terça-feira, 13 de março de 2018

Educação ou democracia: o que vem primeiro?

Há no Youtube a gravação de um debate sobre a decadência da qualidade da educação nos Estados Unidos de que já recebi cópias pelo menos uma dezena de vezes. Nele Michio Kaku, um divulgador da ciência célebre naquele país, adverte que “ela é o motor da prosperidade que só não entrou em colapso nos Estados Unidos ainda porque o país dispõe de uma arma secreta, o H-1b”, que vem a ser o “visto especial para gênios” que o governo concede (ou concedia até Trump) com largueza suficiente para fazer do país um “imã que suga todos os cérebros do mundo”.

Isso é menos de metade da verdade. Se transformar-se num “imã” de cérebros privilegiados fosse apenas uma questão de conceder vistos facilitados ninguém teria problemas em conseguir o mesmo efeito. Os Estados Unidos atraem os cérebros mais brilhantes do mundo pela mesma razão pela qual o dólar é a moeda de referência e sustentação de todas as outras. Porque o seu sistema de governo é o único onde a vontade de um presidente sozinho não pode nada e a vontade popular realmente impera. É porque o país dispõe de instituições montadas para permitir que a vontade dos representados seja imposta aos seus representantes (a saber: voto distrital puro, eleições primárias diretas, recall, referendo, iniciativa, e eleições de retenção de juizes), que o sistema se torna disposto a e capaz decorrigir erros. E isso porque “erros” persistentes nunca são função de enganos genuinos mas sim da condição dada a uma oligarquia para criar e manter privilégios manipulando instituições calculadamente entortadas para lhe dar esse poder.




O cidadão exerce a sua liberdade, na prática, na sua dimensão de produtor e consumidor na medida em que possa escolher entre patrões e fornecedores competindo entre si por sua preferência. O resto é poesia. Ja os déspotas, depois do surgimento das armas de extinção em massa, deram-se conta de que entrar no jogo economico é o unico modo de projetar poder internacionalmente e continuar vivo. A diferença essencial entre os capitalismos de estado e o capitalismo democrático esta, portanto, nos objetivos que se propõem. O primeiro visa o bem estar do indivíduo que depende do estado impor limites ao capital em nome da preservacão da concorrência que garante a liberdade individual. O outro requer a concentração dos poderes do capital e do estado nas mesmas mãos e a sujeição de tudo o mais ao objetivo de projetar internacionalmente a hegemonia que o ditador e seu grupo já exercem internamente. Um só pode avançar com benefício de todos pelos acrescentamentos da inovação que depende da garantia da propriedade intelectual pelo estado. Os outros impõem-se pela lógica do monopólio que hoje tem no pirateamento das invenções alheias e na exploração pelo estado da sua condição de unico empregador a vantagem competitiva que lhes permite esmagar concorrentes pelo mundo afora.

Quando, porém, esses expedientes ou outra causa qualquer produzem turbulências na economia mundial, as chinas todas, para proteger os lucros acumulados que são a munição da sua guerra pela hegemonia econômica, correm para abrigar-se … nos títulos do governo americano. Porque? Porque ele é o unico do mundo que não tem o poder de calotear seus credores internos, que contam com instituições que os fazem mais fortes que o próprio governo, o que redunda na extensão dessa mesma garantia aos credores externos. As explicações conspiratórias e “imperialistas” para a força do dólar são mentirosas. Ele é o que é em função da qualidade das instituições do país que o emite.

Assim também os “gênios” do mundo. É para os Estados Unidos que eles afluem não porque seja fácil conseguir um visto mas para fugir de governos como os das chinas do mundo onde os ditadores da hora podem fazer de seus súditos o que bem entenderem quando bem entenderem, o que torna impossivel a liberdade, a estabilidade e a continuidade que a pesquisa pura e a verdadeira inovação requerem.

No Brasil é voz corrente que instituições de qualidade são produto de uma boa educação e que como não temos uma boa educação jamais teremos instituições de qualidade. Historicamente, entretanto, a ordem desses fatores tem sido a inversa. A boa educação é que é consequência da conquista de boas instituições. A “educação” patrocinada pelos regimes estabelecidos está sempre casada com a religião, vale dizer, com o dogma oficialmente aceito, o unico livre de repressão. E sua função é reproduzir o sistema instituido. Lutero primeiro denuncia o dogma que sustenta as instituições anteriores. E para se compor com os príncipes que queriam se livrar do papa, exige educação gratuita e obrigatória para todos. Na Inglaterra seiscentista, igualmente, é só depois que a volupia de Henrique VIII institui a liberdade religiosa e “legaliza” a convivência com a diversidade de crenças que se abre o espaço que vai ensejar o nascimento da ciência moderna. Nas experiências asiáticas, mais recentes, é sempre o déspota esclarecido que denuncia o dogma anterior (o socialismo). Só então abre-se o caminho para a reforma da educação que, mais adiante, consolida a mudança.

O Brasil mantem “petrificada” a sua miséria medieval muito mais graças ao desconhecimento meticulosamente construido das curas disponiveis mediante um controle estrito da educação e da mídia que por uma recusa consciente da população a tomar os “antibióticos institucionais” que poderiam facilmente cura-la. E essa afirmação de que “estudar medicina” seria um requisito prévio para que esses remédios façam efeito aqui faz parte da mentira de quem nos quer para sempre doentes. Eles curam quem quer que os tome, independentemente do que lhe tenham “ensinado” na vida.

Uma boa educação requer, de qualquer maneira, no mínimo duas ou tres gerações. O atalho obrigatório, que é o que abre caminho para ela, é ousar na reforma das instituições.

Fernão Lara Mesquita

Prioridade para segurança começa a fazer água

Nesta semana, a intervenção federal no Rio de Janeiro fará aniversário de um mês. Você se lembra: estava em cartaz a reforma da Previdência. Sem votos para prevalecer na Câmara, o governo trocou o espetáculo em 16 de fevereiro. Do nada, entraram no vocabulário político de Michel Temer duas palavras: segurança pública. O problema é que certos espetáculos teatrais, apesar de badalados, fracassam porque o público não foi devidamente ensaiado para exercer o papel de bobo.

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Houve intensa movimentação no palco. O general Braga Netto virou interventor da segurança do Rio. O ministro Raul Jungmann foi deslocado da Defesa para a novíssima pasta da Segurança Pública. Temer recepcionou em Brasília governadores e prefeitos de capitais. O Planalto soltou fogos. Era o governo exercitando o velho hábito de superestimar os êxitos, subestimando as dificuldades.

Abriu-se no BNDES uma linha de crédito para governadores e prefeitos. Quebrados, Estados e prefeituras ainda não fizeram fila na frente do guichê. O Ministro da Segurança empina duas prioridades: quer aprovar no Congresso o Sistema Único de Segurança Pública. É inspirado no SUS, como se o Sistema Único de Saúde pudesse inspirar alguma coisa. Deseja também convencer o empresariado a ajudar no financiamento da segurança. É mais fácil o PIB sonegar impostos do que pingar bilhões no chapéu de Raul Jungmann. Por ora, a única certeza é a de que, sob Michel Temer, quem vive de esperanças morre muito magro.

Imagem do Dia

Dusan Djukaric - Boats in Perast
Dusan Djukaric 

Tá osso

Como dizem os motoristas de aplicativos: hoje tá osso. É cada tapa na cara. Paciência, tu tens? Hoje vai ser difícil de entender, porque eu também não estou entendendo nada. E vou te levar comigo.

Oh (edição – TT, não põe exclamação depois do meu oh nem vírgula – meu oh é assim mesmo, no seco e sem entonação). Refaço. Oh que falso e inútil poder esse de te levar comigo nessa viagem minha das quintas-feiras, tão rapidinha, engolida com café preto. Corremos vendados no tiroteio. Uma colega com baixa visão contou-me que já perdeu duas bengalas no centro histórico da minha Poa. Foi atropelada por pedestres que nem pararam pra ajudar ou alcançar-lhe as bengalas. Sério, gente, tenho às vezes vontade de descer com o mundo andando mesmo, não precisa nem parar.

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Uma empresa da Noruega, a Noruega aquela, sabe, toda limpinha, mineradora de alumínio no Pará, descarta dejetos tóxicos direto no meio ambiente e diz não saber de nada. Depois, contou que, tá, sabíamos, mas não admitimos. Então, sabendo realmente o que (não) vai acontecer, por fim, admitiu. Garante que “vai estar analisando”…

Na Síria, genocídio que não gera notícia. No Rio, intervenção militar nas favelas. Como se a cúpula do crime organizado não estivesse nos gabinetes de Brasília. Aqui pelos pagos (pasmem), estão a desmanchar escolas e bibliotecas pra venderem seus terrenos aos amigos. O Júnior quer acabar com o Adote um Escritor, projeto de incentivo à leitura que é sucesso há vinte anos. Daí pra incendiarem livros é só dizer quero ler. Na boa, alguém me traz um Fontol?

Enquanto isso, no Maranhão, o governador comuna, descarado, pagando quase seis pau aos professores. Deusulivre (assim mesmo, TT, uma palavra só). Deusulivre. Criminoso. Tá osso, gente, até pra motoristas de aplicativos, meu amigo disse que tá dormindo dentro do carro. Garante que tem gente em situação bem pior: “outro colega, foi pra baixo do viaduto”. E o Hulk, vai pro pleito? E o Lula, vai em cana? O Neymar, vai à Copa? Você, vai às urnas? Pois devia. Antes que elas sejam suspensas por tempo indeterminado.

Senhores, vocês senhores, que já mostraram suas caras de pau nas votações da CCJ, já viram a cara das ruas? Estamos com fome, senhores, sem moradia, trabalho não temos, as contas, senhores, estão vencidas, saiam às ruas. Eu queria dizer que é mentira. Eu queria dizer que inventei isso tudo só pra terminar essa crônica. Queria dizer bons futuros. Dizer uma prece. Dormir um semestre, eu queria. Mas escuta, não tá dando.

Aliás, queria mas não posso, entrei na UERGS pra estudar letras, licenciatura. Talvez eu aprenda. Daí, te levo comigo outras vezes nessas minhas viagens, em outros dias, com mais polidez, quem sabe. Lembrei do Lenine: “tendo tudo contra e nada me transtorna/ dentro do meu peito/ um desejo martelo/ uma vontade bigorna”.

E a gente querendo ser feliz, aff… Tu tens paciência? A minha tá acabando.

Miséria? Desconhecem

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Qual político diz, na Espanha, na Itália ou na Grécia, que essa miséria é suscetível de nos enlouquecer ou de nos levar ao suicídio? O que sabem os nossos políticos dessa miséria?
Leila Slimani, escritora franco-marroquina

Na Suíça, sem benefícios para os deputados

Guy Mettan, deputado e ex-presidente do Parlamento de Genebra, chega à sede do Poder Legislativo do cantão suíço em sua scooter. Não tem carro oficial. Tampouco tem uma vaga reservada apenas para ele diante do prédio histórico no centro da cidade.

Por vezes, Mettan confessa que vai ao trabalho com um motorista – o que conduz o ônibus público da cidade. Deputado já por 18 anos consecutivos, Mettan levou a reportagem do Estado aos corredores do Grand Conseil, o nome dado ao Parlamento do Cantão.

A região é uma das mais ricas do mundo, tem uma taxa de desemprego de 5,3% e é um dos pilares de um sistema financeiro que guarda em seus cofres trilhões de dólares. Genebra, de forma insistente, entra em todas as listas das cidades mais caras do mundo há anos.

Mas, para não atrapalhar o emprego dos cem representantes do povo, as sessões do Parlamento são todas organizadas no final da tarde, quando o expediente já terminou.

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Não apenas o deputado ordinário não conta com um carro oficial, mas tampouco é beneficiado por qualquer tipo de transporte. Uma exceção é feita ao presidente do Parlamento que, caso esteja indo a um evento oficial, tem o direito de usar um veículo oficial. Mas apenas se ele for à reunião na condição de presidente da Câmara e não a título pessoal.

O auxílio-moradia não faz parte dos benefícios. Ao final de quatro anos de mandato, os deputados não ganham uma aposentadoria. Durante anos no “poder”, não podem contratar parentes e ganham um voucher para fazer duas refeições por mês. Cada uma delas de 40 francos suíços (R$ 137). “Dá para uma pizza e um copo de vinho”, brinca Mettan.

Na melhor das hipóteses, um deputado em Genebra vai somar um salário anual de 50 mil francos suíços (o equivalente a R$ 172 mil), cerca de 4,1 mil francos por mês. Isso se ele for o presidente do Parlamento e comparecer a todas às sessões. O cálculo de quanto Mettan e todos os demais recebem a cada mês é feito por hora. “Se você vem, você recebe. Se não, não recebe”, disse o deputado, que conta que precisa assinar com seu próprio punho uma lista de presença a cada reunião.

Transformado em reais, o valor pode até parecer elevado. Mas, hoje, o pagamento ao presidente do Parlamento de Genebra é inferior à média de um salário de um fabricante de queijo, menor que a renda de um mecânico de carros na Suíça, de uma secretária, de um policial, de um carpinteiro, de uma professora de jardim de infância, de um metalúrgico e de um motorista de caminhão. Ele, porém, é equivalente ao salário médio de um açougueiro da cidade alpina.

Para um deputado “ordinário”, o salário é muito inferior ao do presidente do Parlamento. Por ano, eles chegam a receber cerca de 30 mil francos suíços, o equivalente ao pagamento médio atribuído a um artista de circo ou a um ajudante de cozinha, postos ocupados em grande parte por imigrantes.

No Brasil, o salário de um deputado estadual chega a R$ 25.300 por mês em São Paulo, por exemplo. Além disso, os parlamentares brasileiros têm direito a uma verba mensal (o chamado ‘cotão’), que pode superar R$ 30 mil, para custeio de gastos de alimentação, transporte, passagens aéreas e despesas de escritório.

Mettan explica que a função de deputado consome apenas 25% do seu tempo de trabalho e que, por conta do salário baixo, todos são orientados a manter seus empregos originais, mesmo depois de eleitos.

“Na Suíça, a política é considerada como um envolvimento popular”, explicou. “É um sistema de milícia. Ou seja, não é um sistema profissional. Somos obrigados a ter um emprego paralelo, de ter uma profissão paralela. Não se pode viver com essa indenização”, admitiu o deputado suíço. “Não existe deputado profissional”, completou ele.

Paisagem brasileira

Santana dos Montes (MG)

Lulas à beira da prisão: Brasil, país regenerado ou aotofágico?

A prisão de Lula pode estar iminente. Os recursos processuais que interpôs têm estado a ser julgados a toque de caixa e, uma vez esgotados, a sentença de doze anos e um mês a que foi condenado na Lava Jato pode ser executada de imediato.

Para evitar a humilhação, restava ao velho líder operário a possibilidade do Supremo Tribunal Federal – STF rever a sua própria decisão de mandar cumprir as sentenças logo que um réu seja condenado em segunda instância. Alguns dos juízes gostariam que o plenário reexaminasse a questão. Afinal de contas, de acordo com a Constituição, e em nome da presunção de inocência, ninguém deve ser preso até ao derradeiro trânsito em julgado de uma sentença condenatória.

Mas o STF, tão célere noutros casos, mostra-se desta vez, por decisão da juíza Carmen Lúcia, que preside, renitente a reavaliar a situação – mantendo fechada a porta pela qual Lula poderia escapar.

Resta, assim, ao ex-presidente a possibilidade de algum dos juízes do Supremo, em decisão unilateral, aceitar o habeas corpus preventivo que a sua defesa já apresentou. Mas, mesmo isso, permanece em aberto e o PT vive nestes dias a angústia de ver passar o tempo e com isso avolumar-se a possibilidade do seu líder histórico ser submetido a uma humilhação nacional e internacional.

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Para os adversários de Lula – e boa parte da grande imprensa mais conservadora, que lhe tem movido guerra constante – a sua prisão seria a prova provada de que “o Brasil deixou de ser o país da impunidade e ninguém está acima da lei”.

Mas, face ao comportamento desigual da justiça – muito leniente com políticos de outros quadrantes – muitos aqui consideram que esse quadro idílico não corresponde à realidade. Agora mesmo, a presidente do Supremo não se eximiu de receber em sua casa o atual presidente, Michel Temer, contra quem impendem graves acusações de corrupção por parte do ministério público.

A amarga ironia para Lula e o PT é que foram eles próprios que – em nome da luta contra a corrupção – apoiaram algumas medidas que agora se viram contra eles: a forma de designação do PGR, a lei da delação premiada e a possibilidade de prisão logo após sentença em segunda instância…

Agora, resta saber se essa dinâmica vai prosseguir, prendendo Lula, ou se o sistema acabará, no último momento, por evitar o choque que tal medida não deixaria de provocar, mesmo sabendo que haverá no país uma curta maioria em favor da sua prisão.

Para os juízes e procuradores que a si próprios se vêm como justiceiros e regeneradores, a não prisão de Lula seria enorme desilusão; mas, para os políticos, herdeiros de uma tradição secular de compromissos, seria uma salvaguarda do próprio sistema. E sempre poderiam dizer que Lula, afinal, não é um cara qualquer – foi talvez o presidente mais popular da história do país e o que mais projetou o Brasil no plano externo. E é, ainda hoje e apesar de tudo, o preferido de pelo menos um terço do eleitorado.

O que espanta, neste confronto, é que não se vislumbrem soluções de maior equilíbrio: a emissão de um perdão como Ford fez com Nixon ou uma condenação com pena suspensa – garantindo a condenação moral, mas evitando a humilhação do confinamento.

Para já, parece ser grande a tentação de queimar um capital simbólico remanescente, maculado, é certo, mas real, em nome de um outro ainda só emergente e relativo. Brasil, país regenerado ou autofágico?

Carlos Fino 

O terror

11 desenhos angustiantes que retratam a vida no século XXI A televisão moldando pensamentos
No momento em que a tecnologia da comunicação se juntou com o engodo ideológico, as besteiras tornaram-se mais amplas e mais sinistras
Millôr

A nação dos desconfiados

Em quem você confia? Na família? Nos amigos? Nos vizinhos? Nos Estranhos? E o quanto você confia em todos eles? Quando tomada no agregado da população, as respostas a estas questões podem ser cruciais para determinar o grau de sucesso de uma nação.

Isso porque nada se faz sem confiança. É ela que fornece o material que vai servir de cimento para a colaboração, convivência e concretização de ideias, ideais, projetos ou mesmo sonhos. O que é uma nação senão a somatória dos esforços e da colaboração dos seus cidadãos para o atingimento de objetivos comuns?

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Estudos claramente demonstram uma relação direta entre qualidade de vidas, nível de corrupção de uma nação, e o grau de confiança que seus habitantes depositam uns nos outros. Ou seja, a vida é mais fácil e melhor em lugares em que todos esperam eu os outros cumpram sua parte do contrato social.

Isto porque confiança social é via de duas mãos. De um lado, todos esperam que cada indivíduo seja honesto e confiável. Do outro lado, cria-se um ambiente em que, caso a desonestidade exista, ela é exceção, e, portanto, facilmente identificável e punível.

E, por falar em punição, vergonha, e não cadeia, parece ser o incentivo mais forte. Onde existe confiança e expectativa de honestidade, quebra de confiança causa vergonha. E isolamento. Ou seja, não ser confiável, ou ser simplesmente desonesto tem custo social elevado.

Talvez esteja aí uma das grandes causas do nosso fracasso como nação. Olhando bem no espelho, o brasileiro talvez encontre um sujeito desconfiado. De tudo. De todos. Sempre com um pé atrás. A desconfiança é evidente, clara, concreta. Aparece nos muros cada vez mais altos. Nos carros blindados. E na montanha de leis com o objetivo de regular por escrito cada aspecto da paranoia tropical, mas cujo único efeito prático é tornar mais fechado e incompreensível o já impenetrável emaranhado legal que criamos.

Não confiamos uns nos outros. Não somos exigentes no comportamento individual daqueles que nos cercam. Esperamos pouco ou quase nada do comportamento alheio. Não sentimos vergonha. Ser desonesto, não traz consequência social. Nem isolamento. Nem punição. E muito menos cadeia.

O resultado é este que está aí. Somos a sociedade da desconfiança. É o que construímos. Não dá mesmo para construir um Estado descente para uma nação que, por desconfiada, é descrente. Por descrente, espera pouco. Por esperar pouco, não tem vergonha. Por não ter vergonha, aceita o pior.

A nação dos desconfiados não tem noção. Desconfiança custa caro.

Elton Simões

Escolas públicas e SUS: qualquer semelhança...

Educação e saúde são irmãos fraternos, solidários, inseparáveis. Nascidos da mãe-pátria e do pai-cidadão, que juraram no matrimônio dedicar-lhes todos os esforços e os sacrifícios para que, gerados no amor, criados com dedicação e responsabilidade, frutificassem uma civilização justa, altruísta, digna. Que geração a geração evoluíssem, desvendando os mistérios e os segredos sagrados que o universo nos reserva. Que evoluíssemos a tal ponto que enfim retornássemos à origem de tudo e, assim, entendêssemos, não sem conflito, pecados, incoerências, imaturidades.

É preciso aprender que somos feitos da matéria original, que, mal-encaixada, pode ser explosiva, mortal, desumana. Quantas vezes, esquecidos que somos, nós brincaríamos de deuses e, por castigo, regrediríamos a fases grotescas.

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Inventamos então as escolas. Um lugar sagrado, uma comunidade, onde adultos investidos de uma vida dedicada ao saber, transmitiria seus ensinamentos a crianças e jovens, que, sedentos de conhecimentos, maravilhados com um universo que se revelava naquele meio mágico, tornar-se-iam jovens e adultos muito mais evoluídos para expandir suas fronteiras existenciais.

Na comunidade escolar, pais eram convocados a partilharem suas vivências e comungar suas sabedorias e, junto aos demais funcionários escolares, promoverem um ambiente sadio e agregador da matéria chamada “Vida”. E assim foi desde os tempos bíblicos, passando por civilizações gloriosas, como a egípcia, a grega e a romana, a há algumas poucas décadas.

Isso até que o vírus da tecnologia barata, da informação viciante e rasteira, sequestrou não só a mente de potencial infinito dos jovens, mas devastou os limites básicos da ética, do respeito, da noção de hierarquia. Feras com telas nas mãos destroem intimidades em covardes ataques de bullying, desprezam o conhecimento, pois teclam o oráculo Google, e ingênuos acreditam em redes e se aditam a elas.

Almas penadas virtuais vagam pelas escolas reais, num deprimente espaço paralelo hostil. Não, eu me recuso a falar hoje sobre a banalização sexual com nudes, pegações, sexies, drogas e álcool como se fossem refrigerantes. Exalto as exceções, as escolas que deram show no Enem, como as do Nordeste. Há vida em Marte. Peço que os bons alunos, pais, professores e funcionários não desistam: um novo tempo virá! Entrincheirem-se, resistam. Educadores vão para o céu!

Enquanto isso, o SUS. Sofredores físicos, psíquicos e espirituais se aglomeram na porta do purgatório. A senha podem ser da mãe desesperada com a febre e a tosse do bebê ou o hipocondríaco querendo fazer o centésimo exame de coração, quando, na verdade, é preciso alguém que o ouça em sua viuvez e solidão. Ou uma jovem caladinha, com uma dor estranha no abdome, que nem reagiu ao saber que era número 58, morrerá às cinco da manhã, aos 36 anos, de infarto, sem nem ser atendida. Faltam médico, remédio, exames, humanidade. Falta verba desviada para mansões, jatinhos, sítios, contas na Suíça. Porteiros se vestem como guardas, enfermeiras insones e nervosas, fazem o papel de juízas da vida. “Esse entra no posto, esse vai pro céu”.

Vivemos a Idade Média moderna, esperando um renascimento. Mãos à obra!