentes eleitos.

Estava claro que o PT, ao atear fogo sistematicamente em administrações adversárias, trabalhava contra os seus próprios interesses, já que a legenda frequentava a cena como alternativa de poder. Mas o partido não parecia preocupado com o que pensariam dele no futuro quando foi às ruas com faixas de “Fora Sarney'' e “Fora FHC.'' Jogo jogado.

Na sua fase pós-redemocratização, a democracia brasileira produziu apenas quatro presidentes eleitos pelo voto direto: Fernando Collor foi despachado para casa mais cedo. Lula e FHC resistiram às tentativas. Se o Senado confirmar o impedimento de Dilma, a taxa de letalidade do impeachment será de 50%. Altíssima!

Dilma chegou a insinuar que Collor, hoje na sua base de apoio, talvez tenha sido cassado injustamente, já que o STF o absolveu posteriormente das imputações penais. A insinuação é espantosa, mas todo mundo tem o direito de fazê-la. Porém, para não insultar a inteligência alheia, Dilma talvez devesse reconhecer: sempre que foi intimado pela história a optar, o PT revelou sua preferência por virar a mesa em vez de sentar-se a ela.

Se quiser melhor, faça por merecer

As senhoras correram aos sais, os senhores de ventre farto deploraram o que viam entre um e outro gole de uísque, das vielas surgiram gritos de "golpe", os artistas foram logo recorrer à inspiração e à indignação, as crianças foram proibidas de acompanhar a imoralidade nas telinhas. A cara do Brasil exibida em polegadas para todo mundo deu ânsias de vômito e vergonha geral. Foi literalmente a cusparada na cara do próprio brasileiro.

Podem apontar o que quiserem na votação de domingo na Câmara, mas participantes e espectadores têm as mesmas caras e ideologias. Siameses da gema até em transformar a Câmara em palco para torcidas organizadas.

O Brasil é de uma cretinice atávica de se condenar quando fica diante do espelho. Esperava ver uma câmara de lordes, mas o que aparecia era uma câmara dos comuns, mais comuns impossível. Revoltou-se, é claro, porque se acredita vivendo sob uma democracia de primeiro mundo, sob o som do Big Ben, quando sua democracia é de terceira classe atrasada como o relógio da Central. Que assim seja, ao menos, para não cair em tentações em arapucas.

O que se viu na Câmara, no domingo, é o reflexo do nosso descaso com a política, pouco caso do cidadão consigo próprio. O Brasil da política suja é o dia a dia brasileiro. Ainda não se entendeu aqui que o respeito que se pede ao político tem que se dar na própria cidadania.

Político sujo, ladrão, de conchavos, mentiroso, espelha a convicção do eleitor, que precisa urgentemente repensar o que deseja de cidadania, indo às ruas, reclamando direitos, condenando voto por dinheiro e dinheiro por voto. Enquanto se emprenhar pela publicidade política, pelo noticiário direcionado e a falta de cultura política, de educação, no sentido de formação, vai ter Câmaras iguais ou piores.

Quem não quiser ver a própria imagem pela tevê, desligue o televisor e vá pescar. Mas não reclame se o país continuar indo ladeira abaixo por suas escolhas interesseiras de grupos sociais.

O desastre do tropicalismo de Lula

A corrupção é um problema histórico na política brasileira e o PT não mudou isso. E por mais que políticas sociais como a criação do Bolsa-Família tenham que ser elogiadas, a administração petista cometeu o erro fundamental de se focar apenas nos meandros da política e não investir com mais ênfase em reformas na saúde e na educação, por exemplo.
Por isso é que a esquerda está perdendo o poder no Brasil. Esse impeachment, do jeito que está sendo feito, é bizarro, mas o PT deu a seus inimigos a chance de atacar. Sei que a esquerda está gritando que é golpe, mas o fato é que o suporte ao PT minguou e a elite brasileira conseguiu juntar forças para forçar uma manobra que não é ilegal
Tariq Ali, jornalista e escritor do Reino Unido,'Blairismo tropical' de Lula levou à derrocada do PT

Dilma, a farsante

Se a população ainda tinha dúvidas sobre a capacidade política e intelectual da Dilma para governar o país, começa a dissipá-las agora quando assiste perplexa as bobagens que ela diz nas entrevistas coletivas que concede à imprensa local e a estrangeira. Ao falar aos jornalistas brasileiros depois da admissibilidade do impeachment, a presidente parecia que estava navegando em outro mundo, uma extraterrestre flutuando em outro planeta. Passiva diante da situação, mostrava-se sonâmbula, mas aparentemente convencida de que brevemente voltará para casa para cuidar do netos. Quando tentava se esforçar para dizer uma frase mais inteligente, saia com asneira desse tipo “a sociedade humana”.

A conversa com os jornalistas estrangeiros então foi um desastre só. Fica difícil para os jornais de outros países decifrarem o que a presidente do Brasil quer dizer. Não existe, nos idiomas lá fora, tradução que chegue perto do que que ela fala. Disse, por exemplo, que não tem culpa da estagnação econômica, do caos administrativo e da corrupção generalizada. Culpa a China pela retração do mercado, acusando-a pela queda das commodities que frearam as exportações brasileiras. Não consegue concatenar um raciocínio lógico sobre nada, o que a impede de ser objetiva ou clara sobre qualquer assunto.

O Brasil de tantos talentos na área da cultura, da literatura e da ciência parece que de uma hora apagou-se. Tudo isso é decorrência de quase uma década e meia de descaso na educação e no desenvolvimento do país. A decadência começou com a ascensão da “República Sindical”. Um bando de pelegos viu-se de uma hora para outra administrando as principais empresas públicas e liderando o ensino do país com o aparelhamento do Estado. Chefiando-os um presidente despreparado que fazia apologia do analfabetismo. Muitas vezes enalteceu a sua própria ignorância: “Se eu cheguei, que não estudei, você também pode chegar ao maior cargo do país”, disse certa vez o senhor Luiz Inácio Lula da Silva, o representante, à época, de mais de 200 milhões de pessoas, para delírio de muitas delas, seus fãs.

A Dilma – que chegou a presidência falsificando o currículo acadêmico -, logo acostumou-se a ignorância e a promiscuidade dos seus companheiros petistas. Todos se lembram da sua frase cínica, antes da campanha, de que “podemos fazer o diabo quando é hora de eleição”. Ali ela já sinalizava que já tinha aderido aos predicados rasteiros dos bastidores contaminados da companheirada. Viu, no cercadinho do gabinete do chefe, quando era seu auxiliar, o tratamento que ele dava aos seus assessores, humilhando-os com impropérios. Por isso, assim que assumiu a presidência procurou também imitá-lo com a arrogância e a prepotência de quem nunca se preparou para um cargo como o de presidente da república.

Regozija-se de ser honesta, de nunca ter metido a mão na lama. Mentira. A maracutaia na Petrobrás começou quando ela presidiu o conselho da empresa. Autorizou que a estatal comprasse uma refinaria sucateada no Texas por quase l bilhão de dólares. Quando o escândalo surgiu, procurou se safar dizendo que foi iludida. Ora, como alguém assina um contrato bilionário sem pelo menos analisar com cuidado os seus termos? Na confissão, passou recibo de idiota, e demonstrou o despreparo para exercer qualquer cargo público.

Quer passar a imagem de coitada, enganada, ludibriada, quando se apresenta nas coletivas de imprensa. Não engana. Foi forjada dentro da cúpula petista. Assistiu, com assento privilegiado, as arrumações para reeleição de Lula e para as suas duas campanhas. Conhece, como ninguém, toda trapaça que o PT fez para esvaziar os cofres das empresas públicas e manter o seu projeto de se perpetuar no poder. Além disso, é conivente com o crime quando mantém ao seu lado o Edinho Silva, ministro, acusado de achacar empresários e de receber quase 8 milhões de reais para a campanha dela. Está cercada não de assessores, mas de futuros presidiários que começarão a ser enjaulados assim que o poder se esvair.

Então, doutora Dilma, diante desses fatos escabrosos e do seu envolvimento com os escândalos, não tente mais iludir a população. Mostre dignidade e deixe o cargo, antes que o povo a ponha na rua pela porta dos fundos do Palácio do Planalto.

Lembrando que Renan e o PT têm contas a ajustar

Terá a presidente Dilma adquirido humildade, perdendo a empáfia e a presunção responsáveis por sua derrota na Câmara, domingo? Possível, a hipótese pode ser, mas verdadeira, dificilmente. A causa da queda parece longe de pedaladas e de decretos espúrios, pois assenta-se na postura antes absolutista de Madame, por cinco anos e pouco situando-se acima do bem e do mal, dona das vontades alheias e infensa a julgar-se como uma comum dos mortais.

Sua entrevista de segunda-feira não teve o dom das confissões espetaculares, mas bastou como peça de defesa, na medida em que ela abdicou da condição de Madre Superiora do Convento. Não deixou de acusar os adversários vitoriosos no primeiro round da batalha do impeachment, mas pelo menos anunciou a disposição de manter a luta, agora no Senado.

O mesmo sentimento de rejeição à sua postura autoritária registra-se entre os senadores, ainda que se torne difícil assistir na segunda votação 54 senadores entre 81 dispostos à sua degola definitiva. Há espaço para a resistência, mesmo difícil. Na beira do abismo, ainda lhe sobram forças para lutar pelo mandato.

O grave na tertúlia ainda em andamento é que o país continua em frangalhos, sem governo. Não há espaços no palácio do Planalto para se cuidar da recuperação nacional, pois enquanto Dilma luta para salvar a pele já chamuscada, Michel Temer contenta-se em planejar a volta por cima, que ainda lhe é vedada.

Não cessou por completo a euforia dos vitoriosos de domingo. Soldados de Eduardo Cunha aguardam que Renan Calheiros convoque a sua cavalaria. Os comandantes da Câmara e do Senado não serão propriamente impolutos e competentes guerreiros de alma pura, dado seu passado de ligações espúrias com a corrupção e mais ainda seu futuro, na alça de mira da Justiça. Mesmo assim, é em torno de Renan que evoluem as esperanças de Dilma.

O presidente do Senado detém o controle do processo agora tramitando em sua casa. Pode ser que ofereça prazos regimentais mais extensos, dando à presidente tempo para organizar sua defesa. Também pode ser que coordene um ataque tão veemente quanto exangues tropas do PT e adjacências. Ambos tem contas a ajustar.

Enquanto isso, vale repetir, o desemprego multiplica-se em massa; o custo de vida aumenta a passos largos; taxas, impostos e tarifas não deixam de crescer; os juros sobem, os salários diminuem; a economia falece e os bancos continuam indo muito bem, obrigado…

Dever cumprido!

Dois fatos históricos relevantes me chamaram a atenção do fim de semana pra cá. Primeiramente, os deputados autorizaram, por 25 votos a mais do que os dois terços exigidos pela Constituição, a abertura de processo de impeachment contra Dilma Rousseff pelo Senado. O outro foi a ausência de vândalos nas manifestações contra ou a favor do impedimento.

Muita gente critica nas redes sociais e nos meios de comunicação o teor dos votos pelo sim ou pelo não com muitos apelos a Deus, à família, aos amigos e aos eleitores mais próximos. Ontem, à noite, participei com meu antigo colega na Folha de S.Paulo nos anos 70 e professor de Ciências Sociais da USP José Álvaro Moisés da abertura do programa Todo Seu, apresentado por Ronnie Von na TV Gazeta, em cujos telejornais faço comentários políticos em dois dias por semana. Sou amigo do Pequeno Príncipe há muitos anos e fico muito lisonjeado pelo fato de ele ter parado para refletir sobre o assunto, que serviu de tema para o editorial com que tradicionalmente abre seu programa diário. Ontem, ele fez coro a esse clamor geral, que tem produzido até listas gaiatas, e lamentou o baixo nível de quase todos os votantes naquela sessão histórica. Com todo o respeito que meu anfitrião televisivo merece, discrepo, como dizia mestre Antônio Houaiss. Pois acho que o Congresso deve reproduzir sempre da forma mais fiel possível a vontade da cidadania, que representa. Infelizmente, tenho dúvidas quanto à natureza da representação no voto proporcional à brasileira, em que a matemática das bancadas não corresponde ao tamanho do eleitorado. Acho que uma das mais importantes, e mais difíceis, reformas políticas a serem adotadas é o direito de cada cidadão ter direito a um voto, nem mais nem menos, em igualdade de condições com outro em qualquer Estado da Federação. A Constituição liberal de 1946 já traía esse conceito elementar da democracia representativa. A ditadura militar o agravou com o horrendo Pacote de Abril de 1977. E a Constituição de 1988 tornou o voto ainda mais desigual em matéria de representação. Enquanto não se muda, a discrepância existente entre as bancadas de Unidades da Federação mais ou menos populosas sempre produzirá riscos de votações que não correspondam fielmente à vontade política da sociedade. Então, sempre que ocorre essa fidelidade, eu a comemoro efusivamente. E estes foram os casos dos dois processos de impeachment, o de Collor, em 1992, e o de Dilma agora. Neste os deputados ouviram o clamor das ruas e atenderam a ele.

Para tanto foi necessário que muitos deles fizessem ouvidos de mercador aos cantos da sereia dos governistas, que lhes davam dinheiro e cargos em troca de ausências. Foi uma sessão histórica também porque teve recorde de comparecimento de deputados. Parabéns, pois, a todos eles!

Não há por que lamentar ainda o teor afetivo dos discursos, pois referências a familiares, amigos e outras pessoas mais próximas podem representar um salutar convívio com as chamadas bases. Esse convívio pode ter tornado mais fiel a tradução na votação do desejo manifestado em proporção bastante próxima do que se tem visto nas ruas.

Lamento que o deputado Jair Bolsonaro tenha exaltado, ao proferir o voto, a atuação do notório oficial torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra, da mesma forma que houve quem ali lembrasse inimigos da liberdade do outro lado, como Lamarca e Marighela. É reprovável a cusparada do deputado pelo Rio que votou em seguida, Jean Willys, gesto repulsivo e mal educado, não recomendável em ocasião nenhuma, particularmente numa reunião histórica como foi aquela. No entanto, não nego a nenhum dos dois o direito líquido e certo de votar como votaram. Bolsonaro representa legitimamente na Câmara o segmento do eleitorado nacional que aprova os métodos brutais da ditadura militar contra os adversários da esquerda armada. Embora Willys tenha ultrapassado os limites da civilidade ao cuspir na direção do adversário, atingindo, então, os eleitores que votam no oponente.


Lamento ainda mais a narrativa escolhida pela presidente da República de insultar quem votou sim na noite de domingo, afirmando que quem optou pelo impachment o fez por um motivo torpe: a vingança do presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Essa é uma ofensa que a democracia brasileira não merece e deslustra ainda mais a biografia da chefe do pior governo da História do Brasil, desde que Tomé de Souza desembarcou na Bahia.

Em compensação a essa truculência egocêntrica, burra, arrogante e surrealista, aproveito sua leitura para comemorar muito efusivamente a ordem e a harmonia reinante nas manifestações das ruas durante e depois da votação – o que, aliás, já fiz em comentário sobre o acontecimento ontem no Estadão no Ar da Rádio Estadão. Não houve depredações nem desforço físico num dia cívico inesquecível de clima quente, seja do ponto de vista da meteorologia, seja do convívio social. Dia em que, aliás, vimos a História acontecer diante de nossos olhos e debaixo de nossos pés. A ausência de vandalismo na festa dos vitoriosos e na lamentação dos vencidos é um indício de que o povo brasileiro está aprendendo a conviver com o contraditório democrático, mantendo-o com zelo e afugentando para longe as ameaças de atar mais fogo à estúpida guerra entre oponentes e as promessas de guerra contra a legítima decisão que o Senado vier a tomar sobre o momentoso processo – qualquer que seja.

As 'latitudes' dos votos

Sempre escrevo meus artigos nos fins de semana. E com este não será diferente, apesar do furdunço político em Brasília no domingo. Assim faço porque o resultado do tal impeachment em nada mudará meus costumes. Uma possível troca de Dilma boca porca por Michel Temer, nas circunstâncias atuais, é o mesmo que trocar seis por meia dúzia, a não ser que a Justiça de Curitiba ponha a mão em Lula e sua cambada, inclusive Dilma, por motivos óbvios.

Minha única curiosidade é saber como ficará o “day after”, a troca de bocas... O Michel é um posudo, desses que falam olhando para as próprias mãos, mas sabe ler e escrever e é reconhecido professor de direito constitucional. Já Dilma, guerrilheira sem objetivo, aos 19 anos estava de metralhadora em punho, assaltando bancos para uma causa alienígena. A propósito do tema, até hoje não se sabe o que foi feito dos US$ 2,8 milhões roubados em assalto à casa do ex-governador de São Paulo Ademar de Barros. 


O Brasil, há muito, vive embevecido por tudo o que é diferente. O surgimento no cenário político de um demagogo analfabeto como Lula foi algo diferente. E ele soube explorar esse tipo de diferença, baseado num “coitadismo” de ocasião que pegou o povo brasileiro desprevenido para esse tipo de messianismo.

O alheamento desses políticos que fazem ouvidos moucos para tudo aquilo que não lhes é favorável deu nisso que está aí. O Brasil está na miséria, gastou mais do que tinha no bolso e faz de conta que não sabe de nada. O termo “pedalada”, típico da verve brasileira, significa também, ou principalmente, “irresponsabilidade”, “assalto à mão armada”. Dilma administra o Brasil como fazia em seu tempo de assaltante de banco. E os seguidores fingem que não sabem de nada e afirmam que todo movimento contrário é golpe...

O tempo é implacável, chega para tudo e todos. De tanto falar em golpe, vão acabar achando o que procuram e, aí, como diria o Libório lá da Serra do Anastácio, “vão ver o que é bom pra tosse...”

Reproduzo as palavras ameaçadoras de José Sílvio dos Santos, empresário e presidente do PDT do Distrito Federal, dirigindo-se aos militantes: “Convoco a militância pró-Dilma que vá armada para matar no próximo domingo”. Nós vamos ficar batendo panelas... Acredite nisso, idiota.

E, para terminar, lembro a sessão do egrégio Supremo Tribunal Federal em que, num debate que mais parecia discussão sobre a redondeza das bolas, aquele colegiado deliberava por onde começar a declaração dos votos dos deputados, se pelo Norte ou pelo Sul, e o ministro Barroso, o mais comprido deles, manifestando seu entendimento sobre a questão, explicou que, para ficar acorde com a legislação pertinente, a votação deveria começar pelos Estados do Norte, observado o princípio da alternância dos Estados, bem como suas “latitudes perante as capitais”. E eu pensei com meus botões: “latitudes” ou “platitudes”...

Esses ministros modernos são detalhistas e chatos...