sexta-feira, 30 de setembro de 2016

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Rotatividade delituosa

O titular é a pessoa que avalia e monitora atos presidenciais – aqui incluído o exame prévio da constitucionalidade de cada um deles –, acompanha a execução de ações governamentais da Presidência e demais ministérios, supervisiona o andamento das propostas do Executivo no Congresso, passa o pente-fino em cada palavra a ser publicada no Diário Oficial, analisa o mérito dos projetos, fiscaliza o andamento das propostas, faz a interface com o Parlamento, toca, enfim, a República.

Explicito isso para que o prezado leitor e a cara leitora tenham a exata noção do que significa o posto ocupado nos governos dos variados partidos e do PT por nove titulares. Daí talvez lhes facilitem a compreensão sobre a gravidade de cinco deles serem acusados, condenados ou investigados por corrupção.

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O primeiro e mais poderoso, José Dirceu, cumpriu pena em decorrência do processo do mensalão e foi preso outra vez por decisão do juiz responsável pelo caso do petrolão. Certamente sofrerá novas condenações. Dirceu é aquele cujo braço direito nos primórdios do governo de Luiz Inácio da Silva, Waldomiro Diniz, foi pego pela exibição de um vídeo em que tentava extorquir o bicheiro, dito empresário, Carlos Cachoeira.

Um tempo risonho. Franco e de alguma forma até ingênuo a julgar o que viria depois. Dirceu sucumbiu ao escrutínio do Supremo Tribunal Federal e antes sofreu a cassação do mandato na Câmara numa situação muito semelhante à de Eduardo Cunha, sendo um todo-poderoso que não resistiu aos fatos. Isso numa época em que a votação para esses casos era secreta.

Deu-se um trauma no governo Lula que, para superá-lo, nomeou Dilma Rousseff, a ministra de Minas e Energia de então, para o posto. Já na ideia de construção da candidatura de uma “mulher honesta” que viria a parecer tudo menos honesta. Elegeu-se presidente e no mandato subsequente sofreu o segundo impeachment em menos de 25 anos da história brasileira.

Em seguida a Dilma, ocupou a Casa Civil Erenice Guerra, até então o chamado braço direito dela. Não durou no cargo, do qual precisou abrir mão quando das evidências de prática de influência dela e da família no governo. Erenice hoje está na mira de Curitiba.

Por breve período de dois meses durante a campanha eleitoral de 2010, Carlos Eduardo Esteves foi o chefe da Casa Civil enquanto Dilma cuidava da própria campanha da qual, uma vez eleita, nomeou Antonio Palocci para a Casa Civil. Isso a despeito de o personagem já ter tido várias denúncias, dentre as quais as do recebimento de propinas por causa de um repentino aumento de patrimônio e de ter, por isso, perdido o cargo de ministro da Fazenda.

Hoje Palocci está preso, sob a acusação de extorquir R$ 128 milhões da empreiteira Odebrecht. Sua sucessora, Gleisi Hoffmann, encontra-se nas malhas da Lava Jato por obra do caixa 2 da Petrobrás do qual, segundo os investigadores, teria recebido R$ 1 milhão resultante de propinas acertadas por ocasião de contratos firmados pelo governo com a Petrobrás.

Depois de Gleisi foram nomeados Aloizio Mercadante, Jaques Wagner e Eva Chiavon (militante do MST), descontada a fracassada tentativa de acolitar Lula na Casa Civil para protegê-lo da ação do juiz Sérgio Moro. Não se protegeu nem impediu abertura de procedimento por obstrução de Justiça.

De onde é de se concluir que a Casa Civil foi tratada nos anos do PT no poder como a casa da mãe Joana.

O ex-futuro presidente ideal

Do início do governo Lula até o mensalão, me tornei um grande admirador de Antonio Palocci, imaginava que ele poderia suceder Lula em 2006, estava disposto não só a votar como a fazer campanha para ele. Em contraste com a grossura e a bravataria de Lula, ele era sóbrio e eficiente, de uma discreta simpatia interiorana, habilíssimo em negociações políticas e na condução da economia, um moderado moderno, inteligente e competente, com prestígio politico, experiência administrativa e credibilidade com o empresariado e com todos os partidos. O presidente ideal, que muita gente, até quem não gostava do PT, sonhava. Uma espécie de síntese dialética de Lula e FHC.

Palocci falava, e pensava, com clareza e precisão desconhecidas por Dilma, apesar da língua presa, que não impediu Lula de ser presidente e Cazuza um popstar. É melhor que língua solta e rabo preso.


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Como leitor de romances, fiquei fascinado com o escândalo da “casa dos prazeres” da turma de Ribeirão Preto, regado a garotas bonitas e bons negócios, mas, como eleitor, fiquei arrasado quando Palocci caiu. Não porque estava roubando, fraudando licitações ou arrecadando dinheiro para o partido, pensava-se, caiu por medo da mulher, do que teria que dizer em casa, “pela família”. E perdeu a chance de ser candidato a presidente, com apoio até de parte da oposição.

Para piorar, foi vítima da delação de seu aliado Rogério Buratti, a quem havia recomendado entusiasticamente uma das garotas da casa. Buratti gostou tanto que se apaixonou e rompeu um casamento de 20 anos para se casar com ela. E ficou com ódio eterno de Palocci ...rsrs.

Estava liquidado. Mas não, ele foi decisivo para a eleição de Dilma, ganhou poder e autoridade, e era uma esperança de competência e sensatez na Casa Civil. Poderia ter minimizado os desatinos de Dilma e talvez impedido a grande gastança e a contabilidade criativa. E se credenciado para sucedê-la.

Mas não, preferiu faturar 20 milhões de reais com consultorias duvidosas. Trocou, duas vezes, por dinheiro e por mulheres, a chance de mudar a História do Brasil. E acabou preso. Que história !

Nelson Motta

Imagem do Dia

Frauenkirche, em Dresden (Mirko Seidel)

O padrão político do PT

A decisão unânime da 2.ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) de aceitar a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) e seu marido, o ex-ministro dos governos petistas Paulo Bernardo, por corrupção e lavagem de dinheiro, reflete uma realidade que se enquadra no “contexto de corrupção sistêmica dentro da Petrobrás”, de acordo com entendimento do ministro-relator Teori Zavascki. Essa realidade, que o acúmulo de evidências torna irrefutável, na verdade extrapola o âmbito da Petrobrás e se estende a todo o aparato governamental da era lulopetista. Reflete o método político pelo qual Lula e seu PT optaram, na desastrada tentativa de consolidar um projeto de poder populista.

Chamado a prestar contas à Justiça, o casal de militantes petistas – ela senadora, com passagem pela chefia da Casa Civil de Dilma; ele quadro partidário de primeira linha do lulopetismo, ministro do Planejamento (2005 a 2011) e das Comunicações (2011 a 2015) – surge como símbolo da impostura de um partido político que chegou ao poder prometendo impor padrões morais rígidos à gestão da coisa pública e de ser um defensor intransigente das classes menos favorecidas, provedor infalível e generoso de suas necessidades materiais.

Um fenômeno relevante nos 36 anos de existência do PT ajuda a entender os desvios da trajetória político-programática estabelecida na fundação do partido. Numa primeira etapa, intelectuais e líderes religiosos que haviam ajudado a fundar o partido e a consolidar suas primeiras conquistas foram praticamente expulsos de suas fileiras pela ala sindical, mais rude e direta. Em seguida, após se ter transformado em partido eleitoralmente competitivo e depois de ter conquistado o Planalto, o PT passou a sofrer defecções importantes no seu quadro de lideranças, motivadas pela decepção com os novos caminhos que estavam sendo trilhados sob o comando de Lula e José Dirceu. A liderança remanescente acomodou-se sem maiores problemas em conveniente tolerância à adesão de Lula às práticas políticas de seus novos aliados, que no passado condenara com veemência. Essa gente sempre soube que corrupção é crime. Apenas passou a admitir que é impossível governar sem concessões a ela.

Os resultados da “luta em benefício das causas populares” foram a gastança descontrolada dos recursos públicos, a “nova matriz econômica” que resultou na recessão econômica, no estouro da inflação – que afeta principalmente os mais pobres – e nos mais de 12 milhões de desempregados em todo o País.

O casal Gleisi e Paulo Bernardo simboliza quase à perfeição o substrato do lulopetismo, que tem como uma de suas características mais marcantes a hipocrisia. A senadora, que como dirigente da cúpula partidária e ex-chefe da Casa Civil convivia necessariamente com a corrupção generalizada no governo, teve a ousadia de proclamar, no plenário do Senado, que ali ninguém tinha “autoridade moral” para julgar Dilma Rousseff. E, ao saber que se tornara ré no STF, afirmar que, finalmente, poderia contar a seu favor com o “benefício da dúvida” que lhe teria sido negado na fase de investigação da Lava Jato.

O ex-ministro do Planejamento, por sua vez, fez mais. Estava à frente da pasta quando o “governo popular” implantou a cobrança de uma taxa debitada compulsoriamente na conta de todos os aposentados beneficiários de crédito consignado. Um golpe que possibilitou a arrecadação de R$ 100 milhões que teriam sido destinados aos cofres do PT, descontada a milionária comissão que teria sido embolsada. A investigação relativa a esse golpe, por conta do qual Paulo Bernardo passou alguns dias encarcerado em junho último, não é a mesma que agora leva o STF a transformá-lo em réu. Essa é relativa à acusação de que ele teria recebido dinheiro do esquema do petrolão para abastecer a candidatura de sua cara metade ao Senado, em 2010.

Em seu relatório a favor do recebimento da denúncia, o ministro Zavascki destacou que se sentia à vontade para acolher o pedido da PGR porque evidências contidas no processo vão “muito além das declarações prestadas em colaboração premiada”. Poderia ter dito, em outras palavras, que o jeito petista de fazer política é reconhecível à primeira vista.

Livrai-nos do mal

Estamos às vésperas de mais uma carnavalesca "festa da democracia" assim denominada pelos maus intencionados. Ninguém vai, por obrigação, à festa a que não foi convidado muito menos a um convescote de pilantras conhecidos, sem ética desde criancinha.

As eleições, no Brasil, continuam a ser uma dádiva democrática dos políticos. A festança é deles, não do eleitor, ainda mero coadjuvante de presença obrigatória na peça marqueteira.

O Brasil democrático de hoje atua debaixo dos panos quando se trata de política e governança. O cidadão, traído a cada dia pelas falcatruas "legais", é o último a saber e o primeiro a quem se cobra a conta.

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A democracia da carochinha, praticada nas últimas décadas, se converteu em regra, quando deveria ser exceção. Candidatos, que na verdade só abrem a boca para dizer besteiras, divulgam a cantilena de defender o povo. Mentira manjadíssima, pois estão concorrendo para defender interesses próprios e dos camaradas. Se realmente cumprissem promessa, as cidades não estariam neste miserê nem edis e vereadores viveriam na bonança.

Nas cidades médias e pequenas, prolifera ainda o pós-voto de cabresto, ligado ao assistencialismo, às promessas de água, esgoto e asfalto, como se não fosse obrigação, mas dádiva, sem contar as melhorias na educação e saúde que ficam na propaganda eleitoral.

Os tempos são para pensar seriamente numa reforma política que privilegie o eleitor, o mais importante ator da democracia e não mero financiador deste Circo Brasil sem transparência e Justiça eleitoral andando de carona em carro de boi.

O fim da obrigatoriedade do voto, a extinção do Fundo Partidário, no qual todo mundo contribui para todos os partidores viverem à fartura, um basta às famigeradas coligações servirão para dar mais poder ao eleitor e a restrição da boquinha comissionada - compra de votos legalizada - são outras medidas para tirar o osso da cachorrada.

Há que se exigir urgentemente uma reforma para evitar que já em 2018 o eleitor não seja ainda uma peça no jogo dos poderosos. Os políticos, perdão, canalhas do Brasil devem ser postos no devido lugar de verdadeiros eleitos para servir ao povo, não dele se servirem. Se há mau eleitor, cretino como seu candidato, é porque foi amestrado e traz de berço o DNA da síndrome de Gerson (coisa que uma boa injetada de ética não cure). Uma faxina na legislação vai dar uma boa desratização e só continuará a ser exceção o bandido de raiz.

Quanto a domingo, comecemos a rezar para que as urnas despejem nas prefeituras e câmaras municipais menos calhordas e cretinos.

"Não nos deixeis cair em tentação e livrai-nos do mal"
Luiz Gadelha

Onde foi que erramos? Onde nos perdemos?

Não quero mais escrever nada. Ficar no lero-lero que nada constrói, nada conserta. E então faço o quê? Chutar pedrinhas na rua já não dá, é tarde pra isso, vou é cair, escorregar, levar um tombo. Saudade, Deus meu, de quando dava seis horas da tarde e logo após essa hora da ave-maria, que alguém no rádio rezava (Júlio Louzada?) com grande audiência, e eu podia ouvir Jerônimo, o Herói do Sertão.

O rádio era muito acompanhante e os programas, mais ingênuos, de riso quase bobo.

Muita saudade do meu pai, da minha mãe que ouvia as novelas do Cashmere Bouquet andando de um lado pro outro. Ela não sentava, acho que se afligia, não sei bem.

Éramos uma família em paz. Lá fora também havia paz. Onde foi que erramos? Onde nos perdemos? O que será da nova geração que vem por aí? Que tropeços ela precisará enfrentar, lutar para ultrapassar?

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Eu era feliz sem computador, sem celular. A TV começou a distrair a família do aconchego, dos causos que ouvíamos em comunhão com o passado paterno. Éramos um grupo. Éramos uma família.

Minha mãe fazia questão da ‘hora da mesa’, quando não se podia falar qualquer coisa sem ouvir ‘ó , é hora da mesa’.

Quero meu passado de volta, a paz que ele me trazia e hoje não encontro em nenhuma modernidade.

Quero de volta o seo Lucas, o ‘expressinho’ da injeção em seringas de vidro, que vinha em casa e ainda aplicava o remédio na bunda.

Quero de volta os armazéns do seo Carlos, do seo Bastos, na esquina, onde Aurélio, irmão da Quina, tirava as beiradas do bacalhau cru. Onde eu via vizinhos que faziam compras no caderno para acertar no pagamento.

Quero de volta dona Amelinha e a filha dela, Tereza com Z, professoras que davam aula de reforço na grande varanda da casa, em volta de uma mesa comprida com bancos inteiriços. E eu quis porque quis, mesmo sem precisar, fazer como outras meninas faziam: comparecer a essas aulas.

Minha mãe sorriu da minha vontade. E por um período lá estava eu em volta da grande mesa.
Lembro de uma coisa que errei. Dona Amelinha me pediu para fazer uma frase com a palavra cartaz. Errei porque escrevi: “Sonia tem um grande cartaz”. Era sobrinha da dona Sílvia e seo Olavo, uma menina bonita de olhos verdes e muito espevitada pra época.

Esse seo Olavo foi o mesmo vizinho que me olhou com os olhos cheios d’água ao me ver inteira na delegacia, após eu ligar pra casa e avisar minha mãe que o ônibus havia batido no carro do meu pai quando eu voltava da escola em que trabalhava.

Quero minha vida de volta, a paz daqueles dias em família, o sossego nas ruas.

Devolvo tudo: o computador, o smartphone, a TV de led de não sei quantas polegadas, os cartões de banco que facilitam minha vida em não sei quantas agências no mesmo bairro.

Quero que confiram minha assinatura no livro de capa preta do Banco Mineiro da Produção, onde meu pai tinha conta. Quero de volta o bonde que me levava à escola, ainda que meu pai usasse o carro.

Quero as empregadas amigas que atravessaram gerações em perfeita comunhão conosco. Como a Ana, babá do meu avô ‘nhô’ Chico; Samaria e o filho Joaquim, que subiu na mangueira pra pegar meu irmão lá em cima porque ele não sabia descer; quero Geralda, filha da Samaria, quero a Margarida, que se casou com o Fernando, que pintava a nossa casa. Maria Pretinha ainda está com Tia Zilda e as filhas, com direito a tudo: do plano de saúde ao amor incondicional da família que ajudou a criar e que é dela também.

E que bem lá atrás tomava conta de mim no quarto do vovô e vovó e me perguntava quem eu preferia: a Marlene ou Emilinha?

Pra onde foi tudo isso? Pra onde foi essa felicidade que não volta mais? Não está nos cinemas, não está nos teatros nem nas ruas e em nenhuma viagem. Está no passado. E o passado passou. Envelheceu comigo.

Piano Brasileiro

Juventude transviada e o custo do atraso

Há no momento uma grande necessidade de comunicação entre profissionais da área de ciências sociais e a população em geral, sobre as medidas discutidas de ajuste fiscal. A comunicação é dificultada pelo fato de se tratarem de medidas impopulares. Um caminho possível é deixar claro que são medidas amargas de fato, mas inequivocamente mais amargas se tomadas amanhã, ao invés de hoje. O mote da argumentação pode ser o custo do atraso no ajuste.

O risco que se corre não é de uma fila de aposentados ou funcionários públicos federais sem receber seus proventos em dia. Isto pode ocorrer com um estado, como no Rio. Mas é difícil de imaginar quando há recurso implícito à emissão monetária.

Mesmo no caso limite no qual o endividamento público adicional se torna impossível por falta de credores adicionais, a história de vários países mostra que as forças políticas acabam por levar o Banco Central a emitir moeda para pagamento das contas públicas federais.

O Brasil não corre assim, como se tem dito, o risco de se transformar em um grande Estado falido. Mas sim o risco de retroceder 25 anos, transformando-se de novo em um país com uma inflação demasiadamente alta.

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Como no filme “Juventude transviada”, de 1955, a situação de hoje guarda correlação com aquela dos dois carros que correm lado a lado em direção a um precipício. Neste conhecido jogo, quem salta por último e mais perto do precipício ganha a disputa. O problema é que mostrar-se mais corajoso do que o colega ao volante do outro carro implica altíssimo risco.

De um lado, tem-se o carro da política fiscal, reagindo às forças políticas com o pé no fundo do acelerador das despesas. Do outro lado, o carro da política monetária, este com o pé no fundo de outro acelerador, o dos juros. Reagindo à política fiscal expansionista e tentando controlar a inflação. À frente de ambos, o precipício do desemprego, já beirando 13 milhões de trabalhadores. E a ameaça de uma situação ainda pior, que pode rapidamente fugir ao controle.

Se o carro da política fiscal parar primeiro, o motorista da política monetária pode frear o seu carro logo adiante, evitando o desastre que ocorre no filme. Baixa os juros. Por outro lado, se o carro da política fiscal seguir firme em frente, sem dar ao carro da monetária a sensação de que vai parar, o motorista da monetária não tem opção senão se jogar do carro antes do precipício, a exemplo do que faz James Dean no filme.

Isto significa que o motorista da monetária perdeu o jogo. Daí para a frente, seu carro segue desgovernado emitindo moeda para pagar a todos os credores do governo. É o cenário ao qual os cinéfilos de plantão dão o nome de “dominância do carro fiscal”. A inflação se eleva rápida e fortemente e passa a equilibrar as contas públicas taxando majoritariamente os mais pobres.

James Dean à parte, qual o custo do atraso? Tendo-se como ponto de partida uma dívida do governo geral da ordem de 68,5% do PIB ao final de junho de 2016, um cenário possível, se continuarmos postergando o ajuste fiscal, indica algo em torno de R$ 23 bilhões adicionais apenas de pagamento de juros um ano depois. Somem-se a este montante as oportunidades e os investimentos continuamente perdidos em função da incerteza. Bem como a perda da arrecadação fiscal daí decorrente.

Ou seja, ajustar as contas custa cada vez mais caro. O custo do atraso transforma o país, dia a dia, em paraíso para o rentista e inferno para o trabalhador.

Rubens Penha Cysne

Desinteresse e irritação

Vem se aproximando perigosamente do dia da eleição dois fatores que as pesquisas eleitorais não consideram, pelo contrário, fogem deles como o diabo da cruz: o desinteresse e a irritação. Os candidatos, os partidos políticos, a justiça eleitoral e até a mídia omitem e abominam esses dois sentimentos que acompanharão boa parte do eleitorado e demonstrarão a pouca importância que o cidadão comum vem dando ao processo político.

Vamos aguardar os resultados, mas há quem preveja boa parte do eleitorado deixando de comparecer às urnas, por desinteresse amplo, geral e irrestrito.

Outros que não comparecem ou que votam por obrigação estarão com raiva de tudo o que os candidatos representam. A irritação diante daqueles que mentiram a mais não poder durante as campanhas torna-se evidente em qualquer conversa. “Votar nesses bandidos que nos exploram, para quê?”
Os acontecimentos recentes, do mensalão ao petrolão, da Operação Lava Jato ao juiz Sérgio Moro, deixaram o eleitor com raiva da política e dos políticos. “Para que votar se eles vão roubar?”


Essas previsões dependem de comprovação, porque milagres às vezes acontecem. Pode ser que a maioria do eleitorado decida cumprir o seu dever, assim como existirá, entre os candidatos a prefeito e a vereador, um grupo de gente honesta e capaz de trabalhar pelo povo. Mas é bom não apostar, porque o desinteresse e a irritação batem à porta, faltam só 48 horas.

Houve tempo em que as eleições não eram informatizadas e tínhamos de votar colocando no envelope um papelzinho com o nome do candidato. Era grande o número de eleitores que rabiscavam ofensas e até palavrões em vez do nome do candidato, ou até preferencialmente deixando os dois. A justiça eleitoral proibiu a divulgação daquelas opiniões, e agora ficou impossível exprimir nossa irritação num teclado de computador. Mas a raiva permanece a mesma.

Em suma, vale aguardar a noite de domingo, quando já se conhecerão os prefeitos recém-eleitos, com possibilidade de segundo turno nas cidades com mais de 200 mil eleitores. O desinteresse poderá ser expresso pela ausência, a abstenção e o voto em branco. A irritação, porém, seguirá com o eleitor.

A vergonhosa doutrinação nas escolas

Há dois dias circula nas redes sociais um vídeo com a fala de um professor doutrinador. O vídeo foi publicado por uma estudante e reforça o debate em torno da doutrinação em sala de aula que, apesar de cansativo, é profundamente necessário, dado que existem sujeitos mentindo sobre sua existência. Tal como escrevi em um texto anterior, só os doutrinadores negam a doutrinação e aqueles que de fato não enxergam são os mais aguerridos.

Segue a transcrição do que o professor diz:
“Da mesma maneira que aconteceu em 37, a classe trabalhadora, no caso, vocês, né, estão completamente alijados e alienados do que aconteceu. Apenas a classe média, branca, é quem foi à rua vestido de camisa do Brasil querendo que o governo fosse deposto. Mas é porque a classe média que foi à rua, galera, tava insatisfeita com o fato de pobre tá pegando avião no aeroporto […] com o fato de ter mais negro e gente de periferia dentro de universidade. Gente da origem de vocês. A classe média que foi à rua […] tava insatisfeita porque pobre tava financiando carro. Infelizmente, como a gente tem uma sociedade de analfabetos políticos, as pessoas não se deram conta disso[…] devidamente manipuladas pela Globo.”

Que discurso clichê! É precisamente a pregação da esquerda que quer injetar ódio classista nas mentes dos alunos. Antes que um “pedagogo freireano” venha dizer que os estudantes não são recipientes vazios que devam ser preenchidos, respondo: eu sei! Todavia, negar a influência dos professores na formação dos estudantes, para o bem ou para o mal, é pura falsidade e dissimulação de quem pretende doutriná-los.

Mas analisemos mais pormenorizadamente a fala do professor militante.Ele diz que somente a classe média branca foi às ruas pedir o Impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e que seus alunos pertencem à classe trabalhadora que está alienada do que realmente acontece. Assim, se levarmos em consideração que a aluna, que não é branca e que, para o professor, faz parte da “classe trabalhadora alienada”, está filmando e ri do que ouve, ela deve ter ido às ruas ou apoiado as manifestações. Logo, o argumento dele é falacioso.

Além disso, ele alega que a classe média estaria insatisfeita com o fato de “pobre tá pegando avião no aeroporto”, “de ter mais negro e gente de periferia dentro de universidade” e “financiando carro”. Diz também que essa gente é “da origem de vocês”, isto é, dos estudantes. Portanto, se pessoas da “origem deles” são aquelas “odiadas” pela classe média, os alunos devem ser contrários a ela e odiá-la. Isto nada mais é do que a preparação do terreno para o cultivo da mentalidade esquerdista.

Por fim, o doutrinador diz: “Infelizmente, como a gente tem uma sociedade de analfabetos políticos, as pessoas não se deram conta disso […] devidamente manipuladas pela Globo.” Novamente um clichê de causar espanto. Primeiro que ele, como todo militante esquerdista, acredita que todos aqueles que não concordam com a esquerda são “analfabetos políticos”, menos eles e sua classe de bolcheviques modernos e covardes. Esse pessoal sempre se julga clarividente e capaz de mudar o mundo a partir de suas teorias e frases de efeito. Por último, outro chavão da militância: falar mal da Globo.

Todos sabem que insultar esta emissora, falar mal dos Estados Unidos e do capitalismo é lugar-comum do catecismo marxista. Aliás, pergunte ao professor doutrinador do vídeo o que ele pensa sobre o projeto Escola Sem Partido. Já sabemos a resposta. Não seria nenhuma novidade.

Em suma, o que é isso tudo senão uma pregação da luta de classes? É sempre a mesma coisa, o mesmo mantra esquerdista repetido para fins de lavagem cerebral e criação de autômatos. Felizmente isso tem mudado e, diferentemente do que o professor doutrinador acredita, negros e moradores de periferia também raciocinam e sabem quando estão perante um demagogo barato.

Caminhemos, pois!

Razão de viver...o belo ao chão!:
Uma caminhada de manhã cedo é uma bênção para todo o dia
Henry David Thoreau

Incontinência verbal

Foi o romancista, dramaturgo e político inglês Edward Bulwer-Lytton (1803/1873) quem cunhou a frase que, para mim, mais reconhece o valor da palavra: "a pena é mais poderosa do que a espada".

Se você, Leitor, considerar que mais importante do que o que se fala é o que se ouve, tenho certeza que verá cristalinamente o valor da palavra. E a delicadeza com que essa ferramenta mais forte que a espada deve ser utilizada.

Sei que a Liberdade de Expressão é o mantra sagrado de nossos dias. Mas será que ela deve ser absoluta, essa sacrossanta liberdade, ou seria melhor que fosse equilibrada e muito bem pensada antes de ser utilizada?


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O Leitor leu sobre uma palestra que a professora de filosofia Marilena Chauí deu no Colégio Oswald de Andrade, na segunda-feira 26 de setembro, a alunos de 13 a 18 anos, sobre o tema “A Fragilidade da Democracia”? Em seu palavrório, a professora declarou que “a família é uma invenção do final do século XVIII e princípio do século XIX”. Achou pouco: disse também que os pais são déspotas e que quem defende a família é uma “besta”.

Tendo a concordar, já que as “bestas” pagam a esse colégio mensalidades bem salgadas para seus filhos ouvirem pessoas tipo a Chauí que já declarara, em tempos idos, que “a classe média é uma abominação política, porque é fascista, é uma abominação ética porque é violenta, e é uma abominação cognitiva porque é ignorante”. Não sei a que classe dona Marilena pertence, sei que ela se veste e decora sua casa exatamente como um membro da classe média alta brasileira (Revista Cult).

Os políticos também andam abusando do direito de falar sem pensar e matraquear tal papagaios. Ouvir certos candidatos a prefeito é doloroso. É verdade que depois de falar sem pensar, eles pedem perdão pelo que disseram. Esquecem que “perdão” não é borracha!

Exemplo? Um candidato a prefeito de Curitiba, Rafael Greca, disse “A primeira vez que eu coloquei um pobre dentro do meu carro, vomitei por causa do cheiro”.

Aqui no Rio tivemos um momento inacreditável de grosseria no debate entre os candidatos a prefeito. Alessandro Molon e Flávio Bolsonaro trocaram opiniões conflitantes, natural nesses debates, e o candidato Bolsonaro não soube responder à altura. O que fez o pai do candidato, que estava na plateia? No primeiro intervalo usou seu 'magnífico' direito à Liberdade de Expressão para dizer o seguinte ao concorrente do filho: “Você é um merda, um bosta, cuzão. Não bato em você porque se apaixona (sic) por mim".

Mas tem mais e que vem mais do alto: o ministro do STF, Ricardo Levandovski, que todos vimos cuidar do andamento do processo de impeachment da ex-presidente, numa palestra na USP, no dia 28 de setembro, qualificou o processo como um tropeço na democracia: “A cada 25, 30 anos temos um tropeço na nossa democracia. Lamentável, quem sabe vocês jovens conseguem mudar o rumo da história”. Já vi o impeachment ser chamado de muitas coisas, mas de tropeço? Essa foi nova.

A incontinência verbal, doença aparentemente incurável, não grassa só aqui. Nos EUA há um contaminado em alto grau: Donald Trump. Sujeito estranho, muito estranho, dos cabelos aos gestos que, aos 70 anos, está no terceiro casamento, sabe-se lá por quais motivos, mas que se deu ao direito de fazer um comentário machista e burro a respeito da vida do casal Clinton: “Se Hillary não consegue satisfazer seu marido, o que faz pensar que conseguiria satisfazer a América?”.

Trump usa as palavras não para construir alguma coisa, mas para destruir tudo que não seja uma Trump Tower, dinheiro que ele se gaba de saber empilhar. Dos negros diz que são preguiçosos por natureza. E que odeia ver negros contando seu dinheiro. Para essa ‘nobilíssima’ função, Donald diz que só gosta daqueles homens de baixa estatura com um solidéu na cabeça!

Quando será que descobrirão uma vacina?

O silêncio lusitano

Tão em moda no inicio deste ano, arrefeceram-se por aqui as notícias do golpe, depois do impeachment da Dilma. Noticia-se mais hoje a prisão do staff de Lula – Palocci e Mantega –, estampada nos principais jornais daqui. Nota-se, entre os portugueses, um certo espanto com as notícias e já se percebe uma percepção deles com o que aconteceu no Brasil no governo do PT. Existe, porém, um certo ceticismo em relação ao Temer, uma ligeira desconfiança do que será o seu governo e o que ele vai produzir daqui para frente para tirar o país do caos econômico, atrair investimentos estrangeiros e colocar o Brasil nos trilhos novamente depois da terra arrasada petista.

Quando estive aqui em maio deste ano, discutia-se com fervor a legalidade ou não do impeachment da Dilma. Os portugueses mostravam-se influenciados pelo que liam e viam na televisão produzido por seus correspondentes no Brasil. Depois do impeachment, compreende-se melhor a legalidade constitucional do ato, chancelado pelo presidente do STF, e é evidente o desencanto de muitos com o PT depois da notícia da denúncia de Lula pelos crimes de corrupção e da prisão de seus dois ex-ministros da Fazenda, coisa até então inimaginável para o povo português.

A imprensa lusitana já não trata com tanto destaque a prisão dos petistas no Brasil. Acostumou-se ao noticiário da Lava Jato, as delações premiadas dos empresários e políticos e os escândalos de corrupção que se alastraram pelas empresas públicas com a partipação dos ex-ministro da Dilma e do próprio ex-presidente Lula. A Dilma, algumas vezes, tem sido contemplada com notas de rodapés dos jornais, nada mais do que isso. Sua versão de que fora arrastada do poder por um golpe de estado esvaziou-se. Aqui, como no Brasil, ela está indo para a história como uma presidente tonta e desequilibrada, que desgovernou o país atabalhoadamente durante os seis anos.

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Como era de se esperar, a estrela entre os portugueses é o juiz Sérgio Moro. Para alguns jornalistas e políticos, o magistrado conseguiu inibir a corrupção no Brasil e mostrou, com ousadia, que a elite, que tanto beneficiou o PT com dinheiro roubado, também está sendo punida. Acreditam que o Lula não escapa das garras da justiça porque seus ex-ministros da Fazenda, pressionados pelas investigações que os apontam como intermediários do dinheiro sujo, devem fazer delação premiada. Não querem apodrecer na cadeia, a exemplo de Zé Dirceu e dos ex-tesoureiros do PT.

Muitos dos lusitanos não entendem como um prefeito do interior de São Paulo conseguiu movimentar uma fortuna na campanha. Antônio Palocci, que já respondeu a processos quando esteve à frente da prefeitura de Ribeirão Preto, foi denunciado pelo pessoal da Odebrecht como o homem que fazia as transações do dinheiro sujo para as campanhas do PT. Portanto, se resolver realmente abrir o bico tanto Lula como Dilma vão ter que esclarecer o caixa dois que rolou nas campanhas presidenciais. A indisponibilidade dos 30 milhões de reais, encontrados em sua conta pessoal, impossibilita Palocci de se movimentar e até gastar com seus advogados. Uma medida acertada.

A revelação de que os principais homens de Lula estão envolvidos em corrupção e no assalto aos cofres públicos tem esfriado por aqui os movimentos daqueles que ainda acreditavam na inocência de alguns petistas e de que o governo do PT estava sendo realmente injustiçado. Com as últimas prisões a ficha dos portugueses caiu. Agora eles sabem que o Brasil lava roupa suja diariamente manchada pelas falcatruas e as maracutaias da quadrilha petista que governou o país.

Mas para os portugueses o atual governo também está amordaçado. Não caminha com as próprias pernas porque ainda é refém de um amontoado de ideias desencontradas e de projetos duvidosos para tirar o país do caos. Não consegue inclusive se comunicar com eficiência sobre os seus feitos por absoluta incompetência. E no momento em que deveria falar também para o público externo, mandou desligar o sinal da TV Brasil que transmitia sua programação para Portugal tão usada pelos petistas para combater o impeachment e propagar o golpe.

Quanta trapalhada, meu Deus!

Ucrânia lembra 75 anos do massacre de Babi Yar

No período de dois dias, quase 34 mil judeus foram mortos no maior fuzilamento em massa feito pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial 

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Vasily Mikhailovsky ainda se lembra muito bem daquele dia no final de setembro de 1941. Ele tinha 4 anos quando, de repente, apareceram folhetos na Kiev ocupada pela Alemanha. Eles convocavam os judeus a se reunirem num local específico na periferia da cidade. Era um dia de outono ensolarado. "Um grande número de pessoas se colocou a caminho", recorda Mikhailovsky. "Eles puxavam carrinhos com seus pertences."

Mikhailovsky estava com sua babá, Nadia. A mãe havia morrido logo após o seu nascimento. O pai fora capturado pelos alemães como soldado do Exército Vermelho, mas conseguiu escapar. Em seu retorno a Kiev, foi morto a tiros.

O administrador do prédio disse a Nadia que levasse "a criança judia para Babi Yar". Nadia, que, na memória de Mikhailovsky, "não era particularmente bonita, mas muito, muito simpática", obedeceu a instrução. Na manhã seguinte, os dois fizeram o caminho até a ravina, localizada a sete quilômetros de distância, juntamente com milhares de outros.
"Eu estava muito feliz porque pensei que era uma manifestação, como no Primeiro de Maio ou no dia da revolução", diz Mikhailovsky, em entrevista à DW. "Eu dizia para Nadia: 'Compra para mim um balão ou uma bandeirinha. Mas aquele não era um dia de festa".

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Vasily Mikhailovsky se lembra muito bem
 daquele final de setembro de 1941
O que aconteceu naquele dia foi, em vez disso, o maior fuzilamento em massa realizado pelos nazistas na Segunda Guerra Mundial. No período de dois dias, quase 34 mil judeus foram executados em Babi Yar.

Quando Mikhailovsky e Nadia se aproximaram das demais pessoas na ravina, os soldados se alinhavam na beira da estrada e forçaram as pessoas para dentro da área das execuções. "Eles batiam nas pessoas, as empurravam a coronhadas e cassetetes e as tocavam como gado", recorda-se Mikhailovsky. "Em algum momento, chegamos a uma espécie de cancela."

Ele ainda se lembra de como Nadia mostrou seu passaporte para o policial e disse "eu sou ucraniana, eu sou ucraniana". Um dos guardas a agarrou pelo colarinho e a arrastou para o outro lado da cancela. "Ele apontou para uma pequena passagem e disse 'vá e coloque a criança ali'", diz Mikhailovsky.

Enquanto esperavam, podiam ouvir o que acontecia às pessoas que haviam chegado ao fim da passagem. "Ouvimos gritos e choro, mas os aviões que voavam sobre nós abafavam o barulho", conta Mikhailovsky. "Em algum lugar sobre nós tocava música."

Durante décadas, o que aconteceu naquela ravina não fez parte da história oficial da Ucrânia. No início, as autoridades soviéticas se negaram a reconhecer o massacre. Quando elas finalmente ergueram um monumento – uma enorme estátua de bronze com figuras curvadas em sofrimento – as vítimas foram simplesmente denominadas de "cidadãos soviéticos".

Quando a União Soviética chegava a seu fim, grupos judeus ergueram um monumento de formas mais simples, perto da ravina onde ocorreu a tragédia. Após a independência do país, o governo de Kiev começou a lembrar o evento com cerimônias oficiais.

Neste ano, por ocasião do 75º aniversário, a liderança ucraniana e a comunidade internacional homenageiam as vítimas com um amplo programa, que inclui conferências, exibições de filmes, concertos e exposições. Grupos judaicos querem construir perto do local um grande museu do Holocausto.

Mas a lembrança do ocorrido também gera polêmicas. Os judeus não foram os únicos a serem assassinados em Babi Yar durante a Segunda Guerra Mundial. Também ciganos da etnia rom, prisioneiros de guerra soviéticos, doentes físicos e mentais estão entre as vítimas.

No entanto, a esmagadora maioria dos mortos era de origem judaica. Alguns observadores temem que, com a ênfase no caráter multiétnico da vala comum, o papel de Babi Yar como um dos principais monumentos do Holocausto possa ser diluído.
(O livro "Babi Yar", de Anatoly Kuznetsov, retrata o terror daqueles dois dias e a fumaça da queima dos corpos que por dias encheu a região com a fuligem e o cheiro de carne queimada. A visão e o olfato da imaginação não deixam leitor nenhum imune à atrocidade)