quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Previsões para 2018, um ano imprevisível

Nestes dias atribulados, que deveriam ser de confraternização e são de consumo, busquei ajuda do imponderável para tentar antecipar o cenário do mundo, e em particular do Brasil, no ano que nos aguarda acocorado logo ali à frente. Já que não podemos contar com a racionalidade – 2017 provou, mais uma vez, que a realidade é inverossímil -, apelemos a formas de conhecimento alternativas, que, apenas porque não compreendemos, não podem ser julgadas inferiores.
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Janjão do Jardim Paraná e Tia Maura são videntes reconhecidos em suas comunidades. O primeiro, mestiço alto e forte, é especialista na leitura dos búzios, essas pequenas conchas marinhas que revelam a história futura a quem sabe lê-las e interpretá-las. A segunda, de estatura mediana, nem magra nem gorda, carismática e envolvente, mistura de todas as etnias do mundo, desembaraça os fios vindouros examinando as figuras enigmáticas do baralho cigano.

A ambos fiz perguntas específicas, abarcando questões políticas e econômicas, e, claro, num ano de Copa do Mundo, busquei algum indício a respeito do desempenho da nossa seleção de futebol. O que se segue é um apanhado das respostas, nem sempre claras, nem sempre contundentes, pois a linguagem das predições é a da poesia, que eu tento canhestramente traduzir em prosa. Portanto, se equívoco houver, deverá ser debitado à minha incompetência – traduttore traditore, já esconjuravam os italianos.

O mussoliniano presidente norte-americano, Donald Trump, continuará tentando, a todo custo, provocar uma terceira guerra mundial. Depois de enjerizar o mimado ditador norte-coreano, Kim Jong-un, e de atiçar os muçulmanos com a transferência da embaixada para Jerusalém, Trump arrumará novas desculpas para colocar o planeta na iminência de um conflito de proporções catastróficas. Conseguirá? Não em 2018, não ainda... Mas a passos largos caminhamos nessa direção.

Os fundamentalistas islâmicos seguirão se explodindo nas ruas da Europa e eventualmente dos Estados Unidos, e os miseráveis, expulsos pela fome e pela falta de perspectiva, permanecerão se aventurando nas águas do Mar Mediterrâneo para alcançar as costas da Itália. Enquanto os ricos do mundo fingirem que não têm responsabilidade sobre a tragédia africana e do Médio Oriente, estarão apenas alimentando o ódio, o rancor e o ressentimento, caldo de cultura ideal para o desenvolvimento do fanatismo.

O clima se manterá enlouquecido. O número de ciclones e de tufões aumentará, provocando enormes estragos e inúmeras mortes no Caribe e Estados Unidos, e nos países-ilhas do Oceano Pacífico. Um terremoto de proporções gigantescas assustará o mundo e levará muitos a pensar no Juízo Final. Por aqui, serão registradas temperaturas, máxima e mínima, nunca antes conhecidas. Poderá faltar água em algumas capitais brasileiras, devido a um longo período de escassez de chuvas.

Infelizmente, as notícias sobre o Brasil não são as melhores. A violência urbana fugirá de vez do controle em algumas partes do país, evidenciando o poder real do tráfico de drogas. A economia reagirá como um paciente saindo do coma: com picos de melhora e de piora, pois o organismo, frágil e enfraquecido, às vezes parecerá sucumbir à enfermidade. O desemprego vai se conservar alto e o pessimismo em relação ao futuro levará jovens e idosos de classe média a fugir do país, revivendo um quadro desenhado na década de 1980.

Mas há notícias boas! Um astro da televisão se casará, um fenômeno da música brasileira irá se transformar num sucesso internacional, a internet se expandirá para os mais longínquos lugares do país, e os nossos jogadores continuarão sendo exportados como produto de excelência para campos de futebol de todos os cantos do mundo. Aliás, este é outro dado alentador: a seleção de Tite estará entre os finalistas em Moscou, embora ambos os consultados tenham se arriscado cravando que será a Alemanha o campeão do certame...

E o resultado das nossas eleições? Pois é, aqui, até mesmo os astros preferem se abster...

Indulto se torna insulto na Pasárgada de Temer

Quando escreveu sobre seu sonho de ir embora para Pasárgada, onde era amigo do rei, Manoel Bandeira imaginou que traduzia o desejo de toda a gente. Não poderia supor que, sob Michel Temer, todos os atrativos da terra desejada —ginástica, bicicleta, burro brabo, pau-de-sebo, banho de mar, beira de rio e até a mulher desejada na cama escolhida— seriam trocados por um único benefício: o indulto natalino do rei.

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A Pasárgada de Temer é uma monarquia sui generis. Nela, reina a corrupção. Os amigos do monarca se dividem em dois grupos: os presos e os que aguardam na fila, escondidos atrás do escudo do foro privilegiado. Não desfrutam apenas da amizade do rei. Integram a sua corte. Observam o caos ao redor como se olhassem para outro país, no qual não vivem. O indulto natalino do rei transformou este Brasil alternativo numa Pasárgada turbinada, muito além da sonhada.

Antes, os indultos natalinos colocavam em liberdade os condenados a menos de 12 anos de cadeia por crimes não violentos —corrupção e lavagem de dinheiro, por exemplo— desde que tivessem cumprido um terço da pena. Em 2016, Temer reduziu o tempo de cana para um quarto (25%). Neste ano de 2017, a temporada atrás das grades caiu para um quinto (20%). Mais: foi para o beleléu a barreira que impedia o perdão de condenados a mais de 12 anos. Pior: anistiaram-se também as multas.

Nesta quarta-feira, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, protocolou no Supremo Tribunal Federal uma ação contra o decreto de indulto natalino editado por Temer. A doutora anotou na peça que a generosidade do rei levará à “impunidade de crimes graves, como aqueles no âmbito da Lava Jato e de outras operações contra a corrupção''.

Dodge acrescentou: ''O chefe do Poder Executivo não tem poder ilimitado de conceder induto. Se o tivesse, aniquilaria as condenações criminais, subordinaria o Poder Judiciário, restabeleceria o arbítrio e extinguiria os mais basilares princípios que constituem a República Constitucional Brasileira.''

O que Raquel Dodge escreveu, com outras palavas, foi que o indulto de Temer é um insulto. Mantido o decreto, a Pasárgada hipertrofiada será um lugar onde os amigos do rei integrarão uma confraria dentro da minoria. Na terra dos confrades, o poder, além de se corromper e ser corrompido, ameniza as penas.

De plantão no Supremo Tribunal Federal, a ministra Cármen Lúcia pode restaurar a República por meio de uma liminar que suspenda o descalabro. Do contrário, a Suprema Corte também irá para Pasárgada, um país onde os amigos do rei sempre terão a impunidade desejada no decreto escolhido.

Paisagem brasileira

Sobral CE.
Sobral (CE)

Malandragem?

Há uma parte da população do Rio de Janeiro que sempre construiu para si própria, e para o restante do Brasil que presta atenção no que se fala ali, uma imagem de sua cidade como o centro nacional e mundial da malandragem. Seria uma grande virtude. Esse “espírito”, na sua maneira de ver as coisas, faz do Rio uma cidade superior às demais. Faz de seus cidadãos pessoas mais inteligentes, mais aptas a lidar com a vida e mais hábeis que os outros brasileiros em conseguir o melhor para si próprias. Imagina-se que essa gente esteja sobretudo nos morros, ou nas “comunidades”, como se deve dizer hoje. Muitos de fato estão, mas não são eles os que mais aparecem, pois sua voz não vai longe. Quem realmente leva adiante esta bandeira é uma porção das classes mais ou menos médias da Zona Sul, com a participação decisiva dos artistas, intelectuais que assinam manifestos, formadores de opinião, “influencers”, comunicadores e por aí afora. São eles, hoje, os guardiães da filosofia segundo a qual qualificar-se como “malandro” é um dos maiores dons que um ser humano pode dar a si próprio. Já sua pior desgraça, motivo de vergonha e prova cabal de estupidez, é ser o exato contrário disso – o otário, condenado a passar a vida na humilhação, no logro e no “prejuízo”. Seja tudo no Rio; mas não seja, pelo amor de Deus, um “otário”.

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A música de sucesso no Rio de Janeiro neste fim de ano é “Vai, Malandra”. Comentaristas de futebol, a começar dos mais populares, mais uma vez apostam que a “malandragem natural” do jogador brasileiro de futebol será uma vantagem estratégica importante na Copa do Mundo de 2018 na Rússia. Os políticos da cidade e do Estado são descritos, com orgulho, como “malandros”. Nas artes e naquilo que se chama de “meio cultural” a figura do malandro, e a filosofia que se fabrica em torno de seus méritos, estão entre os temas principais de interesse. A palavra “malandro”, em suma, é um elogio. A palavra “otário” é um insulto. Não melhora as coisas em nada, obviamente, a ideia geral que associa o otário ao sujeito honesto, cumpridor da própria palavra e das leis, pagador de impostos, respeitador das regras do trânsito, bem educado, etc. – tudo isso, cada vez mais, passa a ser visto como uma fraqueza, além de burrice, falta de “jogo de cintura” e outros delitos graves. Um cidadão decente, neste clima, é um cidadão com defeito.

A atitude de culto à “malandragem” não parece estar dando bom resultado na vida prática do Rio de Janeiro. Até outro dia, três ex-governadores do Estado estavam na cadeia, ao mesmo tempo, por corrupção – um deles, que não teve a sorte de pegar um Gilmar Mendes no caminho, continua no xadrez. Nenhum outro Estado do Brasil, em nenhuma época da história, conseguiu nada semelhante. O ano de 2017 está fechando com mais de 130 policiais assassinados no Rio, uma média de um morto a cada três dias. Os funcionários públicos já esqueceram o que é receber o salário mensal em dia. Foi preciso pedir dinheiro emprestado para pagar o décimo terceiro. Um dos maiores orgulhos da cidade e do Brasil, o estádio do Maracanã, continua fechado depois de consumir bilhões de reais em investimentos para brilhar nos Jogos Pan-Americanos, depois na Copa do Mundo de 2014 e finalmente na Olimpíada de 2016, uma coisa depois da outra. O Flamengo, o maior time do Rio, manda seus jogos num lugar chamado “Ninho do Urubu”. Nada disso tem cara de ser, realmente, uma grande malandragem.

A grande aposta

O Estado no Brasil está sempre aumentando suas funções e com elas, a normatização detalhada, que traz oportunidades inovadoras de desvios, abusos, crimes e impunidade. Na conhecida expressão italiana, fatta la legge, fatta la trampa, do latim inventa lege inventa fraude.

Por formalidade institucional da democracia refiro-me a regras explícitas e princípios jurídicos consagrados destinados a proteger as instituições da democracia, como o devido processo legal, normas que regulam o processo eleitoral e direitos individuais, entre outros.

É o ordenamento jurídico dessa hierarquia que foi convocado para processar e julgar crimes financeiros e delitos criminais numa escala jamais imaginada. São matérias jurídicas de conteúdo político e atores políticos acusados de delitos penais. São questões que dividem a Nação em grandes segmentos sociais e políticos opostos e provocam uma situação de legitimidade em questão e insegurança generalizada.

Nunca antes questões jurídicas ganharam audiência dessa magnitude no Brasil. Os atores políticos envolvidos buscam a proteção de advogados talentosos que se desdobram em interpretações “criativas”, argumentos capciosos, e exploram os interstícios existentes entre as normas, esticando ainda mais a tessitura normativa já esgarçada em favor de suas alegações.

O comportamento dos principais atores políticos em relação ao formalismo institucional democrático varia, então, em função dos objetivos políticos buscados.


A esquerda, que não valoriza nem acredita na democracia, que chama depreciativamente de burguesa, busca substituí-la por uma dinâmica política substantiva com práticas de democracia direta, de forma a pavimentar o caminho para um governo de modelo socializante.

Apresenta-se como vítima dessa formalidade, contestando a forma como é praticada. Os vilões são o Ministério Público, a Polícia Federal e os juízes. Não vai ao ponto de contestar abertamente a validade dessa normatividade, já que por ela será julgada. Denuncia os interesses que estariam por trás das decisões de juízes, procuradores e delegados. A estratégia opõe o eventual sucesso político ao insucesso judicial.

A direita (partidos convencionais) encara as formalidades como ameaças. Ideologicamente sempre praticou a retórica da exaltação da democracia e do Estado de Direito. Não podendo, pois, denunciar a institucionalidade democrática nem apostar numa vitória na eleição presidencial, sua aposta se reduz a esperar por uma negociação que encontre uma saída para a perigosa situação de tantos legisladores e políticos.

No governo, as acusações e os processos que pesam sobre alguns de seus ministros e ex-ministros não deixam alternativa senão a saída negociada, se possível pelo impacto de uma bem-sucedida recuperação da economia, já que, se forem aplicadas as regras da formalidade institucional, sua carreira e até a liberdade pessoal estarão em alto risco.

Já os grupos corporativos do setor público continuarão a fazer suas greves, apoiando a esquerda na pressão para ter Lula como candidato, ou seja, a saída sem custos políticos: nem negociada, nem dependente de absolvição, nem dependente da recuperação econômica do País.

O movimento cultural, em sua nova função de ponta de lança das teses de esquerda, deverá manter sua estratégia de atrito e desgaste do governo e da Lava Jato. Seus instrumentos de luta são os eventos provocativos, a participação nas manifestações públicas, o uso de sua popularidade em favor das “causas” e o encargo de dar repercussão e obter algum respaldo internacional à contestação.

Sociologicamente, quem são os protagonistas dessa contestação do formalismo institucional democrático?

As greves no setor privado passam despercebidas, são resolvidas na esfera privada. As greves políticas são greves do serviço público. Distúrbios são provocados por movimentos atrelados a partidos políticos de esquerda. Ações de protesto são protagonizadas por artistas, intelectuais, professores e universitários. Em resumo, a classe média.

É a classe média “de esquerda” que engrossa os movimentos e manifestações. Mas a classe média não faz revolução, ela abastece a esquerda com quadros políticos. São aqueles de quem se pode dizer: quem não é de esquerda tem medo de parecer que não é.

São os companheiros de viagem, segundo a expressão de Stalin. Parceiros de trajeto, não das lutas. Durante sua “fase esquerdista” são mais de esquerda que os verdadeiros radicais; sentem-se empoderados e superiores àqueles que alegam defender, os pobres, os sem “consciência revolucionária”.

Entretanto, no projeto revolucionário das esquerdas, salvo na fase de destruição da democracia, a classe média em nada ajuda e muito atrapalha. Isso se deve ao fato de que a classe média de esquerda, ao radicalizar, se compromete com projetos contrários aos seus interesses. A outra classe média, a da direita, não tem esse problema. Está comprometida com seus próprios interesses e valores, que correspondem aos da imensa maioria do povo.

Na realidade, as formalidades institucionais da democracia são indispensáveis para civilizadamente dar solução aos conflitos políticos. Não há substituto para elas. Sem elas sairemos da crise para entrar no caos. É fácil exacerbar sentimentos, provocar ódio, radicalizar diferenças, demonizar adversários. Difícil é administrar civilizadamente as consequências dos conflitos tornados irreconciliáveis.

Governo quer colocar 'trabalhômetro' em frente ao Planalto

Na tentativa de marcar como positiva a gestão de Michel Temer, o governo pensa em colocar, em frente ao Palácio do Planalto, um painel mostrando que o país vem criando um emprego a cada sete segundos. Será o “trabalhometro”.

A ideia é copiar o painel do Impostômetro, mas com dados positivos. O governo acredita que o emprego é a principal arma para reduzir a rejeição ao presidente Temer e fortalecê-lo como candidato à reeleição ou como fiador de uma candidatura que possa derrotar Lula e Jair Bolsonaro nas eleições de 2018.

Os economistas levantam uma dúvida: o número que o governo está usando, de um emprego criado a cada sete segundos, inclui trabalho informal?
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Pelos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por meio da Pnad Contínua, a maior parte dos empregos criados nos últimos meses foi no mercado informal. Ou seja, o governo está contabilizando como vitória o camelô que botou uma barraca perto de um sinal de trânsito.

Os mesmos economistas ressaltam que o emprego formal está, sim, voltando, mas de forma muito lenta. Tanto que, em novembro, depois de uma sequência de sete meses positivos, o país voltou a fechar vagas formais. As demissões superaram as contratações em 12.292 postos, segundo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).

Numa das propagandas sobre emprego, o governo diz que, “enquanto você prepara seu macarrão instantâneo, 25 brasileiros encontram trabalho no Brasil”. Veja: https://twitter.com/twitter/statuses/941396843426144256.

Na Política, pode-se ler os números da maneira que for mais conveniente. Mas a realidade sempre falará mais alto.

O Brasil voltará a criar empregos, mas, para isso, será preciso que os investimentos produtivos retornem com tudo. Por enquanto, são promessas. Sem investimentos, não há como falar em crescimento sustentado. Isso exige confiança em relação ao futuro. Por enquanto, muitas são as dúvidas, sobretudo no que se refere às eleições e ao ajuste fiscal.

Imagem do Dia

Huacachina- Perú está construído ao redor de um pequeno lago natural no deserto
Huacachina (Peru)

Marun, um subornador, esquece que 904 mil pessoas estão na fila do SUS

O ministro Carlos Marun, evidentemente falando em nome do presidente Michel Temer, revelou a existência de um projeto de suborno e chantagem a deputados e senadores mediante seus votos no Congresso Nacional para a reforma da Previdência, cuja data está marcada para 19 de fevereiro. O suborno inclui financiamentos a serem liberados pelo Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e BNDES. A revelação do ministro da Articulação Política do Governo não poderia conter cinismo maior. O próprio Marun acentuou tratar-se de um caso de reciprocidade. Incrível.

O ministro ressaltou também que o BB, a CEF e o BNDES são órgãos do governo. Não explicou que a concessão de financiamentos e empréstimos cabe às presidências e diretorias dos três bancos. Deixou claro que não se trata de análise para concessão de créditos e sim da seleção dos deputados e senadores à base de seus votos.



Na noite de terça-feira, o Jornal Nacional da Globo mostrou a gravação contendo as declarações do deputado, hoje investido de ministro, confirmando com naturalidade a proposta de suborno. A Globonews também colocou no ar a matéria. E o assunto, nesta quarta-feira, foi objeto de reportagem de Letícia Fernandes, O Globo, e de comentário de Miriam Leitão destacando o comportamento negativo de alguém que publicamente assume uma proposta de subornar aqueles que podem depender do Executivo para obter lucros e vantagens. A entrevista de Carlos Marun foi um desastre para o Palácio do Planalto.

Vai causar uma forte reação daqueles que vão votar o projeto do governo. Não pode ser o contrário, a menos que os parlamentares aceitem a sinuosa colocação feita pelo ministro da Articulação Política. A diferença é grande: uma coisa é articular, outra é subornar.
Mas eu disse que Carlos Marun não conhece, ou não deseja conhecer, a realidade da saúde pública no país. O Conselho Federal de Medicina revelou em sua publicação mensal que no país existem 904.000 pessoas aguardando uma cirurgia na fila interminável do SUS. Esse número foi constatado no período janeiro a início de novembro deste ano. A publicação me foi entregue pelo médico Pedro Campello.

Há casos em que a espera alonga-se por 10 anos. Muitos morrem à espera de atendimento, isso em todo o país. Carlos Marun não pode desconhecer o assunto porque ele é objeto de reportagem de Adriana Dias Lopes na revista Veja que está nas bancas.

Portanto, a tentativa de suborno, de outro o atestado irrefutável da omissão e do desrespeito à condição humana.

Zé Dirceu cria o 'Dia da Fúria' para intimidar a Justiça

O Zé Dirceu é um cara ousado, independente de ser comprovadamente um corrupto. Articulador político do PT e conselheiro privilegiado do ex-presidente Lula, condenado por roubar dinheiro público, o Zé já demonstrou em vários momentos que não teme a justiça, mesmo depois dos vários anos de cadeia nos presídios brasileiros. Agora mesmo ele lança a campanha “Dia de Fúria” para intimidar os juízes do TRF4 que vão revisar, no dia 24 de janeiro, a condenação de nove anos imposta ao Lula pelo juiz Sérgio Moro.

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O ex-ministro, ainda sob a vigilância da justiça, gravou um vídeo e espalhou pela rede social, no qual convoca os militantes petistas para um protesto em Porto Alegre para pressionar os desembargadores. Condenado várias vezes, Zé teve a pena aumentada para 30 anos e 9 meses por esse mesmo tribunal, mas isso não o intimidou a se voltar contra os magistrados que julgam, em segunda instância, os processos da Lava Jato.

Quando estava atrás das grades, o Zé pensava como um monge e vivia como um borrego. Ao depor, emocionou-se ao pedir ao juiz Sérgio Moro que tivesse piedade dele por ser uma pessoa idosa e ter uma filha menor de idade. Consciente de que Dirceu dramatizava o apelo, Moro não se comoveu e o condenou a 20 anos e dez meses, mantendo-o no presídio. Coube aos ministros da segunda turma do STF (Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski) devolvê-lo aos seus familiares, mesmo depois que o TRF4 aumentou a sua pena para mais de 30 anos.

Os petistas, a exemplo de Zé Dirceu, são assim mesmo: na prisão esforçam-se para se mostrar submissos, áulicos e serviçais. Fora dela, botam as garras de fora, agitam-se e se transformam em criminosos reincidentes e perigosos. Quando esteve preso, cumprindo a pena do mensalão, Dirceu continuou a delinquir, como provou a justiça. De dentro do presídio, ele comandou o esquema de corrupção na Petrobrás e nas empreiteiras. Trata-se de um criminoso patológico, que já devia estar fora do convívio social há muito tempo, basta tão somente que a justiça faça prevalecer o que ela mesmo decidiu sobre a conduta desse delinquente.

Os petistas não se conformam com o fim da mamata, com o expurgo do poder. Rosnam como cães raivosos quando acuados pelos procuradores da Lava Jato. Contudo, veem, aos poucos, a organização criminosa se esfacelar com a condenação de seus principais líderes. Temem pela prisão do seu chefe maior e o efeito cascata dessa sentença, pois sabem que o castelo de areia vai desmoronar.

Zé Dirceu, o xerife sem estrela, megalômano, age como se ainda estivesse entre as quatro paredes do Palácio do Planalto, onde ali foi formada a maior quadrilha da história do país. Quer fazer fora da cela o que não fez dentro do presídio, onde rezava como cordeiro na cartilha dos presos antigos que comandam o sistema carcerário. Livre, por uma ação do STF, quer agora cantar de galo, ignorando que a qualquer momento pode voltar à cela quando se esgotarem seus recursos junto ao tribunal de Porto Alegre. De volta à prisão certamente continuará a vida nababesca. O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, acaba de aprovar uma aposentadoria para ele de R$ 9.600,00, mesmo sendo um deputado cassado.

Os petistas querem ganhar no grito, como sempre fizeram quando viviam do imposto sindical e estavam no poder. Ainda não perceberam a mudança da correlação de força. A última convocação para levar os trabalhadores à rua contra a reforma da Previdência foi um fracasso. Desistiram antes de juntar os cacos, pois perceberam que não havia mais comando de ordem para encher as praças públicas nem o delivery da tradicional mortadela. Com a lenta recuperação da economia, seus adeptos preferem o emprego e a comida na mesa à balbúrdia e os tumultos das ruas.

Não entenderam ainda, os petistas, coitados, que o país continua funcionando dentro da legalidade democrática apesar das crises políticas. E que a prisão do Lula, se ocorrer, não vai provocar nenhuma cisão nas instituições. Aliás, antes de ser condenado, Lula espalhava aos ventos que se isso acontecesse, o seu “Exército Vermelho”, a turma do Stédeli, iria tocar fogo no país. Pois bem, o país não saiu chamuscado até hoje mesmo depois da sentença do seu líder de papel.

O resto é conversa pra boi dormir.

Trova do banqueiro

O trabalho do banqueiro
está no seu jogo impuro:
tem lucro com meu dinheiro
e ainda me cobra juro.

Olympio Coutinho

A farra dos penduricalhos

A banalização dos benefícios pecuniários pagos à magistratura tornou impossível saber ao certo qual é o custo efetivo do Poder Judiciário com a folha de pagamento de seus juízes, desembargadores e ministros. Ao todo, são 91 tribunais e em quase todos seus integrantes ganham verba de representação, bonificações e gratificações sob a forma de auxílio-moradia, auxílio-alimentação, auxílio-saúde, auxílio-livro, auxílio-paletó e vários outros penduricalhos pagos com dinheiro dos contribuintes. Como cada tribunal tem sua lista de penduricalhos, a área técnica do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estima que existam em todo o País 40 tipos distintos de gratificações, representações e adicionais aos salários dos juízes.

Com base em informações atualizadas enviadas ao CNJ sobre os vencimentos de cada um de seus magistrados, o Estadão Dados constatou que, no período entre janeiro e novembro de 2017, esses penduricalhos custaram R$ 890 milhões aos cofres públicos. Descobriu, igualmente, que os penduricalhos pagos aos 14 mil magistrados dos Tribunais de Justiça representam, em média, 30% de seu salário básico. Descobriu, ainda, que três em cada quatro juízes estaduais recebem auxílio-moradia, independentemente da cidade onde trabalham e do fato de possuírem ou não residência própria.

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Além disso, como os penduricalhos são pagos a título de verba indenizatória, e não como vencimentos, os valores não são levados em conta no cálculo do teto salarial estabelecido pela Constituição para a administração pública, que hoje é de R$ 33,7 mil. Pela pesquisa do Estadão Dados, um terço dos juízes estaduais tem vencimentos líquidos superiores ao teto. A remuneração nacional média desse grupo é de R$ 42,5 mil. Em Rondônia, a média é de R$ 68,8 mil. No topo da lista, um magistrado desse Estado recebeu recentemente R$ 227 mil no contracheque. E, em julho, um juiz de primeira instância do Estado de Mato Grosso recebeu quase duas vezes e meia esse valor.

Ao defender os penduricalhos da magistratura, que sempre esteve entre as categorias mais bem pagas do funcionalismo público, os presidentes dos tribunais alegam que, se não receberem salários equivalentes aos diretores jurídicos das grandes empresas, os juízes não seriam eficientes na defesa da cidadania e na decisão das questões de alto relevo público. Independentemente da falta de uma relação lógica entre uma coisa e outra, pois a eficiência de um magistrado depende de sua competência, de seu esforço e de sua responsabilidade, os dirigentes da Justiça também não negam que a multiplicação dos penduricalhos foi a resposta que o Judiciário deu ao Executivo, quando os responsáveis pelas finanças públicas alegaram não dispor de recursos para aumentar ainda mais os já polpudos salários dos magistrados. Há três anos, o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) chegou ao disparate de invocar a necessidade de um padrão mínimo de elegância dos juízes para justificar a concessão dos penduricalhos.

O principal argumento da magistratura é que esses benefícios são previstos por lei, motivo pelo qual seu pagamento não seria irregular. O problema, porém, não está na legalidade dos benefícios, mas na sua falta de legitimidade, afirma o ex-presidente do STF Carlos Ayres Britto, profundo conhecedor das artimanhas dos magistrados para burlar as limitações impostas pela Constituição que juraram cumprir. “À medida que há claraboias nesse teto, perde-se a noção dos custos do Judiciário”, afirma o ex-ministro.

A farra dos penduricalhos no Judiciário chegou a tal ponto que até juízes aposentados entraram com ações reivindicando, em nome do princípio da isonomia, os mesmos “direitos” dos magistrados da ativa. Isso mostra o grau de descolamento da realidade por parte de uma corporação incapaz de perceber a crise econômica em que o País se encontra e de compreender que, embora os Poderes sejam independentes, o cofre é um só e a responsabilidade sobre o que nele sai e entra é do Executivo.

Editorial - Estadão