Sou uma jovem estudante de engenharia arquitetônica — um sonho que acalento desde a infância. Um sonho que antes era repleto de cores, linhas e belos desenhos, mas que, sob o fogo da guerra, se transformou em agonia diária, e a esperança está se esvaindo sob os escombros. Em Gaza, não vivemos vidas normais, nem estudamos como os outros. Cada dia é uma batalha pela sobrevivência, mas carregamos nossos livros, nossos dispositivos e nossos sonhos nos ombros e seguimos em frente.
Estou afastada dos meus estudos há mais de um ano — um ano de dor e espera, um ano de busca por um vislumbre de esperança na escuridão da destruição. Todas as manhãs, acordo com o som de bombas e o terror do desconhecido. Caminho por ruas que não conhecem mais segurança, em busca de um sinal de internet para assistir às minhas aulas, de um fio de eletricidade para iluminar a escuridão do meu dia.
Eu era forçada a me aventurar diariamente em jornadas perigosas, indo a lugares onde eu não tinha nem como garantir minha própria segurança, só para encontrar a conexão de internet necessária para estudar. A cada dia que passava, o sonho da formatura se apagava dos meus olhos.
Cada momento era desperdiçado procurando um lugar tranquilo para estudar, entrar em contato com meus professores, entregar trabalhos. Eu não precisava apenas da internet — eu precisava de um espaço seguro para me concentrar, para silenciar as guerras internas que rugiam em meu coração. Era como se eu estivesse lutando a cada momento — fosse buscando um sinal ou fugindo de um ataque aéreo que se aproximava.
Nessas condições, o ensino a distância parecia um sonho distante. A engenharia arquitetônica, uma área que exige aplicação prática, foi reduzida a mero material teórico em uma tela de computador.
Como eu poderia compreender o projeto de construção ou rascunhar plantas quando as ferramentas de que precisava estavam destruídas? Como eu poderia aprender a usar uma impressora 3D ou trabalhar em modelos de engenharia quando o equipamento de que precisava estava em ruínas — quando minha casa, antes meu estúdio, agora era apenas escombros? A ocupação destruiu tudo, até mesmo a esperança de retornar àqueles cômodos outrora repletos de meus sonhos e ambições.
À medida que as provas se aproximavam, meu sofrimento se multiplicava. Conseguir uma conexão de internet estável naquela época era quase impossível. Às vezes, eu assistia a palestras à luz de velas, estudando com anotações rabiscadas às pressas em papel colorido, pois não tinha acesso a materiais digitais ou aos recursos cruciais para as provas. O tempo passava, e um medo profundo se apoderava do meu coração: "Será que vou conseguir passar por essas etapas ou esta guerra marcará o fim dos meus sonhos?"
As provas eram um pesadelo. Imagine ter que entregar um projeto preciso dentro do prazo, sem luz, sem internet, sem um lugar seguro para sentar. Eu me deslocava entre casas e centros, procurando um sinal de Wi-Fi fraco, um carregador portátil, uma vela para estudar.
Eu fiz meus exames com o coração em outro lugar — porque uma invasão poderia começar a qualquer momento, porque a ocupação poderia invadir o bairro ou bombardear a área de repente, porque a morte estava mais perto de nós do que qualquer coisa.
18 de março, quando as balas se tornaram meu projeto final
A noite se esvaiu no céu de Gaza. Já passava da meia-noite e eu estava sentado entre meus esboços arquitetônicos, tentando reconstruir o que restava da minha cidade destruída — como se o lápis em minha mão pudesse desfazer o que os tanques da ocupação haviam feito.
Minhas plantas espalhadas exibiam fileiras de casas, hospitais e escolas — projetos que jamais seriam realizados. Mesmo assim, eu as desenhei para provar a mim mesmo que ainda estávamos vivos, resistindo através dos sonhos.
De repente, o silêncio foi quebrado pelo estrondo dos alto-falantes israelenses, cortando a noite como uma faca:
“Aviso final… Este é o Hospital Al-Shifa… Uma zona militar perigosa… Vocês serão eliminados em minutos.”
Essas palavras caíram sobre mim como pedras. Olhei ao redor — minha mochila de engenharia cheia de plantas onde redesenhei o que os tanques haviam destruído, minha mala de roupas agora apenas uma relíquia de uma época em que eu era uma pessoa comum, um saco plástico contendo restos de comida de dias de fome. Três escolhas, todas iguais à morte.
Naquele momento, entendi que a engenharia que estudei jamais construiria um teto para me proteger de mísseis, que o lápis com o qual esbocei o futuro jamais apagaria as manchas de sangue nos muros de Gaza. Até minha pequena bolsa se tornou uma questão existencial:
Devo levar meus projetos, que podem virar escombros amanhã?
Devo levar minhas roupas para poder morrer “apresentável”?
Ou pego o pão seco, porque meu corpo faminto merece uma última mordida?
Meus olhos buscavam uma resposta entre as ruínas de decisões impossíveis, enquanto meu coração gritava:
“Até a fuga se tornou um exame sem nota de aprovação… Todos os caminhos levam à morte, mas eu preciso escolher como carregá-la!”
No fim, peguei minha mochila de engenharia — não porque fosse a mais importante, mas porque era a mais pesada. Carreguei-a como um caixão para a minha infância. Saí para a rua onde a escuridão lambia os rostos dos que fugiam, onde o céu chovia fogo. Eu sabia que minhas plantas queimariam junto com nossas casas, mas algo dentro de mim se rebelou e disse:
“Eles não roubarão a última coisa que possuo… Continuarei atraindo vida, mesmo enquanto corro pela morte!”
Naquela noite…
Aquela noite não foi apenas uma fuga. Foi o momento em que entendi que, em Gaza, não temos o luxo de escolher entre a vida e a morte — apenas entre formas de morte. Que "sobrevivência" é apenas uma mentira que contamos a nós mesmos para não enlouquecer de terror.
Naquela noite... aprendi que a guerra não rouba apenas vidas — ela rouba até mesmo o nosso direito de sonhar com uma morte digna. Aprendi que "engenharia" em Gaza significa projetar rotas de fuga de um inferno sem fim, que "futuro" é uma palavra que sussurramos com medo, como se fosse uma maldição.
Agora, sempre que passo pela rua da universidade, lembro-me de que uma mão invisível apaga o que construímos, mesmo enquanto o esboçamos. Mesmo assim, ainda carrego minha bolsa de engenharia. Talvez um dia descubramos que cada linha que desenhamos sob bombardeio era uma forma de prece desesperada:
“Olhem para nós… Estamos aqui… Tentando parecer seres humanos apesar de tudo!”
Entre as palavras da tese e o rugido dos mísseis
Meus dedos tremiam sobre o teclado — não de frio, mas do brilho da tela, meu único portal para um mundo além da vasta prisão de Gaza. Arrastei-me para aquele espaço distante onde o sinal de internet era um pequeno roubo das garras da ocupação.
“Doutor, este é o meu projeto para um centro de reabilitação para sobreviventes de guerra”, eu disse, forçando a voz a expressar confiança enquanto meus olhos observavam o céu.
Assim que o professor começou a dar seu feedback, o mundo explodiu. A queda da internet não foi apenas uma falha técnica — foi um grito ensurdecedor: "Não há espaço para sonhos aqui". O míssil que caiu não apenas abalou a Terra — ele destruiu nossa crença de que o conhecimento poderia nos proteger. Eu estava a poucos metros da morte.
Três horas de nada.
Minha mãe circulava entre hospitais, levantando os sudários das crianças, procurando meu rosto.
Meu pai cavou os escombros próximos com as mãos sangrando.
Minha irmãzinha gritou na rua: “Minha irmã é engenheira, ela não tem nada a ver com essa guerra!”
Voltei para casa tarde e encontrei minha família de luto, sofrendo por mim. O laptop que segurei durante todo o caminho parecia mais pesado que uma montanha — não porque continha meu projeto final, mas porque era a única testemunha de que eu havia tentado ser mais do que apenas mais um nome no registro dos mártires.
“Minha filha... Achávamos que você tinha se tornado uma daquelas pessoas cujas vidas são reduzidas a um atestado de óbito”, disse minha mãe, apertando minhas mãos como se confirmasse que eu ainda estava ali.
Naquele momento, eu entendi: nós não estudamos para obter diplomas, nós estudamos para provar que estamos vivos, que merecemos sobreviver.
Agora, quando caminho por aquela área, vejo minha sombra impressa na parede como uma testemunha:
“Aqui estava uma estudante defendendo seu futuro enquanto a guerra debatia seu direito de existir.”
Não rascunhamos nossos projetos no papel — nós os gravamos com sangue nas paredes do tempo, para que o mundo saiba que Gaza nunca foi apenas um lugar de morte. Sempre foi uma escola onde aprendemos a forjar esperança a partir das ruínas.
Isso é apenas uma fração do que suportei em meus estudos durante esta guerra assassina.
Eu sou a estudante de arquitetura sonhadora,