quarta-feira, 29 de outubro de 2025
Capitalismo autofágico
Não nascem notas de dinheiro ao jogar na terra moedas de centavos. O capital não é produzido dessa forma, aliás, o capital não é criado no vácuo ou a partir da natureza, mesmo que seu lastro seja feito a partir de metais preciosos. Gurus neoliberais insistem no acúmulo de riqueza a partir da produção de renda como resultado de fórmulas e constructos ocos. Devaneiam, como se ser rico fosse um quinhão para aqueles com a mente treinada para tal destino. Nessa tese, não há finitude para o capital, pois sua capacidade de multiplicação é autônoma e constante desde que haja um processo incessante de trabalho.
Ao olhar para sua terra, o agricultor de moedas verá que o capitalismo é árido. Não basta trabalho e, muito menos, mente milionária para a prosperidade de sua renda. A finitude do capital está altamente concentrada em poucas mãos, enquanto muitos se acotovelam para sobreviver com a menor parte. É como se alguns tivessem um latifúndio florido enquanto poucos sobrevivem com um vaso de planta murcha.
Tal concentração é um sinal claro que o capital é finito, portanto, sua produção está baseada em como é possível circular moeda no mercado a partir de necessidades e desejos de uma demanda localizada. Mas há um contrassenso, pois isso não explicaria o aumento gradual de capital dos mais ricos. Se o capital é finito e sua criação não é natural, como os mais ricos aumentam suas fortunas dia após dia?
Anselm Jappe, em seu livro A Sociedade Autofágica – capitalismo, desmesura e autodestruição, descreve o mito de Erisícton logo nas primeiras páginas. Presente na mitologia grega, a alegoria conta que Erisícton era rei da Tessália abate uma árvore sagrada para usá-la em uma construção de seu palácio. Deméter, deusa das colheitas, emprega-lhe um castigo: uma fome insaciável. Assim, Erisícton, passa a devorar tudo que via ao seu redor, inclusive a própria natureza e seu reino e, não satisfeito, passa a comer a si mesmo.
Evidentemente, aqui está uma representação do modus operandi capitalista em sua insaciável fome que resulta na alimentação de trabalho e, de forma intrínseca, mais-valor. Para além disso, em uma sociedade que transforma tudo – desde hábitos, labor, necessidades e até psiquê – em mercadorias, tudo aquilo que está presente é passível de alimentar o Erisícton capitalista. Assim, quase tudo que se acumula é devorado, o que não pode ser, é alijado, se houver aquilo que não é capaz de ser mercantilizado.
Todo esse arranjo não é diferente daquilo compreendido por Metabolismo Social, idealizado por Marx. Antes, a dicotomia sociedade/natureza poderia ser vista como uma simbiose a partir dos fluxos de matéria e energia estabelecidos entre a biosfera e a economia, de acordo com Daniel Jeziorny. Nesse sentido, o humano é um agente produtor, que extrai matéria da natureza, a transforma em mercadoria e a devolve em forma de lixo. Porém, na atual fase do capitalismo, o humano vai além e explora a si e mercantiliza aquilo que está em seu íntimo.
Esse fenômeno é possível de ser observado na algoritmização, que explora dados extraídos dos comportamentos – e até pensamentos – daqueles que estão inseridos nessa formatação capitalista. Na vigilância constante de indivíduos, o capitalismo vem se alimentando daquilo que é pessoal e íntimo, como o sono, atividade física e até amostras de DNA.
Percebe-se que a partir do dilema da finitude do capital, a orientação é que se busque alternativas para a mercantilização. Não há um caminho para a produção de mais capital mas há possibilidades para novos arranjos de extração, ou seja, há uma construção para que o capitalismo se alimente de si.
É dessa forma que os indivíduos no topo da pirâmide têm a possibilidade de acúmulo diferentes daqueles que estão na base, pois eles se alimentam, justamente, dos que estão abaixo. Incapazes de produzir mais capital, a alternativa é se alimentar da riqueza daqueles que estão mais vulneráveis.
O trabalho passa a não ser a única forma de gerar mais riqueza aos burgueses, os proletários passam a ser mercantilizados em outras esferas. Por exemplo, o carro do motorista do Uber passa a pertencer, por alguns períodos, à empresa, que por sua vez é capaz de extrair mais informações sobre esse trabalhador e do passageiro. Esses dados são compilados com outros de tantas outras fontes e que somados geram uma mercadoria a ser vendida e exploradas por diferentes empresas.
Ao predar a si, o capitalismo tem como grande objetivo, concentrar ainda mais riqueza em poucas mãos. Isso pode ser visto, por exemplo, quando a fortuna de Musk cresce mais de 700% após a Pandemia de Covid-19. No mesmo período, de acordo com a Oxfam, a riqueza dos cinco maiores bilionários dobrou desde 2020, isso enquanto houve aumento de pobreza e extrema pobreza no mundo.
Os movimentos de contração na base e de expansão no topo mostram que o capital tem sua finitude e uma restrita capacidade de fluidez, em que há pouca (ou nenhuma) circulação na base e uma drenagem para o topo. O oposto não seria um processo autofágico e sim, uma distribuição nutricional equânime desse organismo econômico-social.
Portanto, a dinâmica da desigualdade é uma resposta ao comportamento autofágico do capitalismo, que estará sempre vista no recrudescimento das fortunas dos mais abastados. Obviamente, o aumento de riqueza jamais será através de trabalho ou de produção de capital e sim, pela alimentação da base. Diante da finitude do capital, o banquete será a mercantilização da classe trabalhadora.
Ao olhar para sua terra, o agricultor de moedas verá que o capitalismo é árido. Não basta trabalho e, muito menos, mente milionária para a prosperidade de sua renda. A finitude do capital está altamente concentrada em poucas mãos, enquanto muitos se acotovelam para sobreviver com a menor parte. É como se alguns tivessem um latifúndio florido enquanto poucos sobrevivem com um vaso de planta murcha.
Tal concentração é um sinal claro que o capital é finito, portanto, sua produção está baseada em como é possível circular moeda no mercado a partir de necessidades e desejos de uma demanda localizada. Mas há um contrassenso, pois isso não explicaria o aumento gradual de capital dos mais ricos. Se o capital é finito e sua criação não é natural, como os mais ricos aumentam suas fortunas dia após dia?
Anselm Jappe, em seu livro A Sociedade Autofágica – capitalismo, desmesura e autodestruição, descreve o mito de Erisícton logo nas primeiras páginas. Presente na mitologia grega, a alegoria conta que Erisícton era rei da Tessália abate uma árvore sagrada para usá-la em uma construção de seu palácio. Deméter, deusa das colheitas, emprega-lhe um castigo: uma fome insaciável. Assim, Erisícton, passa a devorar tudo que via ao seu redor, inclusive a própria natureza e seu reino e, não satisfeito, passa a comer a si mesmo.
Evidentemente, aqui está uma representação do modus operandi capitalista em sua insaciável fome que resulta na alimentação de trabalho e, de forma intrínseca, mais-valor. Para além disso, em uma sociedade que transforma tudo – desde hábitos, labor, necessidades e até psiquê – em mercadorias, tudo aquilo que está presente é passível de alimentar o Erisícton capitalista. Assim, quase tudo que se acumula é devorado, o que não pode ser, é alijado, se houver aquilo que não é capaz de ser mercantilizado.
Todo esse arranjo não é diferente daquilo compreendido por Metabolismo Social, idealizado por Marx. Antes, a dicotomia sociedade/natureza poderia ser vista como uma simbiose a partir dos fluxos de matéria e energia estabelecidos entre a biosfera e a economia, de acordo com Daniel Jeziorny. Nesse sentido, o humano é um agente produtor, que extrai matéria da natureza, a transforma em mercadoria e a devolve em forma de lixo. Porém, na atual fase do capitalismo, o humano vai além e explora a si e mercantiliza aquilo que está em seu íntimo.
Esse fenômeno é possível de ser observado na algoritmização, que explora dados extraídos dos comportamentos – e até pensamentos – daqueles que estão inseridos nessa formatação capitalista. Na vigilância constante de indivíduos, o capitalismo vem se alimentando daquilo que é pessoal e íntimo, como o sono, atividade física e até amostras de DNA.
Percebe-se que a partir do dilema da finitude do capital, a orientação é que se busque alternativas para a mercantilização. Não há um caminho para a produção de mais capital mas há possibilidades para novos arranjos de extração, ou seja, há uma construção para que o capitalismo se alimente de si.
É dessa forma que os indivíduos no topo da pirâmide têm a possibilidade de acúmulo diferentes daqueles que estão na base, pois eles se alimentam, justamente, dos que estão abaixo. Incapazes de produzir mais capital, a alternativa é se alimentar da riqueza daqueles que estão mais vulneráveis.
O trabalho passa a não ser a única forma de gerar mais riqueza aos burgueses, os proletários passam a ser mercantilizados em outras esferas. Por exemplo, o carro do motorista do Uber passa a pertencer, por alguns períodos, à empresa, que por sua vez é capaz de extrair mais informações sobre esse trabalhador e do passageiro. Esses dados são compilados com outros de tantas outras fontes e que somados geram uma mercadoria a ser vendida e exploradas por diferentes empresas.
Ao predar a si, o capitalismo tem como grande objetivo, concentrar ainda mais riqueza em poucas mãos. Isso pode ser visto, por exemplo, quando a fortuna de Musk cresce mais de 700% após a Pandemia de Covid-19. No mesmo período, de acordo com a Oxfam, a riqueza dos cinco maiores bilionários dobrou desde 2020, isso enquanto houve aumento de pobreza e extrema pobreza no mundo.
Os movimentos de contração na base e de expansão no topo mostram que o capital tem sua finitude e uma restrita capacidade de fluidez, em que há pouca (ou nenhuma) circulação na base e uma drenagem para o topo. O oposto não seria um processo autofágico e sim, uma distribuição nutricional equânime desse organismo econômico-social.
Portanto, a dinâmica da desigualdade é uma resposta ao comportamento autofágico do capitalismo, que estará sempre vista no recrudescimento das fortunas dos mais abastados. Obviamente, o aumento de riqueza jamais será através de trabalho ou de produção de capital e sim, pela alimentação da base. Diante da finitude do capital, o banquete será a mercantilização da classe trabalhadora.
Dia da Memória das Vítimas da Corrupção
Ao criar o Dia da Memória das Vítimas do Comunismo, o governador do Distrito Federal se refere, provavelmente, às vítimas do regime comunista da antiga União Soviética, que desapareceram há quase meio século. Não está considerando as vítimas da Rússia capitalista na Ucrânia, nem os 6 milhões — quase todos judeus — mortos pelo regime de direita nazista na Alemanha. Tampouco considera os 1.700 israelenses mortos e os cerca de 300 sequestrados, vítimas do terrorismo do Hamas, nem os 70 mil mortos e condenados à fome por Israel no gueto de Gaza. Ainda menos, não leva em conta as dezenas de milhares de presos, torturados, exilados ou os mortos pela ditadura militar de direita capitalista no Brasil.
É estranho criar um dia para lembrar as vítimas do comunismo na União Soviética quando, no Brasil, os comunistas sempre foram as vítimas — nos 10 anos do Estado Novo e nos 21 anos da ditadura militar —, sem promover um dia em memória das vítimas passadas do regime militar e das vítimas da corrupção em nosso regime democrático.
Seria justo decretar um dia de memória pelos 400 mil mortos que teriam sobrevivido à covid-19 se o presidente daquela época tivesse o mínimo de sensibilidade e competência — em vez do escárnio e da estupidez com que tratou os doentes e seus familiares, recusando vacinas, zombando dos mortos, chamando-os de fracos.
O governador lembrou-se de vítimas do comunismo na finada URSS, mas não teve consideração pela memória dos brasileiros que enfrentam a tragédia da saúde pública no DF, provocada pela inoperância e pela corrupção. Apesar dos bilhões transferidos anualmente ao GDF pelo resto do Brasil, pela primeira vez na história há brasilienses indo buscar atendimento na rede pública de Goiás, porque não encontram tratamento dentro do nosso quadrilátero. É preciso um dia de memória para os que são obrigados a esse percurso e para os que sentem vergonha do estado em que a incompetência, o descuido e a corrupção deixaram o que antes era exemplo de excelência no sistema público de saúde do Brasil, com o programa Saúde em Casa.
Deveríamos ter um dia de memória para as crianças que morreram por descuido com a saúde e com a segurança da população. Nenhum dia foi proposto em homenagem às crianças assassinadas — como ocorreu com Isaac Vilhena, morto no último dia 17, aos 16 anos, entre as quadras 112 e 113 Sul. O governo do DF não sancionou uma lei criando o dia da memória dos 4 milhões de escravizados trazidos da África, nem dos nascidos no Brasil, transportados por nove meses no ventre de suas mães, tampouco de seus descendentes, que até hoje estudam em escolas-senzala. Não decretou um dia em memória dos 20 a 30 milhões de brasileiros que viveram e morreram sem saber ler e escrever devido ao descaso histórico de nossos governantes com a educação de nosso povo. Nem pensou em lembrar dos que morreram de fome em país exportador de alimentos.
Somadas ao longo da história, o número de vítimas da corrupção — seja pela escolha errada de prioridades nas políticas públicas, seja pelo comportamento dos políticos que roubam em vez de cuidar do povo — é maior do que das vítimas dos crimes do comunismo em terras distantes e tempos passados.
Devemos lembrar as incontáveis vítimas de doenças e mortes decorrentes da ausência de saneamento, por descuido, incompetência e corrupção que desviam verbas públicas; também as vítimas da falta de remédios e de equipamentos hospitalares; e as vítimas morais — os habitantes do DF envergonhados com a imagem, no dia 8 de janeiro de 2023, da inoperância de nossa segurança pública, incapaz de evitar a depredação dos prédios que simbolizam a democracia. Vergonha por não sabermos se o governo daquele momento foi incompetente ou se participou da tentativa de golpe, levando o secretário de Segurança e integrantes da nossa gloriosa Polícia Militar a perderem suas carreiras e serem condenados à prisão, enquanto seus superiores são inocentados.
Não se trata de discutir se as vítimas distantes do comunismo merecem ser lembradas no DF, mas de denunciar a hipocrisia derivada da embriaguez eleitoral de quem quer agradar aos golpistas. Precisamos de um Dia da Memória das Vítimas de Governos Locais Incompetentes, Corruptos e Embriagados Eleitorais. Uma data apropriada seria o 8 de Janeiro, dia da nossa vergonha — com os que mostraram a cara no golpe e com aqueles que se esconderam, jogando a culpa em subordinados.
É estranho criar um dia para lembrar as vítimas do comunismo na União Soviética quando, no Brasil, os comunistas sempre foram as vítimas — nos 10 anos do Estado Novo e nos 21 anos da ditadura militar —, sem promover um dia em memória das vítimas passadas do regime militar e das vítimas da corrupção em nosso regime democrático.
Seria justo decretar um dia de memória pelos 400 mil mortos que teriam sobrevivido à covid-19 se o presidente daquela época tivesse o mínimo de sensibilidade e competência — em vez do escárnio e da estupidez com que tratou os doentes e seus familiares, recusando vacinas, zombando dos mortos, chamando-os de fracos.
O governador lembrou-se de vítimas do comunismo na finada URSS, mas não teve consideração pela memória dos brasileiros que enfrentam a tragédia da saúde pública no DF, provocada pela inoperância e pela corrupção. Apesar dos bilhões transferidos anualmente ao GDF pelo resto do Brasil, pela primeira vez na história há brasilienses indo buscar atendimento na rede pública de Goiás, porque não encontram tratamento dentro do nosso quadrilátero. É preciso um dia de memória para os que são obrigados a esse percurso e para os que sentem vergonha do estado em que a incompetência, o descuido e a corrupção deixaram o que antes era exemplo de excelência no sistema público de saúde do Brasil, com o programa Saúde em Casa.
Deveríamos ter um dia de memória para as crianças que morreram por descuido com a saúde e com a segurança da população. Nenhum dia foi proposto em homenagem às crianças assassinadas — como ocorreu com Isaac Vilhena, morto no último dia 17, aos 16 anos, entre as quadras 112 e 113 Sul. O governo do DF não sancionou uma lei criando o dia da memória dos 4 milhões de escravizados trazidos da África, nem dos nascidos no Brasil, transportados por nove meses no ventre de suas mães, tampouco de seus descendentes, que até hoje estudam em escolas-senzala. Não decretou um dia em memória dos 20 a 30 milhões de brasileiros que viveram e morreram sem saber ler e escrever devido ao descaso histórico de nossos governantes com a educação de nosso povo. Nem pensou em lembrar dos que morreram de fome em país exportador de alimentos.
Somadas ao longo da história, o número de vítimas da corrupção — seja pela escolha errada de prioridades nas políticas públicas, seja pelo comportamento dos políticos que roubam em vez de cuidar do povo — é maior do que das vítimas dos crimes do comunismo em terras distantes e tempos passados.
Devemos lembrar as incontáveis vítimas de doenças e mortes decorrentes da ausência de saneamento, por descuido, incompetência e corrupção que desviam verbas públicas; também as vítimas da falta de remédios e de equipamentos hospitalares; e as vítimas morais — os habitantes do DF envergonhados com a imagem, no dia 8 de janeiro de 2023, da inoperância de nossa segurança pública, incapaz de evitar a depredação dos prédios que simbolizam a democracia. Vergonha por não sabermos se o governo daquele momento foi incompetente ou se participou da tentativa de golpe, levando o secretário de Segurança e integrantes da nossa gloriosa Polícia Militar a perderem suas carreiras e serem condenados à prisão, enquanto seus superiores são inocentados.
Não se trata de discutir se as vítimas distantes do comunismo merecem ser lembradas no DF, mas de denunciar a hipocrisia derivada da embriaguez eleitoral de quem quer agradar aos golpistas. Precisamos de um Dia da Memória das Vítimas de Governos Locais Incompetentes, Corruptos e Embriagados Eleitorais. Uma data apropriada seria o 8 de Janeiro, dia da nossa vergonha — com os que mostraram a cara no golpe e com aqueles que se esconderam, jogando a culpa em subordinados.
Reconciliar as reivindicações do homem
A educação atual e as atuais conveniências sociais premeiam o cidadão e imolam o homem. Nas condições modernas, os seres humanos vêm a ser identificados com as suas capacidades socialmente valiosas. A existência do resto da personalidade ou é ignorada ou, se admitida, é admitida somente para ser deplorada, reprimida ou, se a repressão falhar, sub-repticiamente rebuscada. Sobre todas as tendências humanas que não conduzem à boa cidadania, a moralidade e a tradição social pronunciam uma sentença de banimento. Três quartas partes do Homem são proscritas. O proscrito vive revoltado e comete vinganças estranhas. Quando os homens são criados para serem cidadãos e nada mais, tornam-se, primeiro, em homens imperfeitos e depois em homens indesejáveis.
A insistência nas qualidades socialmente valiosas da personalidade, com exclusão de todas as outras, derrota finalmente os seus próprios fins. O atual desassossego, descontentamento e incerteza de propósitos testemunham a veracidade disto. Tentamos fazer homens bons cidadãos de estados industriais altamente organizados: só conseguimos produzir uma colheita de especialistas, cujo descontentamento em não serem autorizados a ser homens completos faz deles cidadãos extremamente maus. Há toda a razão para supor que o mundo se tornará ainda mais completamente tecnicizado, ainda mais complicadamente arregimentado do que é presentemente; que graus cada vez mais elevados de especialização serão requeridos dos homens e mulheres individuais. O problema de reconciliar as reivindicações do homem e do cidadão tornar-se-á cada vez mais agudo. A solução desse problema será uma das principais tarefas da educação futura. Se irá ter êxito, e até mesmo se o êxito é possível, somente o evento poderá decidir.
Aldous Huxley, "Sobre a democracia e outros estudos"
A insistência nas qualidades socialmente valiosas da personalidade, com exclusão de todas as outras, derrota finalmente os seus próprios fins. O atual desassossego, descontentamento e incerteza de propósitos testemunham a veracidade disto. Tentamos fazer homens bons cidadãos de estados industriais altamente organizados: só conseguimos produzir uma colheita de especialistas, cujo descontentamento em não serem autorizados a ser homens completos faz deles cidadãos extremamente maus. Há toda a razão para supor que o mundo se tornará ainda mais completamente tecnicizado, ainda mais complicadamente arregimentado do que é presentemente; que graus cada vez mais elevados de especialização serão requeridos dos homens e mulheres individuais. O problema de reconciliar as reivindicações do homem e do cidadão tornar-se-á cada vez mais agudo. A solução desse problema será uma das principais tarefas da educação futura. Se irá ter êxito, e até mesmo se o êxito é possível, somente o evento poderá decidir.
Aldous Huxley, "Sobre a democracia e outros estudos"
Liberdade, liberdade
Predomina hoje uma concepção que restringe a ação do homem baseada somente em uma questão de escolha. Sob essa ótica, quase tudo se torna prisioneiro do mercado, dos objetos que se compra na esquina de casa ao voto exercido a cada quatro anos pelos cidadãos. Na realidade, muitas das nossas opções são impulsionadas pela busca do lucro e do poder. Segundo dados revelados pelo Instituto Federal de Tecnologia, da Suíça, apenas 147 mega corporações controlam 40% de toda a economia no mundo. Não creio ser preciso dizer muito mais. Até mesmo o exercício do voto obedece a determinadas leis da propaganda e ao controle dos mecanismos de indicação por parte de minorias encasteladas nos partidos políticos. Ou seja, o voto como mercado pura e simplesmente.
Assim, há uma imposição do mercado sob o comando do capital; essa imposição não se exerce por intermédio da força bruta do Estado necessariamente. Ainda que não se possa esquecer que fenômenos como o fascismo ou o populismo tentam fazer, mais uma vez, com que a balança pese para o lado da dominação pelo carisma do chefe, apresentado como “escolha” – vá lá – da população. Uma combinação explosiva se aproxima do nosso horizonte, reunindo imposição do mercado e imposição política.
O desgaste e o cansaço provocados por práticas que excluem a cidadania pode estar trazendo de volta a noção do chefe e do poder mantido pelo indivíduo forte, que tudo resolve e centraliza, justamente, acima das próprias instituições. Isso, com a ajuda de partidos que nada representam em matéria de lutas pela liberdade, limitando-se ao triste papel de extensão ou "puxadinho" do Estado ou até do chefe no poder. É o que nós estamos vendo ao redor do mundo.
Estou convencido de que devemos repensar a noção de liberdade, enriquecendo-a com a inclusão em seu bojo da noção de sujeito coletivo, do homem da pólis. Debater o valor da cidadania enfim. A liberdade do indivíduo não pode se restringir à liberdade individual, centrada em escolhas muitas vezes induzidas. E isso, a meu juízo, por uma razão muito forte: vivemos em sociedade, somos seres sociais, com seus direitos e também deveres. Pertencemos a um coletivo. Indivíduo não se iguala a um posicionamento individualista.
Vale dizer, a participação conta e muito. No caso brasileiro, a sociedade tem buscado ir à luta, apesar das dificuldades. Temos milhões de pessoas trabalhando por conta própria, entre as quais cerca de dez milhões de artesãos. Isso na economia. Mas, na Cultura, o mesmo fenômeno ocorre, com uma criatividade que se espalha pelos quatro cantos do país, com músicos, escritores e atores apresentando suas peças de teatro na própria rua, ao mesmo tempo que cresce o número de envolvidos na busca pela solução dos nossos graves problemas ambientais.
Ou seja, a liberdade vai se exercendo das mais diversas formas, multiplicando seus campos de atuação. Aos trancos e barrancos, mas vai, colocando cada vez mais empecilhos à continuidade de práticas que se assemelham às da chamada República Velha. Falta agora que esta liberdade atinja a área institucional, a área da representação política, e mesmo jurídica, tão necessitada de novos atores e mecanismos.
Assim, há uma imposição do mercado sob o comando do capital; essa imposição não se exerce por intermédio da força bruta do Estado necessariamente. Ainda que não se possa esquecer que fenômenos como o fascismo ou o populismo tentam fazer, mais uma vez, com que a balança pese para o lado da dominação pelo carisma do chefe, apresentado como “escolha” – vá lá – da população. Uma combinação explosiva se aproxima do nosso horizonte, reunindo imposição do mercado e imposição política.
O desgaste e o cansaço provocados por práticas que excluem a cidadania pode estar trazendo de volta a noção do chefe e do poder mantido pelo indivíduo forte, que tudo resolve e centraliza, justamente, acima das próprias instituições. Isso, com a ajuda de partidos que nada representam em matéria de lutas pela liberdade, limitando-se ao triste papel de extensão ou "puxadinho" do Estado ou até do chefe no poder. É o que nós estamos vendo ao redor do mundo.
Estou convencido de que devemos repensar a noção de liberdade, enriquecendo-a com a inclusão em seu bojo da noção de sujeito coletivo, do homem da pólis. Debater o valor da cidadania enfim. A liberdade do indivíduo não pode se restringir à liberdade individual, centrada em escolhas muitas vezes induzidas. E isso, a meu juízo, por uma razão muito forte: vivemos em sociedade, somos seres sociais, com seus direitos e também deveres. Pertencemos a um coletivo. Indivíduo não se iguala a um posicionamento individualista.
Vale dizer, a participação conta e muito. No caso brasileiro, a sociedade tem buscado ir à luta, apesar das dificuldades. Temos milhões de pessoas trabalhando por conta própria, entre as quais cerca de dez milhões de artesãos. Isso na economia. Mas, na Cultura, o mesmo fenômeno ocorre, com uma criatividade que se espalha pelos quatro cantos do país, com músicos, escritores e atores apresentando suas peças de teatro na própria rua, ao mesmo tempo que cresce o número de envolvidos na busca pela solução dos nossos graves problemas ambientais.
Ou seja, a liberdade vai se exercendo das mais diversas formas, multiplicando seus campos de atuação. Aos trancos e barrancos, mas vai, colocando cada vez mais empecilhos à continuidade de práticas que se assemelham às da chamada República Velha. Falta agora que esta liberdade atinja a área institucional, a área da representação política, e mesmo jurídica, tão necessitada de novos atores e mecanismos.
Offshore
A citação de Charlie Munger, o sócio do famoso Warren Buffett, Show me the incentive, and I’ll show you the outcome (Mostrem-me o incentivo e eu mostro-vos o resultado) foca-nos no segredo do sucesso das plataformas eletrónicas como Instagram, TikTok e YouTube.
Não se trata da inovação tecnológica ou da comodidade de acesso. O seu crescimento resulta de uma opção legislativa.
Na televisão, na rádio e na imprensa escrita, o proprietário é solidariamente responsável com o autor da peça ou do texto pelos prejuízos causados. Sendo crime, o diretor pode também ser acusado, a par de quem criou o texto ou a imagem, quando não impediu a sua publicação. Isso incentiva a um cuidado especial. Os média tradicionais têm linhas editoriais e diretores de informação que cuidam de evitar a divulgação de conteúdos que incitem ao ódio ou sejam falsos ou capazes de induzir em erro (a tão famosa “desinformação”). Como qualquer outra empresa, também as televisões, as rádios e os jornais visam o lucro, mas o risco financeiro e de processos-crime impedem práticas predadoras.
Com o intuito de promover o comércio eletrónico, optou-se por isentar as plataformas da responsabilidade pelos prejuízos causados pelos conteúdos partilhados. Um offshore, com zero de responsabilidade. O legislador não ponderou os resultados deste incentivo. Livres de qualquer responsabilidade e, tal como qualquer média tradicional, dependentes da publicidade para rentabilizar o investimento, o objetivo é ganhar audiência. Para tal há que garantir que cada um vê o máximo possível daquilo que lhe interessa. E se o conteúdo for chocante, mais interessados nos tornamos, mais nos mantemos online. Mais tempo somos “audiência”. Há por isso que desenvolver algoritmos capazes de perceber do que gostamos, o que nos vicia, para continuar a alimentar o nosso insaciável apetite. Um feed, que sempre que pegamos no telemóvel nos relembra o nosso interesse num tema, com novos conteúdos, imparável, sempre com uma nova sugestão. E assim, juntamente com o conteúdo, a mensagem publicitária que garante o lucro. Há que assegurar que se não estamos online, iremos rapidamente estar e, então, inventam-se as notificações, que nos interrompem com um toque, um tremor, uma imagem. O feitiço completa-se com o botão do like. O nosso desejo de aprovação satisfeito com um polegar que sinaliza a receção ao conteúdo que partilhámos ou criámos.
“Mostrem-me o incentivo e eu mostro-vos o resultado.” O resultado é a proliferação dos conteúdos mais extremos e chocantes, que nos criam visões distorcidas da realidade. A “realidade” no nosso telemóvel é aquilo que tememos e nos choca.
John Stuart Mill afirmava que o maior risco para a democracia era a ameaça à liberdade de pensamento e expressão. As big tech utilizam Mill, indevidamente, para se oporem a qualquer responsabilização pelos conteúdos disponíveis nas plataformas. Afinal, afirmam, se removerem conteúdos estão a violar a liberdade de expressão. O argumento é falso. Os conteúdos mais chocantes geram mais visualizações e partilhas e, como tal, mais “audiência”. E “audiência” gera vendas de publicidade. Mill acreditava que a exposição a diferentes posições permitiria rebater as opiniões falsas ou irracionais. Mas o algoritmo não alimenta o feed com prós e contras de forma equilibrada, ao invés, reforça apenas uma visão. A maior ameaça à democracia é, no século XXI, o algoritmo.
O Regulamento dos Serviços Digitais não alterou, significativamente, o regime legal em matéria de responsabilização. Mantém-se a inexistência de um dever de vigilância, e obriga-se, apenas, as plataformas a retirarem conteúdos ilegais na sequência de uma denúncia ou porque “sabem” que é ilegal. A legislação continua a ignorar que as plataformas não são passivas. Promovem a disseminação, priorizam conteúdos.
O legislador europeu não precisa de criar uma legislação específica, basta aplicar o regime da responsabilidade dos média tradicionais, sempre que as plataformas optem por promover a disseminação de um determinado conteúdo. Alterar o incentivo contribuiria para uma internet mais segura e verdadeira – onde o falso, ilegal e danoso, ao não ser prioritizado pelo algoritimo, daria lugar à informação verdadeira, que todos os dias é partilhada.
Não se trata da inovação tecnológica ou da comodidade de acesso. O seu crescimento resulta de uma opção legislativa.
Na televisão, na rádio e na imprensa escrita, o proprietário é solidariamente responsável com o autor da peça ou do texto pelos prejuízos causados. Sendo crime, o diretor pode também ser acusado, a par de quem criou o texto ou a imagem, quando não impediu a sua publicação. Isso incentiva a um cuidado especial. Os média tradicionais têm linhas editoriais e diretores de informação que cuidam de evitar a divulgação de conteúdos que incitem ao ódio ou sejam falsos ou capazes de induzir em erro (a tão famosa “desinformação”). Como qualquer outra empresa, também as televisões, as rádios e os jornais visam o lucro, mas o risco financeiro e de processos-crime impedem práticas predadoras.
Com o intuito de promover o comércio eletrónico, optou-se por isentar as plataformas da responsabilidade pelos prejuízos causados pelos conteúdos partilhados. Um offshore, com zero de responsabilidade. O legislador não ponderou os resultados deste incentivo. Livres de qualquer responsabilidade e, tal como qualquer média tradicional, dependentes da publicidade para rentabilizar o investimento, o objetivo é ganhar audiência. Para tal há que garantir que cada um vê o máximo possível daquilo que lhe interessa. E se o conteúdo for chocante, mais interessados nos tornamos, mais nos mantemos online. Mais tempo somos “audiência”. Há por isso que desenvolver algoritmos capazes de perceber do que gostamos, o que nos vicia, para continuar a alimentar o nosso insaciável apetite. Um feed, que sempre que pegamos no telemóvel nos relembra o nosso interesse num tema, com novos conteúdos, imparável, sempre com uma nova sugestão. E assim, juntamente com o conteúdo, a mensagem publicitária que garante o lucro. Há que assegurar que se não estamos online, iremos rapidamente estar e, então, inventam-se as notificações, que nos interrompem com um toque, um tremor, uma imagem. O feitiço completa-se com o botão do like. O nosso desejo de aprovação satisfeito com um polegar que sinaliza a receção ao conteúdo que partilhámos ou criámos.
“Mostrem-me o incentivo e eu mostro-vos o resultado.” O resultado é a proliferação dos conteúdos mais extremos e chocantes, que nos criam visões distorcidas da realidade. A “realidade” no nosso telemóvel é aquilo que tememos e nos choca.
John Stuart Mill afirmava que o maior risco para a democracia era a ameaça à liberdade de pensamento e expressão. As big tech utilizam Mill, indevidamente, para se oporem a qualquer responsabilização pelos conteúdos disponíveis nas plataformas. Afinal, afirmam, se removerem conteúdos estão a violar a liberdade de expressão. O argumento é falso. Os conteúdos mais chocantes geram mais visualizações e partilhas e, como tal, mais “audiência”. E “audiência” gera vendas de publicidade. Mill acreditava que a exposição a diferentes posições permitiria rebater as opiniões falsas ou irracionais. Mas o algoritmo não alimenta o feed com prós e contras de forma equilibrada, ao invés, reforça apenas uma visão. A maior ameaça à democracia é, no século XXI, o algoritmo.
O Regulamento dos Serviços Digitais não alterou, significativamente, o regime legal em matéria de responsabilização. Mantém-se a inexistência de um dever de vigilância, e obriga-se, apenas, as plataformas a retirarem conteúdos ilegais na sequência de uma denúncia ou porque “sabem” que é ilegal. A legislação continua a ignorar que as plataformas não são passivas. Promovem a disseminação, priorizam conteúdos.
O legislador europeu não precisa de criar uma legislação específica, basta aplicar o regime da responsabilidade dos média tradicionais, sempre que as plataformas optem por promover a disseminação de um determinado conteúdo. Alterar o incentivo contribuiria para uma internet mais segura e verdadeira – onde o falso, ilegal e danoso, ao não ser prioritizado pelo algoritimo, daria lugar à informação verdadeira, que todos os dias é partilhada.
Mosquitos e humanos
Já vimos placas alertando sobre animais selvagens, cães bravos e outros. Nunca se viu uma advertindo sobre humanos perigosos. Não há leão com cara de bonzinho, mas há humanos cujo marketing os faz parecerem bonzinhos, apesar dos milhões que contribuem para matar!
Passou quase despercebida nos últimos dias uma notícia de grande importância: foram encontrados, pela primeira vez na história, mosquitos na Islândia! Esse país nórdico era uma das pouquíssimas áreas no planeta onde inexistiam tais insetos, devido ao rigor do clima quase polar! Outra região sem eles é a Antártica.
Foi exatamente no dia 16/10/25 que foram encontrados três exemplares, duas fêmeas e um macho, da espécie Culiseta annulata. Não por coincidência neste verão aquele país viveu temperaturas jamais observadas, com máximas beirando os 30 o C. O frio intenso na maior parte do ano impede que a população de mosquitos prospere, mas, doravante, alguns exemplares, alojados em porões ou estábulos, poderão sobreviver ao inverno. E, mantido o estilo de vida intensivo em carbono, plástico, velocidade, desigualdade e tóxicos variados, as tendências destrutivas que os supostos sapiens ainda não conseguiram alterar, em breve terá malária nos polos! E nos demais biomas, podemos esperar o quê?
A importância da notícia reside em que se tornou realidade o que era previsão. Além de mosquitos, peixes de águas menos frias foram encontrados na Islândia. Já há alertas de risco de dengue e chicungunha na Inglaterra, onde inexistiam, mas já foram encontrados exemplares das espécies tão conhecidas aqui nos trópicos. E não só animais têm migrado, fugindo do calor: diversas espécies de árvores hoje já prosperam em latitudes próximas dos polos. Os humanos também bucam novos habitats, movidos pelas mudanças do clima e por ódio, fome, medo e outros motivos, ao tempo em que crescem manifestações contra imigrantes, insufladas por humanos perigosos e poderosos.
Como, com tantas evidências, ainda há pessoas que negam o processo de aquecimento global? Há alguns que argumentam que o planeta sempre apresentou ciclos de mudanças climáticas, e negam o papel dos humanos no processo atual. Cabe comparar a velocidade da queda de uma bola deixada solta no plano inclinado de um morro, com outra bola, colocada no mesmo local e chutada morro abaixo. A humanidade está, literalmente, chutando o clima e a biosfera para além das condições que permitem a vida.
A crescente velocidade das atuais mudanças planetárias coloca em risco todas as nossas instituições e modo de vida. E o absurdo é que aqueles que negam o papel dos humanos nessas mudanças o fazem, em larga escala e na melhor das hipóteses, com o propósito de manter o status quo! Décadas atrás disse o Bush pai, estabelecendo limites para sua participação na conferência Rio 92, a origem das COP: “O american way of life é inegociável!” Ou seja, o estilo de vida que destrói o planeta e não elimina a miséria não pode ser questionado.
Nesse quadro, os dirigentes – recuso-me a chamá-los de líderes – das mais poderosas nações seguem minimizando a responsabilidade de seus países, negando apoio aos condenados pelo sistema vigente e pior, decidiram ampliar seus gastos militares.
Como substituir os perigosos loucos que hoje nos comandam?
Passou quase despercebida nos últimos dias uma notícia de grande importância: foram encontrados, pela primeira vez na história, mosquitos na Islândia! Esse país nórdico era uma das pouquíssimas áreas no planeta onde inexistiam tais insetos, devido ao rigor do clima quase polar! Outra região sem eles é a Antártica.
Foi exatamente no dia 16/10/25 que foram encontrados três exemplares, duas fêmeas e um macho, da espécie Culiseta annulata. Não por coincidência neste verão aquele país viveu temperaturas jamais observadas, com máximas beirando os 30 o C. O frio intenso na maior parte do ano impede que a população de mosquitos prospere, mas, doravante, alguns exemplares, alojados em porões ou estábulos, poderão sobreviver ao inverno. E, mantido o estilo de vida intensivo em carbono, plástico, velocidade, desigualdade e tóxicos variados, as tendências destrutivas que os supostos sapiens ainda não conseguiram alterar, em breve terá malária nos polos! E nos demais biomas, podemos esperar o quê?
A importância da notícia reside em que se tornou realidade o que era previsão. Além de mosquitos, peixes de águas menos frias foram encontrados na Islândia. Já há alertas de risco de dengue e chicungunha na Inglaterra, onde inexistiam, mas já foram encontrados exemplares das espécies tão conhecidas aqui nos trópicos. E não só animais têm migrado, fugindo do calor: diversas espécies de árvores hoje já prosperam em latitudes próximas dos polos. Os humanos também bucam novos habitats, movidos pelas mudanças do clima e por ódio, fome, medo e outros motivos, ao tempo em que crescem manifestações contra imigrantes, insufladas por humanos perigosos e poderosos.
Como, com tantas evidências, ainda há pessoas que negam o processo de aquecimento global? Há alguns que argumentam que o planeta sempre apresentou ciclos de mudanças climáticas, e negam o papel dos humanos no processo atual. Cabe comparar a velocidade da queda de uma bola deixada solta no plano inclinado de um morro, com outra bola, colocada no mesmo local e chutada morro abaixo. A humanidade está, literalmente, chutando o clima e a biosfera para além das condições que permitem a vida.
A crescente velocidade das atuais mudanças planetárias coloca em risco todas as nossas instituições e modo de vida. E o absurdo é que aqueles que negam o papel dos humanos nessas mudanças o fazem, em larga escala e na melhor das hipóteses, com o propósito de manter o status quo! Décadas atrás disse o Bush pai, estabelecendo limites para sua participação na conferência Rio 92, a origem das COP: “O american way of life é inegociável!” Ou seja, o estilo de vida que destrói o planeta e não elimina a miséria não pode ser questionado.
Nesse quadro, os dirigentes – recuso-me a chamá-los de líderes – das mais poderosas nações seguem minimizando a responsabilidade de seus países, negando apoio aos condenados pelo sistema vigente e pior, decidiram ampliar seus gastos militares.
Como substituir os perigosos loucos que hoje nos comandam?
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