segunda-feira, 6 de março de 2017

Parece, mas não é

Mais um dos nós cegos que amarram a vida brasileira está prestes a ser atado pela trajetória dessa “lei de iniciativa popular” do Ministério Público que surfou a onda da luta contra a corrupção.

Nem entro no mérito das “10 Medidas”. Tudo está errado nessa história, a começar pela figura deformada de lei de iniciativa popular enfiada de última hora na Constituição de 88. Ferramentas de “democracia semidireta” como essa são uma inovação suíça dos meados do século 19 que foi incorporada à democracia americana na virada para o 20. Pouco menos de cem anos depois da inauguração do “governo do povo, pelo povo e para o povo”, em 1787, a excessiva “blindagem” dos representantes eleitos arquitetada pelos “Fundadores” tinha se revelado um trágico equívoco. Com mandatos garantidos até à eleição seguinte, como continuam sendo no Brasil, políticos corruptos estavam à vontade para se mancomunar com empresários corruptos e se locupletar impunemente, o que reduziu o sistema a uma ditadura de uma minoria articulada para explorar o povo.

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Nada disso! A obra da sociedade é que precisava de garantias de estabilidade! E para obtê-la era preciso quebrar a dos representantes eleitos, que a comprometia, sem, no entanto, enfraquecer o “governo de representação”. As leis de iniciativa popular foram o primeiro instrumento da reforma permanente que começou ali e prossegue ininterrupta até hoje. Foi com elas que se instituíram, em etapas sucessivas, os complementos do “referendo” das leis dos Legislativos e do “recall” dos mandatos dos representantes, que inclui os de todos os funcionários que prestam serviços diretos ao público e, para isso mesmo, são eleitos por ele, e não nomeados por políticos.

O pressuposto dessas três ferramentas é, no entanto, o estrito respeito ao princípio federalista. Uma organização democrática – a prerrogativa de decidir, entre iguais, quem vai fazer o quê por ordem de quem – era um imperativo de sobrevivência para comunidades isoladas em territórios hostis longe das autoridades dos países de origem. Foi a mesma que funcionou por 300 anos no Brasil Colônia das Câmaras Municipais. O federalismo apenas institucionaliza a lógica da necessidade e consagra a sequência histórica desse segundo renascimento da democracia no “Novo Mundo”. Se o povo é a única fonte de legitimação das instituições republicanas, tudo o que envolver um só município – educação, segurança, normas de convivência, etc. – deve ser decidido (e bancado) por ele mesmo e só o que envolver mais de um município deve ser decidido (e bancado) pelo poder estadual. Nos EUA independentes essas unidades políticas e geográficas originais só concordaram em aderir a um ente nacional abstrato se os poderes dele ficassem restritos à defesa do território e da moeda nacionais e ao estabelecimento de relações internacionais, pois tudo contra o que se lutava, lá e nas “Vilas Ricas” do Brasil, era um poder centralizado colhendo, à distância, impostos abusivos e mandando despoticamente em gente diferente com necessidades diferentes apenas para sustentar seus privilégios.

Toda lei “nacional” fora desse escopo restrito é, portanto, intrinsecamente antidemocrática. Quanto à regra de maioria, ela é a menos ruim porque todas as alternativas são piores. Mas também as maiorias são tanto mais democráticas quanto menores forem os pedaços em que a massa dos eleitores for pulverizada. As ferramentas de “democracia semidireta” só se aplicam aos âmbitos municipal e estadual e num contexto de eleição distrital pura, não só por essa razão, mas também porque só esse sistema define quem exatamente é representante de quem e permite processos de cobrança e substituição perfeitamente legítimos. Qualquer cidadão pode iniciar uma petição de “recall”, propor uma nova lei ou convocar o “referendo” de uma lei baixada pelo Legislativo. Mas é preciso colher entre 5% e 7% (dependendo do município) das assinaturas dos eleitores do funcionário ou representante visado ou do eleitorado afetado pela lei proposta ou desafiada. Conferidas as assinaturas pelo secretário de Estado municipal ou estadual, função que existe especificamente para supervisionar a legitimação desses processos, fica a petição qualificada para ser submetida a um “sim” ou “não” de todos os eleitores daquele funcionário ou representante numa votação especial, no caso de “recall”, ou mediante a impressão da lei proposta ou desafiada na cédula da próxima eleição majoritária para aprovação ou rejeição de todos os eleitores do Estado ou município afetados por ela. Na de novembro passado, a média nacional de propostas do gênero nas cédulas nos EUA foi de 62.

Os Legislativos são, portanto, meros “pacientes” desses processos. Não podem alterar o que é decidido de forma tão transparente e inclusiva. O Judiciário pode, em alguns casos, interferir. Mas para desencorajar desvios há eleições de confirmação (ou não) também dos juízes de cada comarca a cada quatro anos. No âmbito federal há só processos indiretos de “impeachment”, que rarissimamente chegam a ser aplicados, pois o sistema vai sendo permanentemente higienizado ao longo do caminho.

Tendo recomendado reiteradamente a “democracia semidireta” adotada com variações em todo o mundo que funciona, chamo a atenção, agora, para as falsificações presentes em todas as ditaduras disfarçadas. Nossa lei torta, aberta apenas à iniciativa de corporações e fechada aos cidadãos comuns, pode, com muito boa vontade, ser considerada como uma brecha num sistema hermético que pode eventualmente ser usada para o bem. Mas dar a um indivíduo no STF o poder de fixar o precedente de que bastam umas tantas assinaturas para substituir 140 milhões de eleitores e impor leis intocáveis a todo o País terá o mesmo efeito do que tentou fazer o PT quando quis substituir o conjunto do eleitorado pelos seus “movimentos sociais” amestrados: será o tiro de misericórdia na esperança de uma democracia no Brasil.

Democracia ameaçada

Fica combinado com o PT: o que Marcelo Odebrecht disse sobre Temer, Padilha e Aécio é verdade, mas o que disse sobre Dilma, Palocci e Guido Mantega não é.

Com o PMDB: Padilha pode ter recebido dinheiro de caixa dois, mas jamais contou a Temer, nem ele quis saber.

Com o PSDB: Aécio pediu dinheiro para financiar campanhas, mas dinheiro declarado à Justiça.

Com o distinto público: bem, deixa pra lá...

Deixa pra lá também a combinação sugerida por Henrique Eduardo Alves, ex-ministro de Dilma e Temer, a propósito da descoberta de que ele tinha uma conta secreta na Suíça.

Odebrecht

Eduardo Alves admite que abriu uma conta por lá e que não a declarou por aqui. Mas quer que acreditemos que os 833 mil dólares encontrados na conta não foram depositados nem movimentados por ele. Foram por quem então?

Por generosidade ou cinismo, dê-se a Eduardo Alves o benefício da dúvida. Dê-se o mesmo a Lula, que não sabia que a OAS reformou e equipou de graça o tríplex que ele havia comprado na praia do Guarujá.

Lula ficou surpreso ao saber que a Odebrecht havia reformado de graça o sítio de Atibaia, registrado em nome do sócio de um dos seus filhos, e que servia de repouso à família Silva.

Estenda-se o benefício da dúvida ao advogado José Yunes, amigo há mais de 40 anos de Temer, assessor especial dele até dezembro último. Eliseu Padilha, chefe da Casa Civil, pediu a Yunes que recebesse um pacote no seu escritório, em São Paulo.

Entregue pelo doleiro Lúcio Funaro, hoje preso em Brasília, o pacote foi repassado depois a Padilha. Yunes jura desconhecer seu conteúdo. Pode, Arnaldo?

Reza a lenda que Fernando Henrique Cardoso, um dia, pediu que esquecessem o que ele havia escrito antes de assumir a presidência da República.

Se não pediu, talvez um dia peça que esqueçam o que ele escreveu na semana passada sobre a diferença entre dinheiro de caixa dois pago para enriquecer políticos e dinheiro de caixa dois doado para financiar campanhas – esse, uma reles infração eleitoral.

No tempo do absolutismo não havia crime mais grave, sujeito à pena de morte, do que o de lesa-majestade - traição cometida contra a pessoa do Rei, ou seu Real Estado.

O crime de lesa-pátria é o crime contra o poder de um Estado. Como deve ser chamado o crime contra o povo, convocado nas democracias a manifestar sua vontade por meio do voto, e em nome do qual todo o poder é exercido?

Porque quando recebe propina para que vote assim ou assado, ou quando recebe dinheiro sujo para financiar sua eleição, o político atenta contra a vontade soberana do povo a quem representa.

Atenta contra o Estado Democrático onde todos são iguais perante a lei. Como disputar o voto popular em igualdade de condições um político que respeita a lei e outro que a desconhece?

Como dizer que reflete a vontade do povo eleições corrompidas pela troca de favores entre políticos e seus patrocinadores ocultos?

Vota-se por melhor educação, melhor saúde, mais saneamento básico, mais empregos.

A corrupção superfatura o preço de obras públicas, diminui a eficiência do Estado, encarece o custo de vida e estimula a sociedade a copiar o mau exemplo que vem do alto.

Resultado: um país que vê dissiparem-se pouco a pouco princípios e valores da civilização que um dia imaginou cultivar.

Por sua extensão, um país gigante, mas a serviço de uma tribo de pigmeus gulosos e insaciáveis. Haverá crime mais abominável do que esse de lesa-democracia?

Continua faltando governança

Pois é. Estamos onde não conseguimos evitar. Faltou determinação, esforço, valores e vontade. Ninguém queria esta situação onde todos perdem. Mas pouco foi feito para preveni-la. E muito foi feito para aqui chegar.

A realidade não perdoa ninguém. Ainda que os culpados sejam identificados e punidos. Ainda que a justiça não tarde e não falte. No evento improvável que quem deve pague. Ainda que tudo isso aconteça rápido e bem, não existem garantiam de que tudo não acontecera novamente. O mais provável é que tudo se repita como capitulo repetitivo de enredo duvidoso.

Olhando para trás, dá para ver a falha monumental dos sistemas de governança dos trópicos. Não foi, certamente, falta de lei. Lei tem de sobra. E segui-la, poderia ter evitado muita coisa.

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Mas tudo falhou. Conselhos de administração não viram. Órgãos de controle não controlaram. Instituições não funcionaram. Toleraram muito e por muito tempo, a teia de conflitos de interesse que levou não somente a corrupção, mas especialmente ao estado de degradação institucional que terminou em total falta de fé ou credibilidade na nossa capacidade de nos governar, na esfera governamental ou corporativa.

Conflitos de interesse, quando tolerados, se transformam me governança falha. Em conselhos e órgãos de controle eternamente complacentes com a frequência dos desvios. A frequência, por sua vez, normaliza comportamentos. E subverte valores e comportamentos tornando conflitos de interesse matéria aceitável contra a qual nada pode ou deve ser feito. Corrupção vira norma. E a norma, cultura.

Procurando lado positivo nisso tudo, alguém poderia dizer que esta é oportunidade para aprender. Mas não parece que seja isto o que esteja acontecendo. Pouco está sendo feito para aprimorar a governança pública e corporativa.

No macro, as instituições não estão melhorando. O funcionamento regular da máquina continua defeituoso, ou melhor, produzindo os defeitos. No micro, não se tem notícia de esforços radicais para a modificação da cultura corporativa, institucional ou governamental. Sem estes esforços, o mais provável é que coisas semelhantes aconteçam no futuro.

Quando a poeira baixar, parece que pouca coisa terá mudado na maneira de conduzir os negócios públicos e privados. Verdadeiro convite a reviver pesadelos. Periódica e certamente.

Um filme, uma música

A estatização da bondade humana

Cozida no caldeirão dos mágicos do Supremo, humilhada por portarias no Executivo e esquartejada por almas mortas do Congresso, a Constituição brasileira agoniza diante da desarmonia entre Poderes. E a moda de fazer lei avança na direção errada. Atenção: a política pretende estatizar a compaixão.

A filantropia é o caminho dos otimistas. Nasceu da moral privada das pessoas de bem. E só, muito depois, contaminou a ética pública dando origem ao estado de bem-estar social e os regimes democráticos. No Brasil, chegou com as Santas Casas de Misericórdia, ainda no período colonial. Muito antes da Independência e da Proclamação da República.


Quando praticada de forma verdadeira é vocação que não engana nem frustra a confiança das pessoas. A riqueza que produz é salvar setores vulneráveis do esquecimento. Imaginar sua razão de ser no campo tributário é achar que o imposto é um deus e desconhecer o milagre que a faz funcionar com milhares de colaboradores. O coletor de impostos não sabe o papel dos serviços de natureza social na economia invisível da sociedade.

Instrumento de promoção e integração de pessoas à cidadania plena, o que a impulsiona é o desprendimento, solidariedade, altruísmo, o voluntariado. A filantropia é o oposto do egoísmo. Em quase mil municípios brasileiros a única instituição de saúde é filantrópica. Para jovens que buscam estágio e aprendizagem não há nada melhor do que o CIEE. Algum setor do Estado se acha mais digno do que a APAE, o Pestalozzi? Quem não admira as Congregações religiosas que educaram o Brasil a vida inteira?

A filantropia autêntica ultrapassa o que pede a Lei. Constrói, fora do Estado, tão sólida ética pública que são bons governos que valorizam as parcerias com o setor. A assistência social, de alcance universal, sem ônus para seus beneficiários, é a mais moderna e autônoma política pública. Não pode ser objeto de escolha política errada em razão de crise econômica provocada por má governança das contas públicas. Respeitados os princípios contidos na Constituição Federal, de gratuidade, controle social e transparência deveria ser bem-vindo quem a ela se dedicasse.

O esforço do governo para se meter em tudo não é democracia. Assim, o Estado não deve pretender, em todos os casos, ser o titular, o formulador da política para a sociedade. Muitas entidades filantrópicas têm mais a ensinar do que a aprender dos governos. Foi essa autocontenção do Estado, em relação à sua competência regulatória total, que deu origem à parceria público-privada, da qual a filantropia é o mais elevado exemplo.

Ora, reduza tudo à tributação, obrigação, igualdade e a direito que do ser humano você só verá o vassalo, o subcidadão. A política não é tudo. Por isso, é sempre hora de valorizar o que nossa cultura, e pessoas beneméritas com visão de futuro, construíram. Afinal, que virtude pode ter a Sociedade onde só ao Estado cabe fazer o bem?

O novo inimigo

O novo inimigo
O principal inimigo da democracia liberal – da liberdade – já não é o comunismo, mas o populismo. O primeiro deixou de ser quando a União Soviética desapareceu, por sua incapacidade de resolver os problemas econômicos e sociais mais elementares, e quando (pelos mesmos motivos) a China se transformou num regime capitalista autoritário. Os países comunistas que sobrevivem – Cuba, Coreia do Norte e Venezuela – encontram-se num estado tão calamitoso que dificilmente poderiam ser um modelo, como parecia ser o caso da URSS, para tirar uma sociedade da pobreza e do subdesenvolvimento. O comunismo é agora uma ideologia residual, e os seus seguidores, grupos e grupelhos, estão à margem da vida política das nações.

Mas, ao contrário do que muitos de nós pensávamos – que o desaparecimento do comunismo reforçaria a democracia liberal e a estenderia pelo mundo –, surgiu a ameaça populista. Não se trata de uma ideologia, e sim de uma epidemia viral – no sentido mais tóxico da palavra – que ataca igualmente os países desenvolvidos e os atrasados, adotando máscaras diversas para cada caso, do esquerdismo no Terceiro Mundo ao direitismo no Primeiro. Nem sequer os países de tradições democráticas mais arraigadas, como Grã-Bretanha, França, Holanda e Estados Unidos, estão vacinados contra essa doença. Provas disso são o triunfo do Brexit [a saída do Reino Unido da União Europeia], a presidência de Donald Trump, a liderança da formação de Geert Wilders – o Partido da Liberdade (PVV) – nas pesquisas para as próximas eleições holandesas e da Frente Nacional de Marine Le Pen nas francesas.

O que é o populismo? Acima de tudo, uma política irresponsável e demagógica de governantes que não hesitam em sacrificar o futuro de uma sociedade por um presente efêmero. Por exemplo, estatizando empresas, congelando os preços e aumentando os salários, como fez no Peru o presidente Alan García durante seu primeiro mandato, gerando uma bonança momentânea que disparou sua popularidade. Depois viria uma hiperinflação que esteve a ponto de destruir a estrutura produtiva de um país, empobrecido por tais políticas de maneira brutal. (Aprendida a lição à custa do povo peruano, Alan García desenvolveu uma política bastante sensata no segundo mandato).

Um ingrediente central do populismo é o nacionalismo, fonte, depois da religião, das guerras mais mortíferas que se abateram sobre a humanidade. Trump promete aos eleitores que a “América será grande de novo” e que “voltará a ganhar guerras”; os EUA já não serão explorados pela China, pela Europa ou por qualquer país, porque agora seus interesses prevalecerão sobre os de todas as nações. Os partidários do Brexit – eu estava em Londres e ouvi, estupefato, a saraivada de mentiras chauvinistas e xenofóbicas propalada na TV por pessoas como Boris Johnson e Nigel Farage, o líder do Partido da Independência do Reino Unido (UKIP) durante a campanha – ganharam o referendo proclamando que, ao sair da UE, o Reino Unido teria de volta a soberania e a liberdade, agora submetidas aos burocratas de Bruxelas.
Há governantes que não hesitam em sacrificar o futuro de uma sociedade por um presente efêmero
Inseparável do nacionalismo é o racismo, que se manifesta sobretudo buscando bodes expiatórios, culpando-os de tudo o que dá errado no país. Atualmente, os imigrantes negros e os muçulmanos são as vítimas do populismo no Ocidente. Os mexicanos, por exemplo, foram acusados pelo presidente Trump de serem estupradores, ladrões e narcotraficantes. Já os árabes e africanos são acusados por Geert Wilders na Holanda e Marine Le Pen na França, ou mesmo por Viktor Orbán na Hungria e Beata Szydlo na Polônia, de roubar o trabalho dos nativos, abusar da seguridade social e degradar a educação pública, entre outras coisas.

Na América Latina, os Governos de Rafael Correa no Equador, do comandante Daniel Ortega na Nicarágua e de Evo Morales na Bolívia se orgulham de serem anti-imperialistas e socialistas, mas, na verdade, são a própria encarnação do populismo. Os três são cautelosos na hora de aplicar as receitas comunistas de nacionalizações em massa, coletivismo e estatismo econômico, pois, com melhor olfato que o do iletrado Nicolás Maduro, sabem que tais políticas provocam desastres. Apoiam Cuba e Venezuela em voz alta, mas não as imitam. Praticam, mais propriamente, o mercantilismo de Putin (ou seja, o capitalismo corrupto dos cúmplices), estabelecendo alianças mafiosas com empresários servis, que são favorecidos com privilégios e monopólios, desde que sejam submissos ao poder e paguem as comissões adequadas. Todos eles consideram, como o ultraconservador Trump, que a imprensa livre é o pior inimigo do progresso e criaram sistemas de controle, direto ou indireto, para solapá-la. Nisso Correa foi mais longe que qualquer outro: aprovou a lei de imprensa mais antidemocrática da história da América Latina. Trump ainda não aprovou a sua, pois a liberdade de imprensa é um direito profundamente arraigado nos EUA, e um ato dessa natureza provocaria uma enorme reação negativa das instituições e da população. Mas não se pode descartar que, mais cedo ou mais tarde, ele tome medidas que – como na Nicarágua sandinista e na Bolívia de Morales – restrinjam e desnaturalizem a liberdade de expressão.

O populismo tem uma tradição muito antiga, embora nunca tenha alcançado a magnitude atual. Uma das maiores dificuldades para combatê-lo é que apela aos instintos mais puros dos seres humanos: o espírito tribal, a desconfiança e o medo do outro – seja de raça, língua ou religião diferente –, além da xenofobia, do patriotismo exagerado, da ignorância. Observamos isso de maneira dramática nos EUA de hoje. A divisão política no país nunca foi tão grande, e a linha divisória jamais foi tão clara: de um lado, toda a América culta, cosmopolita, educada, moderna; do outro, a mais primitiva, isolada, provinciana, que vê com desconfiança ou pânico a abertura de fronteiras, a revolução das comunicações, a globalização. O populismo frenético de Trump a convenceu de que é possível parar o tempo, retroceder a esse mundo supostamente feliz e previsível, sem riscos para os brancos e cristãos, que foram os EUA dos anos cinquenta e sessenta. Despertar dessa ilusão será traumático e, infelizmente, não só para o país de Washington e Lincoln, mas também para o resto do mundo.

Pode-se combater o populismo? Claro que sim. É o caso dos brasileiros que fazem uma formidável mobilização contra a corrupção. Dos norte-americanos que resistem às políticas demenciais de Trump. Dos equatorianos que acabam de impor uma derrota aos planos de Correa, votando por um segundo turno que poderia dar a vitória a Guillermo Lasso, um democrata genuíno. E dos bolivianos que derrotaram Morales no referendo com o qual pretendia se reeleger por séculos. Também dão exemplo os venezuelanos que, apesar da selvagem repressão da ditadura narcopopulista de Maduro, continuam lutando pela liberdade. Mas a derrota definitiva do populismo, como aconteceu com o comunismo, será fruto da realidade, do fracasso traumático de políticas irresponsáveis que agravarão todos os problemas sociais e econômicos dos países ingênuos que se renderam ao seu feitiço.

Por que Lula?

A semana promete ser tomada pelo “lançamento” da sexta candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência. O pontapé inicial foi um manifesto “espontâneo” assinado pelos intelectuais de cabeceira do petismo, e que dará origem a um site e um road show do ex-presidente e réu na Lava Jato pelo País. O título do abaixo-assinado é “Por que Lula?”. 

Está aí uma boa pergunta, mas a resposta está longe de ser o misto de ingenuidade, desonestidade intelectual e manipulação contidos no documento.

Por que Lula? Por que o Brasil precisa dele ou por que ele precisa dessa candidatura como escudo para se defender das acusações de que, no exercício da Presidência e depois de deixá-la, praticou corrupção passiva, tráfico de influência, lavagem de dinheiro e outros crimes investigados no petrolão?

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O calendário do lançamento de Lula coincide com a reta final de um dos processos nos quais o petista é réu, sob a acusação de ter recebido propina de até R$ 3,7 milhões na forma de “mimos” da OAS, que reformou um triplex no Guarujá que seria ofertado à sua família e pagou pela guarda das “tranqueiras” que ele carregou quando deixou o Alvorada.

Lula vai depor em maio diante do juiz Sérgio Moro. Até lá, deve rodar o País entoando a cantilena de que é vítima de perseguição política e de que os processos nada mais são do que uma tentativa de tirá-lo da vida pública e impedir uma nova candidatura.

Não será o contrário? Lula nunca desejou de fato ser candidato novamente à Presidência. Não o fez quando teve a faca e o queijo na mão: petistas como Rui Falcão e Marta Suplicy lançaram o “volta Lula” em 2014, e ele não o levou adiante.

Não foi em respeito a Dilma Rousseff que ele deixou de ser candidato. Lula desistiu porque não podia vislumbrar a possibilidade – na época, ainda bastante remota – de não ser eleito nem a perspectiva, esta bem concreta, de fazer um governo pior do que os anteriores.

Por que, então, teria mudado de ideia agora que é réu em cinco ações penais, o PT foi varrido do mapa nas eleições municipais, Dilma sofreu impeachment e a economia está em frangalhos? Altruísmo? Senso de dever para com aqueles que o PT diz ter incluído e que voltaram à miséria?

Talvez Chico Buarque ou Leonardo Boff acredite de fato nisso, embora seja espantoso.

A desigualdade social e o desemprego galopam no País por obra e graça dos governos Lula e Dilma. Ele por não ter aproveitado o vento favorável na economia mundial que vigorou até 2009 para fazer as reformas que eram necessárias. Ela por se lançar na tal “nova matriz econômica”, que nada mais era do que desculpa para abraçar a irresponsabilidade fiscal como se não houvesse amanhã.

A Lava Jato nada mais é do que a resposta da Justiça a um esquema de desvio de recursos públicos sem precedentes, montado de forma deliberada e reiterada pelos governos do PT – neste caso mais dele do que dela – para sustentar um projeto de poder que era para durar ao menos 20 anos.

O fato de Lula responder agora pelos crimes dos quais é acusado não é perseguição política, mas consequência do amadurecimento democrático e institucional do Brasil. Não à toa, os defensores do ex-presidente falam em “Justiça para todos e para Lula”, sem esconder a pretensão a que o cacique petista seja beneficiado por uma indulgência que não se destinaria a “todos”, só a ele.

É esse o desejo indisfarçado que transborda do texto dos “intelectuais” lulistas. O por que Lula, aqui, parece pressupor um complemento: por que Lula tem de responder como qualquer mortal perante a Justiça?

Portanto, não é a Lava Jato que quer impedir a candidatura do petista. É a candidatura que visa interditar, no grito, as investigações contra ele. Por que Lula? Por que não ele?

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Wuzhen old town in Zhejiang province, China:
Wuzhen (China)

Manifestações e delações

As delações da Odebrecht, que começam a aparecer sob a forma de depoimentos prestados ao Tribunal Superior Eleitoral, são estarrecedoras. Até o mais cético se pergunta como pudemos ter chegado lá, com o Estado tendo sido tomado de assalto por uma organização criminosa. Foi o esplendor dos governos lulopetistas.

A abrangência, contudo, desses depoimentos e delações mostra que a praga, capitaneada pelo PT, não se restringiu a esse partido, contaminou profundamente o PMDB, o PP, o PDT e agora o PSDB, além de outros partidos. É praticamente toda a classe política que foi posta em questão.

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A questão política tornou-se uma questão policial, tendo como pano de fundo uma profunda recessão e um amplo desemprego produzidos pelos sucessivos governos petistas. O desmonte foi total, atingiu empresas estatais, como a Petrobrás, que se tornou instrumento de corrupção e propina, sustentando um projeto de poder e enriquecendo políticos e funcionários. Empresas “vermelhas”, como a Odebrecht, foram colaboradoras entusiastas e aproveitadoras do projeto socialista.

Acontece que a desestruturação política foi de tal porte que produziu um imenso enfraquecimento institucional, que só não foi maior pelo comprometimento da Justiça personificado pela Lava Jato. O bem público foi posto em primeiro lugar. Poderosos pela primeira vez foram investigados, condenados e presos. Eis a luz no meio de um cenário sombrio.

O presidente Michel Temer, alçado constitucionalmente a essa posição, foi resultado de todo esse descalabro econômico, social, político e institucional. Determinantes foram as manifestações de rua, em particular a de 13 de março de 2016, que deu um não definitivo à ex-presidente Dilma e ao PT, e um sim indireto ao novo mandatário.

Coube a Temer empreender a transição, enfrentando uma herança maldita que só aos poucos se foi tornando clara. Medidas urgentes na área econômica foram postas como prioritárias, tendo como resultado a PEC do Teto do gasto público, o envio da PEC da Previdência, o projeto de lei da modernização da legislação trabalhista, a profissionalização da gestão da Petrobrás, a efetiva independência concedida ao Banco Central, que se traduziu na queda da inflação, além de outras medidas igualmente importantes como uma nova política externa após o descalabro bolivariano-petista, e o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI).

Mas a sociedade está insatisfeita, e com razão! Exigiu – e continua exigindo – uma nova forma de fazer política, ancorada no princípio da moralidade pública. O não dito a Dilma e ao PT não foi um sim à permanência das mesmas formas de governar. E nesse quesito o novo governo deixou a desejar.

Premido por aprovar as reformas econômicas, o novo presidente terminou privilegiando a relação com a Câmara e o Senado, consciente de que esse era o caminho. Descuidou, porém, da moralidade pública, cercando-se de assessores e ministros que não correspondem ao padrão ético exigido pelos brasileiros. Entrou em descompasso.

É bem verdade que o novo presidente só poderia governar com deputados e senadores eleitos na onda populista de esquerda, acostumados aos privilégios e aos mais diferentes tipos de “negócios”. Entretanto, houve um evidente desbalanceamento, com as novas demandas éticas relegadas a segundo plano.

Nesse sentido, o presidente Temer está sendo responsabilizado por suas escolhas iniciais. Nada há que o desabone pessoalmente, o que foi mostrado no recente depoimento de Marcelo Odebrecht. O mesmo não se pode dizer de várias pessoas de seu entorno.

O volume de vazamentos nas próximas semanas, se não dias, será equivalente ao de uma avalanche, levando alguns à desonra, outros a condenações e prisões. Não haverá controle sobre esse processo. E seus efeitos serão os mais impactantes, numa espécie de terra política arrasada.

O procurador Janot, se estivesse verdadeiramente à altura de seu cargo, deveria partir imediatamente para oferecer denúncias contra os mais envolvidos na Lava Jato, abrindo caminho para que o presidente Temer, conforme sua promessa, possa imediatamente afastar alguns ministros, segundo critério por ele mesmo estabelecido. Não há, porém, nenhum indício de que vá seguir essa via, contentando-se com a abertura de inquéritos que podem levar anos.

Aumenta aí a responsabilidade do presidente, pois não poderá ele aguardar que denúncias se produzam se o volume de delações e depoimentos for avassalador. A sociedade pode entrar em estado de indignação, traduzindo-se por fortes manifestações de rua. Não vai esperar!

Refiro-me, evidentemente, às manifestações do tipo que levaram ao impeachment da ex-presidente Dilma, e não às do tipo circense organizadas pelo PT e seus movimentos sociais, os mesmos que levaram à grave crise atual. Esses só podem pretender uma crise ainda mais profunda, que permita realizar seus delírios socialistas. Aliás, nesse quesito estão sendo apoiados por intelectuais igualmente circenses, que pretendem fazer voltar ao poder o ex-presidente Lula, que se esmera em fugir de condenações e da prisão. É o conluio da esquerda com o crime.

Não há o que temer de uma sociedade que reage e exige de seus governantes padrões éticos de conduta. Se não aprova o modo de fazer política do novo governo, reproduzindo comportamentos anteriores, é seu dever manifestar-se. Manifestações tanto mais legítimas se souberem igualmente reconhecer os enormes avanços da agenda econômica reformista da administração Temer.

Manifestações são gritos de uma sociedade que quer fazer-se ouvir. O presidente tem uma rara oportunidade de se tornar seu verdadeiro interlocutor. Para isso deve tomar medidas de moralidade pública no seu círculo ministerial, que mostrem sintonia com uma opinião pública que clama por mudanças.

1,7 milhão de crianças morrem por ano devido a fatores ambientais

Muitas vezes não nos ligamos, mas também somos parte da natureza, do meio ambiente... Então, nos ajudarmos e preservarmos o planeta significa questão de sobrevivência. www.eCycle.com.br Sua pegada mais leve.:
Dois novos relatórios divulgados neste domingo dizem que fatores de risco ambiental - como as condições do ar, água contaminada, falta de saneamento e higiene - são responsáveis pela morte de 1,7 milhão de crianças menores de cinco anos por ano. Os documentos foram elaborados pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Outro número encontrado nos textos é o de que mais de 1 em cada 4 mortes de crianças com menos de 5 anos é atribuída a ambientes insalubres.

O primeiro relatório foi intitulado de “Herdando um mundo sustentável: Atlas da saúde e do ambiente da criança”. Ele mostra que boa parte das causas mais comuns de mortes entre crianças nessa faixa etária - como diarreia, malária e pneumonia - podem ser evitadas com intervenções para a redução dos riscos ambientais e passando a garantir água potável e fontes limpas para a cozinha de casa.

"Um ambiente poluído é fatal, especialmente para crianças pequenas", disse Margaret Chan, diretora-geral da OMS. "O desenvolvimento de órgãos e sistemas imunológicos, e seus corpos menores e suas vias aéreas, os tornam especialmente vulneráveis à sujeira do ar e da água", completou.


De acordo com a organização, as exposições nocivas podem iniciar já no útero da mãe e aumentar a chance de um parto prematuro. Além disso, quando crianças são expostas ao fumo passivo e à poluição do ar há um risco aumentado de pneumonia durante a infância e uma maior chance de desenvolver doenças respiratórias crônicas, como a asma. O ar poluído aumenta, também, o risco de problemas cardíacos, acidente vascular cerebral e câncer.

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O segundo plano


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Se não estivermos aparelhados, apercebidos, couraçados por todos os recursos da energia do caráter, iremos todos, os latino-americanos, insensivelmente e fatalmente para o segundo plano
Paulo Mendes Campos, "Reformas de base"

Intelectuais do PT informam: o povo 'perderam'

“Por que Lula?”, pergunta a primeira linha do manifesto em que 424 autodenominados intelectuais a serviço do PT imploram ao chefe da seita que oficialize a candidatura à eleição de 2018. Até os bebês de colo e os doidos de hospício sabem a resposta: porque a esperteza talvez ajude a fantasiar de “perseguido político” um prontuário ambulante enriquecido por sítios, apartamentos, palestras secretas, jatinhos, negociatas africanas, filhos que multiplicam dinheiro de origem misteriosa e outros espantos. Só finge não saber disso a fila de signatários do documento, puxada pelo inevitável Leonardo Boff e previsivelmente engrossada por Chico Buarque (assinatura n° 9) e João Pedro Stédile (n° 10).

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Por que submeter a verdade a tão selvagens sessões de tortura?, perguntam os brasileiros normais ao fim da leitura do manifesto. Não há uma única e escassa menção ao assalto à Petrobras, ao maior esquema corrupto de todos os tempos, a descobertas da Lava Jato, à herança maldita legada por Lula e Dilma, a quadrilheiros engaiolados, à devastação provocada por 13 anos de roubalheira e incompetência. Aos olhos dos fiéis, a alma viva mais pura do mundo não tem nada a ver com isso. Lula tem tudo a ver apenas com a consolidação da democracia, o extermínio da pobreza, o sistema de saúde próximo da perfeição, o sistema educacional de dar inveja a professor finlandês e a transformação do Brasil numa potência petrolífera respeitada no mundo inteiro, fora o resto.

E por que assassinar o pobre português já no primeiro parágrafo?, perguntam os que tratam com mais brandura a língua oficial do Brasil. Em que medida o massacre do idioma ajudaria a livrar da cadeia um ex-presidente que saiu da História para entrar na bandalheira? Teriam os redatores do palavrório resolvido homenagear o Exterminador do Plural? Ou seria uma demonstração de solidariedade aos inventores da linguística lulopetista, para os quais falar errado está certo? Se não tem nada de mais insultar o português pronunciando frases como “Nós pega os peixe”, os discípulos de Lula estão à vontade para redigir o trecho abaixo reproduzido, com observações em negrito do colunista.
“É o compromisso com o Estado Democrático de Direito, com a defesa da soberania brasileira e de todos os direitos já conquistados pelo povo desse (Errado, o certo é ‘deste’) País, que (Alguém infiltrou uma vírgula bêbada entre ‘País’ e ‘que’) nos faz, através desse (É errado o uso de ‘através desse’: o certo é ‘por meio deste’) documento, solicitar ao ex-Presidente Luiz Inácio LULA da Silva que considere a possibilidade de, desde já, lançar a sua candidatura à Presidência da República no próximo ano (A candidatura deve ser lançada desde já ou no próximo ano?), como forma de garantir ao povo brasileiro a dignidade, o orgulho e a autonomia que perderam”.

Como é que é, companheiros inteleques? Quem “perderam”? O povo? Nesse caso, foram simultaneamente trucidados os fatos e a concordância verbal. O povo brasileiro nunca “perderam”; sempre perdeu, no singular. Mas desta vez não perdeu a dignidade, o orgulho e a autonomia, como fantasia o manifesto. O que perdeu foi a montanha de dólares acumulada pelo PT e seus comparsas. Também perdeu o respeito pelos farsantes no poder havia 13 anos, perdeu a paciência com os poderosos patifes e perdeu o medo de ditar os rumos da nação.

Nenhum país tem mais intelectuais por metro quadrado que o Brasil, constatou Nelson Rodrigues. O problema é que a maioria é incapaz de pensar. Enquanto mantêm guardado na cabeça um romance incomparável, escritores escrevem manifestos de envergonhar o mais bisonho reprovado no Enem. Nessa categoria figura o que sonha com a volta de Lula. A coleta de assinaturas recomeçará na segunda-feira, informou o site do PT. Sobra tempo para que os 424 pensadores façam as correções indispensáveis. Se quiserem copiar as feitas acima, estejam à vontade. De nada.

Também clama por um revisor com mais de cinco neurônios o texto que festeja no site do PT a desembestada ofensiva retórica. Confira:
“Numa iniciativa que responde à escolha que milhões de brasileiros manifestam com clareza sempre que lhe perguntam quem deve governar o país, o lançamento da candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República começa a tomar forma e conteúdo. A partir de segunda-feira (6), todo cidadão brasileiro será convidado a colocar seu nome, através de uma plataforma aberta na internet, a um abaixo assinado que solicita a Lula considerar “a possibilidade de, desde já, lançar sua candidatura a Presidência da República como forma de garantir ao povo brasileiro a dignidade, o orgulho e a autonomia que perderam.”

Esse monumento à ignorância vai ficar sem retoques. Primeiro, porque a cena do crime deve permanecer intocada, como alertam as séries policiais da TV americana. Depois, porque o parágrafo acima, da mesma forma que o manifesto, é uma prova contundente de que ─ ele, de novo ─ Nelson Rodrigues tinha razão: os idiotas estão por toda parte. Por que estariam ausentes de reuniões que terminam com o parto de outro manifesto?

Paisagem brasileira

Ponte de Pedra, Goiás:
Ponte de Pedra, Paraúna (GO)

Os bobos da corte

Convenhamos. O empresário Marcelo Odebrecht nunca foi o bobo da corte dos governos de Lula e de Dilma Rousseff, como se autodefiniu em depoimento para o TSE. Nem foi o otário dos mesmos governos, como ele quis fazer crer. Tampouco foi o dono do governo petista, essa uma imagem criada pelos partidos que fizeram oposição ao PT e que hoje fazem parte do grupo que assumiu o poder.

O dono dos governos do PT foi o PT, assim como o do PMDB é o PMDB. Apesar da força que aliados costumam ter nos governos no presidencialismo de coalizão, como o que é praticado no Brasil, quem vai responder perante a história pelo que fez ou não fez enquanto exerceu o poder será o partido do presidente da República. 


Agora, se fosse possível encontrar a figura do bobo da corte, essa figura até cairia bem nos eleitores que votaram no PT, no PMDB, no PSDB, no PP, no DEM e nos demais partidos que, no poder ou fora dele, se meteram em “tenebrosas transações”, só para lembrar um dos versos de Vai passar, de Chico Buarque, inspirado poema de resistência à ditadura.

O que houve entre o Estado brasileiro, políticos, partidos e empreiteiras foi uma ação de tal magnitude que alguém mais radical poderia pensar em enquadrar todo mundo em crime de lesa-pátria. Marcelo Odebrecht se queixou no depoimento ao TSE de que muitas vezes se viu forçado a entrar em projetos e empreendimentos que não desejava, além de não ver como receber as contrapartidas que julgava necessárias. Aí já está a confissão: faço, mas exijo algo em troca. Sem falar na romaria de partidos e políticos atrás de doações para campanhas.

As relações promíscuas entre o Estado brasileiro, as empreiteiras, os políticos e partidos chegaram a tal ponto que a CPI dos Fundos de Pensão descobriu que esses fundos, cujos ativos pertencem aos trabalhadores de estatais como a Petrobrás, o Banco do Brasil, os Correios e a Caixa Econômica, entre outros, foram obrigados pelo governo a jogar R$ 4 bilhões na Sete Brasil, empresa criada em 2010, no governo Lula, para cuidar da administração das sondas que seriam utilizadas no pré-sal. Só o FGTS, fundo dos trabalhadores administrado pelo governo, contribuiu com outros R$ 2,5 bilhões. Bancos e empresas privadas aportaram mais bilhões e bilhões. A mesma CPI apurou que todo o dinheiro renderia ao menos 3% em propina para partidos políticos. Em junho do ano passado, a empresa entrou com pedido de recuperação judicial, anunciando um rombo de US$ 19,3 bilhões, algo em torno de R$ 61 bilhões. É dinheiro que ninguém mais vai reaver.

Esse conluio entre o Estado e o setor privado jogou na lama a própria legislação brasileira. A toda hora alguém diz, em uma delação premiada, que pagou tantos milhões por uma medida provisória que tratava da isenção de impostos para montadoras de veículos, outros tantos por uma emenda a um projeto de lei, mais não se sabe quantos milhões para que empresas fossem autorizadas a refinanciar dívidas, só para citar alguns exemplos.

É claro que é difícil estabelecer exatamente a linha que define o que é um corruptor e um corrupto, o que é achaque e o que é corrupção ativa numa confusão dessas. Mas que houve no Brasil um ambiente de leniência com a corrupção sem tamanho, isso houve. Tanto é que hoje se apura um dos maiores casos de corrupção em todo o mundo, com exportação do método para vários países. Vergonhosa exportação.

Já que não é possível jogar o passado fora, a saída é uma só: o Brasil precisa seguir em frente, sem se deixar paralisar pela Lava Jato, que apura os escândalos; também não pode paralisar a Lava Jato. Encerrada essa fase, ganhos para as instituições democráticas virão. Para o País também.

A festa no céu já terminou para o PT

O sapo pediu ao urubu para entrar na sua viola e voar com ele para o céu, onde haveria uma festa de arromba. O batráquio divertiu-se como nunca, a ponto de não perceber que a festa estava acabando e o urubu já tinha descido. Não teve outro remédio senão pular, arrebentando-se todo aqui em baixo.

A fábula se conta a propósito do PT. Foi para as alturas, esbaldou-se e festejou sua intimidade com o poder. Fez de tudo em matéria de corrupção, como se fosse o dono da festa. Só que agora se vê sozinho, sem poder retornar às suas bases. O urubu não vai voltar para resgatá-lo. Não tem outra saída a não ser o pulo.

O PT já teve 72 deputados federais, agora possui 57 e quantos conseguirá eleger em 2018?

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Tudo depende do Lula. Sendo candidato e conseguindo superar a rejeição que o envolve, certamente contribuirá para a permanência do partido entre os maiores do Congresso, ainda que não mais o primeiro. Mas se for alijado da disputa por conta da Operação Lava Jato, deixará o PT sem pai nem mãe. Como também sem urubu capaz de levá-lo aos sindicatos ou mesmo a outra festa no céu.

O partido que já foi dos trabalhadores não tem como chegar a eles, sequer para evitar as reformas previdenciária e trabalhista. Não se tem notícia de qualquer campanha petista contra as reformas celeradas propostas pelo governo Michel Temer. Muito menos de sua aliança com as centrais sindicais. O desemprego de 13 milhões de trabalhadores parece não lhe dizer respeito. A festa no céu acabou mesmo.

Para salvar Michel Temer, TSE terá de se matar

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Arma-se no Tribunal Superior Eleitoral uma grande encenação. Envolve o processo sobre a reeleição de Dilma Rousseff e Michel Temer. Suas páginas estão apinhadas de provas do uso de recursos ilícitos na campanha vitoriosa de 2014. As evidências tocam fogo na Presidência-tampão de Temer. Para ocultar as manobras que visam salvar o mandato do subsituto de Dilma, ninguém grita incêndio dentro do teatro. Mas a inclusão dos depoimentos de delatores da Odebrecht no processo mostra que, às vezes, torna-se inevitável gritar teatro dentro do incêndio.

Nesta segunda-feira, o ministro Herman Benjamin, relator do processo, interrogará mais dois ex-executivos da Odebrecht: Cláudio Melo Filho e Alexandrino de Salles Ramos de Alencar. Com isso, Benjamin fecha a série de cinco oitivas de colabores da empreiteira. Os depoimentos forneceram dados que complicam a vida da turma do deixa-disso. Agora, quem quiser se fingir de cego para livrar Temer da cassação terá de fechar os olhos para as propinas que ajudaram a reelegê-lo.

Ao julgar o processo, o TSE não decidirá somente contra ou a favor da interrupção do governo Temer ou da inelegibilidade de Dilma. Os ministros votarão para saber de que matéria-prima é feita a Justiça Eleitoral. Prevalecendo o conchavo, os colegas de Benjamin terão de fazer contorcionismo retórico para justificar um incômodo paradoxo: depois de transformar a auditoria nas contas da chapa Dilma—Temer num marco histórico, o TSE jogará o trabalho no lixo. Em nome da etabilidade da República, manterá a tradição de cassar apenas vereadores, prefeitos e governadores de Estados periféricos.

Inicialmente, tramava-se a separação das contas de Dilma e Temer, sob o pretexto de que apenas as arcas da campanha de madame receberam verbas sujas. Como os votos que o eleitorado deu para Dilma são os mesmos que fizeram de Temer seu substituto constitucional, aceitar a tese da segregação das contas poderia levar à desmoralização. Ficaria claro que, sob o exterior meio idiota de um magistrado disposto a engolir esse lero-lero, se esconde um débil mental completo.

Dentro e fora do TSE, os operadores de Temer agarraram-se a um novo lema: “Nunca deixe para amanhã o que você pode deixar hoje.” Trabalha-se agora para enviar o julgamento às calendas. Algo que talvez leve a plateia a se perguntar: para que serve a Justiça Eleitoral? Se o TSE chegar a esse ponto, como parece provável, potencializará a impressão de ter perdido a sua função.

Os partidários do resgate de Temer alegam que o TSE não pode ficar alheio à conjuntura política e econômica. O risco de mergulhar o país numa turbulência que ameaçaria a tímida recuperação da economia justificaria um olhar atenuatório sobre as culpas e as omissõers de Temer.

Recorda-se, de resto, que a cassação de Temer desaguaria numa eleição indireta para a escolha do seu substituto. Como prevê a Constituição, caberia ao Congresso, abarrotado de parlamentares enrolados no petrolão, apontar o nome do próximo presidente. Paradoxo supremo: para fugir da lama congressual, finge-se que a podridão da campanha não existiu.

Se a sensibilidade auditiva fosse transportada para o nariz, as pessoas, ao ouvir o burburinho por trás das portas de certos gabinetes brasilienses, sentiria um mau cheiro insuportável. É um odor típico dos processos de decomposição. Para salvar Michel Temer, o Tribunal Superior Eleitoral terá de se matar.