quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Indulto se torna insulto na Pasárgada de Temer

Quando escreveu sobre seu sonho de ir embora para Pasárgada, onde era amigo do rei, Manoel Bandeira imaginou que traduzia o desejo de toda a gente. Não poderia supor que, sob Michel Temer, todos os atrativos da terra desejada —ginástica, bicicleta, burro brabo, pau-de-sebo, banho de mar, beira de rio e até a mulher desejada na cama escolhida— seriam trocados por um único benefício: o indulto natalino do rei.

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A Pasárgada de Temer é uma monarquia sui generis. Nela, reina a corrupção. Os amigos do monarca se dividem em dois grupos: os presos e os que aguardam na fila, escondidos atrás do escudo do foro privilegiado. Não desfrutam apenas da amizade do rei. Integram a sua corte. Observam o caos ao redor como se olhassem para outro país, no qual não vivem. O indulto natalino do rei transformou este Brasil alternativo numa Pasárgada turbinada, muito além da sonhada.

Antes, os indultos natalinos colocavam em liberdade os condenados a menos de 12 anos de cadeia por crimes não violentos —corrupção e lavagem de dinheiro, por exemplo— desde que tivessem cumprido um terço da pena. Em 2016, Temer reduziu o tempo de cana para um quarto (25%). Neste ano de 2017, a temporada atrás das grades caiu para um quinto (20%). Mais: foi para o beleléu a barreira que impedia o perdão de condenados a mais de 12 anos. Pior: anistiaram-se também as multas.

Nesta quarta-feira, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, protocolou no Supremo Tribunal Federal uma ação contra o decreto de indulto natalino editado por Temer. A doutora anotou na peça que a generosidade do rei levará à “impunidade de crimes graves, como aqueles no âmbito da Lava Jato e de outras operações contra a corrupção''.

Dodge acrescentou: ''O chefe do Poder Executivo não tem poder ilimitado de conceder induto. Se o tivesse, aniquilaria as condenações criminais, subordinaria o Poder Judiciário, restabeleceria o arbítrio e extinguiria os mais basilares princípios que constituem a República Constitucional Brasileira.''

O que Raquel Dodge escreveu, com outras palavas, foi que o indulto de Temer é um insulto. Mantido o decreto, a Pasárgada hipertrofiada será um lugar onde os amigos do rei integrarão uma confraria dentro da minoria. Na terra dos confrades, o poder, além de se corromper e ser corrompido, ameniza as penas.

De plantão no Supremo Tribunal Federal, a ministra Cármen Lúcia pode restaurar a República por meio de uma liminar que suspenda o descalabro. Do contrário, a Suprema Corte também irá para Pasárgada, um país onde os amigos do rei sempre terão a impunidade desejada no decreto escolhido.

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