A conta não fecha. Os repasses do Fundo de Participação dos Estados (FPE) aos entes federativos, este ano, exibem um rombo em relação aos anos anteriores. No Rio Grande do Norte, por exemplo, a queda do repasse, entre janeiro e maio último, foi de R$ 92 milhões.
Para Estados com curtos orçamentos e grandes carências, cofres vazios sinalizam calamidade, ainda mais com a falta de água que aflige o semi-árido nordestino, incluindo o norte de Minas Gerais. Na devastada paisagem, caminhões-pipa são aguardados por pessoas aflitas, que, em extensas filas, esperam a vez de encher seus potes e baldes com volumes racionados.
O clamor regional se espalha, mas não consegue sensibilizar os ouvidos do Planalto, atentos que estão à calibragem da economia. Governadores expressam suas angústias na Esplanada dos Ministérios, voltando ao habitat com as mãos abanando.
Onde arranjar recursos, se os cortes de verbas nos Ministérios inviabilizam qualquer tipo de ajuda? Falta água, falta pasto e tem faltado também comida porque o dinheiro do Bolsa Família começa a ser corroído pela inflação.
Os cortes nos orçamentos dos Ministérios paralisam obras. A transposição do São Francisco, prometida para 2014, caminha a passos de tartaruga, com grandes pedaços ainda nem licitados.
Programas governamentais definham. O assistencialismo se resume a migalhas distribuídas a esmo.
As identidades dos governos se derretem sob grandes demandas nas áreas da saúde, educação, transportes e violência. Selos de marketing perdem sentido.
Velhos e novos atores vagueiam a procura de soluções criativas.
Quadros funcionais mostram-se desmotivados. Por todos os lados, enxergam-se escombros – obras paralisadas, empreendimentos inconclusos, equipamentos quebrados, desarrumação. A radiografia, vale dizer, cobre não apenas o Nordeste, mas outras regiões. O país vive o pleno ciclo das vacas magras.
Os impactos sobre os governantes serão fortes. As massas costumam colocar a bagagem de problemas sobre o colo dos donos do poder. Como não dispõem de coelhos na cartola, os mandatários mudam rotinas, tornando menos frequentes suas visitas às regiões devastadas, evitando respostas negativas às crescentes demandas das comunidades. Afastam-se do povo, perdem motivação e alguns chegam a cultivar o tédio.
Em menos de seis meses, alguns governos já parecem velhos, administrando massas falidas, consumindo quase todo o orçamento estadual com a folha dos servidores e fazendo pressão sobre os aliados nas Casas Congressuais para arrumar com o Executivo alguns trocados.
O que se pode fazer para animação das equipes e aperfeiçoamento das estruturas em ciclos de crise, como o que estamos vivendo?
Vejamos. Se grandes empreendimentos não são viáveis, as administrações poderiam se voltar ao mundo das pequenas coisas, particularmente na frente dos métodos usados nos órgãos e estruturas. A reengenharia operacional é fruto de um intenso debate interno a ser promovido por equipes, sob a coordenação de consultores/coordenadores. O investimento na análise de processos operacionais, de fluxos e cronogramas de ações, da racionalidade de sistemas pode redundar em grandes benefícios.
O primeiro ano de governo é propício a este empreendimento. Trata-se de uma tarefa que não exigirá grande soma de recursos, eis que deverá contar, sobretudo, com o engajamento e participação dos quadros.
Fazer do limão uma limonada – é o refrão popular para explicar a situação. Ou seja, eliminar a tendência de acomodação, desmotivação, lerdeza, desinteresse, muito comuns em ciclos de crise.
Como é sabido, depois de algum tempo, a tendência dos governos é a de entrar num estado de letargia. Trata-se de uma doença ainda pouco diagnosticada, mas cada vez mais generalizada. Afeta, sobretudo, governantes do Poder Executivo - presidente da República, governadores e prefeitos -, podendo, ainda, pegar gerentes e chefetes da tecnoburocracia. Tem um nome: podernite, que, como todas as ites, é uma inflamação, só que, ao invés de tomar o corpo, invade a alma. Podemos designá-la como a “doença do poder’”. Exibe graus variados de metástase.
Nos Estados desenvolvidos, de culturas políticas evoluídas, a doença não se espalha muito porque as críticas da mídia e dos grupos formadores de opinião funcionam como antivírus. Nos Estados menos aculturados, dominados por estruturas paternalistas e sistemas feudais, a doença geralmente chega a graus avançados.
Se alguém quiser associá-la ao egotismo, a importância que uma pessoa atribui a si mesmo, está correto, pois os conceitos são próximos. Uma inflexão voltada para animação dos times evitará essa mazela, afastando os governos da fronteira do marasmo.