segunda-feira, 20 de janeiro de 2025
Ocasião faz o tirano
Que a tirania de dez milhões se exerça sobre um indivíduo, que a de um indivíduo se exerça sobre dez milhões, é sempre tirania, é sempre uma coisa abominável.
Alexandre Herculano
Como sobreviver a Trump e big techs
Para evitar compras supérfluas, resolvi consertar algumas roupas velhas. Por meio das redes sociais, consegui uma costureira que veio da Baixada Fluminense com sua máquina, trabalhou algumas horas e resolveu tudo.
Fiquei maravilhado com o fato de as redes sociais, além de terem importância comercial, abrirem fontes de renda para milhares de trabalhadores autônomos. Andei pesquisando, e alguns números indicam que cerca de 10 milhões de pessoas geram parte ou toda a sua renda nas redes. Numa pesquisa de 2023, mais de 60% das pequenas empresas brasileiras retiravam parte ou toda a sua renda de plataformas como Instagram e Facebook.
Vejo essa posição da Meta como uma ponta do iceberg. O fato principal é a existência de uma coalizão de bilionários donos das big techs com o governo dos Estados Unidos. Elon Musk, X, Mark Zuckerberg estão ao lado de Trump numa aventura inédita na História mundial.
De um ponto de vista econômico, que tipo de resistência é possível oferecer a essa nova coalizão?
Países como a China criaram suas redes sociais próprias: WeChat (semelhante ao WhatsApp, com funções adicionais de pagamento e comércio digital), Weibo (similar ao X) e Douyin (TikTok).
A China tem uma perspectiva de controle político, uma visão mais severa de segurança nacional e muita tecnologia. Não é o modelo.
Mesmo com o risco de parecer ingênuo, estou tentando formular algumas ideias que possam nos tornar menos vulneráveis a esse tremendo poder simbolizado pelo novo governo americano e as big techs.
Confesso que estou tateando. No entanto me arrisco a dizer que alguns fatores da luta contra o aquecimento global convergem diretamente para uma pauta de resistência democrática a essa formidável aliança de extrema direita.
O primeiro ponto que poderá nos fortalecer é uma transição rápida no campo da energia. Energia renovável e abundante é necessária não apenas para o crescimento sustentável, mas para amparar um avanço tecnológico. Centros de dados e a inteligência artificial são vorazes consumidores de energia.
O país precisaria de mais satélites. Servem para monitorar o clima, mas também para basear uma estrutura própria de comunicação.
Aliás, nesse contexto tão delicado, redes de comunicação local, intranets, tecnologias off-line, tudo isso poderia ajudar. Assim como poderia ajudar o investimento em infraestrutura descentralizada, diversificação econômica e inovação tecnológica. O Brasil ficaria mais forte formando mais gente em cibersegurança, engenharia de rede e gestão de crises.
Outro aspecto que reduziria a vulnerabilidade é incentivar a produção local para reduzir a dependência das cadeias globais. Sentimos como na pandemia Índia e China tinham mais produtos médicos; na guerra na Ucrânia, corremos atrás de fertilizantes.
Não sei ainda se isso é um programa sensato para tornar o país menos vulnerável. No momento, o único fator que detém os bilionários das big techs é o lucro. O Brasil é um grande mercado. No entanto, em certos momentos, pode ser que, por motivos políticos, queiram dar um xeque-mate. Aí então, o conceito de soberania nacional transcende ao campo simbólico, não depende tanto de juízes do STF, mas sim da base material para começar uma conversa.
Não é preciso criar uma rede social nacional, mas estar próximo disso é um grande argumento: data centers, internet de alta velocidade, tecnologia de inteligência artificial e algoritmos, muita gente especializada e, sobretudo, recursos — tudo isso se acumulando no tempo acaba sendo um fator de dissuasão.
Fiquei maravilhado com o fato de as redes sociais, além de terem importância comercial, abrirem fontes de renda para milhares de trabalhadores autônomos. Andei pesquisando, e alguns números indicam que cerca de 10 milhões de pessoas geram parte ou toda a sua renda nas redes. Numa pesquisa de 2023, mais de 60% das pequenas empresas brasileiras retiravam parte ou toda a sua renda de plataformas como Instagram e Facebook.
No momento, temos discutido muito o alinhamento da Meta ao governo Trump e a desmontagem de sua estrutura de checagem do material que veicula. Sem dúvida, um tema importante porque trata de questões políticas, democracia, liberdade de expressão, fake news e respeito à legislação nacional.
Vejo essa posição da Meta como uma ponta do iceberg. O fato principal é a existência de uma coalizão de bilionários donos das big techs com o governo dos Estados Unidos. Elon Musk, X, Mark Zuckerberg estão ao lado de Trump numa aventura inédita na História mundial.
De um ponto de vista econômico, que tipo de resistência é possível oferecer a essa nova coalizão?
Países como a China criaram suas redes sociais próprias: WeChat (semelhante ao WhatsApp, com funções adicionais de pagamento e comércio digital), Weibo (similar ao X) e Douyin (TikTok).
A China tem uma perspectiva de controle político, uma visão mais severa de segurança nacional e muita tecnologia. Não é o modelo.
Mesmo com o risco de parecer ingênuo, estou tentando formular algumas ideias que possam nos tornar menos vulneráveis a esse tremendo poder simbolizado pelo novo governo americano e as big techs.
Confesso que estou tateando. No entanto me arrisco a dizer que alguns fatores da luta contra o aquecimento global convergem diretamente para uma pauta de resistência democrática a essa formidável aliança de extrema direita.
O primeiro ponto que poderá nos fortalecer é uma transição rápida no campo da energia. Energia renovável e abundante é necessária não apenas para o crescimento sustentável, mas para amparar um avanço tecnológico. Centros de dados e a inteligência artificial são vorazes consumidores de energia.
O país precisaria de mais satélites. Servem para monitorar o clima, mas também para basear uma estrutura própria de comunicação.
Aliás, nesse contexto tão delicado, redes de comunicação local, intranets, tecnologias off-line, tudo isso poderia ajudar. Assim como poderia ajudar o investimento em infraestrutura descentralizada, diversificação econômica e inovação tecnológica. O Brasil ficaria mais forte formando mais gente em cibersegurança, engenharia de rede e gestão de crises.
Outro aspecto que reduziria a vulnerabilidade é incentivar a produção local para reduzir a dependência das cadeias globais. Sentimos como na pandemia Índia e China tinham mais produtos médicos; na guerra na Ucrânia, corremos atrás de fertilizantes.
Não sei ainda se isso é um programa sensato para tornar o país menos vulnerável. No momento, o único fator que detém os bilionários das big techs é o lucro. O Brasil é um grande mercado. No entanto, em certos momentos, pode ser que, por motivos políticos, queiram dar um xeque-mate. Aí então, o conceito de soberania nacional transcende ao campo simbólico, não depende tanto de juízes do STF, mas sim da base material para começar uma conversa.
Não é preciso criar uma rede social nacional, mas estar próximo disso é um grande argumento: data centers, internet de alta velocidade, tecnologia de inteligência artificial e algoritmos, muita gente especializada e, sobretudo, recursos — tudo isso se acumulando no tempo acaba sendo um fator de dissuasão.
Trump: Um cão que sempre ataca
A partir desta segunda-feira veremos o quanto morde esse cão que late grosso. Será o dia da posse do novo presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, este seguidor do estrategista político da extrema direita (all-right) Steve Bannon, que mandou “atacar sempre”.
Atacar sempre é o que Trump não deixa de fazer, com o objetivo declarado de pôr em prática o lema do aviador Charles Lindbergh, evocado em 1941: “America first”, a América em primeiro lugar.
É postura que implica escolha permanente do inimigo a combater. E o principal é a China, e não mais a extinta União Soviética ou a nova Rússia comandada por Vladimir Putin, hoje tido mais como aliado do que como antagonista.
As ameaças de anexar o Canadá e a Groenlândia, mais a de intervir no Canal do Panamá, por enquanto não parecem mais que latidos estridentes destinados a desviar a atenção de outros alvos prioritários.
Trump alardeia a iminência de uma política fortemente protecionista, que procure cortar as asas da China e dos novos campeões globais.
Será uma política que apresenta lá suas limitações. A China tira, sim, mercado do produtor e emprego do trabalhador dos Estados Unidos quando mantém uma política agressiva de exportações e emplaca um superávit
comercial de quase 1 trilhão de dólares em 12 meses, como em 2024. Mas é esse megasuperávit que também constrói sólida demanda por títulos do Tesouro dos Estados Unidos, a ponto de compor a maior parte das reservas externas chinesas, hoje de US$ 3,2 trilhões. Sem essas compras massivas de treasures pela China, a sustentação da dívida e da política fiscal dos Estados Unidos corre riscos.
Além disso, todas as grandes empresas dos Estados Unidos estão na China e exportam de lá. O poderoso Tycoon da Tesla, de Elon Musk, vem batendo recordes de produção e de exportação de carros elétricos a partir da China. Tirar oxigênio das exportações chinesas acabará por asfixiar também cadeias produtivas em capitais dos Estados Unidos. É mais uma limitação.
Uma política protecionista para valer não prejudicará apenas a China e demais tigres asiáticos. Tenderá a sangrar, também, a produção da União Europeia e dos parceiros comerciais dos Estados Unidos, Canadá e México. Bastará o efeito desse torniquete para lesar a produção e o comércio ao redor do mundo.
Daí os riscos dos efeitos perniciosos da política de Trump também sobre o Brasil. Está para ser avaliado seu impacto sobre as exportações de matérias-primas, especialmente de grãos, petróleo e minérios, que perfazem a maior parte das vendas externas do Brasil.
E deverão aumentar as pressões para que o governo brasileiro ajude a conter a China na expansão da sua Nova Rota da Seda, que conta com a adesão de mais de 145 países.
Enfim, uma coisa é cão que late e outra, cão que morde – e quanto morde.
Atacar sempre é o que Trump não deixa de fazer, com o objetivo declarado de pôr em prática o lema do aviador Charles Lindbergh, evocado em 1941: “America first”, a América em primeiro lugar.
É postura que implica escolha permanente do inimigo a combater. E o principal é a China, e não mais a extinta União Soviética ou a nova Rússia comandada por Vladimir Putin, hoje tido mais como aliado do que como antagonista.
As ameaças de anexar o Canadá e a Groenlândia, mais a de intervir no Canal do Panamá, por enquanto não parecem mais que latidos estridentes destinados a desviar a atenção de outros alvos prioritários.
Trump alardeia a iminência de uma política fortemente protecionista, que procure cortar as asas da China e dos novos campeões globais.
Será uma política que apresenta lá suas limitações. A China tira, sim, mercado do produtor e emprego do trabalhador dos Estados Unidos quando mantém uma política agressiva de exportações e emplaca um superávit
comercial de quase 1 trilhão de dólares em 12 meses, como em 2024. Mas é esse megasuperávit que também constrói sólida demanda por títulos do Tesouro dos Estados Unidos, a ponto de compor a maior parte das reservas externas chinesas, hoje de US$ 3,2 trilhões. Sem essas compras massivas de treasures pela China, a sustentação da dívida e da política fiscal dos Estados Unidos corre riscos.
Além disso, todas as grandes empresas dos Estados Unidos estão na China e exportam de lá. O poderoso Tycoon da Tesla, de Elon Musk, vem batendo recordes de produção e de exportação de carros elétricos a partir da China. Tirar oxigênio das exportações chinesas acabará por asfixiar também cadeias produtivas em capitais dos Estados Unidos. É mais uma limitação.
Uma política protecionista para valer não prejudicará apenas a China e demais tigres asiáticos. Tenderá a sangrar, também, a produção da União Europeia e dos parceiros comerciais dos Estados Unidos, Canadá e México. Bastará o efeito desse torniquete para lesar a produção e o comércio ao redor do mundo.
Daí os riscos dos efeitos perniciosos da política de Trump também sobre o Brasil. Está para ser avaliado seu impacto sobre as exportações de matérias-primas, especialmente de grãos, petróleo e minérios, que perfazem a maior parte das vendas externas do Brasil.
E deverão aumentar as pressões para que o governo brasileiro ajude a conter a China na expansão da sua Nova Rota da Seda, que conta com a adesão de mais de 145 países.
Enfim, uma coisa é cão que late e outra, cão que morde – e quanto morde.
Posse de Trump é o fim de um mundo
'Estou morrendo. O que peço é que me deixem em paz. Meu ciclo já terminou’, pediu em entrevista ao jornal Búsqueda José “Pepe” Mujica nos primeiros dias de 2025. Dono de uma trajetória que só não comove quem desconhece o significado de pertencer à espécie humana, o uruguaio Mujica sabe estar doente e cansado. Pediu repouso tendo chegado aos 89 anos como fortaleza moral e cívica de um mundo em extinção. E iniciou o merecido retiro poucos dias depois que outra figura de coerência rara — o ex-presidente americano Jimmy Carter — morrera aos 100 anos para só então receber o reconhecimento culposo que lhe fora negado na Casa Branca.
É com esse pano de fundo que assistiremos à volta ao poder de Donald Trump como 47º presidente dos Estados Unidos. Oportuno momento para relembrar um histórico comentário de 111 anos atrás, feito por Sir Edward Grey, à época chanceler do então ainda portentoso Império Britânico. Encostado à janela do palacete que abrigava seu gabinete, profetizou:
— As luzes estão se apagando por toda a Europa. Não voltaremos a vê-las acesas em nosso tempo.
Poucas horas depois, duas divisões do Exército alemão esmagavam a fronteira da Bélgica, dando início à Grande Guerra de 1914-1918, que engoliu cerca de 21,5 milhões de vidas (entre civis e militares). Grey sempre argumentara que a neutralidade não era uma opção viável diante do expansionismo alemão.
Não que o mundo vá acabar a partir de amanhã nas mãos de um triunfal Donald Trump. Mas a posse em Washington pode muito bem servir de data oficial para o fim de “um” mundo — aquele no qual vivíamos, frequentemente às turras, desde o final da Segunda Guerra. Ao complexo militar-industrial de ontem vem se juntar agora o domínio sem fronteiras do complexo tecnoindustrial, cujos plenos poderes ainda estão longe de serem mapeados. E ainda menos, cerceados. Eles lidam com a manipulação e o controle da verdade, este bem cada vez mais fugidio no nosso cotidiano.
Em sociedades decadentes, nas quais a população abre mão de exercer poder político, poder social, interesse cívico ou econômico (outro que o consumismo), a figura do líder de soluções simples parece redentora. Trump prometeu um retorno a uma mítica idade dourada da História americana, que, na realidade, jamais existiu, mas que habita o imaginário de dependentes de redes sociais. Também recebeu consentimento de seus eleitores para descartar grupos destoantes e indivíduos incômodos. Para muitos, inclusive democratas, parte das fulminantes mudanças anunciadas haverá de parecer necessária para desemperrar a ineficiência da máquina do Estado, enquanto a corrosão aos fundamentos do Estado Democrático de Direito permanecerá invisível por largo tempo.
A chacoalhada geral que se inicia encontra terreno fértil neste que já foi batizado de “século antissocial”. O termo — cunhado por Derek Thompson em ensaio na revista The Atlantic — aponta a dissolução da vida comunal pela tecnologia como o fator de maior mudança na sociedade americana no século XXI — uma solidão autoimposta, não a obrigatória dos tempos da Covid-19. Thompson retrata de vários ângulos quanto o cotidiano coletivo foi sendo substituído por “vivências delivery”. Em muitas lanchonetes e restaurantes do país, perdeu-se o contato humano, substituído pela impessoal retirada de pedidos feitos on-line. A socialização vem declinando em níveis que evocam as telas de Edward Hopper. Entre jovens de menos de 25 anos, o declínio de convívio interpessoal fora das redes sociais cresceu em 35%.
Ao contrário das outras espécies, ensina Pepe Mujica, a vida humana, pelo seu próprio desenvolvimento intelectual, permite que tenhamos a consciência de fazer escolhas, de dar um sentido ao viver.
— Sem objetivo, ou uma causa, a sociedade de mercado vai te enquadrar e vais passar o resto da vida pagando contas, pois és essencial para a mecânica do mercado — explicou em entrevista à BBC no ano passado. — Acabas confundindo o ser com o ter.
É nesse terreno fértil a experimentações que Donald Trump assume o poder. O mundo não merecia tamanho retrocesso civilizatório — a era de desagregação social em que vivemos já deveria ser castigo suficiente.
É com esse pano de fundo que assistiremos à volta ao poder de Donald Trump como 47º presidente dos Estados Unidos. Oportuno momento para relembrar um histórico comentário de 111 anos atrás, feito por Sir Edward Grey, à época chanceler do então ainda portentoso Império Britânico. Encostado à janela do palacete que abrigava seu gabinete, profetizou:
— As luzes estão se apagando por toda a Europa. Não voltaremos a vê-las acesas em nosso tempo.
Poucas horas depois, duas divisões do Exército alemão esmagavam a fronteira da Bélgica, dando início à Grande Guerra de 1914-1918, que engoliu cerca de 21,5 milhões de vidas (entre civis e militares). Grey sempre argumentara que a neutralidade não era uma opção viável diante do expansionismo alemão.
Não que o mundo vá acabar a partir de amanhã nas mãos de um triunfal Donald Trump. Mas a posse em Washington pode muito bem servir de data oficial para o fim de “um” mundo — aquele no qual vivíamos, frequentemente às turras, desde o final da Segunda Guerra. Ao complexo militar-industrial de ontem vem se juntar agora o domínio sem fronteiras do complexo tecnoindustrial, cujos plenos poderes ainda estão longe de serem mapeados. E ainda menos, cerceados. Eles lidam com a manipulação e o controle da verdade, este bem cada vez mais fugidio no nosso cotidiano.
Em sociedades decadentes, nas quais a população abre mão de exercer poder político, poder social, interesse cívico ou econômico (outro que o consumismo), a figura do líder de soluções simples parece redentora. Trump prometeu um retorno a uma mítica idade dourada da História americana, que, na realidade, jamais existiu, mas que habita o imaginário de dependentes de redes sociais. Também recebeu consentimento de seus eleitores para descartar grupos destoantes e indivíduos incômodos. Para muitos, inclusive democratas, parte das fulminantes mudanças anunciadas haverá de parecer necessária para desemperrar a ineficiência da máquina do Estado, enquanto a corrosão aos fundamentos do Estado Democrático de Direito permanecerá invisível por largo tempo.
A chacoalhada geral que se inicia encontra terreno fértil neste que já foi batizado de “século antissocial”. O termo — cunhado por Derek Thompson em ensaio na revista The Atlantic — aponta a dissolução da vida comunal pela tecnologia como o fator de maior mudança na sociedade americana no século XXI — uma solidão autoimposta, não a obrigatória dos tempos da Covid-19. Thompson retrata de vários ângulos quanto o cotidiano coletivo foi sendo substituído por “vivências delivery”. Em muitas lanchonetes e restaurantes do país, perdeu-se o contato humano, substituído pela impessoal retirada de pedidos feitos on-line. A socialização vem declinando em níveis que evocam as telas de Edward Hopper. Entre jovens de menos de 25 anos, o declínio de convívio interpessoal fora das redes sociais cresceu em 35%.
Ao contrário das outras espécies, ensina Pepe Mujica, a vida humana, pelo seu próprio desenvolvimento intelectual, permite que tenhamos a consciência de fazer escolhas, de dar um sentido ao viver.
— Sem objetivo, ou uma causa, a sociedade de mercado vai te enquadrar e vais passar o resto da vida pagando contas, pois és essencial para a mecânica do mercado — explicou em entrevista à BBC no ano passado. — Acabas confundindo o ser com o ter.
É nesse terreno fértil a experimentações que Donald Trump assume o poder. O mundo não merecia tamanho retrocesso civilizatório — a era de desagregação social em que vivemos já deveria ser castigo suficiente.
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