quarta-feira, 7 de julho de 2021

Imagem do Brasil

 


O Brasil em voo cego

Evidências crescentes da gravíssima crise climática levam o mundo, apesar do atraso, a ampliar esforços para mitigá-la. Mas, para quase todos os políticos brasileiros, o assunto inexiste! Autoridades negam o fenômeno e atrasam providências. Sobre a questão climática, as oposições não se manifestam.

Nos últimos dias, fatos ligados ao aquecimento global pouco repercutiram no Brasil, mas devem ser lembrados.

No normalmente gelado Canadá, moradores da pequena cidade de Lytton, perto da costa oeste, sofreram 49,60C, temperatura mais elevada da história no país e mais alta que Dubai. Na vizinha Seattle o termômetro ficou em 420C, acima do recorde de Miami! Portland, próxima, superou em 50C o recorde de Houston!



E não só lá. No Japão, nos três primeiros dias deste julho, mais chuvas do que o esperado para todo o mês causaram deslizamento de terra e mortes; em partes do Paquistão e no golfo Pérsico ondas de calor elevaram a temperatura acima do que pessoas saudáveis podem suportar ao ar livre! No Brasil, a crise hídrica ameaça com falta d’água!

Isso tudo está se tornando o “novo normal”, e nem chegamos ainda à elevação de 20C referida no acordo de Paris; mantido nosso comportamento atual, projeções indicam aumento da temperatura média da Terra acima de 40C nas próximas décadas!

Também na semana passada a contida rainha Elizabeth II, visitando centro de pesquisa climática, afirmou que “enfrentar a mudança climática significará mudar a maneira como fazemos as coisas”. Com isso, ela rompeu a barreia posta pelo ex-presidente George Bush quando, às vésperas da Rio 92, disse “nosso estilo de vida é inegociável”. Mudar a maneira como fazemos as coisas, isto é, nosso estilo de vida, com apoio em novas políticas, tecnologias e valores, é a única forma de evitarmos que se generalizem – ainda mais em países tropicais – temperaturas mais elevadas do que humanos podem suportar!

Enquanto isso, no tropical Brasil, o número de focos de incêndio continua crescendo, o governo destrói agências ambientais e cria uma comissão inoperante! Sem gerar resultados condizentes com a construção do futuro, como afirmar que as instituições estão funcionando?

Não há dúvidas: as aceleradas mudanças climáticas agravarão ainda mais nossos problemas de saúde, saneamento, habitação, segurança, educação e outros, ampliando as desigualdades. É essencial e urgente enfrentá-las e mitigá-las, caminhar rumo a novos estilos de vida, com novas tecnologias, minimizando, com urgência, a queima de combustíveis fósseis, a geração de lixo e a ocupação descontrolada do solo. Enfim, alterando “a vida como ela é”! Não é fácil mas é indispensável!

Ao ideologizar esses temas, vê-los como frutos de conspirações contra nós e descartar enfrentá-los, o governo nos condena à retaguarda da história e a sofrimentos ainda maiores. Mais grave e preocupante: não se conhece manifestação dos ditos presidenciáveis sobre a questão climática!!!!
Eduardo Fernandez Silva

Falou, Spike!

Este mundo é governado por gângsteres, O Agente Laranja [Trump], o cara do Brasil [Bolsonaro] e [Vladimir] Putin. Eles são gângsteres e farão o que quiserem. Eles não têm moral nem escrúpulos. Este é o mundo em que vivemos, e nós temos que falar publicamente contra gângsteres como esses
Spike Lee, cineasta americano que preside o júri da 74ª edição do Festival de Cannes

Uma receita para Bolsonaro

As pedaladas que custaram o mandato a Dilma Rousseff tinham algo de malandragem contábil, só. O rolo das vacinas tem muito mais que isso. Ainda faltam-lhe, contudo, as digitais de Jair Bolsonaro. Os irmãos Miranda denunciaram a picaretagem indiana durante uma conversa, e ele não fez nada. É forte, mas pode ser pouco.

Negacionismo só produz misérias. A “gripezinha” abalou a credibilidade do governo em tudo que tem a ver com uma pandemia que já matou mais de 525 mil brasileiros. O mandato de Jair Bolsonaro está em perigo. Na melhor das hipóteses (para ele), a reeleição torna-se um sonho perdido que milicianos não conseguirão reativar.


A Bolsonaro, de nada adianta mobilizar pelotões contra a CPI, maltratar repórteres ou falar para convertidos nas redes sociais. A compra de vacinas pelo governo brasileiro expôs um redemoinho de picaretagens. Um cabo da PM mineira diz que recebeu um pedido de pixuleco de US$ 1 para cada uma dos 400 milhões de doses da AstraZeneca. Capilé de US$ 400 milhões num golpe semelhante é coisa que não existe, mas outras libélulas giravam em torno da AstraZeneca. A vacina do cabo custaria US$ 4,50 (com o pixuleco incluído). Na mesma época, um misterioso operador oferecia-se para privatizar imunizações, oferecendo a mesma vacina a um grupo de empresários por US$ 23,79 a unidade. A proposta foi detonada pelos bilionários que seriam mordidos. Isso com a AstraZeneca. 

Com a Covaxin indiana, o ministro Benjamin Zymler, do Tribunal de Contas da União, pergunta ao governo por que a unidade, negociada a US$ 10 em novembro do ano passado, foi contratada por US$ 15 em fevereiro.

Todos os laboratórios reiteram que nada tiveram a ver com essas ofertas. Tudo não passaria de conversa de atravessadores, mas, em todos os casos (salvo no da oferta ao consórcio de empresários), na outra ponta havia servidores públicos habilitados a negociar.

A única vacina que não foi rondada pela turma do pixuleco foi a CoronaVac. Aquela que, segundo ele, NÃO SERÁ COMPRADA (maiúsculas de Bolsonaro).

O capitão pode persistir no caminho do vitupério. Nele, a Covid-19 era uma gripezinha, e as vacinas poderiam transformar cidadãos em jacarés. Esse negacionismo já levou o país à ruína dos 525 mil mortos e mandou o governo às cordas. Recorrer aos militares, nem pensar, pois eles já carregam o desastre do general Pazuello e dos coronéis que ele levou para o Ministério da Saúde.

O tamanho do problema sugere que seria conveniente nomear uma pessoa ou uma comissão independente para tratar dessa cavalariça, limpando-a. Nada a ver com notáveis terrivelmente seja lá o que for. Para fulanizar, apenas mostrando um perfil dessa pessoa. Poderia entregar o caso ao ministro Marco Aurélio Mello, que está prestes a deixar o Supremo Tribunal Federal.

Essa pessoa, ou comissão independente, investigaria o que acontece no Ministério da Saúde e no seu entorno, restringindo-se à questão do preço das vacinas. Terminado o serviço, entregaria a Bolsonaro uma bandeja com a cabeça dos envolvidos, bem como uma avaliação de seu papel nos episódios. Esse procedimento não tiraria das costas do capitão os 525 mil mortos da Covid-19, nem os quase 15 milhões de desempregados. No mínimo, aliviaria o país de um aspecto de sua conduta irracional.

Bolsonaro jogou os militares num barco que parece fazer água por todos os lados

Nenhum outro presidente fez tão mal às Forças Armadas como o capitão insubordinado Jair Bolsonaro.

O Ministério da Saúde do governo Jair Bolsonaro, em plena pandemia, embolou militares da ativa e da reserva com PM lotado a quilômetros de distância, pastor dito “humanitário”, empresas fajutas nacionais e internacionais, atravessadores picaretas, apadrinhados do líder do governo e do Centrão. De perder o fôlego. E isso dá em “rolo” na certa.

Se Bolsonaro foi longe demais ao irritara sociedade, as Forças Armadas precisam agir para evitar o contágio enquanto é tempo, se ainda há tempo. Não é trivial um general da ativa e tantos coronéis e tenentes coronéis, da ativa e da reserva, citados de forma nada dignificante, inclusive em encontros com gente de péssima reputação, representando empresas suspeitas e oferecendo vacinas a preços exorbitantes.

A lista de oficiais citados, liderada por Eduardo Pazuello, general da ativa, continua aumentando. Os dois novos, trazidos pela Rede Globo, com base em e-mails entre a Saúde e a tal “empresa” Davati, são: coronel Hélcio Bruno de Almeida, que participou de reuniões com um pastor dedicado subitamente ao ramo das vacinas, e um tal “coronel Guerra”, que se mete em negócios do ministério diretamente dos EUA.



Dos oito listados, dois já foram acomodados no Planalto, Pazuello e o coronel da reserva Elcio Franco. Dá para enfiar os outros seis lá? E, afinal, o que a Defesa, o Exército, a Marinha e a Aeronáutica acham de tudo isso? Caiu ou não a ficha? Nenhum outro presidente fez tão mal às FA como o capitão insubordinado Jair Bolsonaro.

Com tantas certezas nesta vida, ele diz que não sabe nada do que acontece nos ministérios e, sempre tão falante, não diz absolutamente nada sobre a versão dos irmãos Luis Miranda, deputado federal, e Luis Ricardo Miranda, diretor de Importação da Saúde: de que relataram a ele todo o “rolo” Covaxin – e ele, que nem pareceu surpreso, não fez nada.

Bolsonaro tem obsessões: acabar com a urna eletrônica e reinstaurar o voto impresso, que fazia a festa dos “coronéis” da política; armar toda a população civil; derrubar a floresta para “desenvolver” a Amazônia; tirar as reservas dos indígenas, que só querem “celular e internet”.

É uma enxurrada de ideias muito próprias, peculiares, chocantes, mas talvez fosse mais conveniente o presidente acompanhar o que ocorre não só na Saúde e no Meio Ambiente, mas em todos os ministérios. Ou seja, passar a governar, botar a mão na massa, porque a coisa está ficando feia para o lado dele.

A CPI da Covid está indo mais longe do que se imaginava, com depoimentos, dados e provas abundantes do descaso do presidente pela ciência e é impossível achar uma explicação razoável para o desprezo por Coronavac, Pfizer e Covax Facility em favor de Covaxin, Convidecia, Sputnik e a tal Davati, uma farsa.

À CPI, soma-se mais uma investigação no Supremo: além da acusação de Sérgio Moro de intervenção política na Polícia Federal, agora a de três senadores de que ele prevaricou, ao desprezar a denúncia dos irmãos Miranda.

Pior: depois convocou Pazuello para matar no peito, numa história sem pé nem cabeça.

A isso, acrescentem-se as investigações do Ministério Público e do TCU, os 124 pedidos de impeachment na mesa do presidente da Câmara, Arthur Lira, e as manifestações do “Fora, Bolsonaro”, em São Paulo, Rio, Brasília e todas as capitais. Teve quebra-quebra no fim? Esses vândalos têm cara, cheiro e jeito de infiltrados...

Se a semana passada acabou mal, esta já começa com os áudios da excunhada de Bolsonaro, Andrea Siqueira Valle, no UOL, relatando como ele não apenas participava como tinha voz ativa nas “rachadinhas” dos gabinetes parlamentares da família. Pinga daqui, pinga dali, a sensação é de que o barco Bolsonaro faz água por todo lado.

Falta Lalau pra rir do falso moralismo

Valei-me, Stanislaw Ponte Preta! Há 55 anos, num julho como este, você lançava o primeiro Festival de Besteira que Assola o País, o Febeapá, uma espécie de balanço do golpe dos militares – e eis-me aqui a lamentar sua ausência para contar as histórias bizarras protagonizadas agora pelos súditos daqueles. Todo dia tem uma.

A mais recente é a da ministra (que Deus nos perdoe) da Família. Sempre tão proba, carola a ponto de negar aborto a uma adolescente estuprada, no fim de semana ela se viu denunciada em suposto pecado por ex-colega de igreja, um outro cidadão de bem que, por sua vez, é notório na fé de distribuir fake news.

Foi aí, divino mestre da fina flor dos Ponte Preta, todos moradores da então pacata Boca do Mato, foi aí que me lembrei de sua frase, e de como ela ainda é na medida para identificar o falso moralismo do Brasil de hoje: “O homem sensato, quando soube que todos seus vizinhos eram pessoas exemplares, mudou-se imediatamente para outro bairro”.


Esses “homens exemplares” retomaram o poder e ao estilo daqueles de 1964 – com Deus no coração e um revólver engatilhado embaixo do travesseiro. “E o homem honesto?”, você se perguntava. “É aquele que se vende caro?” Pois é, Lalau, o Centrão manda responder que sim. Os teus três volumes do “Febeapá” colecionaram as asneiras militares entre 1964 e 1967. Parecia aquela seção da revista Readers’ Digest, Piadas de Caserna, mas era tudo verdade. Os generais proibiram o balé Bolshoi para combater o comunismo, permitiram um jogo da seleção contra a Alemanha Oriental “desde que não tivesse cunho político”. Confundiram “A capital”, do Eça, com “O capital”, do Marx, e mandaram recolher o portuga das livrarias.

Eu gosto também da notícia em que um delegado mineiro, “para evitar ofensa às forças armadas”, proibiu no carnaval fantasias em que as mulheres ficassem de pernas de fora. Você, o mui digno criador das Certinhas do Lalau, concluiu sábio: “como se perna de mulher alguma vez tivesse ofendido as armas de alguém”.

Lalau, os cronistas que te sucederam em 2021 estão naturalmente enfurecidos com esses moralistas do sétimo dia que sonham o pesadelo de uma nova ditadura. Na ânsia louca de botar o maluco presidenciário no olho da rua, fecharam os punhos, cerraram fileiras e partiram para o discurso. Os cronistas perderam a leveza. Você cutucava a pança gorda dos que zelavam pelos bons costumes com a facada do humor.

Diante de instituições do tipo “Liga da Decência” e “Associação de Pais de Família”, todas metidas a reformar os hábitos alheios, você era só o mais risonho escárnio. “Quem tem a consciência tranquila não entra para clube nenhum. A consciência é como a vesícula, a gente só se preocupa quando dói.”

No Brasil 2021 os novos homens de bem praticam um cristianismo de mercado, onde quem dá aos pobres acha que eles merecem R$ 150 de auxílio emergencial. Zombam da fé, os insensatos. Já mataram 500 mil pessoas e avisaram que a vida é assim mesmo, vão morrer outras tantas porque, como você debochava, “quem não morre não vê Deus”.

A avacalhação é geral, mente-se como nos tempos do Febeapá original, “com tanta ênfase que até o contrário do que se diz está longe da verdade” – e eu sinto falta de teu humor para documentar o chorrilho de tantas sandices. Locupletam-se todos, ninguém restaura a moralidade. Muito lalau, meu caro, e pouco Lalau, os males do Brasil são.