sábado, 12 de dezembro de 2015
E o pulso ainda pulsa
Em 1906, graças aos investimentos feitos em saneamento básico e saúde pública pelo governador Jorge Tibiriçá que poderia dar aulas de modernidade a 9,9 entre 10 dos políticos brasileiros de hoje, São Paulo comemorou a extinção da febre amarela e da varíola na capital.
Agora, com apenas 13 anos de PT, aí estão São Paulo e o Brasil afundados na dengue, na chikungunia, na zika e na microcefalia galopantes…
Ontem à noite voltei ao 2º volume de “Julio Mesquita e Seu Tempo“, de Jorge Caldeira, que é, na verdade, uma fascinante história dos primeiros passos do capitalismo brasileiro que nasceu com a Republica. Em outro livro imprescindível à compreensão do Brasil de hoje, “História do Brasil com Empreendedores“, Caldeira já tinha demonstrado com farta documentação como Caio Prado Junior, com seu marxismo de orelha (ele nunca leu Marx), animou duas ou tres gerações de patrulheiros ideológicos a manter o Brasil intoxicado e moralmente deprimido pela quimioterapia que lhe foi imposta para o tratamento de uma doença que ele nunca teve, e consagra-se cada vez mais como o grande historiador do Brasil Real, este da gente que trabalha e vem construindo a nação na semi-clandestinidade, desviando-se como pode do cêrco da vanguarda do atraso que, dominando quase sempre a política nacional, nunca se conformou em perder os privilégios que o absolutismo monárquico lhe garantia. (Leia mais sobre a obra de Caldeira aqui e aqui).
O lulopetismo, que se afirma “progressista“, é o herdeiro direto, com um pouco menos de polimento, dos reacionários “positivistas” que desde o primeiro dia da República vêm lutando para banir a liberdade de trabalhar e empreender que ela tentou instituir para voltar a centralizar absolutamente o processo econômico e subordinar tudo às autorizações (comercializáveis) do Estado. Vende a idéia de que trabalha pelos mais pobres mas repete, apenas, os expedientes, ou dos ditadores militares, ou dos ditadores da “zelite” para conquistar para si os privilégios que foram deles.
É impressionante, no livro, a minúcia com que as ações do petismo de hoje se configuram como a exata reprodução dos expedientes das duas ditaduras que inauguraram nossa história republicana e dos presidentes “imperiais” que vieram depois de Prudente de Morais. Até a relação invertida entre o Rio de Janeiro e o Brasil moderno, que não se reformou até hoje, é milimétrica. Vítima da corrupção pela corte pela qual foi invadido em 1808, o Rio nunca mais se adaptou completamente à modernidade; sempre foi bem quando o Brasil foi mal e mal quando o Brasil foi bem, exatamente como agora, com seus políticos, sempre na vanguarda da ala mais podre do Brasil Oficial, se esforçando por nos empurrar de volta para trás. Aí está o melífluo Pezão e seu fantoche Leonardo Picciani, trabalhando ferozmente para abortar o impeachment que pode salvar o Brasil do retorno à idade média para não nos deixar mentir.
É notável, ainda, a exata semelhança do episódio do resgate da Argentina das mãos dos “petistas” de lá e da recusa de Cristina Kirshner, a Dilma deles, de comparecer à posse de Maurício Macri, e a da transmissão da presidência de Floriano Peixoto, o segundo ditador da Republica, para Prudente de Morais, o primeiro democrata (e um dos únicos verdadeiros) a ocupar a Presidência. Floriano não só não foi à posse do sucessor como mandou destruir a golpes de baioneta todos os móveis do palácio. E o establishmentpolítico do Rio de Janeiro, então capital da Republica, tinha tanto horror ao que Prudente representava que quando ele desembarcou na estação, vindo de São Paulo, não havia ninguém esperando. Ele chegou ao palácio sozinho num táxi (quatro anos depois sairia em triunfo, depois de conquistar o povo carioca e brasileiro).
É por essas e outras que é preciso fazer saber àquela boa gente do Estado Islâmico com quem Dilma Rousseff já manifestou a intenção de se entender que existem caminhos muito mais fáceis para o retorno ao Século 7º do que este que eles estão tentando abrir com bombas e decapitações.
O PT resolve isso com uma perna nas costas.
Entre Cunha e chicungunha
No mundo real, as coisas são complexas, ainda que nem sempre complicadas. Admitir a complexidade significa reconhecer que elas são entretecidas: um fio se trança com outros. Esquecer isso pode fazer com que alguns esforços sejam inúteis, e a busca de soluções simples fique reduzida apenas a propostas simplistas, que não consideram o todo.
Diante do alarmante crescimento dos casos de microcefalia em bebês, relacionados ao vírus zica, voltam as campanhas para que a população não deixe água limpa parada, tampe recipientes, ponha areia nos vasinhos de plantas. Decretos de situação de emergência permitem que agentes de saúde e o Exército forcem entrada em casas. Aconselham-se repelentes, meias, mangas compridas,
Ainda bem, é indispensável mesmo tomar essas medidas. Mas por que só agora? Por que o lixo se acumula? Certamente, nele há muitíssimos criadouros do mosquito, após qualquer chuva que caia em qualquer plástico de formato côncavo que retenha água, em pneus acumulados, latas velhas, copos descartáveis, garrafas pet. Nossa educação precária fica evidente em cada um deles. Como se recolhe o lixo no alto de morros em que só é possível chegar por escadinhas ou vielas estreitas onde não passa caminhão? Há quem cuidadosamente o traga até uma caçamba mais em baixo, sem dúvida, mas há também quem simplesmente jogue um voador encosta abaixo, onde ficará criando mosquito. Cada vez que boas intenções politicamente corretas repetem que favela não é problema, é solução, deviam insistir também em dizer que é só meia solução, a ser complementada pela presença obrigatória de serviços públicos essenciais, como o secretário Beltrame não se cansa de lembrar.
Inclusive boas escolas. Limpeza também tem a ver com educação. Mas a falta de recolhimento de lixo não é uma carência apenas das chamadas comunidades. Está nas invasões que se multiplicam pelas periferias. Nos pontos de ônibus. Ao longo de qualquer estrada brasileira. Em maior ou menos escala, está por toda parte, com poucas exceções.
Nosso problema habitacional é imenso e mal resolvido. Agravado porque o país abandona o interior e as cidades menores, de tal forma que deixa seus habitantes quase sem escolha. Suga-se gente do campo para metrópoles já abarrotadas e superpovoadas, sempre recebendo pessoas em busca de oportunidades e sonhos, fugindo de uma sina madrasta em sua terra, para esquecer a mais absoluta falta de perspectivas. Mesmo quando um programa como Minha Casa Minha Vida procura melhorar as coisas, ninguém se lembra de incluir telas nas esquadrias das casas para barrar a entrada de insetos, vindos das poças, valões e monturos de lixo que continuam lá fora. Nada disso é complicado: é apenas complexo, por reunir fios diferentes — saneamento e habitação, educação e saúde.
A omissão não é de admirar, num país complexo e confuso, onde tudo está ligado mas parece estanque. E onde vingança e chantagem engordam pedido de impeachment de presidente, em meio a um campeonato de ver quem mente mais. E enquanto ela jura honradez (o que ninguém lhe negou) e silencia sobre o crime de responsabilidade de que a acusam, chama-se de golpe um recurso constitucional. Além de convocarem a Brasília (quem pagou as passagens?) 30 juristas que pensam igual, querem nomear para a comissão oito deputados que pensam igual. Tudo entrelaçado e complexo, da chantagem à mentira, passando pelo pensamento único.
Quando os especialistas dizem que a proliferação do mosquito é um problema mais urbano que rural ou silvestre, não apenas distinguem a malária (transmitida peloAnopheles) das doenças transmitidas pelo Aedes aegypti. Dão também uma pista sobre as condições de um tipo de habitat que nos caracteriza e atrapalha o combate aos vírus da dengue, da chicungunha, da zica (por que escrever com k?) e outros. É incrível que, em pleno século XXI, não se consiga controlá-los.
A atuação pioneira de laboratórios em nossas universidades já descobriu formas de combatê-los, introduzindo na natureza mosquitos geneticamente modificados que sustam a proliferação da espécie. Mas não há verbas suficientes. Então essa solução não pode ser adotada na escala necessária.
Agora se anuncia que falta larvicida no Nordeste. Não surpreende: saneamento, saúde, educação, segurança não são tratados como importantes diante das despesas de custeio de uma máquina administrativa e burocrática inchada, um tanto inútil, e milhares de vezes maior do que existe no resto do mundo. Para não chover no molhado, basta um lembrete: neste ano de cortes, em que o ajuste fiscal é confessada prioridade do governo, o fundo partidário mais do que triplicou. Já outras verbas ficam na saudade. Para não falar em desvios e propinas.
Diante do alarmante crescimento dos casos de microcefalia em bebês, relacionados ao vírus zica, voltam as campanhas para que a população não deixe água limpa parada, tampe recipientes, ponha areia nos vasinhos de plantas. Decretos de situação de emergência permitem que agentes de saúde e o Exército forcem entrada em casas. Aconselham-se repelentes, meias, mangas compridas,
mosquiteiros, cuidados para não engravidar. Usam-se drones para localizar possíveis focos. Em alguns casos, até caminhões são mandados para recolher lixo acumulado havia meses numa esquina ou terreno baldio.
Ainda bem, é indispensável mesmo tomar essas medidas. Mas por que só agora? Por que o lixo se acumula? Certamente, nele há muitíssimos criadouros do mosquito, após qualquer chuva que caia em qualquer plástico de formato côncavo que retenha água, em pneus acumulados, latas velhas, copos descartáveis, garrafas pet. Nossa educação precária fica evidente em cada um deles. Como se recolhe o lixo no alto de morros em que só é possível chegar por escadinhas ou vielas estreitas onde não passa caminhão? Há quem cuidadosamente o traga até uma caçamba mais em baixo, sem dúvida, mas há também quem simplesmente jogue um voador encosta abaixo, onde ficará criando mosquito. Cada vez que boas intenções politicamente corretas repetem que favela não é problema, é solução, deviam insistir também em dizer que é só meia solução, a ser complementada pela presença obrigatória de serviços públicos essenciais, como o secretário Beltrame não se cansa de lembrar.
Inclusive boas escolas. Limpeza também tem a ver com educação. Mas a falta de recolhimento de lixo não é uma carência apenas das chamadas comunidades. Está nas invasões que se multiplicam pelas periferias. Nos pontos de ônibus. Ao longo de qualquer estrada brasileira. Em maior ou menos escala, está por toda parte, com poucas exceções.
Nosso problema habitacional é imenso e mal resolvido. Agravado porque o país abandona o interior e as cidades menores, de tal forma que deixa seus habitantes quase sem escolha. Suga-se gente do campo para metrópoles já abarrotadas e superpovoadas, sempre recebendo pessoas em busca de oportunidades e sonhos, fugindo de uma sina madrasta em sua terra, para esquecer a mais absoluta falta de perspectivas. Mesmo quando um programa como Minha Casa Minha Vida procura melhorar as coisas, ninguém se lembra de incluir telas nas esquadrias das casas para barrar a entrada de insetos, vindos das poças, valões e monturos de lixo que continuam lá fora. Nada disso é complicado: é apenas complexo, por reunir fios diferentes — saneamento e habitação, educação e saúde.
A omissão não é de admirar, num país complexo e confuso, onde tudo está ligado mas parece estanque. E onde vingança e chantagem engordam pedido de impeachment de presidente, em meio a um campeonato de ver quem mente mais. E enquanto ela jura honradez (o que ninguém lhe negou) e silencia sobre o crime de responsabilidade de que a acusam, chama-se de golpe um recurso constitucional. Além de convocarem a Brasília (quem pagou as passagens?) 30 juristas que pensam igual, querem nomear para a comissão oito deputados que pensam igual. Tudo entrelaçado e complexo, da chantagem à mentira, passando pelo pensamento único.
Fim da amnésia cívica
O advento da internet e das redes sociais fornece o antídoto mais eficaz contra uma das maiores moléstias de que sempre padeceu o povo brasileiro: a amnésia histórica.
O falecido Ivan Lessa, no seu estilo hiperbólico, escreveu certa vez que “o brasileiro, a cada quinze minutos, esquece o que lhe aconteceu nos últimos quinze minutos”.
Essa anomalia permitiu, entre nós, que a história frequentemente se repetisse como farsa e como tragédia. E estimulou políticos e partidos a se valer dos mesmos expedientes para renovar trapaças e engodos, com o objetivo de alcançar ou manter o poder. Basta conferir a gênese dos numerosos golpes e tentativas de golpe da história republicana brasileira.
No caso presente, em que o PT pretende convencer a população de que o processo de impeachment, previsto na Constituição, é um golpe, ninguém o contradiz com mais eficácia que ele próprio, o PT. Basta resgatar na internet vídeos do protagonismo do partido ao tempo em que defendeu por duas vezes a deposição, por aquela via, de dois presidentes da República.
No caso de Fernando Collor, em 1992, não estava só – e havia motivos. A sociedade se engajou e o impeachment aconteceu. O importante, porém, é conferir a argumentação de então, sustentada pelos próceres do partido. Fiquemos com Lula.
As falas estão no Youtube, mas é importante registrá-las por escrito, pois, como disse recentemente o vice Michel Temer, em carta à presidente Dilma, “verbam volant, scripta manent” (“as palavras voam, os escritos permanecem”).
Numa entrevista a um telejornal, Lula sustentava:
“O Congresso Nacional sabe da responsabilidade que hoje recai sobre os ombros da instituição e sabe que, se não votar o impeachment, ficará desacreditado na opinião pública. Acho que o Congresso Nacional tem clareza de que nós vivemos uma crise profunda de governo e somente com a saída do governo é que nós iremos resolver alguns problemas da nação”.
Não alegou um crime, embora houvesse, mas “uma crise profunda de governo” para justificar a saída do presidente. Uma crise bem menor que a atual, diga-se. Mas sigamos.
Em um programa de auditório, respondendo a uma jovem, Lula foi categórico:
“O povo brasileiro, pela primeira vez na América Latina, deu uma demonstração de que é possível que o mesmo povo que elege um político possa destituir esse político”. E concluía, categórico: “Eu peço a Deus que nunca mais o povo brasileiro esqueça essa lição”. Deus, ao que parece, o atendeu - o povo brasileiro, nas ruas hoje pelo impeachment de Dilma, não esqueceu a lição.
Em janeiro de 1999, uma semana após a posse de FHC, reeleito em primeiro turno, tem início a segunda – e dessa vez fragorosamente fracassada – campanha por novo impeachment.
Começou com o então governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, num artigo para a Folha de S. Paulo. Baseava-se não num crime comum, como os já levantados pela Lava Jato, ou num crime de responsabilidade, como as pedaladas contra a Lei de Responsabilidade Fiscal, condenadas pela unanimidade do TCU (algo inédito na história), mas na suposta infração que representariam atos de política econômica de alegada inspiração “neoliberal”, que teriam feito o país recorrer ao FMI. Nada menos.
No curso daquele ano, a pretexto do Proer – o plano de recuperação dos bancos, que Lula, já no poder, elogiaria -, que provocara uma CPI dos Bancos no Senado, o PT formalizou junto à Câmara, presidida por Michel Temer, um pedido de impeachment.
Foi arquivado por falta de fundamentação jurídica. O autor do pedido, o petista carioca Milton Temer (nenhum parentesco com Michel) aludia ainda ao “crime” de “estelionato eleitoral”, alegando que FHC, além dos atos do Proer (que, repita-se, seriam reconhecidos como indispensáveis pelo PT quando no poder), prometera a criação de empregos, “ao tempo em que negociava com o FMI a política de recessão em que nos encontramos”.
Comparada à crise de hoje, aquela seria um surto de prosperidade, em plena vigência do Plano Real.
José Dirceu acusou FHC de “crime de responsabilidade”, por ter “coagido” o Ministério Público – “o que é público e notório e dispensa provas”. Impeachment sem provas, em nome da democracia. A roubalheira do PT na Petrobrás é “pública e notória” e, mesmo com abundância de provas (que, inclusive, levaram José Dirceu à cadeia), é vista hoje pelo PT como “insuficiente para enquadrar a presidente”, que desde 2003 comanda a estatal.
Além do PT, subscreviam aquele pedido o PDT (partido a que então pertencia Dilma Roussef), PSB e PCdoB – os mesmos que hoje (coincidência?) falam em “golpe”.
Michel Temer arquivou a proposta, o PT recorreu ao plenário pelo desarquivamento e perdeu feio: 342 a 100.
Em momento algum, o PT admitiu a ideia de golpe, que hoje proclama. Como em 1992 (e bem ao contrário de hoje), mencionou a Constituição, o teor democrático da iniciativa e a ideia de que, se o povo elegeu, pode deseleger.
O detalhe é que o PT, naquela época, se julgava o próprio povo, que nem tomou conhecimento daquela iniciativa esdrúxula. O PT está sendo banido da História pelo Facebook.
O falecido Ivan Lessa, no seu estilo hiperbólico, escreveu certa vez que “o brasileiro, a cada quinze minutos, esquece o que lhe aconteceu nos últimos quinze minutos”.
Essa anomalia permitiu, entre nós, que a história frequentemente se repetisse como farsa e como tragédia. E estimulou políticos e partidos a se valer dos mesmos expedientes para renovar trapaças e engodos, com o objetivo de alcançar ou manter o poder. Basta conferir a gênese dos numerosos golpes e tentativas de golpe da história republicana brasileira.
No caso de Fernando Collor, em 1992, não estava só – e havia motivos. A sociedade se engajou e o impeachment aconteceu. O importante, porém, é conferir a argumentação de então, sustentada pelos próceres do partido. Fiquemos com Lula.
As falas estão no Youtube, mas é importante registrá-las por escrito, pois, como disse recentemente o vice Michel Temer, em carta à presidente Dilma, “verbam volant, scripta manent” (“as palavras voam, os escritos permanecem”).
Numa entrevista a um telejornal, Lula sustentava:
“O Congresso Nacional sabe da responsabilidade que hoje recai sobre os ombros da instituição e sabe que, se não votar o impeachment, ficará desacreditado na opinião pública. Acho que o Congresso Nacional tem clareza de que nós vivemos uma crise profunda de governo e somente com a saída do governo é que nós iremos resolver alguns problemas da nação”.
Não alegou um crime, embora houvesse, mas “uma crise profunda de governo” para justificar a saída do presidente. Uma crise bem menor que a atual, diga-se. Mas sigamos.
Em um programa de auditório, respondendo a uma jovem, Lula foi categórico:
“O povo brasileiro, pela primeira vez na América Latina, deu uma demonstração de que é possível que o mesmo povo que elege um político possa destituir esse político”. E concluía, categórico: “Eu peço a Deus que nunca mais o povo brasileiro esqueça essa lição”. Deus, ao que parece, o atendeu - o povo brasileiro, nas ruas hoje pelo impeachment de Dilma, não esqueceu a lição.
Em janeiro de 1999, uma semana após a posse de FHC, reeleito em primeiro turno, tem início a segunda – e dessa vez fragorosamente fracassada – campanha por novo impeachment.
Começou com o então governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, num artigo para a Folha de S. Paulo. Baseava-se não num crime comum, como os já levantados pela Lava Jato, ou num crime de responsabilidade, como as pedaladas contra a Lei de Responsabilidade Fiscal, condenadas pela unanimidade do TCU (algo inédito na história), mas na suposta infração que representariam atos de política econômica de alegada inspiração “neoliberal”, que teriam feito o país recorrer ao FMI. Nada menos.
No curso daquele ano, a pretexto do Proer – o plano de recuperação dos bancos, que Lula, já no poder, elogiaria -, que provocara uma CPI dos Bancos no Senado, o PT formalizou junto à Câmara, presidida por Michel Temer, um pedido de impeachment.
Foi arquivado por falta de fundamentação jurídica. O autor do pedido, o petista carioca Milton Temer (nenhum parentesco com Michel) aludia ainda ao “crime” de “estelionato eleitoral”, alegando que FHC, além dos atos do Proer (que, repita-se, seriam reconhecidos como indispensáveis pelo PT quando no poder), prometera a criação de empregos, “ao tempo em que negociava com o FMI a política de recessão em que nos encontramos”.
Comparada à crise de hoje, aquela seria um surto de prosperidade, em plena vigência do Plano Real.
José Dirceu acusou FHC de “crime de responsabilidade”, por ter “coagido” o Ministério Público – “o que é público e notório e dispensa provas”. Impeachment sem provas, em nome da democracia. A roubalheira do PT na Petrobrás é “pública e notória” e, mesmo com abundância de provas (que, inclusive, levaram José Dirceu à cadeia), é vista hoje pelo PT como “insuficiente para enquadrar a presidente”, que desde 2003 comanda a estatal.
Além do PT, subscreviam aquele pedido o PDT (partido a que então pertencia Dilma Roussef), PSB e PCdoB – os mesmos que hoje (coincidência?) falam em “golpe”.
Michel Temer arquivou a proposta, o PT recorreu ao plenário pelo desarquivamento e perdeu feio: 342 a 100.
Em momento algum, o PT admitiu a ideia de golpe, que hoje proclama. Como em 1992 (e bem ao contrário de hoje), mencionou a Constituição, o teor democrático da iniciativa e a ideia de que, se o povo elegeu, pode deseleger.
O detalhe é que o PT, naquela época, se julgava o próprio povo, que nem tomou conhecimento daquela iniciativa esdrúxula. O PT está sendo banido da História pelo Facebook.
Na rua ou em casa, vendo TV, você decide
Teodiceia é a parte da teologia que investiga as origens do mal. Trata, portanto, de perguntas que angustiam o ser humano desde tempos imemoriais.
No Brasil, essa disciplina teológica tem milhões de cultores – e não sem razão. Por que nosso país se desenvolveu muito menos do que poderia e permanece impotente para erradicar sua imensa chaga de pobreza? Por que temos uma multidão de analfabetos funcionais e um sistema educacional vergonhoso? Como pudemos chegar a índices absolutamente espantosos de corrupção e criminalidade violenta?
Durante séculos, centenas de eruditos escritores, ensaístas e antropólogos perscrutaram nossa História em busca das raízes profundas de nossos males. Sem pendor para inquirições tão abrangentes, tentarei examinar a questão em função do momento imediato. A questão, agora, é que o enorme estoque de maldições que a História nos legou entrou numa trajetória de acelerado crescimento. Podemos afirmar sem temor a erro que o futuro da próxima geração será rapidamente destruído se nada for feito para reverter tal processo. A raiz desse mal específico está à vista de todos: um governo grotescamente incompetente, prepotente e sem rumo. As alternativas ao nosso alcance são, pois, meridianamente claras: ou o impeachment, para que um novo governo se possa organizar sobre os escombros do atual, ou deixar o País por mais três anos nas mãos de Dilma Rousseff e de tudo o que ela representa.
No plano jurídico, a presidente é acusada (originariamente pelo Tribunal de Contas da União) de se haver posto acima das leis que regem a aplicação dos recursos públicos. Na economia, ao contrário do que ela insiste em repetir, o desastre não decorreu de fatores externos, nem primacialmente de um Congresso hostil, muito menos de uma oposição demoníaca. Decorreu de sua obstinada teimosia, de seu desábito de fazer uso dos órgãos auriculares e de sua formação sabidamente diáfana em economia. O resultado aí está: 4,5 de recessão nos últimos 12 meses; a inflação subindo lépida e fagueira para a casa dos dois dígitos, apesar da taxa básica de juros em 14,5%; e uma legião de indivíduos abatidos pelas agruras presentes do desemprego, ou por maus
A principal causa do que acontece no futuro é, como se sabe, o que acontece no presente. Daí minha curiosidade em saber como certos setores da sociedade se vão comportar nos próximos dias: se irão à rua ou se preferirão acompanhar as manifestações pela TV, endossando implicitamente a continuação do atual estado de coisas.
Os grandes empresários, por exemplo. Como explicam a origem do mal é algo que ignoro por completo. O bem – a crer nos ensinamentos de um celebrado filósofo – provém das tetas do Estado. No momento atual, o que os influencia mais: a recessão brutal em que o País se encontra ou o estado de bem-aventurança que o BNDES lhes assegurou sob Lula e Dilma?
No pequeno e médio empresariado, o que desde há muito me impressiona é sua tendência a crer em duendes. No passado recente muitos acreditaram que o Brasil, tendo atingido a invejável marca de metade ou mais da população na “classe média”, estaria batendo às portas do Primeiro Mundo. Não se deram conta de que o modelo de crescimento acalentado pela sra. presidente não tem espaço para um pequeno empresariado moderno, com amplo acesso a crédito e tecnologia e a um mercado em expansão sem os artifícios do financiamento ao consumo. Por que, então, os menciono? Para brincar de humor negro? Não. Menciono-os porque ninguém como eles pode aquilatar o desastre econômico a que o País foi levado. Ninguém enxerga tão rapidamente a expressão “passa-se o ponto”, hoje visível em todo o Brasil.
Os pequenos e médios empresários trabalham como mouros, pagam impostos e arriscam seu capital. A mortandade de suas empresas é um espetáculo tão feio quanto a de peixes num rio cheio de mercúrio. Será que perscrutam a alma e nela creem ver um aceno do BNDES? Deve ser por isso que ainda hesitam em ir à rua exigir o fim do presente desgoverno.
E os líderes sindicais, saberão eles pelo menos quantos postos de trabalho foram para o vinagre graças à clarividência econômica da “doutora” Dilma? Onde está aquela meia dúzia de bravos que um dia jurou desmontar a organização sindical que os castrava? Ora, meus caros leitores, a vanguarda sindical daqueles tempos se associou ao PT e com ele se “reapelegou”.
Os estudantes universitários sabem que o sistema público vive uma situação de extrema penúria e o privado cobra os olhos da cara. Por que diabos isso estará acontecendo, se o governo federal está nas mãos do PT, se desde 2003 todos os ministros da Educação foram do PT, se o PT se proclama o mais lídimo representante da educação e da cultura e se o ambiente ideológico das universidades é sabidamente de esquerda? Será talvez porque a mãe, num incontido acesso de fúria, resolveu devorar os filhos?
Por último, os governadores e parlamentares federais. Tempo houve em que os governadores se comportavam como os eleitores esperam: como representantes de seus Estados, em primeiro lugar. Atualmente, é constrangedor observar a facilidade com que coonestam a pretensão populista de governar ao arrepio das leis, como pretendem Dilma Rousseff, seu mentor e seu partido.
Espetáculo ainda pior é o que muitos parlamentares federais nos têm proporcionado, comportando-se ora de forma errática, ora como terceirizados do Executivo, ora como diligentes despachantes federais. Oxalá me desmintam nos próximos dias, saindo às ruas e ostentando, na hora da verdade, a altivez que o mandato eletivo e a vida pública pressupõem.
No Brasil, essa disciplina teológica tem milhões de cultores – e não sem razão. Por que nosso país se desenvolveu muito menos do que poderia e permanece impotente para erradicar sua imensa chaga de pobreza? Por que temos uma multidão de analfabetos funcionais e um sistema educacional vergonhoso? Como pudemos chegar a índices absolutamente espantosos de corrupção e criminalidade violenta?
Durante séculos, centenas de eruditos escritores, ensaístas e antropólogos perscrutaram nossa História em busca das raízes profundas de nossos males. Sem pendor para inquirições tão abrangentes, tentarei examinar a questão em função do momento imediato. A questão, agora, é que o enorme estoque de maldições que a História nos legou entrou numa trajetória de acelerado crescimento. Podemos afirmar sem temor a erro que o futuro da próxima geração será rapidamente destruído se nada for feito para reverter tal processo. A raiz desse mal específico está à vista de todos: um governo grotescamente incompetente, prepotente e sem rumo. As alternativas ao nosso alcance são, pois, meridianamente claras: ou o impeachment, para que um novo governo se possa organizar sobre os escombros do atual, ou deixar o País por mais três anos nas mãos de Dilma Rousseff e de tudo o que ela representa.
No plano jurídico, a presidente é acusada (originariamente pelo Tribunal de Contas da União) de se haver posto acima das leis que regem a aplicação dos recursos públicos. Na economia, ao contrário do que ela insiste em repetir, o desastre não decorreu de fatores externos, nem primacialmente de um Congresso hostil, muito menos de uma oposição demoníaca. Decorreu de sua obstinada teimosia, de seu desábito de fazer uso dos órgãos auriculares e de sua formação sabidamente diáfana em economia. O resultado aí está: 4,5 de recessão nos últimos 12 meses; a inflação subindo lépida e fagueira para a casa dos dois dígitos, apesar da taxa básica de juros em 14,5%; e uma legião de indivíduos abatidos pelas agruras presentes do desemprego, ou por maus
presságios quanto ao médio prazo no mercado de trabalho.
Os grandes empresários, por exemplo. Como explicam a origem do mal é algo que ignoro por completo. O bem – a crer nos ensinamentos de um celebrado filósofo – provém das tetas do Estado. No momento atual, o que os influencia mais: a recessão brutal em que o País se encontra ou o estado de bem-aventurança que o BNDES lhes assegurou sob Lula e Dilma?
No pequeno e médio empresariado, o que desde há muito me impressiona é sua tendência a crer em duendes. No passado recente muitos acreditaram que o Brasil, tendo atingido a invejável marca de metade ou mais da população na “classe média”, estaria batendo às portas do Primeiro Mundo. Não se deram conta de que o modelo de crescimento acalentado pela sra. presidente não tem espaço para um pequeno empresariado moderno, com amplo acesso a crédito e tecnologia e a um mercado em expansão sem os artifícios do financiamento ao consumo. Por que, então, os menciono? Para brincar de humor negro? Não. Menciono-os porque ninguém como eles pode aquilatar o desastre econômico a que o País foi levado. Ninguém enxerga tão rapidamente a expressão “passa-se o ponto”, hoje visível em todo o Brasil.
Os pequenos e médios empresários trabalham como mouros, pagam impostos e arriscam seu capital. A mortandade de suas empresas é um espetáculo tão feio quanto a de peixes num rio cheio de mercúrio. Será que perscrutam a alma e nela creem ver um aceno do BNDES? Deve ser por isso que ainda hesitam em ir à rua exigir o fim do presente desgoverno.
E os líderes sindicais, saberão eles pelo menos quantos postos de trabalho foram para o vinagre graças à clarividência econômica da “doutora” Dilma? Onde está aquela meia dúzia de bravos que um dia jurou desmontar a organização sindical que os castrava? Ora, meus caros leitores, a vanguarda sindical daqueles tempos se associou ao PT e com ele se “reapelegou”.
Os estudantes universitários sabem que o sistema público vive uma situação de extrema penúria e o privado cobra os olhos da cara. Por que diabos isso estará acontecendo, se o governo federal está nas mãos do PT, se desde 2003 todos os ministros da Educação foram do PT, se o PT se proclama o mais lídimo representante da educação e da cultura e se o ambiente ideológico das universidades é sabidamente de esquerda? Será talvez porque a mãe, num incontido acesso de fúria, resolveu devorar os filhos?
Por último, os governadores e parlamentares federais. Tempo houve em que os governadores se comportavam como os eleitores esperam: como representantes de seus Estados, em primeiro lugar. Atualmente, é constrangedor observar a facilidade com que coonestam a pretensão populista de governar ao arrepio das leis, como pretendem Dilma Rousseff, seu mentor e seu partido.
Espetáculo ainda pior é o que muitos parlamentares federais nos têm proporcionado, comportando-se ora de forma errática, ora como terceirizados do Executivo, ora como diligentes despachantes federais. Oxalá me desmintam nos próximos dias, saindo às ruas e ostentando, na hora da verdade, a altivez que o mandato eletivo e a vida pública pressupõem.
O Brasil lava mais branco
O nome é PL 2.960, mas sugiro batizá-lo como estatuto de fundação da Lavabrás. Nasceu no governo, a pretexto de contribuir com o ajuste fiscal, foi aprovado na Câmara por 230 a 213, com os votos cruciais do PT e do PMDB, mas contra todos os partidos oposicionistas. Depois, percorreu o Senado em regime de urgência e pousou na mesa de Renan Calheiros, que pode expô-lo a deliberação final a qualquer momento. Não ganhou as manchetes principais dos jornais, embora provoque frêmitos quase sexuais no mercado financeiro. O Brasil de Dilma, Levy, Lula, Temer, Cunha e Calheiros alcançou consenso em alguma coisa: a legalização da lavagem de dinheiro oriundo do crime.
A Lavabrás opera no registro da duplicidade. Seu estatuto diz uma coisa em letras grandes e o oposto dela em letras pequenas. Letras grandes: o artigo 1º anuncia um "regime especial" de regularização de recursos e bens de origem lícita não declarados ao fisco, mantidos no exterior ou repatriados. Letras pequenas: o artigo 5º inclui no "regime" os frutos de uma longa série de crimes, oferecendo anistia geral, irrestrita, a sonegadores do fisco, violadores de regras tributárias, autores de golpes contra a Previdência, falsificadores de documentos públicos e privados, contrabandistas e, claro!, quadrilhas dedicadas à evasão de divisas e lavagem de dinheiro. Elaborada por gente que entende do riscado, a lei anistia a prática de associação criminosa, o uso de "laranjas" e os próprios "laranjas". Corra, Lola, corra: só ficam excluídos os condenados com sentença transitada em julgado.
A Lavabrás suprime o princípio da igualdade perante a lei, premiando seus sócios potenciais, os criminosos de colarinho branco, que obtêm excepcionais vantagens tributárias. Letras grandes: os recursos declarados no "regime especial" incorrem em imposto de 15% mais multa de 100% sobre o imposto, totalizando 30%, similar à taxação de contribuintes honestos e pontuais (27,5%, pessoa física, ou 34%, pessoa jurídica) e muito menos que a taxação de sonegadores comuns, sujeitos a multa de 150% mais juros Selic sobre o imposto devido. Letras pequenas: fixa-se o câmbio de conversão dos recursos pela cotação do dólar do último dia de 2014, o que representa um "desconto" da ordem de 40% na taxação dos patrimônios de origem criminosa. No Brasil, o crime compensa.
A Lavabrás é um antídoto contra a Lava Jato. Enquanto a força tarefa de Curitiba desvenda a ramificada teia da corrupção público-privada, seguindo as pegadas da evasão de divisas e da lavagem de dinheiro, o estatuto da Lavabrás extingue a punibilidade dos crimes investigados e –cúmulo da perfeição!– cobre-os com o manto sagrado do sigilo fiscal. Tudo está lá, em letras pequenas, nas catacumbas do parágrafo 12 do artigo 4º, do parágrafo 1 do artigo 5º e do parágrafo 1 do artigo 7º. São as perucas, os bigodes e as cirurgias plásticas destinadas a reinserir os bandidos da corte no nosso belo quadro social.
A Lavabrás obedece ao cronograma da emergência. No contexto da globalização, da corrupção internacional, do terrorismo e do tráfico de armas e drogas, os EUA introduziram na arena diplomática os acordos Fatca (Foreign Account Compliance Act), destinados ao intercâmbio de informações tributárias. Como outras nações do G20, o Brasil assinou o acordo bilateral com os EUA, além de outro similar, com a Suíça. Eles entram em vigor no início de 2017, quando extensas listas de criminosos de colarinho branco, fornecidas pelos governos americano e suíço, chegarão às mãos da Receita brasileira. É por isso que o estatuto da Lavabrás concede 210 dias para adesão ao "regime especial". O Brasil lavará dinheiro em 2016, aproveitando a janela de oportunidade que se fecha por iniciativa do "imperialismo".
Impeachment? Eles brigam por coisas menores, mas sabem onde o calo aperta.
A Lavabrás opera no registro da duplicidade. Seu estatuto diz uma coisa em letras grandes e o oposto dela em letras pequenas. Letras grandes: o artigo 1º anuncia um "regime especial" de regularização de recursos e bens de origem lícita não declarados ao fisco, mantidos no exterior ou repatriados. Letras pequenas: o artigo 5º inclui no "regime" os frutos de uma longa série de crimes, oferecendo anistia geral, irrestrita, a sonegadores do fisco, violadores de regras tributárias, autores de golpes contra a Previdência, falsificadores de documentos públicos e privados, contrabandistas e, claro!, quadrilhas dedicadas à evasão de divisas e lavagem de dinheiro. Elaborada por gente que entende do riscado, a lei anistia a prática de associação criminosa, o uso de "laranjas" e os próprios "laranjas". Corra, Lola, corra: só ficam excluídos os condenados com sentença transitada em julgado.
A Lavabrás suprime o princípio da igualdade perante a lei, premiando seus sócios potenciais, os criminosos de colarinho branco, que obtêm excepcionais vantagens tributárias. Letras grandes: os recursos declarados no "regime especial" incorrem em imposto de 15% mais multa de 100% sobre o imposto, totalizando 30%, similar à taxação de contribuintes honestos e pontuais (27,5%, pessoa física, ou 34%, pessoa jurídica) e muito menos que a taxação de sonegadores comuns, sujeitos a multa de 150% mais juros Selic sobre o imposto devido. Letras pequenas: fixa-se o câmbio de conversão dos recursos pela cotação do dólar do último dia de 2014, o que representa um "desconto" da ordem de 40% na taxação dos patrimônios de origem criminosa. No Brasil, o crime compensa.
A Lavabrás é um antídoto contra a Lava Jato. Enquanto a força tarefa de Curitiba desvenda a ramificada teia da corrupção público-privada, seguindo as pegadas da evasão de divisas e da lavagem de dinheiro, o estatuto da Lavabrás extingue a punibilidade dos crimes investigados e –cúmulo da perfeição!– cobre-os com o manto sagrado do sigilo fiscal. Tudo está lá, em letras pequenas, nas catacumbas do parágrafo 12 do artigo 4º, do parágrafo 1 do artigo 5º e do parágrafo 1 do artigo 7º. São as perucas, os bigodes e as cirurgias plásticas destinadas a reinserir os bandidos da corte no nosso belo quadro social.
A Lavabrás obedece ao cronograma da emergência. No contexto da globalização, da corrupção internacional, do terrorismo e do tráfico de armas e drogas, os EUA introduziram na arena diplomática os acordos Fatca (Foreign Account Compliance Act), destinados ao intercâmbio de informações tributárias. Como outras nações do G20, o Brasil assinou o acordo bilateral com os EUA, além de outro similar, com a Suíça. Eles entram em vigor no início de 2017, quando extensas listas de criminosos de colarinho branco, fornecidas pelos governos americano e suíço, chegarão às mãos da Receita brasileira. É por isso que o estatuto da Lavabrás concede 210 dias para adesão ao "regime especial". O Brasil lavará dinheiro em 2016, aproveitando a janela de oportunidade que se fecha por iniciativa do "imperialismo".
Impeachment? Eles brigam por coisas menores, mas sabem onde o calo aperta.
O PT sempre planejou um golpe
Diante da atual e grave crise política e institucional que o Brasil vive atualmente, inclusive com o perigo de um impeachment da presidente da república, Dilma Rousseff, o PT e outras organizações ligadas ao governo e as esquerdas afirmam constantemente que tudo não passa de uma tentativa de golpe para tirar do poder uma presidente eleita legitimamente pelo voto.
O impeachment, assim como a cassação, pode até ser um tipo de golpe. Isso é o tipo de coisa que só haverá alguma “luz”, algum tipo de esclarecimento, daqui a uns 100 anos, após várias e várias interpretações feitas por analistas políticas, sociólogos e historiadores.
Dentro da democracia, dentro do jogo politico aberto e com algum grau de liberdade, o impeachment, a cassação e a renúncia fazem parte do jogo. Muito pior é na tirania e num regime autoritário, onde as pessoas são apenas comunicadas, quando o são, de alguma decisão dos governantes. Bom mesmo é a democracia onde as pessoas podem lutar, dentre outras coisas, por impeachment, cassação e renúncia dos governantes.
Se for verdade que impeachment é golpe, coisa de gente golpista, também é verdade que nos últimos 30 anos o PT foi o partido político que mais tentou sistematicamente dar um golpe. Vejamos, em muitos aspectos, o PT liderou e pediu o impeachment dos ex-presidentes Fernando Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso. Sem contar que, em nível estadual e municipal, a história se repete, ou seja, o PT, e seus aliados, é campeão nacional em pedir o impeachment de governadores e prefeitos.
Diante dessa realidade, fica a pergunta: por que só é golpe quando se pede o impeachment de um presidente eleito pelo PT? Na prática o PT passou os últimos 30 anos, de forma disciplinada e até heroica, tentando dar um golpe. Em algum sentido, o golpe funcionou em 1992, com o impeachment de Fernando Collor, mas, talvez por azar, quem assumiu não foi o PT, mas o então vice-presidente da república, Itamar Franco. Talvez por entender tanto de golpe, por ser um especialista no assunto, que agora o PT grite com tanta força que o impeachment de Dilma Rousseff é um golpe. O PT que passou 30 anos planejando um golpe, agora é vítima de seu próprio veneno.
O impeachment, assim como a cassação, pode até ser um tipo de golpe. Isso é o tipo de coisa que só haverá alguma “luz”, algum tipo de esclarecimento, daqui a uns 100 anos, após várias e várias interpretações feitas por analistas políticas, sociólogos e historiadores.
Dentro da democracia, dentro do jogo politico aberto e com algum grau de liberdade, o impeachment, a cassação e a renúncia fazem parte do jogo. Muito pior é na tirania e num regime autoritário, onde as pessoas são apenas comunicadas, quando o são, de alguma decisão dos governantes. Bom mesmo é a democracia onde as pessoas podem lutar, dentre outras coisas, por impeachment, cassação e renúncia dos governantes.
Se for verdade que impeachment é golpe, coisa de gente golpista, também é verdade que nos últimos 30 anos o PT foi o partido político que mais tentou sistematicamente dar um golpe. Vejamos, em muitos aspectos, o PT liderou e pediu o impeachment dos ex-presidentes Fernando Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso. Sem contar que, em nível estadual e municipal, a história se repete, ou seja, o PT, e seus aliados, é campeão nacional em pedir o impeachment de governadores e prefeitos.
Diante dessa realidade, fica a pergunta: por que só é golpe quando se pede o impeachment de um presidente eleito pelo PT? Na prática o PT passou os últimos 30 anos, de forma disciplinada e até heroica, tentando dar um golpe. Em algum sentido, o golpe funcionou em 1992, com o impeachment de Fernando Collor, mas, talvez por azar, quem assumiu não foi o PT, mas o então vice-presidente da república, Itamar Franco. Talvez por entender tanto de golpe, por ser um especialista no assunto, que agora o PT grite com tanta força que o impeachment de Dilma Rousseff é um golpe. O PT que passou 30 anos planejando um golpe, agora é vítima de seu próprio veneno.
Simples constatação
Não é questão de ser contra ou a favor do impeachment de Dilma Rousseff. É questão de lógica. De estar aberto para perceber que a atual presidente não reúne mais as mínimas condições para assegurar a governabilidade e colocar novamente o país nos trilhos, tanto sob o ponto de vista político como em seus aspectos econômicos. É simples constatação.
Independentemente das loucuras das e agruras de Eduardo Cunha, que, por motivos óbvios, já deveria estar fora há muito tempo, o impeachment é uma ferramenta legal, que as trapalhadas da presidente, do PT e uma nova postura de combate à corrupção vigente no país acabaram por viabilizar.
A oposição, seguramente apoiada pela maior parte da população e vitaminada pela nova postura do PMDB, demorou covardemente para acordar e descobrir que já reúne forças suficientes para acelerar a saída da mandatária.
Há pouco tempo, Dilma seria a única em condições de promover uma saída para o Brasil. Uma guinada de 360º. Caberia a ela um ato altivo, que coincidiria com uma espécie de renúncia programada. Ela poderia conclamar o povo e dar um xeque-mate aos espoliadores da nação que tomaram conta das cadeiras do Congresso, impondo-lhes reformas mais do que urgentes em troca de uma retirada “republicana”. Perdeu o tempo.
Dilma, ao que se vê, caminha a passos largos para uma derrocada melancólica e traumática para ela e, sobretudo, para a nação.
Não é possível ter certeza alguma de que o impeachment será o melhor para o país, mas, no momento, verdade seja dita, é a única expectativa que paira sobre os brasileiros.
Independentemente das loucuras das e agruras de Eduardo Cunha, que, por motivos óbvios, já deveria estar fora há muito tempo, o impeachment é uma ferramenta legal, que as trapalhadas da presidente, do PT e uma nova postura de combate à corrupção vigente no país acabaram por viabilizar.
A oposição, seguramente apoiada pela maior parte da população e vitaminada pela nova postura do PMDB, demorou covardemente para acordar e descobrir que já reúne forças suficientes para acelerar a saída da mandatária.
Há pouco tempo, Dilma seria a única em condições de promover uma saída para o Brasil. Uma guinada de 360º. Caberia a ela um ato altivo, que coincidiria com uma espécie de renúncia programada. Ela poderia conclamar o povo e dar um xeque-mate aos espoliadores da nação que tomaram conta das cadeiras do Congresso, impondo-lhes reformas mais do que urgentes em troca de uma retirada “republicana”. Perdeu o tempo.
Dilma, ao que se vê, caminha a passos largos para uma derrocada melancólica e traumática para ela e, sobretudo, para a nação.
Não é possível ter certeza alguma de que o impeachment será o melhor para o país, mas, no momento, verdade seja dita, é a única expectativa que paira sobre os brasileiros.
O banditismo do presidente da Câmara, o oportunismo do PSDB, o interesse pessoal do vice-presidente e a sede de poder a qualquer custo do PMDB estão aí, mas sempre estiveram.
A principal causa dos riscos que a presidente corre é ela mesma. A autofagia de Dilma começou há 15 meses, nas eleições do ano passado, perpetrando-se em 2015, depois que foi obrigada a se desmentir. A presidente perdia, assim, a confiança da população e, agora, afunda-se ao perder o PMDB, fatalmente, o pilar que deu sustentação a ela própria e ao ex-presidente Lula em todos os seus muitos momentos de desventuras.
O Cara ... de sempre
Como 'truculência' de Oswaldo Cruz varreu o Aedes aegypti
Rio de Janeiro, início do século 20. Na calada da noite, eles entravam nas casas à procura de um invasor sorrateiro e muitas vezes imperceptível. Reviravam tudo e, se o encontrassem, matavam-no sem dó nem piedade.
Essa era a rotina do Serviço de Profilaxia da Febre Amarela, criada pelo sanitarista Oswaldo Cruz, para combater a epidemia da doença, também transmitida pelo mosquito Aedes aegypti, que assolava o país. Agindo por vezes de forma truculenta, as chamadas brigadas de mata-mosquitos ─ grupos de agentes sanitários munidos de inseticidas capazes de eliminar focos de insetos ─ empregavam um modelo de ação totalmente militar.
Apesar das críticas, as medidas surtiram efeito em pouco tempo. Em março de 1907, a febre amarela foi considerada erradicada no Rio de Janeiro. E até hoje não existem casos notificados da variação da doença em áreas urbanas no Brasil.
A iniciativa das brigadas para combater o Aedes aegypti nasceu em meio à escassez de métodos alternativos. Como na época não havia vacina contra a febre amarela, caçar o mosquito era a única opção viável para resolver o problema.
Os agentes percorriam as ruas da capital e entravam nas casas, lavavam caixas de água, jogavam remédio em ralos e bueiros, limpavam telhados e calhas, instalavam redes de proteção, removiam qualquer possível local de desova dos mosquitos, num trabalho exaustivo de combate à doença.
Muitas vezes, as brigadas simplesmente invadiam as casas quando não eram bem-vindas. E quando a população começou a conseguir habeas corpus para impedir a invasão sanitária, Oswaldo Cruz colocou suas brigadas para trabalhar de madrugada, surpreendendo os moradores.
Ao encontrar doentes nas casas visitadas, os agentes não apenas desinfetavam o local, como providenciavam o isolamento domiciliar do paciente ou o transferiam para um hospital de isolamento.
Mas o Aedes aegypti voltou no fim dos anos 80 e desde 1990 o Brasil convive com epidemias sazonais de dengue no verão. Neste ano, duas novas epidemias, ambas transmitidas pelo mosquito, ganharam terreno: a chikungunya e a zika. Com a última se revelando um problema de bem maior do que o imaginado originalmente e com um impacto social devastador, caçar o mosquito não poderia ser, mais uma vez, a solução?
"De fato, até o fim dos anos 80, a questão era dada por resolvida", constata o epidemiologista Denizar Vianna, do Departamento de Clínica Médica da UERJ.
"Mas as coisas mudaram muito. Naquela época não havia a mobilidade de hoje, com o fluxo constante de pessoas para todo lado", acrescenta.
Especialistas acham praticamente impossível repetir, mais de 100 anos depois, a façanha de Oswaldo Cruz. Primeiro pela dimensão do problema.
O primeiro caso de zika no país foi registrado em maio deste ano e, atualmente, já há notificações em praticamente todas as unidades da federação. Além disso, foi confirmada uma relação entre o vírus e a microcefalia ─ uma má formação do cérebro durante a gestação. Segundo o Ministério da Saúde, já são 1.761 casos notificados em 422 municípios de 13 Estados e no Distrito Federal.
E a doença, hoje, se espalha assim tão rapidamente, por um motivo simples: mobilidade. Em poucas horas, um sujeito infectado sai do Nordeste e já está no Rio de Janeiro, pronto para ser picado por um mosquito que disseminará o vírus.
No início do século passado era muito diferente. Poucas pessoas se locomoviam por grandes distâncias e, mesmo quando isso, eventualmente, acontecia, elas levavam semanas no deslocamento ─ o que dava tempo até de curar a doença antes de chegar ao destino. Há 100 anos, os focos de doenças eram muito mais concentrados, enquanto que hoje são muito mais espalhados.
Para preservar a nação, é necessário um ato de coragem
Afinal, a defesa da nação e o culto dos seus valores parecem haver prevalecido a duras penas, embora o mais natural deles – a renúncia – fosse o caminho mais luminoso. Não se refletiu sobre o célebre conselho de Napoleão: “Chassez le naturel, il vous viendra en galop” (“Se caçar o natural, ele virá para você no galope”).
Todavia, as palavras de um ministro do STF podem ter ressoado aos ouvidos da presidente Dilma Rousseff após tomar conhecimento de comentário ácido e severo – um chamamento aos deveres e às responsabilidades presidenciais – dirigido à consciência da chefe do Estado brasileiro, em hora trepidante e carregada de advertência: “Precisamos”, comentou o ministro Marco Aurélio, “reconhecer com desassombro que hoje não há mais governo no Brasil”.
Em período histórico assim tão devastador, as instituições, que não conseguem falar, acabam sendo ouvidas quando perigam as vigas sustentadoras dos patrimônios moral e jurídico-político que formaram. O célebre pensador francês Ernest Renan, em formosa oração na Sorbonne, esculpiu famosa definição que vara tempestades e bonanças: “Uma nação é uma alma, um princípio espiritual. A existência de uma nação é um plebiscito de todos os dias, assim como a existência individual é uma afirmação perpétua de vida”.
Ora, se a nação periga porque a instituição denominada “governo” não mais funciona, é de reconhecer, com coragem e sem medo, que não mais há o princípio espiritual que nos inspira, nos aponta rumos, nos dirige. Sem desassombro, aceitemos a trágica realidade de que a comunidade jurídica que nos rege e sobre a qual se assenta o Estado nacional começa a ruir e se parte a sólida solidariedade entre povo e nação, cuja identidade afunda e submerge nas águas revoltas e procelosas que levam para as profundezas o nosso próprio destino como seres humanos.
Daí que o primeiro e mais vinculante dever de quem governa é assegurar aos nacionais “o legado de um presente e um passado de glórias e sacrifícios” e manter, com essa herança, as instituições, a Constituição democrática, a pátria e o regime democrático.
Todo esse inestimável patrimônio representa as defesas que prezamos e pelas quais aprendemos a lutar, alimentados pelo princípio espiritual desde o nascer. As instituições se formam e se fundam para defender os fundamentos e os valores nos quais repousa e se realiza o direito jeffersoniano de ser feliz.
Entre nós, diante das degradantes demonstrações de parlamentares no plenário da Câmara dos Deputados nesta semana, deve, provavelmente sob a desnecessária decisão do STF, iniciar-se o processo do impeachment presidencial, instrumento de defesa contra maus governantes que praticaram crimes previstos na Constituição e nas leis.
A medida político-jurídica é essencialmente democrática para punir crimes de responsabilidade, nos termos constitucionais, pelas Casas do Congresso Nacional. A nação, como é curial, porque intranquiliza a sociedade civil e política pela complexidade do seu caminhar, espera que seus representantes ajam e votem com serenidade, e não como um bando de celerados sem compostura que sujaram a representação de que são investidos.
Vamos passar um período de dificuldades: sem governo, nos termos da observação do ministro aqui citado; sem líderes capazes de desarmar a desacerbação dos descontrolados; e, finalmente, sem os grandes líderes que tivemos no passado, a nossa melhor garantia no respeito à dignidade da representação popular.
Todavia, as palavras de um ministro do STF podem ter ressoado aos ouvidos da presidente Dilma Rousseff após tomar conhecimento de comentário ácido e severo – um chamamento aos deveres e às responsabilidades presidenciais – dirigido à consciência da chefe do Estado brasileiro, em hora trepidante e carregada de advertência: “Precisamos”, comentou o ministro Marco Aurélio, “reconhecer com desassombro que hoje não há mais governo no Brasil”.
Em período histórico assim tão devastador, as instituições, que não conseguem falar, acabam sendo ouvidas quando perigam as vigas sustentadoras dos patrimônios moral e jurídico-político que formaram. O célebre pensador francês Ernest Renan, em formosa oração na Sorbonne, esculpiu famosa definição que vara tempestades e bonanças: “Uma nação é uma alma, um princípio espiritual. A existência de uma nação é um plebiscito de todos os dias, assim como a existência individual é uma afirmação perpétua de vida”.
Ora, se a nação periga porque a instituição denominada “governo” não mais funciona, é de reconhecer, com coragem e sem medo, que não mais há o princípio espiritual que nos inspira, nos aponta rumos, nos dirige. Sem desassombro, aceitemos a trágica realidade de que a comunidade jurídica que nos rege e sobre a qual se assenta o Estado nacional começa a ruir e se parte a sólida solidariedade entre povo e nação, cuja identidade afunda e submerge nas águas revoltas e procelosas que levam para as profundezas o nosso próprio destino como seres humanos.
Daí que o primeiro e mais vinculante dever de quem governa é assegurar aos nacionais “o legado de um presente e um passado de glórias e sacrifícios” e manter, com essa herança, as instituições, a Constituição democrática, a pátria e o regime democrático.
Todo esse inestimável patrimônio representa as defesas que prezamos e pelas quais aprendemos a lutar, alimentados pelo princípio espiritual desde o nascer. As instituições se formam e se fundam para defender os fundamentos e os valores nos quais repousa e se realiza o direito jeffersoniano de ser feliz.
Entre nós, diante das degradantes demonstrações de parlamentares no plenário da Câmara dos Deputados nesta semana, deve, provavelmente sob a desnecessária decisão do STF, iniciar-se o processo do impeachment presidencial, instrumento de defesa contra maus governantes que praticaram crimes previstos na Constituição e nas leis.
A medida político-jurídica é essencialmente democrática para punir crimes de responsabilidade, nos termos constitucionais, pelas Casas do Congresso Nacional. A nação, como é curial, porque intranquiliza a sociedade civil e política pela complexidade do seu caminhar, espera que seus representantes ajam e votem com serenidade, e não como um bando de celerados sem compostura que sujaram a representação de que são investidos.
Vamos passar um período de dificuldades: sem governo, nos termos da observação do ministro aqui citado; sem líderes capazes de desarmar a desacerbação dos descontrolados; e, finalmente, sem os grandes líderes que tivemos no passado, a nossa melhor garantia no respeito à dignidade da representação popular.
Fábula dos gatos
Um fazendeiro plantava milho e o armazenava no paiol. Com o milho, o fazendeiro alimentava as galinhas, os cavalos, as vacas, e todos os outros bichos da fazenda. Os bichos da fazenda, por sua vez, garantiam ao fazendeiro o seu sustento.
Os ratos insistiam em roubar o milho armazenado no paiol. Quem cuidava do paiol era um cachorro. Um cachorro preto e grande. Quem cuidava do paiol antes do cachorro cuidar do paiol era o pai do cachorro e, antes do pai do cachorro, quem cuidava do paiol era o avô do cachorro. E sempre foi assim, a família do cachorro cuidando do paiol, e não deixando que os ratos comessem todo o milho.
Era um trabalho duro: os ratos não acabavam nunca e, chovesse ou fizesse sol, lá estavam para roubar uma espiga aqui, outra ali. O cachorro não tinha folga e para fazer frente à rapidez dos ratos, mantinha os músculos em forma e os reflexos ligeiros. Em compensação, o cachorro adorava o seu trabalho. Afinal, se não fosse por ele, os ratos já teriam há muito tempo comido todo o milho e acabado com a comida dos demais bichos. Em reconhecimento ao seu trabalho, a bicharada elegeu o cachorro o presidente da fazenda.
E claro que o mando do presidente não era perfeito, discussões surgiam, a insatisfação aparecia. Mas, de uma coisa todos podiam ter certeza: quem trabalhasse, ganhava o seu quinhão.
Um dia, apareceu na fazenda um gato. Um gato magro e bigodudo. Tão bigodudo que, se tivessem barba os gatos, esse poderia ser um gato barbudo. O cachorro, como todo cachorro que se preza, ciente da sua função e do valor do seu trabalho, latiu para o gato, quis que o gato fosse embora. O cachorro sentia que aquele bicho de ar debochado, malicioso, sem muito gosto para o trabalho, não poderia ser grande coisa. O fazendeiro não ouviu o que o cachorro quis dizer, e o gato foi ficando, foi ficando, foi ficando...
O gato, que não trabalhava (que, aliás, nunca tinha trabalhado), tinha bastante tempo para conversar com os outros bichos da fazenda. E chegava de mansinho junto da bicharada, magrinho, fraquinho, e começava a miar. Os outros bichos, muito bonzinhos, paravam para escutar o que o gato tinha para dizer:
- Miau, miau, ai, ai. O que vai ser de mim. Não existe lugar nesta fazenda para um bichinho como eu, tão injustiçado, tão fraquinho! Veja, não posso trabalhar, o sistema é tão injusto! Só por que não nasci forte como o senhor, Seu Cavalo, só por que não posso dar leite como Dona Vaca, não posso trabalhar!
O Seu Cachorro, o dono do poder, não avalia essas contingências históricas e me mantém mergulhado nessa penúria...
- Mas, Seu Gato, e aquele trabalho que lhe ofereceram na casa, como guardião da dispensa?
- Não aceitei, Seu Cavalo. Na verdade, prefiro continuar minha luta por condições mais dignas!
No fim, depois de tanta ladainha, os bichos começaram a acreditar no gato. A sentir pena do gato. E o gato, que se dizia injustiçado. E se fazia passar por vítima. Que era explorado pelo sistema e, principalmente, pelo cachorro que lhe negava tais milhos. Conquistou a simpatia dos bichos. E fez com que os bichos acreditassem que ele, tão sofrido, tão maltratado, iria garantir a todos melhores condições de vida.
Tanto miou, tanto fez, que um dia os bichos revoltados com a situação de absoluta miserabilidade do gato e com a injustiça social reinante na fazenda, resolveram destituir o cachorro.
E de nada adiantou o cachorro insistir que cuidar do paiol não era para qualquer um. Que ele havia treinado muito para assumir essa função. Que os ratos não eram mole, e não dariam trégua assim tão fácil.
Afastaram o cachorro e, por unanimidade, colocaram no seu lugar o gato. Os bichos sabiam que o gato dantes nunca havia trabalhado. Que não tinha sequer se preparado para assumir a função mais importante na fazenda.
Mas acreditaram que o gato, por ter sofrido mais do que ninguém com a política do cachorro, traria ordem e moralidade à administração do paiol.
No começo, tudo foi festa: no lombo de Seu Cavalo, viajava o gato para outros sítios e fazendas, falando sobre a sua conquista. Contava aos outros bichos que agora a fazenda vivia uma nova realidade. Tanta era a festa, tanta era a euforia, tanta era a esperança, que os bichos não perceberam que mais e mais gatos não paravam de chegar.
Gatos de todos os jeitos. Gatos vindos de todas as partes. Gatos, que em comum com o gato-presidente, nunca tinham trabalhado na vida. E o gato-presidente, que curiosamente chamava todos os demais gatos de "cumpanheiros", precisava arranjar uma função para aquela gataiada.
Então, um dia, quando Seu Cavalo apareceu para puxar o arado, percebeu que, no seu lugar, um bando de gatos ocupava os arreios. E Dona Vaca, que produzia o melhor leite da região, foi expulsa da estrebaria pelos companheiros do gato-presidente. E as galinhas, no galinheiro não moravam mais: nos poleiros, gatos e mais gatos fingiam estar botando ovos.
E o gato-presidente remunerava prodigamente todos os seus companheiros. Afinal, um trabalho em prol da coletividade desempenhavam...Como era de se esperar, o gato-presidente (nunca havia trabalhado) não conseguia cuidar do paiol. Os ratos logo perceberam a situação: atacavam, como nunca haviam feito, o milho da fazenda.
Tão complicada ficou a situação que o gato-presidente precisou conversar com o seu conselheiro. Um gato de óculos, que miava de um jeito esquisito, puxando demais os "erres":
- Miarr, presidente. A coisa tá feia. Em nome da governabilidade da fazenda, temos que nos aliar aos ratos!
- Cumpanheiro, os fins justificam os meios! Devemos passar aos demais bichos uma imagem de ordem e tranqüilidade! E os gatos fizeram um pacto com os ratos: os ratos fingiam que não roubavam o milho, os gatos fingiam que caçavam os ratos.
Dessa forma, a bicharada acreditava que os ratos estavam sendo combatidos, e os ratos, que por baixo do pano recebiam suas espiguinhas, mantinham os gatos no poder.
Entretanto, o milho foi acabando. E os bichos, que haviam acreditado na conversa do gato-presidente, com fome, começaram a ficar insatisfeitos. E foram todos reclamar com o gato-presidente.
Tarde demais. O paiol já estava infestado de ratos, ratos por toda parte, ratos em tudo. Ratos e gatos, gordos, barbudos, aproveitando tranqüilamente o que havia sobrado de milho no paiol enquanto o resto da bicharada, os bichos que sabiam trabalhar, que davam duro, ficaram sem comida. Sem comida, e traídos que se sentiram, o maior tesouro de todos: a esperança de dias melhores.
Eu votei no Lula. Como grande parte dos brasileiros, acreditei que o governo petista compensaria a sua inexperiência e despreparo com ética e moralidade.
Dei ao PT o que passei a chamar de "chance ética". Sinto-me traído. Sinto-me decepcionado. Não só temos tido um presidente fraquíssimo do ponto de vista administrativo como temos vivido uma fase de imoralidade pública, de improbidade como nunca se viu na história desse País.
Isso sem contar os compromissos ideológicos jogados na lata de lixo!
Não votarei novamente no PT. Não acredito mais em gatos ou em ratos... Não acredito no Lula.
Palavras voadoras
A inteligência voltada para o mal é pior do que a burrice, dizia o psicanalista Hélio Pellegrino, e a máxima é mais atual do que nunca, embora a burrice honesta, bem intencionada e incompetente, quando no poder, tenha se mostrado igualmente devastadora, como na administração Dilma Rousseff. Eduardo Cunha é o melhor exemplo do pior caso: sua inteligência ágil e sem escrúpulos multiplica sua malignidade e sua capacidade destrutiva de reputações, responsabilidades e instituições.
O que mais irrita em Dilma e seus assessores não é só mentir deslavadamente sobre todos os temas, mas imaginar que alguém possa acreditar naqueles disparates, que zombam da inteligência alheia. Imagino que eles já saibam que ninguém vai acreditar, mas, como é preciso responder a perguntas irrespondíveis, as palavras voam. Vai que cola?
Não há brasileiro vivo ou morto que acredite que daqui pra frente tudo vai ser diferente com Dilma e Temer, como no clássico de Roberto e Erasmo Carlos, que eles vão aprender a ser gente, e seus orgulhos não valerão nada. Quem vai acreditar que eles terão uma relação profícua e fértil enquanto seus partidários se matam uns aos outros?
Mas quem escreve uma carta daquelas, com palavras escolhidas para permanecer, não pode em 24 horas simular uma reconciliação de araque, depois de cinco anos de desprezo, traições, sabotagens e desconfianças mútuas, como se nada tivesse acontecido. E uma pessoa que recebe uma carta daquelas, com aquelas acusações, precisa ter pouca vergonha na cara ou excesso de espírito público, ou de medo do impeachment, para receber o missivista e fingir que eram só palavras ao vento.
Durante cinco anos Temer não apitou nada, mas também não reclamou, só agora descobriu que era decorativo e que ele e seu partido não mandavam nada no governo e na formulação de políticas, só na partilha de cargos e boquinhas. Dá para acreditar num cara assim?
Dilma e Cunha, já se sabe, são mentirosos contumazes, e 70% da população não acreditam em nada que eles dizem e querem vê-los longe do poder.
Quem vai ganhar a guerra de palavras, Dilma, Cunha ou Temer? O perdedor é certo: o Brasil e todos nós.
Nelson Motta
Assinar:
Postagens (Atom)