quinta-feira, 30 de junho de 2016

A saída possível

Muitas vezes somos assolados por um sentimento de impotência em relação ao futuro do Brasil. Afinal, por mais que caminhemos, parece-nos sempre que voltamos ao mesmo ponto em que a realidade de violência, corrupção e desinteresse pelo bem comum impõe-se como uma fatalidade. No entanto, há saídas e uma delas, a mais óbvia e mais duradoura, seria uma profunda mudança no nosso sistema de ensino. Não há país no mundo que tenha conseguido superar suas mazelas sem investir prioritariamente em educação. E o resultado aparece não apenas no aumento do nível cultural da população, mas reflete-se de maneira imediata nos índices econômicos. País educado é sinônimo de nação rica e socialmente mais equilibrada.

Para resolver nossos problemas devemos, antes de tudo, reconhecer que temos problemas. O Brasil mantém-se nos últimos lugares do ranking elaborado pelo Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) que, desde sua criação em 2000, examina os conhecimentos de estudantes de 15 anos de 64 países nos campos da ciência, matemática e leitura. Segundo dados da ONG Todos pela Educação, 78,5% dos brasileiros terminam o ensino médio sem dominar minimamente a língua portuguesa. O Instituto Paulo Montenegro, em conjunto com a ONG Ação Educativa, encontrou 38% de analfabetos funcionais – pessoas que não conseguem interpretar textos simples – entre nossos universitários, e concluiu que 73% da população adulta – de 15 a 64 anos – não é plenamente alfabetizada. No ano passado, o Brasil destinou 6,6% do Produto Interno Bruto (PIB) à educação, maior que a média dos países filiados à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que é de 5,6%. No entanto, nosso gasto por aluno é três vezes menor - 2.900 contra 8.900 dólares. Então, o problema não é tanto o total de dinheiro destinado ao ensino público, mas a maneira como ele é gerido.


De acordo com a Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem (Talis, na sigla inglesa), patrocinada pela OCDE, 90% dos professores brasileiros dos anos finais do ensino fundamental concluíram o curso superior, mas cerca de 25% não estão habilitados a dar aulas. Apenas 40% são empregados em tempo integral (contra 82% na média dos países da OCDE) e cada um administra 34 alunos em sala (contra 24 nos países da OCDE). Além disso, nossos professores dedicam 25 horas por semana às aulas, seis horas a mais que a média dos outros países, mas, deste total, 12% são gastos em tarefas burocráticas e 20% na tentativa de impor ordem à classe.

E aqui nos deparamos com o dado mais alarmante. Pesquisa da Talis mostra que o Brasil lidera os casos de violência nas escolas: 12,5% dos professores ouvidos relatou ser vítima de agressões verbais ou de intimidação de alunos pelo menos uma vez por semana, uma frequência quatro vezes maior que a média global. Segundo dados do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial de São Paulo (Apeoesp), 44% dos professores da rede pública do estado mais rico da União já sofreram algum tipo de violência em sala de aula. A hostilidade verbal é a forma mais comum (atingindo 39% dos docentes), seguida de assédio moral (10%), bullying (6%) e agressão física (5%). O estudo mostra também que quem mais sofre com a violência são os professores do sexo masculino que lecionam no ensino médio: 65% deles afirmam já terem sido agredidos.

Além de ter de conviver com a falta de infraestrutura adequada (prédios, móveis, bibliotecas, computadores), os professores ainda não contam com o apoio daqueles que deveriam ser seus principais aliados, os pais dos alunos. A educação válida, aquela que nos capacita para o exercício da cidadania, única garantia para uma sociedade democrática, tem que necessariamente ser compartilhada entre a família e o Estado. Em casa, adquirimos conhecimentos gerais e recebemos noções morais e éticas, valores que, introjetados, constituirão nosso ser pelo resto da vida. Na escola, espaço privilegiado de socialização, recebemos instrução, ou seja, somos alfabetizados, organizamos os conhecimentos gerais e exercitamos as noções morais e éticas. Apenas 12,6% dos professores acredita que sua profissão é valorizada pela sociedade, contra a média global de 31%. Esse desinteresse pelos educadores transparece no valor da remuneração de seu trabalho. A média salarial é de 2.181,00 reais para professor de ensino fundamental e 2.476,00 reais para o ensino médio por 40 horas semanais. O piso nacional, que nem todos os estados respeitam, é de 2.135,64 reais – salário quase 70% menor que o praticado nos países desenvolvidos.

O sonho da TV pública acabou?

A manchete do GLOBO desta segunda-feira mostra que as estatais contrataram 56 mil servidores em quatro anos e revela um dado estarrecedor sobre a Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Seu número de funcionários cresceu nada menos que 180%; foi de 913 para 2.564.

A EBC é a controladora da TV Brasil, também conhecida por TV Lula, que, desde sua criação, há nove anos, não apenas não conquistou um ponto sequer de audiência, como deixou de cumprir ou mesmo de estabelecer metas artísticas, criativas ou de qualquer natureza televisiva.

A título de comparação, vale a pena lembrar que a Rede Bandeirantes, uma das mais modernas do país, tem menos de quatro mil funcionários. E que a Rede Globo, uma das cinco maiores do mundo, tem cerca de 18 mil.

O governo Temer, que vem ameaçando extinguir a empresa desde que o presidente interino se viu impedido de substituir um diretor, ganha agora forte munição para isso. Os opositores do atual governo despejam na opinião pública frases de efeito como “Temer quer destruir a TV pública”, quando, na verdade, o quadro é o oposto.

Charge O Tempo 29.6.2016

Logo no início do primeiro governo Lula, o PT criou inéditas condições políticas para que o país investisse meio bilhão de reais na formação de uma rede pública de TV. O governo acenava para algo que era verdadeiro: a necessidade de se construir uma televisão pública forte, que trafegasse lado a lado com a poderosa estrutura da TV privada do país. Alavancou para isso pelo menos dois grandes seminários nacionais — um no Rio, outro em Brasília — onde especialistas do Brasil e do mundo debateram os valores de uma televisão gerida pela sociedade e a conveniência da medida.

A criação da EBC foi uma bela conquista política, mas, no momento seguinte, ficou claro que não havia a mínima intenção de colocar em prática tudo o que havia sido prometido. Seminários e o desfile de nobres intenções eram apenas a máscara para a construção de mais uma estatal voltada para o aparelhamento, o empreguismo e o desperdício de dinheiro público.

Tudo isso é quase nada em comparação com a ética desse engodo; com o que representou a mobilização da consciência da sociedade brasileira em torno da necessidade de se criar uma TV pública, imediatamente derrubada pela revelação do que efetivamente se estava fazendo. Foi, portanto, o PT, e não o governo Temer, que destruiu a televisão pública no Brasil — e não há dinheiro que pague isso.

Dos quase três mil funcionários que hoje são pagos pelo contribuinte, contam-se nos dedos os que foram instruídos para moldar uma TV capaz de criar, ousar, retornar de alguma forma à sociedade aquilo que ela está gastando. A uma televisão privada que é respeitada em todo o mundo, a TV pública brasileira sequer procurou agregar um frame de inovação. E se tivesse agregado, isso não seria percebido. A TV Brasil até hoje não entra em São Paulo e, no Rio, o sinal para as operadoras de cabo ainda é enviado por VHF — razão pela qual é provavelmente a única emissora do mundo que chega aos usuários de TV por assinatura com fantasmas, ruídos e outras imperfeições típicas da TV aberta dos anos 80.

Por ironia, o bom exemplo está na porta do vizinho. Em São Paulo, a TV Cultura desenvolve hoje uma das melhores programações do país, com um jornalismo — através de programas como o “Jornal da Cultura” e o “Roda Viva”, por exemplo — que nada deixa a dever às melhores televisões públicas do mundo.

Ainda assim, a virtual extinção da EBC não representaria apenas o fechamento de mais uma empresa corrompida. Poderia ser o sepultamento de um sonho bom que, ainda com más intenções, foi propagado quando o primeiro governo petista ainda tinha um imenso aval popular. Este é um ativo que o governo tem como preservar. O desafio agora consiste em apagar o que foi feito e, ainda assim, manter a ideia de uma TV pública de verdade — o que é muito maior que simples políticas viciosas. Empresas podem morrer; utopias, não.

Nelson Hoineff

Brasil no pau-de-arara

Por força desse comportamento reiterado das autoridades - "Eu sou autoridade, você não é ninguém, portanto,cale-se", é que o país está desse jeito.
Não me calo. diante do autoritarismo, diante da injustiça, diante dos comportamentos ditatoriais que nós temos verificado neste País
Janaína Paschoal 

Um jovem universitário, em São Paulo, foi executado militarmente pela política depois de furar uma blitz policial. Os policiais envolvidos foram afastados e cumprem funções internas enquanto se investiga a participação deles.

O ex-ministro Paulo Bernardo teve revogada sua prisão. Sem foro privilegiado, apesar de todos os indicativos de seu connhecimento e participação no assalto a funcionários e pensionistas públicos com o crédito consignado, ainda assim o ministro do STF, Dias Toffoli, considerou a prisão um "constrangimento ilegal".

O Brasil continua  o paraíso que privilegia a autoridade, seja ela da polícia ou da política, em detrimento do cidadão. Um país de duas caras. A primeira concede a liberdade e a liberalidade sob os risos de felicidade; a outra, uma carranca de desprezo, autoritária, espalhando choro e ranger de dentes. O cidadão sem farda vai logo para o xilindró; sem amizade política, paga como pena multas injustificáveis quando não, se pobre, em presídios dos mais desumanos do mundo.

Se o mundo mudou, o Brasil sobrevive socialmente entre a casa-grande e a senzala sob os holofotes edulcorados da auto-propaganda. Mudança, como se espera, haverá compulsoriamente quando talvez daqui a 100 anos o planeta estiver mudado. Mas não no momento enquanto se cultivar tanto o privilégio da "autoridade" sobre a cidadania.

Tão perto! Tão longe!

Desde que a Lava-Jato demonstrou que o PT é o Eduardo Cunha e vice-versa, e que há muito pouca coisa entre os dois que se diferencie radicalmente de ambos, o Brasil está paralisado na sua perplexidade.

Seriam, de fato, os R$ 0,85 de cada mensalidade embolsados pelo ministro Paulo Bernardo o maior escândalo desses “empréstimos consignados” com juros subsidiados que já montam a R$ 281 bi (4,5% do PIB) para a casta dos “com tudo” ao lado dos mais de 400% ao ano de juros do cartão do desespero dos “sem nada” de quem o Estado já toma outros 46% do PIB (36% de carga + 10% de déficit)? Pense bem: o Bolsa Família, sempre aventado como desculpa para manter os ladrões onde estão, custa 0,3% do PIB…

Este país de avessos, onde as escolas é que estão “ocupadas” e estudar passou a ser uma atividade clandestina que a polícia reprime de preferência a quem trata de impedi-la, teve tempo de sobra para acostumar-se com isto em que se transformou. Os sindicatos-impostos de Getulio Vargas evoluíram do primeiro e único ao 15º milésimo de hoje e a metástese prossegue sem combate ao ritmo de 280 novos por ano. E daí saltamos com toda a naturalidade para os nossos por enquanto 35 partidos-impostos a quem pagamos horários-impostos para que nos ofendam e humilhem diariamente na TV, tudo sob a proteção dos “movimentos-sociais-impostos” recheados de militantes-impostos que nos cobram hora-extra para viajar em ônibus-impostos para onde quer que sejam convocados para defender a intocabilidade dos “seus” impostos. Passados 80 anos eis-nos bancando festas nos palácios com impostos diretamente arrancados às favelas…

Com toda a barreira de silêncio que ainda protege da exposição à execração pública que merece o mundo da côrte movida a impostos onde “demissão” não consta do dicionário, “auxílio” não é renda e os salários continuam subindo 60 bilhões por ano em meio ao pânico aqui fora, bate na cara do país inteiro o verdadeiro divisor de águas – contribuíntes x “contribuidos” – que separa os dois Brasis e não se encaixa nem a murro no repertório “esquerda-direita” dos nossos ditadores de “correção política”.

Agora temos o ciclo completo. Do imperador ao proletário, todos que estiveram no comando do “Sistema” colheram variações do desastre que é só o que ele pode produzir ou, no máximo, suspenderam temporariamente seus efeitos. Caiu finalmente a ficha. É tudo uma fraude. Tudo tem sido uma fraude. E o país que não se assume como desonesto calou-se…

Tão perto! Tão longe!

O buraco é de dar vertigem mas o tamanho do nosso atraso é o nosso maior trunfo. O mundo está todo numa encruzilhada mas é uma encruzilhada lá na frente. Tudo que diferencia o 1º do Último Mundo é, hoje, estrada batida. Para percorrê-la basta se dispor a tanto. Você saberá que o Brasil tem cura quando se começar a afirmar em voz alta, por aí, as duas balizas mais elementares da democracia plantadas ha mais de 300 anos. Apoiar o discurso do ajuste das contas públicas no princípio da igualdade perante a lei colocando na linha de cortes todos os “direitos” e isenções que não sejam comuns a todos os brasileiros é a única maneira de desarmar o torneio entre padrinhos de privilégios à custa do aprofundamento da corrupção e da miséria em que ele, mais uma vez, se vai transformando. Redefinir o direito de representação confirmando exclusivamente o dos sindicatos, partidos políticos e entidades que forem capazes de conquistá-lo e mante-lo por livre eleição e financiamento dos seus representados é o único modo objetivo de sairmos do feudalismo e começarmos a nos beneficiar do processo de depuração recorrente inerente aos sistemas democráticos. A “cláusula de barreira” que o STF matou não era mesmo a melhor solução pois cuidava só de represar a lama incessantemente produzida por um sistema torto e corrupto que acabará sempre, inevitavelmente, em “desastres da Samarco” com “danos ambientais” permanentes.

Para que “as instituições funcionem” de fato não é a letra, é a essência democrática da Constituição, definida nos seus artigos iniciais, que tem de ser imposta acima de tudo e de todos, começando pelo desafio jurídico de toda a vasta massa de exceções e penduricalhos esboçados nos que lhe foram acrescentados na sequência e estão em conflito insanável com eles.

Quando não foram diretamente protagonizadas pelo Poder Judiciário, como as da Inglaterra do século 17 que criaram a democracia moderna, as poucas revoluções verdadeiras que a história da humanidade registra – não confundir com os banhos de sangue recorrentes para troca de comandantes de monarquias ou ditaduras das culturas latinas – consolidaram-se (ou não) nas reformas jurídicas que foram empurrando a humanidade para fora do padrão geral do privilégio institucionalizado e para dentro da igualdade perante a lei cujo corolário obrigatório é sair do “a cada um segundo o seu grau de cumplicidade para com os crimes do rei” e enveredar pelo muito menos venenoso “a cada um segundo o esforço investido na obra coletiva”.

O que houve de empolgante no atual processo brasileiro foi exatamente o fato de ter ele partido do Poder Judiciário. Com as condenações do “mensalão” o Brasil acordou para o fato de que não é obrigatório, afinal, que o crime vença sempre, e foi às ruas para comemorar esse quase milagre e empurrar para adiante a “marolinha” que, a partir de Curitiba, assumiu ares de tsunami e ameaça fazer escola.

O Brasil Velho está vivo como prova o fato de todos os ladrões estarem presos e continuarem soltos os seus chefes. Mas o Novo não dá sinal de abandonar a arena. Seria uma excelente bandeira para essa OAB reconciliada com sua tradição histórica de alinhamento com o que é justo tomar a si, junto com os movimentos de rua, esse “Mutirão pela Igualdade Perante a Lei”, de modo a forçar o país inteiro a tomar posição em relação ao que ha de mais essencial numa ordem realmente democrática.

Dois presidentes são nenhum

Caso não tenha mudado de ideia, a presidente afastada Dilma Rousseff estará viajando hoje para Belém às custas de donativos da direção do PT para ressarcir a viagem aérea, possivelmente num avião da Força Aérea. Depois de muito meditar, Madame e sua turma desistiram de utilizar uma aeronave particular. Preferiram os meios oficiais, por questões de segurança, mas como só tinham autorização para voar de graça no trajeto Brasília-Porto Alegre-Brasília, optaram por arcar com as despesas. Organizaram uma célebre “vaquinha”, reunindo doações dos companheiros. Ignora-se quanto custará o périplo, muito menos como os recursos chegarão à FAB.

Mais uma trapalhada da presidente afastada. Primeiro porque não deveria estar viajando pelo país inteiro, prerrogativa incompatível com sua quarentena. Depois, porque o PT não existe para custear despesas particulares. Acresce que se fosse imprescindível seu deslocamento à capital do Pará, deveria ter apelado para suas reservas privadas.

De qualquer forma, lá se vai a presidente para mais uma de suas múltiplas incursões fora de hora, quando deveria estar cuidado de sua defesa, procurando anular o afastamento quando se esgotarem os 180 dias fora do poder. Pelo jeito, parece perto da saída definitiva.

Enquanto isso, o país parou. Michel Temer esforça-se inutilmente para governar. Teria essa condição caso estivesse no exercício pleno de suas funções. Dois presidentes da República são nenhum, mais ou menos como no final de sua vida Luiz Carlos Prestes definia o Partido Comunista: “Não é partido e não tem comunistas”.

Acabou a espera de João por uma vaga na UTI em Brasília. Ele

João Rosa do Nascimento, 55 anos, peão de obra desempregado, esperou por 84 horas para ser transferido a uma Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) que vagasse em qualquer hospital de Brasília.

Estava em coma induzido por conta de um derrame. Seus filhos conseguiram três ordens judiciais para obrigar o Governo do Distrito Federal a acomodá-lo em um quarto de UTI. Tudo em vão.

Ontem, pouco antes de 22h, João sofreu a quarta parada cardíaca desde que deu entrada no hospital do Paranoá, a menos de 20 minutos de carro do prédio do Ministério da Saúde.

Aparelhos hospitalares defeituosos, essenciais no tratamento de pacientes em estado grave, estão encostados em uma sala no hospital do Paranoá a espera de reparos (Foto: Guga Noblat)
Foto: Guga Noblat
Morreu numa cama de uma das salas do pronto socorro do hospital. Em outras dependências do hospital, amontoam-se aparelhos de UTI sucateados

João chegou ao hospital no domingo depois de sentir tonteira e formigamentos no momento em que tomava o café da manhã. Era um Acidente Vascular Cerebral (AVC), comumente chamado de derrame.

Ontem à tarde, o secretário de Saúde, Humberto Fonseca, disse a este blog que a condição dele era estável, apesar de demandar cuidados de uma UTI.

Como havia casos mais urgentes, João teria que continuar esperando a abertura de uma vaga, avisou Fonseca. São 800 quartos de UTI em Brasília, 80 vagos por falta de médicos e de enfermeiras.

O drama de João com o sistema público de Saúde do Distrito Federal começou no ano passado quando ele quebrou a mão e não recebeu o tratamento adequado.

João precisava passar por uma cirurgia que nunca aconteceu. Por isso, acabou demitido do emprego. Trabalhava com construção civil.

Sua maior paixão era construir casas. Outra paixão era pescar.

Na semana que antecedeu ao derrame, ele foi todos os dias as hospital do Paranoá para tentar marcar a cirurgia da mão que deveria ter sido feita há oito meses.

“Só que a burocracia do Estado não permitiu que ele se operasse”, queixa-se Vando, um dos sete filhos de João.

João chegou a Brasília há 40 anos. Veio da pequena Itumbiara, em Goiás. Na capital, apaixonou-se por Aparecida de Jesus do Nascimento com quem logo se casou.

A família dependia do seu trabalho para se manter. E assim foi por pouco mais de 20 anos.

O funeral de João será hoje na cidade de Planaltina.

Quem tem pena do cidadão comum?

Desde que a reputação de herói começou a forjar a armadura com a qual a opinião pública nacional protege a condição incólume da ação do juiz federal paranaense Sergio Moro, a inveja, o ciúme e o instinto de sobrevivência de alguns colegas de ofício dele passaram a maldizê-la com fervor. A primeira arma dessa luta vã é retórica: o comandante da Operação Lava Jato “não é nem pode ser o único juiz honesto do Brasil”. Isso não basta para convencer o cidadão comum a abrir mão da “república de Curitiba”, amada pelos representados e temida pelos representantes de nossa democracia cabocla, pois esta preserva um raro resquício do conceito basilar do Estado Democrático de Direito, até segunda ordem vigente entre nós: a igualdade de todos perante a lei. Em seguida a esse desafio, a esperança de mantê-la, ressurgida nos dois mensalões, o tucano e o petista, começou a plantar êmulos de Moro pelo País afora. Colegas menos expostos à luz dos holofotes se dispuseram a mostrar que há juízes em Berlim. E até mesmo fora do Paraná.

Na semana passada, emergiu do noticiário outro desses exemplos de que nem tudo é procrastinação no Judiciário pátrio. Chama-se Pedro Bueno de Azevedo, tem 38 anos e chefia a 6.ª Vara Criminal em São Paulo. De suas decisões emergiu a Operação Custo Brasil, que revela uma das maiores ignomínias perpetradas por criminosos de colarinho branco na História de nossa República: o pagamento de propinas ao partido político que capitaneia o time que governou o Brasil durante 13 anos, quatro meses e 12 dias, até o impeachment de Dilma Rousseff. Não é o maior no volume de furto. Mas o mais indecente na natureza do butim: o pagamento de propina para políticos fiéis a esse desgoverno e a seu partido, o PT, tungando sem anuência da folha de pagamento de um ministério, o do Planejamento, a cada mês e em taxas módicas, o suficiente para passar em brancas nuvens e “sair na urina”. Paulo Bernardo, duas vezes ex-ministro, despontou no alto da ponta desse iceberg.

O fio da meada da devassa, feita pela Polícia Federal (PF) e pelo Ministério Público Federal (MPF) sob a égide de um juiz isento e insuspeito, foi puxado do depoimento do vereador Alexandre Romano, de Americana, na Operação Lava Jato. Não há, contudo, como estabelecer conexão com um laivo de perseguição do implacável Moro e seus intocáveis. Tornada notória na mesma ocasião em que o coordenador da Lava Jato, Deltan Dallagnol, cunhou o lema do caráter devastador do roubo generalizado do dinheiro público no Brasil – “a corrupção é um serial killer sorrateiro” –, a operação jurídico-policial carrega a denominação mais exata do que qualquer outra antes empreendida. Custo Brasil diz tudo.

Os funcionários que tomaram empréstimos consignados de 2010 a 2015 pagaram R$ 1,25 pelos serviços da consultoria Consist, que, na verdade, custaram R$ 0,30, ou seja, um quarto. Do restante foram originados os R$ 100 milhões entregues aos ex-tesoureiros do Partido dos Trabalhadores João Vaccari Neto e Paulo Ferreira. Ex-deputado federal pelo PT do Paraná, o ministro do Planejamento de Lula e de Comunicações de Dilma ficou, segundo os investigadores, com R$ 7 milhões. Isso parece lana-caprina se comparado com os bilhões furtados de Petrobrás, BNDES e fundos de pensão.

Mas o procurador Andrey Borges de Mendonça, ao descrever o furto, lembrou que “a corrupção não é um privilégio da Petrobrás”, ela “está espraiada como um câncer”, e “o coração do governo estava agindo por esse mal”. Esse vício maligno, descrito por Dallagnol como “uma assassina sorrateira, invisível e de massa… que se disfarça de buracos de estradas, de falta de medicamentos, de crimes de rua e de pobreza”, acabou flagrado ao sair do bolso dos contribuintes para rechear contas bancárias de bandidos, passando pela folha de pagamento de servidores enganados de forma fria e cruel.

A Custo Brasil desnuda ainda uma expressão funesta da representatividade de nossa democracia: o corporativismo nefasto de “representantes” dos cidadãos, que mimam parceiros da corporação política e esquecem os representados. O PT, fundado para pôr fim à politicagem e à corrupção, não se solidarizou com os servidores, dos quais 46% dos sindicatos são filiados à CUT, nem com os mutuários de “sua” Bancoop ou os acionistas de “nossa” Petrobrás. Mas, sim, com ex-tesoureiros e mandatários vassalos do desgoverno afastado.

O Senado, por decisão do presidente, Renan Calheiros (PMDB-AL), exigiu do Supremo Tribunal Federal (STF) a anulação da busca e apreensão na casa de Bernardo, pedida pelos promotores, autorizada pelo juiz e efetuada pelos policiais. Motivo: o preso é casado com uma ex-chefe da Casa Civil de Dilma, Gleisi Hoffmann, que, senadora, tem direito a impunidade seletiva, vulgo foro privilegiado. Assim, o “direito alagoano” reescreve o romano e o anglo-saxônico ao instituir o puxadinho do privilégio, garantido no foro de Murici, em que os dois gozam o benefício de um pelo tálamo de ambos

Essa comiseração corporativista inspirou a desfaçatez dos maganões. Com o tom exaltado com que execra Dilma, mas sem mais autoridade para manter a exaltação ao impeachment, o líder tucano na Casa, Cássio Cunha Lima, vociferou contra a violência de juiz, promotores e policiais, que “humilharam” a coleguinha casada com o indigitado. Sem levar em conta que o juiz tinha vedado na busca a coleta de quaisquer pertences ou documentos da esposa do procurado. O insigne líder do partido, que jura fazer oposição, não fez justiça aos funcionários furtados, mas aderiu ao coro mudo dos omissos, em que petroleiros calam quanto à bancarrota da Petrobrás, bancários ignoram o uso desavergonhado do BNDES e sindicalistas, o arrombamento dos fundos de pensão.

Na algaravia geral brasileira não se ouve uma só voz que se apiede do cidadão comum ou zele pela Pátria, mãe gentil.

José Nêumanne

Delação coletiva

A ideia é maluca, mas a solução talvez possa estar numa delação premiada coletiva, tanto por parte dos políticos quanto dos empresários, mesmo no caso dos que cometeram apenas pecado venial. Todos nós, na verdade (como disse o papa Francisco em relação aos gays), deveríamos pedir perdão ao país (e ao mundo) no qual vivemos. É da palavra “perdão” que estamos necessitados. É esse o termo que todos – nós, políticos e empresários – precisamos incorporar. E ela só não basta. Ajamos, sem medo, em favor de reformas profundas já. E antes que os injustiçados se rebelem
Ou estamos à espera de uma rebelião fratricida?!

Acílio Lara Resende, 'Que este desabafo sirva, pelo menos, como mais um alerta"

Brasil lidera índice de número de partidos

PP, PTB, PSC, PMDB, PEN, PT, PSDB, PR, PSB, PSD, DEM, PRB, PDT, PTN, PTdoB, PSL, SD, PCdoB, PPS, PHS, PV, PSOL, PROS, REDE, PMB, PRP e PRTB. Essa é a sopa de letrinhas dos 27 partidos que integram nossa Câmara de Deputados, a mais fragmentada do mundo.

A anormalidade brasileira é um dos fatores que explicam a enorme turbulência que se abateu sobre o sistema presidencialista brasileiro. Dezenas de partidos para negociar no Congresso e uma presidente com pouco traquejo político, junte-se a isso uma recessão econômica profunda e um gigantesco escândalo de corrupção, eis a receita para a maior crise em décadas.


Segundo levantamento publicado neste ano pela Universidade de Gotemburgo, na Suécia, o Brasil tem o maior número de partidos com força política na Câmara em um conjunto de 110 países monitorados.

A comparação internacional usou dados de 2011. Naquele ano, o número de partidos políticos efetivos do país era 11, segundo o Instituto de Qualidade de Governo da universidade. A média mundial era 4,1.

Para efeitos de comparação, considerando números arredondados, Índia tinha 8; Argentina, 7; Alemanha, 6; México, 4; e Estados Unidos, 2, os conhecidos partidos Democrata e Republicano.

Esse índice é o mais usado para fazer comparações internacionais. A partir de uma fórmula que leva em conta o número total de cadeiras na Câmara dos Deputados e a quantidade de parlamentares por legenda, calcula-se o número de partidos que têm votos suficientes para influenciar o resultado das votações.

Há consenso de que esse número subiu ainda mais nos últimos anos no país. Segundo cálculo do cientista político Michael Gallagher, especialista no tema da Universidade Trinity, na Irlanda, a quantidade de partidos políticos efetivos no Brasil deu um salto na última eleição, tendo passado de 11 em 2010 para 14 em 2014.

Segundo o cientista político Sérgio Abranches, o índice costuma ser um bom parâmetro do que se observa na prática sobre quantos partidos têm, de fato, poder de influenciar e bloquear discussões no Congresso.

Um número muito baixo de partidos pode indicar um problema de representação em países como grupos sociais diversificados. Já um índice alto indica maior dificuldade para o presidente formar uma base parlamentar que lhe dê governabilidade.

Abranches foi quem cunhou, no fim dos anos 1980, o termo "presidencialismo de coalizão" para classificar o sistema político brasileiro que nascia com a redemocratização. Ele previa que as grandes desigualdades sociais e regionais do país levariam ao crescimento do número de partidos, o que obrigaria à legenda vencedora das eleições presidenciais a se aliar com outras para poder governar.

O problema, nota ele, é que as regras eleitorais do país acabaram criando incentivos para a multiplicação dos partidos, levando a uma hiperfragmentação que torna "mais cara" a gestão da coalizão.

"Digo mais cara no sentido técnico da palavra, sem levar em consideração qualquer aspecto de corrupção. Exigem-se mais concessões do presidente, tanto no sentido de compartilhar o governo (com cargos), como no sentido de abrir mão de posições programáticas para encontrar uma mediana entre os partidos e implementar um conjunto de políticas públicas", explica ele.

quarta-feira, 29 de junho de 2016

Brasileirismos

Gente boa: do bom e do bem. Platônicos sem saber, eles unem o bom vinho e o excelente uísque a amigos inigualáveis. Eles amam execrar e, temos depois, santificar o execrado. Tem sido assim com grandes pensadores e até com ditadores. Eis um brasileirismo.

Não falam de questões, mas de pessoas. Dos “outros” – deles mesmos vistos de longe. Cada caso tem uma versão. Quando surge uma indiscrição, tergiversam. Fazem parte dos “arrumados” e estão “no mesmo barco”. Um barco com espaço para mais um grupo. Isso os torna imunes aos naufrágios. Eis um outro brasileirismo.

Aceitam abusos e tramoias porque seguem o brasileirismo das relações pessoais. Todos se ligavam com todos, de modo que basta saber quem é para safar (ou agravar) uma situação. A consideração era maior do que a eficiência que eles tanto clamavam.


Uma pessoa diz que o sujeito é fascista, mas se o amigo afirma que é um conhecido, cria-se um dilema. Esse era um brasileirismo clássico, mas eles não davam importância às relações pessoais, que era justamente a dimensão social que lhes permitia as ultrapassagens.

Assim, quanto mais faziam leis, mais os elos pessoais as neutralizavam, alimentando o sonho pueril de revoluções institucionais destinadas a consertar definitivamente o sistema. Promulgavam a lei que igualava, mas quando os acusados eram amigos, o laço pessoal – tomado como banalidade, inocência e engano – era imediatamente usado de modo que o patife virava ambicioso, o fanático um exagerado; o nazista um exaltado e o ladrão partidário uma vítima da imprensa midiática.

O abuso dos elos pessoais, que salva criminosos e os transforma em perseguidos, gera uma relação duvidosa com a lei e as instituições, pois torna a impessoalidade antipática, senão impossível. As leis são boas para os outros, não para nós. O magistrado é competente, até que se saiba de seus amigos. Então, num só movimento, se desmoralizam as leis, porque ninguém discute ou percebe o peso das relações pessoais no funcionamento da sociedade.

O país das leis não se entende com a sociedade das amizades. Não querendo conhecer a força do “dou para receber”, essa norma que amarra mais do que as constituições, pois, sem ela, não haveria simplesmente sociedade, o País inventa brasileirismos. Cria leis e mais leis com o objetivo de tornar real o anonimato sem o qual não há cidadania, mas elas reforçam os relacionamentos pessoais.

O fato é que ou estar “dentro” ou “fora” é mais importante do que o certo ou o errado. Laços ideológicos nutridos por amizade e obséquios ultrapassavam partido e credos, obrigando a isentar criminosos óbvios e a negar erros crassos de gerenciamento. As amizades englobam os interesses nacionais. Uma gigantesca onda de corrupção, ao lado de dilemas político-burocráticos, engendrou um cenário jamais previsto pelos politicólogos: o brasileirismo de um país com dois presidentes. Um afastado constitucionalmente, e o outro, empossado com o aval do STF, tentando remendar o que pode, sendo impiedosamente chamado de “golpista”.

O personalismo, tido como banal e inconsequente, é justamente o cerne dos brasileirismos. Ele leva o sistema ao pré-suicídio, porque opera com leis explícitas e com regras implícitas. A lei proíbe claramente, a amizade faculta ocultamente.

Lado a lado, essas éticas criam arranjos imprevisíveis. Os laços pessoais interferem com os institucionais e vice-versa. Quem faz é mais importante do que aquilo que foi feito.

A discriminação pessoal do “esse eu conheço!” neutraliza as leis.

O maior brasileirismo não é a tão propalada e vergonhosa desigualdade, mas, sem sombra de dúvida, é o clamor igualitário. Não podemos continuar com a teoria segundo a qual, quando se trata de país é ideológico e político; mas, quando se trata de amigos, é coisa de honra, respeito e consideração. Como conciliar esses códigos claramente indispensáveis para uma vida social equilibrada, senão discutindo suas demandas, confrontos e implicações?

Num mundo de amigos e compadres, nada pode ser mais perverso do que a igualdade de todos perante a lei.

É preciso acabar com leis de incentivo à cultura; sou contra até lei de incentivo ao feijão

Estamos acompanhando estarrecidos as primeiras revelações sobre a roubalheira derivada da Lei Rouanet. Acho, como diria o viciado em clichês, que se trata apenas da ponta do iceberg. Nessa matéria, preciso dizer uma coisa que me parece imperiosa: eu sou contra qualquer forma de incentivo ou subsídio à produção cultural por princípio. Aliás, eu sou contra subsídio ou incentivo especial para a produção de feijão. Imaginem se vou defender tais expedientes para metáforas e trinados.

E notem: nesse caso, estou me referindo a pessoas que fazem honestamente o seu trabalho. Estou partindo do princípio de que não existe roubalheira. Mesmo assim, sou contra.



Aqui e ali se fazem algumas confusões: “Ah, o estado não dá dinheiro para determinadas produções; apenas autoriza a captação de recursos”. Alto lá duas vezes! Em primeiro lugar, em alguns casos, dá dinheiro, sim. Em segundo lugar, a palavra “captação” esconde uma verdade: renúncia fiscal. A empresa que faz a sua doação pela Lei Rouanet vai deduzir do Imposto de Renda uma parcela do que doou. Logo, Lei Rouanet é dinheiro público, sim, mesmo na modalidade “autorização para captação”. Deixa de entrar nos cofres públicos o dinheiro que deveria. E, como vemos, dada a vida dos nababos, a grana acaba em algum lugar.

A Lei Rouanet é de 1991. Está aí, portanto, há 25 anos. Digam-me cá: assistimos, por acaso, a algum notável florescimento cultural? Gênios do povo surgiram nesse período? Alguma experiência de arte de vanguarda caiu nas graças da lei e exerceu a sua influência a ponto de mudar parâmetros, ganhar epígonos? O que o povo brasileiro efetivamente ganhou nesse tempo? A resposta é conhecida. Os únicos beneficiários da Lei Rouanet são… os beneficiários da Lei Rouanet!!!

A Lei de Incentivo ao Audiovisual é outra, mas também lida com a ideia de subsídio e da isenção fiscal. Já financiou algumas coisas boas. Já alimentou muitas porcarias. A única intervenção que eu admitiria do estado nessa área seria no incentivo à criação de um mercado que pudesse, este sim, financiar os artistas e sua produção.

Não posso compreender que um artista produza a sua obra com financiamento estatal — não nos dias que correm. Não faz sentido. Se o mercado quer o que está sendo produzido, ele vai financiar; se ele ainda não quer porque não entende a linguagem, porque esta lhe parece hostil ou porque a mensagem soa aborrecida, é um contrassenso que o estado paternalista, então, se encarregue de financiar “a vanguarda”. Inexiste vanguarda do oficialismo. Contestador financiado pelo cofre público é picareta.

Da mesma sorte, não faz sentido que o leite de pata estatal alimente artistas do establishment. Ora, há só uma chance de o sujeito que produz segundo os cânones não dar certo: não ser acolhido pelo público que deseja capturar. Se é assim, por que dar a ele recursos oficiais?

Sei que muitos artistas rejeitam essa perspectiva. “Pô, já é tão ruim… Imagine se não houver incentivo nenhum!” Eu diria que se trata precisamente do contrário: para que seja bom, é preciso que algo se financie. Só assim artistas e produtores saem da zona do conforto. Não deve ser mera coincidência que, pré-leis de incentivo, peças de teatro ficavam em cartaz de terça a domingo, com duas sessões aos sábados. Hoje, com a mamata da Rouanet, mal se aguentam de quinta a domingo.

A arte não é feita pelo público, mas pelo artista. Este, no entanto, só existirá se houver quem o reconheça. Entram aí muitas variáveis, mas uma coisa é certa: não será a transformação da produção artística numa burocracia que vai libertar as novas mentes criativas.

Por último, noto que a escolha do projeto A ou do projeto B para receber os benefícios será sempre arbitrária e acabará derivando do gosto dos que têm a caneta na mão. E nós todos gostamos de coisas diferentes. Por que vamos permitir que o estado escolha o que julga interessar?

Leis de incentivo à cultura com honestidade já seriam perniciosas e teriam de ser extintas. Com roubalheira, tornam-se insuportáveis.

Pelo fim da Lei Rouanet!

Foi a causa, companheiro!

Ramon Mercader, o assassino de Trotsky, passou vinte anos numa cadeia mexicana sem jamais admitir ter agido a mando de Stalin, sem revelar sua real identidade. Esse militante dedicado não se via como um assassino e sim como quem cumpriu uma tarefa revolucionária, como quem nunca traiu seus companheiros de causa. Por isso mesmo foi condecorado como herói da União Soviética, em 1961.

Não foi uma exceção. Rudolf Ivanovich Abel nunca reconheceu que era o chefe da espionagem soviética nos EUA, nem mesmo quando foi trocado pelo piloto norte-americano Francis Gary Power.

Como estes personagens, de “O homem que amava os cachorros” e “Uma ponte entre os espiões”, João Vaccari Neto é um militante disciplinado, mas tem uma ética diferente. Em vez de aguentar o tranco sozinho, quer que o Partido dos Trabalhadores assuma, formalmente, que os assaltos aos cofres públicos, investigados pela Lava-Jato e outras operações, foram feitos em nome da legenda e não por iniciativa pessoal de seus militantes. O mea-culpa do PT abriria a possibilidade de quem está preso assumir a sua cota, sem grandes dramas de consciência, entre eles o da “traição”.



Vaccari sempre foi um cumpridor de tarefas, jamais um formulador. Não deve, portanto, ser o autor da ideia. Provavelmente ela saiu de uma cabeça mais refinada, como a de José Dirceu, este sim um estrategista responsável por grandes inflexões na história do PT, para o bem ou para o mal; na maioria das vezes para o mal.

A estratégia do “Foi a causa, companheiro” teria vários objetivos. O primeiro deles, claro, o de livrar a própria pele dos dirigentes presos, abrir uma possibilidade para que não passem o resto de suas vidas atrás das grades. Como isso aconteceria não se sabe muito bem. Não há o menor indicativo da Justiça quanto a um possível abrandamento das penas de Dirceu, Vaccari, André Vargas a partir de um pedido de desculpas do PT.

O pulo do gato estaria em outro movimento. O Partido dos Trabalhadores assumiria a culpa, mas se colocaria duplamente na condição de vítima. Tanto da “perseguição” da Lava-Jato, da qual seria o alvo final, como do próprio sistema político, ao qual os petistas apenas teriam aderido. Assim, o pedido de desculpas viria acompanhado da defesa arraigada da reforma política.

Culpar o sistema político pelos ilícitos cometidos serviria tanto para o público interno como para o público externo. É um discurso roto, esfarrapado, mas é o único ao alcance das mãos, para o PT tentar sobreviver à previsível hecatombe eleitoral de 2016 e de 2018.

Vaccari é o escudo de José Dirceu, por uma razão muito simples. O ex-tesoureiro é um homem de reputação ilibada nas hostes petistas. Na ética do PT, nunca fez nada de errado. Apenas cumpriu a missão que lhe foi dada, desviando recursos públicos para a causa e não em benefício pessoal, diferentemente de Dirceu e André Vargas, que cederam às “tentações burguesas” e locupletaram-se com o erário público.

Parodiando a Bíblia: para os petistas, Vaccari é o bom ladrão, já Dirceu e Vargas os maus, e não merecem o perdão.

A distinção entre o “bom” e o “mau corrupto” serve para consumo interno, para aplacar a militância, mas não resolve o problemão colocado à frente do PT. O tempo vai passando e o peso da cadeia começa a se fazer sentir. Vaccari está com 58 anos, tem como perspectiva uma pena de 24 anos. Ou seja, se tivesse de cumprir a punição integralmente sairia da cadeia com 82 anos! Não há horizonte para quem tem 70 anos e é condenado a 20 anos de cadeia, como é o caso de José Dirceu.

O sentimento de abandono, a rotina gris da vida carcerária, a irritação com o imobilismo petista, para utilizar uma expressão do próprio João Vaccari, e a pressão dos familiares podem dobrar os mais fortes, sobretudo em uma época em que não há mais ideologia e bandeiras para justificar o sacrifício. Elas foram enterradas pelo Partido dos Trabalhadores há muito tempo.

Vaccari mandou seu recado. Não tem vocação alguma para Ramon Mercader ou para Ivanovich Abel.

Cultura da boca livre

Há pouco mais de um mês o Brasil assistiu ao espetaculoso movimento produzido pela denominada classe artística contra o fim do Ministério da Cultura e o possível estrangulamento da joia da coroa: a Lei Rouanet. A mídia e as redes sociais foram tomadas por gritos histéricos condenando o cataclisma do atentado contra a cultura com o fim do ministério.

Houve quem via nisso o choro de desmamados. Nunca em tempo algum a cultura serviu tanto como bandeira política para encher o bolso de uns e outros de forma descaradamente eleitoreira. Foram anos de escandalosa apropriação de dinheiro público para colorizar o mural nebuloso de uma vitória do povo.


A operação Boca Livre desta semana deixou muita gente de cabelo em pé e mais um batalhão calado. Ainda não se ouviu nenhum gritinho de artística histeria contra a devassa nas contas da cultura de massa subsidiada.

A rapinagem dos cofres públicos, em nome da cultura, não é de hoje. Apenas se institucionalizou quando se descobriu que qualquer coisa pode levar o nome de Cultura (assim com maiúscula) quando o termo foi banalizado em nome de interesses econômicos e principalmente políticos.

Quantas orquestras jovens, quantos cursos artísticos, quantas peças teatrais amadoras foram incentivados nos municípios? Mas foram incontáveis os shows pagos com dinheiro público para dar "circo" ao povo como convém à petralhada dos últimos anos. Nem falta neste histórico a vangloriosa afirmação de um prefeito de ter promovido mais shows em sua gestão do que em toda a história municipal de séculos. Uma apresentação revoltante da apropriação indébita dos cofres públicos devidamente aplaudida pela gangue eleitoreira.

A operação Boca Livre só pegou uma casquinha de ovo. Há ainda uma granja inteira para se investigar em todos os setores da cultura. Em particular na área do livro, na qual a Lei Rouanet bancou e ainda banca iniciativas como a encerrada no fim de semana em Maricá, supostamente cultural. A última de uma série de promoções culturais em ano eleitoral para incensar candidatos da situação como protetores da cultura. Um preço muito caro para realizações medíocres em detrimento das verdadeiras necessidades de um município.

Círculo vicioso

Não estamos em condições de nos salvar a nós próprios, sobre isso não restam dúvidas. Falamos em democracia, mas ela é apenas a expressão política para um estado de espírito caracterizado pelo "Pode ser assim, mas também de outro modo". Vivemos na época do boletim de voto. Até votamos todos os anos no nosso ideal sexual, a rainha da beleza, e o fato de termos transformado a ciência no nosso ideal intelectual não significa mais do que pôr na mão dos chamados fatos um boletim de voto, para que eles escolham por nós. Este tempo é antifilosófico e cobarde: não tem coragem para decidir o que tem ou não tem valor, e a democracia, reduzida à sua expressão mais simples, significa: Fazer aquilo que acontece! Diga-se de passagem que é um dos mais desonestos círculos viciosos que alguma vez existiu na história da nossa raça. 
Robert Musil
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Educação de qualidade para todos?

Num livro publicado há poucos meses, Helping Children Succeed, Paul Tough observa, com tristeza, que o déficit de aprendizagem entre alunos de 8.º ano, provenientes de diferentes estratos de renda, vem crescendo nos Estados Unidos, ao invés de diminuir, a despeito dos esforços para mudar a situação. O país tem apresentado não apenas desempenho incompatível com seu grau de desenvolvimento, como tampouco conseguiu evitar que os mais pobres tenham um ensino ainda mais precário.

O mesmo pode ser dito em relação ao Brasil. Celebramos importantes avanços no Pisa de 2012, mas ainda estamos em posição inaceitável entre as 65 economias que participam desse teste internacional de qualidade da educação. Mais ainda, a despeito de sermos o país que mais avançou em Matemática, de 2003 para 2012, ainda temos 67,1% dos alunos com baixo desempenho na área. O tema de maior dificuldade para os alunos brasileiros, em que tivemos o menor desempenho, foi o de “formular situações matematicamente”, competência relevante para diversas profissões e áreas de pesquisa. Só 1,1% dos alunos apresentam desempenho elevado. Mas o que se mostra particularmente cruel para os que acreditam que educação é o caminho para gerar oportunidades para todos é a profunda desigualdade educacional do nosso país, tanto no acesso e na conclusão de cada etapa de escolaridade quanto no desempenho escolar ou na aprendizagem.

Estive recentemente em Xangai, cidade chinesa, com mais de 23 milhões de habitantes, que obteve o primeiro lugar entre as economias que participaram do Pisa. Fui lançar um estudo do Banco Mundial sobre as razões do excepcional desempenho da cidade. Em solução de problemas, por exemplo, Xangai ficou em 6.º lugar no Pisa 2012 entre 44 países ou sistemas regionais – o Brasil ficou na 38.ª posição. Embora conte com número importante de alunos em situação de pobreza, estudantes que se encontram entre os 10% mais pobres de Xangai são tão bons em Matemática quanto os 20% de adolescentes mais ricos do Reino Unido e dos Estados Unidos. Ou seja: Xangai não tem apenas o melhor desempenho em Matemática e um dos melhores em leitura e Ciências; é também um dos mais igualitários, apesar de contar com uma proporção elevada de migrantes internos.

O que fazem de excepcional para chegar lá? Os professores são preparados para uma profissão e o currículo na universidade enfatiza o conhecimento do conteúdo a ser ensinado e a prática em sala de aula, incluindo a didática específica daquela área. Além disso, a universidade reúne-se com os professores da escola para analisar, com eles, problemas de aprendizagem que lá tenham emergido e, juntos, constroem soluções possíveis com os recursos disponíveis. Outro ponto importante é que os professores têm seu tempo de atividades extraclasse dentro da escola (e não fora dela, como em muitas escolas brasileiras), corrigindo tarefas escolares e preparando planos de aula minuciosos, com base no currículo e em colaboração com os colegas. Observam, também, as aulas dos colegas e juntos discutem o que pode ser aperfeiçoado.

Não escrevo isso para que pensemos em copiar o modelo dessa megacidade chinesa, mas para que possamos perceber que é possível ter qualidade para todos. A escolaridade dos pais e a situação socioeconômica da família têm forte papel no desempenho escolar dos alunos. Afinal, interpretação de textos, por exemplo, depende muito do repertório cultural adquirido pelo aluno, e é sabido que importante parte dele vem da família. Mas a escola pode, deve e tem conseguido, em muitos casos, garantir o direito de aprender de crianças mesmo vindas de famílias de reduzida escolaridade ou situação socioeconômica adversa. Xangai ilustra isso, várias escolas no Brasil também o fazem, como mostra o interessante estudo da Fundação Lemann Excelência com Equidade – 250 escolas públicas com alunos de nível socioeconômico situado entre os 25% mais baixos da região onde estavam localizadas, e com pelo menos 70% dos alunos com nível adequado em Matemática e Língua Portuguesa na Prova Brasil e, no máximo, 5% de alunos no nível insuficiente, evidenciaram que é possível aliar qualidade e equidade. Duas delas estão localizadas no Rio de Janeiro, e tive a oportunidade de visitá-las. O que têm em comum? Metas claras e uma equipe de professores comprometidos com um ensino que assegure que todos aprendam.

Mas como garantir que o exemplo dessas escolas seja estendido às demais no Brasil que concentram crianças em situação de pobreza? As condições de sucesso escolar para alunos em situação de vulnerabilidade podem ser melhoradas, e muito, se houver uma política pública que assegure a atração e retenção de bons professores e lhes dê material de apoio adequado, conte com uma educação de qualidade e cuidados na primeira infância. Se investirmos mais em remunerar melhor o professor, alocá-los numa única escola, com tempo para ali, colaborativamente, preparar suas aulas e aprender com os colegas, ajudaria. Se tornarmos a formação inicial do professor mais adequada aos desafios da sala de aula, e não enfatizarmos apenas os fundamentos da educação, também ajudaria. Mas se pudermos, além disso, reduzir o impacto das condicionantes socioeconômicas no desempenho escolar do aluno, por meio de um investimento forte e focado em educação infantil de qualidade e cuidados na primeira infância, poderemos, aí, sim, combinar qualidade com equidade, como preconiza o Objetivo do Desenvolvimento Sustentável, recém-aprovado pela ONU, para a educação (ODS-4), a ser atingido até 2030: “Assegurar a educação inclusiva, equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos”.

Não é muito difícil garantir educação de qualidade para poucos, mas o princípio da equidade demanda que isso seja estendido a todos – daí o nosso grande desafio!

Claudia Costin

Às ruas, outra vez, cidadãos e cidadãs!

Muitos de vocês que estão sempre conectados às redes sociais já sabem: voltaremos às ruas! Daqui a um mês, para coincidir com a conclusão do processo de impeachment. Pois acompanho ano a ano a capacidade de mobilização da sociedade civil organizada e só tenho a afirmar que estamos indo bem melhor do que nossos governantes. Estaduais, locais ou federais, nossos políticos estão sempre a reboque dos milhões de cidadãos e cidadãs que têm ido às ruas nos últimos anos. Seja porque estão se deparando com a iminente falência geral do Estado, que eles mesmos promoveram, seja porque estão sempre ocupados em se defender do bombardeio das delações premiadas de ex-asseclas, o fato é que não governam. Tão simplesmente isto: não governam! E o país segue à deriva.

Voltaremos às ruas porque está claro que a Operação Lava Jato não é ainda uma conquista segura da cidadania política brasileira. Apesar de seu grande e inquestionável avanço e da quebra do paradigma da cultura de impunidade, ainda não a transformamos em sólidas instituições jurídico-políticas. A quadrilha de oligarcas e esquerdistas que tomou conta do Estado brasileiro vira e mexe ameaça cercear instituições como o Ministério Público, a Polícia Federal e a Justiça, sobretudo a de primeira instância, mais independente do jogo sujo dos atuais mandatários.


Mas estamos mobilizados e mobilizando. Já há dois meses está agendada para o dia 31 de julho uma nova megamanifestação de movimentos sociais organizados, entidades da sociedade civil, comunidades e grupos da internet, associações civis de profissionais, de amigos de bairro, de cidades e próprios do patrimônio público, além de pessoas físicas e jurídicas dedicadas a causas cívicas e políticas. E aqui o nosso segredo de polichinelo: não temos saído às ruas impulsivamente. Planejamos com antecedência, esquentamos os motores nas redes sociais e compartilhamos banners digitais do modelo “eu vou” para milhões de internautas curtidores.

Tenho acompanhado dezenas de redes de entidades e movimentos como a Rede Amarribo-IFC (composta de mais de 230 associações de amigos), a rede dos Observatórios Sociais (com 104 entidades filiadas), a Abracci (com 58 organizações), a Rede Cidades Sustentáveis (mais de 600 entidades), o VPR (mais de 1,3 milhão de seguidores), o MBL (mais de 150 núcleos e 1 milhão de seguidores), a Rede Raps (com mais de 450 líderes e empreendedores) e, mais recentemente, a Aliança Nacional dos Movimentos Democráticos (com 53 grupos integrantes). Sem considerar milhões de ativistas digitais esparsos, somente estas últimas redes têm a capacidade de mobilizar cerca de 5 milhões de cidadãos e cidadãs conectados por Facebook, Twitter e, mais recentemente, por WhatsApp, o que torna a comunicação e a interação muito mais ágeis e dinâmicas, verdadeiras ágoras modernas de participação, consulta e informação, formando cultura de cidadania e muitas vezes se antecipando aos furos da própria mídia profissional. Não que pretendam competir com a mídia de massa, uma vez que sempre estão postando links para os próprios conteúdos da grande mídia. Mas seguramente complementam o sistema investigativo do jornalismo profissional, não apenas focando na cobertura dos “escândalos em série” da delinquência política cotidiana, que frequentemente desestimula os cidadãos, mas conscientizando de que não há outra saída senão o engajamento político dos cidadãos. Isso tem resultado na quebra de nosso paradigma cultural, superando o alegado preconceito da alienação política de nosso povo com um surpreendente protagonismo político nunca antes suspeitado.

O grande problema do novo protagonismo político da cidadania, no entanto, é o voluntarismo dos movimentos, a aparente “desorganização” das iniciativas que, como tudo o que acontece espontaneamente na sociedade, inclusive a própria dinâmica do mercado, são regidas pelos diversos interesses de indivíduos e grupos, desprovidos de uma “ordem geral” preestabelecida, a exemplo das instituições construídas a partir de códigos de conduta. Esta ordem espontânea dos movimentos sociais, embora coesa na comunicação via redes sociais, acaba por gerar iniciativas muitas vezes desarticuladas, devido ao personalismo de algumas lideranças. Mas nem assim deixa de manifestar uma expressiva força política como resultado de uma supremacia de lideranças mais aglutinadoras em momentos decisivos.

Como estamos presenciando na Comissão Especial de Impeachment atitudes meramente procrastinatórias por parte da defesa da presidente afastada, já alcunhada de “bancada do holofote” ou “bancada da chupeta”, por tantas chicanas processuais para ganhar tempo de exibição na mídia e retardar os prazos, o efeito na sociedade passou a ser exatamente o contrário diante da célere derrocada dos indicadores econômicos e sociais. Daí o dia 31 de julho, aprazado pela maioria dos movimentos sociais para a mais ampla megamanifestação entre as já ocorridas, com o objetivo preciso de pressionar os senadores “indecisos” a honrar de uma vez por todas o mandato popular a eles conferido. Dia 31 de julho será o domingo imediatamente anterior ao 1º de agosto, prazo inicialmente previsto pelo calendário do relator para a votação definitiva do impeachment. E, se for atrasado o prazo, tanto pior para a classe política nacional. O número de presenças confirmadas nas redes sociais até a presente semana já alcança mais de 1 milhão, superior às megamanifestações de 2013 e 2015 à mesma data, inclusive a última, de 13 de março deste ano, que juntou 4 milhões de manifestantes em mais de 350 cidades brasileiras.

E se posso sugerir algo aos cidadãos e cidadãs brasileiras é que tomem o país como de fato seu. Não abandonem a vida pública a políticos inescrupulosos. Porque são eles que produzem o sucateamento dos serviços públicos, o que, por sua vez, interfere diretamente na qualidade de sua vida privada. A imagem anônimaque circula nas redes sociais sobre o que vem a ser a origem do poder da cidadania política vale tanto quanto um curso de educação política. Vale mais do que mil palavras. Não é preciso explicar que a correlação de forças depende justamente da aliança de cidadãos e seus coletivos.

Aliás, a Rede Aliança originou-se há cerca de um ano no bojo do movimento do Vem Pra Rua, com o objetivo de alinhar e potencializar os esforços de dezenas de grupos e movimentos democráticos atuando nas redes sociais e em mobilizações de rua, tendo como mote o combate à corrupção e à impunidade. A carta de princípios da Aliança foi assinada na assembleia geral de 28 de maio de 2015, em Brasília, e pode ser acessada aqui. Dos 42 grupos signatários, se destacavam os mais diversos: contra a corrupção, ambientalistas, de cunho cívico e patriótico, coletivos de ativismo digital e até mesmo de maçons e associações profissionais, provenientes de mais de 14 Estados brasileiros. Hoje, a Aliança conta com 55 grupos associados que você pode conhecer aqui, bem como as ideias e propostas de cada participante através de sua página oficial.

A Aliança funciona com coordenações de planejamento, mobilização, jurídica, integração com os movimentos e comunicação. A coordenadora executiva, Henriette Krutman, é responsável pela interface externa com os demais movimentos, como VPR, Avança, Acorda, NasRuas, com os quais são combinadas as ações conjuntas, via WhatsApp e Telegram. Veja também a participação dela no programa de Agentes de Cidadania de nosso Instituto.

Em cada cidade, os grupos da Aliança são estimulados a interagir com os demais, principalmente no alinhamento de ações de rua. Um exemplo deste protagonismo da cidadania política brasileira vem de Evandro Neto, um membro colaborador da Aliança, responsável pelo design dos posts e edição dos vídeos de toda a Rede. Ele tem 17 anos, cursa o último ano de Informática da Escola Técnica em Almenara, Minas Gerais, e mora em Felisburgo, cidade com 6 mil habitantes no Vale do Jequitinhonha. Ele se ofereceu como voluntário a partir de uma “chamada” feita na página da Aliança pedindo colaboradores voluntários em design.

E você? Não se anima em tomar o Brasil como seu de fato? Participe. Dia 31 de julho está aí!

'Disque 100" ganha R$ 2,2 milhões em novos serviços

Nas compras do mês de junho, a Presidência da República fez um empenho de “reforço” de R$ 2,2 milhões para a extinta Secretaria Nacional de Promoção de Defesa de Direitos Humanos (SEDH). O objetivo é garantir os serviços de “teleatendimento humano generalista”, ou seja, o “Disque 100 Direitos Hsumanos”. A compra refere-se à comunicação de dados – rastreamento, monitoramento e encaminhamento de denúncias -, seleção e treinamento de pessoal de apoio administrativo e capacitação continuada.

Os recursos são oriundos do orçamento do também extinto Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos para atender o exercício de 2016.

As compras do Disque 100 foram empenhadas para a Call Tecnologia e Serviços Ltda., uma empresa que começou com apenas dois clientes em 2002, na cidade do Guará, no Distrito Federal, mas que se expandiu e conta, hoje, segundo sua timeline, com fábrica própria de software, em São Paulo.

Festas juninas dos deputados custam R$ 20 milhões aos brasileiros

Entre os dias 20 de junho e 1º de julho, os contribuintes brasileiros gastarão cerca de 20 milhões de reais para ver os deputados federais que os representam tirarem dias extras de folga durante o período de festas juninas em um ano de crise econômica e política. Na semana passada, por determinação de Waldir Maranhão (PP-MA), o controverso presidente interino da Câmara dos Deputados, a Casa ficou parada durante três dos cinco dias úteis, a justificativa era o feriado de São João, no dia 24 de junho. Nesta, o recesso branco durará quatro dias e o santo homenageado é São Pedro, em 29 de junho. A única data em que está prevista a realização de uma sessão em que pode haver votações é nesta terça-feira, ainda assim, a expectativa é que não haja quórum mínimo para deliberações, que é a metade dos 513 deputados.


O cálculo do custo dos parlamentares aqui citado é baseado no valor diário que eles representam aos cofres públicos: 2,87 milhões de reais. A conta é feita sobre salários além dos gastos com auxílio moradia, verba de gabinete, alimentação, transporte, aluguel de veículo e imóveis, além de verbas com a divulgação do mandato. Ele não inclui, por exemplo, o valor da manutenção e funcionamento dos prédios da Câmara nem o quanto é pago para os servidores concursados ou terceirizados.

Em nota divulgada pela sua assessoria de imprensa, Maranhão informou que a paralisação se deve aos “festejos juninos, durante os quais há grande mobilização popular, especialmente na região Nordeste do país”. Nesses dias, as comissões continuarão funcionando, mas possivelmente estarão esvaziadas. O detalhe é que, em menos de um mês, está prevista outra folga geral na Câmara, que é o recesso parlamentar oficial entre os dias 18 e 31 de julho. A decisão dele também leva em conta o período de campanha eleitoral que se aproxima. Em agosto, começará o prazo em que os concorrentes às prefeituras e às Câmara de Vereadores iniciam a divulgação de suas candidaturas. Deputados federais estão entre os principais concorrentes a prefeitos de diversos municípios.

DEPUTADOS CUSTAM 1 BILHÃO DE REAIS AO ANO

Um levantamento feito pelo site Congresso em Foco mostra que os deputados custam ao ano cerca de 1 bilhão de reais aos cofres públicos. Os principais gastos são com salário, de 33.763 reais, e verba de gabinete, de 92.000 reais ao mês.
BenefícioMédia mensalPor ano
SalárioR$ 33.763,00R$ 438.919,00
Ajuda de custoR$ 1.406,79R$ 16.881,50
Transporte, alimentação, alugueis e outrosR$ 39.884,31R$ 478.611,67
Auxílio-moradiaR$ 1.608,34R$ 19.300,16
Verba de gabinete para até 25 funcionáriosR$ 92.000R$ 1.104.000,00
Total de um deputadoR$ 168.662,44R$ 2.023.949,28
Total dos 513 deputadosR$ 86.523.831,72R$ 1.038.285.980,64
Fonte: Congresso em Foco