sexta-feira, 17 de março de 2023

Pensamento do Dia

 


Do 'Consumo Consciente' ao 'Consumo Necessário'

Os esforços recentes de toda humanidade em estabelecer uma convivência pacífica entre a sociedade e o meio ambiente tem como principal desafio conter o consumo.

O ímpeto de consumo de todos nós traz desequilíbrios irreversíveis entre fontes renováveis e ambição consumista. Os Chineses, com sua tradição milenar de consumo necessário, foram os últimos a sucumbirem ao padrão: “Sou o que consigo consumir”.


Infelizmente não haverá ESG (Ambiental, Social e Governança) suficiente para reverter os estragos do consumismo instalado e em pleno voo.

Empresas socialmente corretas, de energia limpa, reciclagem, economias circulares etc. não escapam de burocracias enormes de difícil e lenta implementação.

São poucas as iniciativas que respeitam as prerrogativas nativas de fazer o bem e normalmente brotam da necessidade ou da previsibilidade que essa bandeira no médio e longo prazo aumentará os lucros, portanto bem-vindas, mas insuficientes.

Insuficientes porque permeiam a premissa do “Consumo Consciente” e esse modelo de pensamento não conseguiu barrar o necessário para garantir o futuro do homo sapiens.

Então, qual o novo engajamento?

É o “Consumo Necessário”.

Mas o que é consumo necessário?

Para as pessoas o consumo necessário é, por exemplo, após o fabricante de celular ter lançado vários modelos novos, você continuar com o seu até a necessidade da trocar ser real, ou por estar danificado ou por defasagem tecnológica.

Para as empresas, quando as pessoas forem em suas lojas, o atendente gentilmente pedir para ver o seu celular, e após breve análise, orientar que não cabe um novo aparelho. O seu é suficiente para suas demandas, para o que você precisa.

E, pasmem, todos voltarem para suas casas felizes da vida! As pessoas satisfeitas com seus velhos celulares e as empresas satisfeitas com seus lucros.

Hoje não temos mais dúvidas que o clima do planeta está em acelerada mudança.

Notícias corriqueiras em nosso dia a dia traduzem esse potencial estrago na prática, e bem perto, não mais do outro lado do mundo.

As Pessoas e as Nações estão como duas crianças dizendo uns para os outros: Comece você primeiro!!

Hora de entendermos que basta “Eu ser Eu” e “Você ser Você”, juntos implantarmos o “Consumo Necessário” e barrarmos a degradação do Planeta.

Para trazermos toda população do mundo para esse contexto, fica aqui uma sugestão no idioma global: “Me being myself ” and “You being yourself ”.

Tais militares, tais civis

Civis não podem entrar de surpresa num quartel militar e sair pintando postes sem autorização —os militares são muito ciosos de seus postes. Civis não podem invadir as repartições dos quartéis e sair carimbando despachos ou assinando promoções de segundo sargentos a primeiro sargentos —os militares são muito específicos a respeito de despachos a serem carimbados e de quais segundo sargentos merecem passar a primeiro. E, claro, nenhum civil pode se candidatar a general e, mesmo que seja absurdamente aceito pela comunidade militar, continuar se dizendo civil, com os gozos e benesses dos civis.


Já o contrário é possível. Os militares têm o direito anual de rolar seus pesados tanques e canhões pelas ruas dos civis, sem ligar para o estrago do asfalto sob as rodas e lagartas. Os militares podem trabalhar como funcionários em repartições civis, abrir gavetas, escarafunchar fichários, cantar as secretárias e ainda serem pagos para isso. E, pior, um general pode subir em palanques eleitorais e continuar general com os privilégios dos generais —como o de ser julgado por seus pares, não pela Justiça civil, e sair assobiando no azul.

É verdade que, num regime democrático, um militar só fará tudo isso com o estímulo de um civil, geralmente o presidente da República. Foi o que tivemos com Bolsonaro. Os militares estavam quietos nas casernas, limitando-se a rosnar em surdina contra as bandalheiras civis, quando viram em Bolsonaro a resposta às suas preces. Para muitos, ali estava o homem que botaria ordem no país. E pularam no seu colo.

Só não imaginavam que, sob Bolsonaro, teriam de acobertar desmatadores, cobrar propinas por vacinas, praticar charlatanismos, arapongar desafetos do presidente, tumultuar as eleições, abrigar golpistas, exterminar indígenas, contrabandear joias etc. —o rol é vasto.

E, que nem os civis, aprender a mentir.

Requintes de crueldade

Talvez não tivesse havido no mundo senhores de escravo mais cruéis do que os senhores de escravos no Brasil.

Tem-se a impressão de que, durante o longo período de escravidão, o brasileiro se esqueceu de que era ser humano e de que como a seres humanos devia tratar os seus semelhantes.

Para vergonha nosa, a história daquele triste período revela práticas de crueldade que hoje nos parecem incríveis.

(...) No Rio de Janeiro, a cidade mais culta do país, se encontravam nos jornais anúncios como este: "Na rua tal, número tal, vende-se carne-seca própria para escravos".

Sabem vocês que carne-seca era essa? Carne inferior, carne deteriorada apodrecida.

Viriato Corrêa, "História da liberdade no Brasil"

Paulo Freire: como o legado do educador brasileiro é visto no exterior

O nome do pensador e educador brasileiro Paulo Freire, premiado mundialmente pelos métodos educacionais que criou e desenvolveu, está comumente associado a polêmicas e tem dividido opiniões em seu país natal.

Seu sistema de alfabetização reconhecido mundo afora pela eficácia quando aplicado em larga escala principalmente em comunidades carentes, é ligado pelo espectro político mais conservador a ideologias de esquerda. Em consequência, o nome de Paulo Freire vem sendo usado com frequência como um rótulo político-partidário, um emblema de referência para reforçar argumentos e narrativas tanto dos que o criticam como dos que o defendem.

Agora, nesse começo de 2023, o nome de Paulo Freire volta ao centro de debates com a intenção de mudança do nome de uma estação do metrô de São Paulo, como noticiado pelo jornal Folha de S.Paulo, nesta terça-feira (14/03).

Segundo a reportagem, a estação que ainda não foi inaugurada, deixaria de chamar-se Paulo Freire como inicialmente planejado e passaria a ser batizada como Fernão Dias, em homenagem ao polêmico bandeirante.

A mudança teria sido feita por dirigentes da empresa que administra o metrô, controlada pelo governo de Tarcísio de Freitas, um aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro, que atacou Freire em diversas ocasiões.


Tratada pelo governo Bolsonaro como bode expiatório da má qualidade do ensino público brasileiro, a obra do educador Paulo Freire (1921-1997) pode ser controversa. Mas o trabalho do pedagogo e filósofo, nomeado em 2012 patrono da educação brasileira e autor de um método de alfabetização que completou 50 anos em 2013, não deixa de ser bastante relevante nas discussões mundiais sobre pedagogia.

Freire é estudado em universidades americanas, homenageado com escultura na Suécia, nome de centro de estudos na Finlândia e inspiração para cientistas em Kosovo. De acordo com levantamento do pesquisador Elliott Green, professor da Escola de Economia e Ciência Política de Londres, na Inglaterra, o livro fundamental da obra do educador, Pedagogia do Oprimido, escrito em 1968, é o terceiro mais citado em trabalhos acadêmicos na área de humanidades em todo o mundo.

Para especialistas em educação ouvidos pela BBC News Brasil, entretanto, a raiz da controvérsia em torno da pedagogia de Paulo Freire não é sua aplicação em si - mas o uso político-partidário que foi feito dela, historicamente e, mais do que nunca, nos dias atuais. "Li a maior parte dos livros dele. Minha tese de doutorado foi amplamente baseada em seus ensinamentos. Tenho aplicado seu método de várias maneiras em minha carreira profissional, na prática e na pesquisa", afirmou a pedagoga Eeva Anttila, professora da Universidade de Artes de Helsinque, na Finlândia.

"A maior vantagem de sua metodologia é a abordagem anti-opressiva e não autoritária, a pedagogia dialógica e respeitosa que ele promoveu. O problema é que suas ideias têm sido usadas para fins políticos - o que, em meu entendimento, nunca foi seu propósito inicial", disse a finlandesa.

Freire tornou-se conhecido a partir do início dos anos 1960. Ele desenvolveu um método de alfabetização de adultos baseado nos contextos e saberes de cada comunidade, respeitando as experiências de vida próprias do indivíduo. Aplicou o modelo pela primeira vez em um grupo de 300 trabalhadores de canaviais em Angicos, no Rio Grande do Norte. De acordo com os registros da época, a alfabetização ocorreu em tempo recorde: 45 dias.

Referência mundial em qualidade do ensino, a Finlândia conta, desde 2007, com um espaço dedicado a discutir a obra do educador brasileiro. O Centro Paulo Freire Finlândia fica na cidade de Tampere. "É um hub para os interessados em Paulo Freire e em seu legado para tornar o mundo mais igualitário e justo", de acordo com a definição da própria instituição. Eles publicaram, online, três livros com artigos - em finlandês - analisando a obra do brasileiro. O material teve 17 mil downloads.

Há centros de estudos semelhantes, todos batizados com o nome do brasileiro, na África do Sul, na Áustria, na Alemanha, na Holanda, em Portugal, na Inglaterra, nos Estados Unidos e no Canadá. Na Suécia, Freire é lembrado em um monumento público. Localizada no subúrbio de Estocolmo, 'Depois do Banho' é uma obra em pedra-sabão esculpida entre 1971 e 1976 pela artista Pye Engström. Sentadas lado a lado, estão retratadas sete personalidades com apelo político, como o poeta chileno Pablo Neruda (1904-1973), a escritora sueca Sara Lidman (1923-2004) e a sexóloga norueguesa Elise Ottesen-Jensen (1886-1973).

Mas a obra do educador brasileiro está longe de ser unanimidade entre os países que costumam liderar o ranking Pisa (sigla em inglês para Programa Internacional de Avaliação de Estudantes). Em Cingapura, que apareceu na primeira colocação na edição 2016 da avaliação trienal realizada pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) com escolas conhecidas por adotar um método linha-dura, a BBC News Brasil procurou a mais importante instituição de ensino superior do país para saber se algum pesquisador comentaria a obra do brasileiro Paulo Freire.

Professor destacado pela assessoria de comunicação da Universidade Nacional de Cingapura para atender à reportagem, Kelvin Seah disse que "não era a melhor pessoa para comentar sobre Paulo Freire". "Eu não sou familiarizado com seu método", afirmou.

Convidado a comentar sobre qual seria o método mais adequado ao contexto brasileiro, o especialista recomendou que os gestores analisassem caso a caso. "O método mais apropriado para os alunos em uma escola depende do perfil dos alunos da escola, do treinamento prévio recebido pelos professores, bem como dos recursos de instrução e financeiros disponíveis para a escola."

Em artigo acadêmico analisando o legado de Paulo Freire pelo mundo, o professor de filosofia da educação da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, Ronald David Glass aponta que o mérito de Paulo Freire está no método que valoriza a "consciência crítica, transformadora e diferencial, que emerge da educação como uma prática de liberdade".

"Paulo Freire viveu sua vida no espaço desta consciência; é por isso que inspirou e energizou pessoas no mundo inteiro, e é por isso que seu legado se prolongará muito além de qualquer horizonte que possamos enxergar agora", escreveu o professor. "Freire sempre estava buscando se tornar mais humano, tornar possível que outros fossem mais humanos e, se acolhermos esta busca com tanto amor e determinação quanto ele, então uma maior medida de justiça e democracia estará ao alcance."

Professor da Faculdade de Educação da Universidade Cristã do Texas, Douglas J. Simpson causou certa polêmica no meio acadêmico ao publicar, anos atrás, um artigo intitulado 'É Hora de Engavetar Paulo Freire?'. "Na verdade, não acho que suas ideias devam ser arquivadas", esclareceu ele à BBC News Brasil. "Meu texto foi pensado para atrair a atenção daqueles que acham que sempre estamos recorrendo a Freire. Pessoalmente, acho importante descobrir de novo ou pela primeira vez por que precisamos combinar uma forte paixão reflexiva 'freireana', de respeito e amor, a pessoas carentes de justiça pessoal."

Simpson afirma que a pedagogia baseada no diálogo é fundamental "para que a educação e a democracia prosperem, ou pelo menos sobrevivam". Ele culpa justamente a falta de diálogo pelo fato de as sociedades - e as escolas - estarem fortemente polarizadas politicamente. "Não temos sido efetivamente ensinados a praticar o diálogo nas escolas, muito menos nos governos." Para o professor, Paulo Freire ensinou, acima de tudo, que precisamos aprender "a ouvir, a entender e a respeitar uns aos outros" e a "trabalhar juntos nos problemas".

Considerando o contexto brasileiro, Simpson acredita que não deveria haver uma padronização - ou seja, que as escolas não deveriam seguir todas o mesmo método pedagógico. "As escolas precisam de culturas e responsabilidades que se baseiem em uma ética profissional, políticas e práticas meritórias", disse. Para ele, os métodos são necessários, "mas devem ser vistos como revisáveis, porque as escolas, sociedades, trabalhos e aprendizados são dinâmicos". "A padronização nas escolas muitas vezes leva a uma inércia indevida, de mesmice, de regulamentação estéril", complementou.

Nos anos 1970, o pedagogo John L. Elias, então professor da Universidade de Nova Jersey, escreveu muito a respeito de Paulo Freire. O educador brasileiro foi tema de sua tese de doutorado. Em texto de 1975, Elias apontou "sérios problemas no método" do brasileiro.

"A teoria da aprendizagem de Freire está subordinada a propósitos políticos e sociais. Tal teoria se abre para acusações de doutrinação e manipulação", afirmou ele. "A teoria de Freire da aprendizagem é doutrinária e manipuladora?", provocou.

Elias apontou que o educador brasileiro via "os sistemas educacionais do Terceiro Mundo como o principal meio que as elites opressoras usam para dominar as massas". "Conhecimento e aprendizado são políticos para Freire, porque eles são o poder para aqueles que os geram, como são para aqueles que os usam", argumentou.

Professora de Educação Internacional e Comparada na Faculdade dos Professores da Universidade Columbia, nos Estados Unidos, Regina Cortina já abordou a metodologia de Paulo Freire em diversos estudos sobre educação na América Latina, mas disse à BBC News Brasil que não se sentia "confortável" em comentar o tema no momento "por causa das mudanças administrativas no Brasil". Cortina afirmou, por meio da assessoria de imprensa da universidade, que não é possível vislumbrar com clareza "como as coisas vão seguir nas escolas brasileiras".

Para Freire, o ensino ocorre a partir do diálogo entre professor e aluno, desenvolvendo assim capacidade crítica e preparando os estudantes para sua emancipação social. No jargão do meio, o método Freire é o oposto ao conceito "bancário" de educação - aquele no qual o professor "deposita" o conhecimento nas mentes dos alunos. Para Freire, a educação é construída em conjunto.

O método Paulo Freire chegou a ser adotado pelo governo de João Goulart (1919-1976) em esforços para alfabetização de adultos. Com a ditadura militar, entretanto, o educador passou a ser perseguido, chegou a ser preso por 70 dias e viveu no exílio na Bolívia e no Chile. Após a publicação da 'Pedagogia do Oprimido', em 1968, Freire foi convidado para ser professor visitante na Universidade Harvard, nos Estados Unidos.

Reconhecido desde 2012 como o Patrono da Educação Brasileira, Paulo Freire é considerado o brasileiro mais vezes laureado com títulos de doutor honoris causa pelo mundo. No total, ele recebeu homenagens em pelo menos 35 universidades, entre brasileiras e estrangeiras, como a Universidade de Genebra, a Universidade de Bolonha, a Universidade de Estocolmo, a Universidade de Massachusetts, a Universidade de Illinois e a Universidade de Lisboa. Em 1986, Freire recebeu o Prêmio Educação para a Paz, concedido pela Unesco, a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciências e Cultura.

Há instituições de ensino que seguem o método Paulo Freire em diversos países. É o caso da Revere High School, escola em Massachusetts que em 2014 foi avaliada como a melhor instituição pública de Ensino Médio nos Estados Unidos. Em Kosovo, um grupo de jovens acadêmicos criou um projeto de ciência cidadã inspirado na pedagogia crítica do brasileiro. Os participantes recebem um kit para monitorar as condições ambientais e, assim, juntos, pressionar o governo por melhorias na área.

"Acredito que seria ótimo que a pedagogia em qualquer escola de qualquer país partisse do pensamento de Freire", comentou a pedagoga finlandesa Anttila. "Especialmente no Brasil, dada a atual situação política e a história do país." Ela diz que um método de ensino, para funcionar bem, precisa levar em conta as situações de vida dos alunos. "Não acredito em pedagogia autoritária. As aulas não precisam ser autoritárias. É preciso diálogo, discussão, negociação, exploração. Construir conhecimento para que haja capacidade de expressar ideias e ouvir os outros. Eis a chave para a democracia. E a educação democrática é a única maneira de salvaguardar uma sociedade democrática", declarou.