quinta-feira, 11 de janeiro de 2024
Colonização moderna
Quando pensamos no futuro do Brasil, não vemos futuro, mas tão somente a continuidade de um triste presente. Como é possível compreender, aceitar e viver sem indignação numa sociedade como a do nosso País, formada por:
1) uma multidão majoritária de pobres e negros, excluída, escravizada e inconsciente da realidade em que vive, sem condições de participar da vida política e econômica do país; 2) uma classe média sem qualquer noção de nacionalidade, que serve aos interesses dos poderosos, que odeia os pobres e que age como o capataz moderno, como bem define osociólogo Jessé de Souza;
3) uma elite econômica, que influencia na formação da classe política desqualificada e corrupta e que, em conjunto com a classe média, forma um bloco antipopular, que além de explorar o povo ainda tem “vendido” o País às nações estrangeiras.
Alia-se a isso, ainda, uma mídia em grande parte mantida pelo poder econômico, que tem exercido um crescente poder de manipulação da sociedade. São raros os veículos de comunicação que exercem a missão de fiscalizar, investigar, criticar, denunciar e cobrar, que se espera de uma imprensa livre, séria e compromissada com os destinos da Nação. Infelizmente, a publicidade pública quase sempre é usada com igual objetivo e não para educar, informar e bem orientar a sociedade, conforme determina a Constituição (art. 37, $ 1º).
Por tudo isso, estamos fadados a continuar sendo colônia das grandes potências, que aqui vêm buscar as commodities (matérias primas de baixo valor agregado) de que precisam para desenvolver as suas indústrias, gerar renda e empregos para os seus nativos, sob o olhar omisso da sociedade brasileira, uns por conveniência, outros por ignorância.
As ricas reservas de minérios, a exemplo do complexo minerário da Serra dos Carajás, no estado do Pará, o maior do mundo, estão sendo sugadas para sustentar a indústria da China e de países europeus, entre outros, deixando muito pouco ou quase nada para o Brasil além da degradação ambiental.
A desarticulação da Agência Nacional de Mineração, principal estatal voltada à organização e à fiscalização da atividade minerária, fez com que os garimpos ilegais se alastrassem, principalmente pelo território amazônico, avançando sobre áreas de proteção ambientais e sobre terras indígenas. Hoje a desordem impera nesse setor, situação que se agravou no governo passado, como vêm denunciando as poucas entidades da sociedade civil que atuam nessa área – Observatório da Mineração, site Amazônia real, sinaldefumaca.com, Brasil de Fato, entre outras.
A Vale S.A., por exemplo, usa tecnologia de ponta para extrair e transportar os minérios da Serra dos Carajás para fora do país, especialmente para China, principal compradora do minério de ferro, e também para a Europa e, em menor proporção, para Turquia, EUA, Argentina, Romênia, Omã, Ilhas Maurício, África do Sul e Egito. Mas nunca demonstrou o menor interesse em promover um processo de industrialização nacional. E nem nunca foi exigida pelo governo brasileiro a atuar nessa direção.
Segundo o site Brasil de Fato(2), só em 2021 a Vale deixou de pagar R$ 20,3 bilhões em impostos, sem qualquer contrapartida, o que faz com que as renúncias fiscais a ela concedidas sejam só um bônus para aumentar seu lucro. Em menos de dois anos, a Vale recebeu em benefícios fiscais do governo o equivalente a todo o acordo de reparação de Brumadinho.
Por isso, essa política de renúncias fiscais deveria ser revista, com urgência, pelo Brasil. Ela só se sustenta pelo forte lobby que as empresas mantêm no Congresso Nacional, a exemplo do que ocorre com o agronegócio. Aliás, saliente-se que os maiores investimentos da Vale e das grandes empresas do agronegócio são na manutenção dos lobbies e nas campanhas publicitárias.
O bom senso e os interesses do País indicam que essas benesses só se justificariam para empresas do setor industrial, que geram empregos qualificados e renda para os brasileiros. Para mineradoras que só exportam o minério in natura, que geram muito poucos empregos e renda no país, assim como para os grandes grupos empresariais do agronegócio que só produzem para exportar, é um verdadeiro crime de lesa-pátria conceder a elas incentivos fiscais.
Aliás, no agronegócio a situação ainda é pior. Além de não pagarem impostos, as grandes empresas desse setor são beneficiadas com créditos a juros subsidiados e renúncias de receitas. Espertamente, os grandes empresários do agro procuram confundir-se com os pequenos e médios produtores rurais e com as empresas industriais, com o objetivo de usufruir dos benefícios governamentais a ambos concedidos. Reitere-se que os investimentos no País só são feitos para a manutenção de uma bancada aguerrida no Congresso e na promoção de campanhas publicitárias manipuladoras da opinião pública.
Em 2019, por exemplo, a exportação de produtos do agronegócio rendeu aos cofres públicos apenas R$ 16,3 mil em imposto, de acordo com os dados publicados no artigo Agrotóxicos, capital financeiro e isenções tributárias, de Marcelo Carneiro Novaes e Thomaz Ferreira Jensen, um dos textos que compõem o livro Direitos Humanos no Brasil 2020, lançado pelo Movimento Humanos Direitos e pela Rede Social de Justiça e Direitos Humanos.
E a situação de lá para cá só piorou. Nossas férteis terras estão sendo usadas por um seleto grupo do agronegócio para produzir alimentos destinados exclusivamente à exportação, atendendo aos interesses dos países importadores. Para nós estão sobrando tão somente a devastação dos biomas, a degradação e a contaminação por agrotóxicos dos solos e das águas.
Dados levantados pelo Repórter Brasil, resultantes do cruzamento de informações do Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano (Sisagua) do Ministério da Saúde, com testes feitos em 2022, encontraram uma mistura de 27 agrotóxicos na água consumida pela população de 210 municípios brasileiros, como São Paulo (SP), Fortaleza (CE) e Campinas (SP).
Em 2022, o alerta máximo para contaminação da água acendeu em 28 cidades de Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Mato Grosso e Tocantins, nas quais testes de qualidade encontraram agrotóxicos na rede de abastecimento, ou em poços de uso particular, em quantidade acima do limite considerado seguro pelo Ministério da Saúde. Essa situação, segundo especialistas, representa um risco à saúde, principalmente se a água contaminada for consumida de forma contínua.
Esses são temas que deveriam preocupar a sociedade brasileira e, sobretudo, o Congresso Nacional e ensejar atuações visando uma mudança que melhor atenda aos interesses do País. No entanto, é utopia esperar que isso aconteça, uma vez que a maioria dos atuais parlamentares é comprometida com o grande capital, para o qual atuam como verdadeiros lobistas.
Resta esperar que setores mais conscientes da sociedade denunciem e pressionem por mudanças, fazendo com que eles passem a contribuir mais com o Brasil e menos com interesses particulares e pouco republicanos.
1) uma multidão majoritária de pobres e negros, excluída, escravizada e inconsciente da realidade em que vive, sem condições de participar da vida política e econômica do país; 2) uma classe média sem qualquer noção de nacionalidade, que serve aos interesses dos poderosos, que odeia os pobres e que age como o capataz moderno, como bem define osociólogo Jessé de Souza;
3) uma elite econômica, que influencia na formação da classe política desqualificada e corrupta e que, em conjunto com a classe média, forma um bloco antipopular, que além de explorar o povo ainda tem “vendido” o País às nações estrangeiras.
Alia-se a isso, ainda, uma mídia em grande parte mantida pelo poder econômico, que tem exercido um crescente poder de manipulação da sociedade. São raros os veículos de comunicação que exercem a missão de fiscalizar, investigar, criticar, denunciar e cobrar, que se espera de uma imprensa livre, séria e compromissada com os destinos da Nação. Infelizmente, a publicidade pública quase sempre é usada com igual objetivo e não para educar, informar e bem orientar a sociedade, conforme determina a Constituição (art. 37, $ 1º).
Por tudo isso, estamos fadados a continuar sendo colônia das grandes potências, que aqui vêm buscar as commodities (matérias primas de baixo valor agregado) de que precisam para desenvolver as suas indústrias, gerar renda e empregos para os seus nativos, sob o olhar omisso da sociedade brasileira, uns por conveniência, outros por ignorância.
As ricas reservas de minérios, a exemplo do complexo minerário da Serra dos Carajás, no estado do Pará, o maior do mundo, estão sendo sugadas para sustentar a indústria da China e de países europeus, entre outros, deixando muito pouco ou quase nada para o Brasil além da degradação ambiental.
A desarticulação da Agência Nacional de Mineração, principal estatal voltada à organização e à fiscalização da atividade minerária, fez com que os garimpos ilegais se alastrassem, principalmente pelo território amazônico, avançando sobre áreas de proteção ambientais e sobre terras indígenas. Hoje a desordem impera nesse setor, situação que se agravou no governo passado, como vêm denunciando as poucas entidades da sociedade civil que atuam nessa área – Observatório da Mineração, site Amazônia real, sinaldefumaca.com, Brasil de Fato, entre outras.
A Vale S.A., por exemplo, usa tecnologia de ponta para extrair e transportar os minérios da Serra dos Carajás para fora do país, especialmente para China, principal compradora do minério de ferro, e também para a Europa e, em menor proporção, para Turquia, EUA, Argentina, Romênia, Omã, Ilhas Maurício, África do Sul e Egito. Mas nunca demonstrou o menor interesse em promover um processo de industrialização nacional. E nem nunca foi exigida pelo governo brasileiro a atuar nessa direção.
Segundo o site Brasil de Fato(2), só em 2021 a Vale deixou de pagar R$ 20,3 bilhões em impostos, sem qualquer contrapartida, o que faz com que as renúncias fiscais a ela concedidas sejam só um bônus para aumentar seu lucro. Em menos de dois anos, a Vale recebeu em benefícios fiscais do governo o equivalente a todo o acordo de reparação de Brumadinho.
Por isso, essa política de renúncias fiscais deveria ser revista, com urgência, pelo Brasil. Ela só se sustenta pelo forte lobby que as empresas mantêm no Congresso Nacional, a exemplo do que ocorre com o agronegócio. Aliás, saliente-se que os maiores investimentos da Vale e das grandes empresas do agronegócio são na manutenção dos lobbies e nas campanhas publicitárias.
O bom senso e os interesses do País indicam que essas benesses só se justificariam para empresas do setor industrial, que geram empregos qualificados e renda para os brasileiros. Para mineradoras que só exportam o minério in natura, que geram muito poucos empregos e renda no país, assim como para os grandes grupos empresariais do agronegócio que só produzem para exportar, é um verdadeiro crime de lesa-pátria conceder a elas incentivos fiscais.
Aliás, no agronegócio a situação ainda é pior. Além de não pagarem impostos, as grandes empresas desse setor são beneficiadas com créditos a juros subsidiados e renúncias de receitas. Espertamente, os grandes empresários do agro procuram confundir-se com os pequenos e médios produtores rurais e com as empresas industriais, com o objetivo de usufruir dos benefícios governamentais a ambos concedidos. Reitere-se que os investimentos no País só são feitos para a manutenção de uma bancada aguerrida no Congresso e na promoção de campanhas publicitárias manipuladoras da opinião pública.
Em 2019, por exemplo, a exportação de produtos do agronegócio rendeu aos cofres públicos apenas R$ 16,3 mil em imposto, de acordo com os dados publicados no artigo Agrotóxicos, capital financeiro e isenções tributárias, de Marcelo Carneiro Novaes e Thomaz Ferreira Jensen, um dos textos que compõem o livro Direitos Humanos no Brasil 2020, lançado pelo Movimento Humanos Direitos e pela Rede Social de Justiça e Direitos Humanos.
E a situação de lá para cá só piorou. Nossas férteis terras estão sendo usadas por um seleto grupo do agronegócio para produzir alimentos destinados exclusivamente à exportação, atendendo aos interesses dos países importadores. Para nós estão sobrando tão somente a devastação dos biomas, a degradação e a contaminação por agrotóxicos dos solos e das águas.
Dados levantados pelo Repórter Brasil, resultantes do cruzamento de informações do Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano (Sisagua) do Ministério da Saúde, com testes feitos em 2022, encontraram uma mistura de 27 agrotóxicos na água consumida pela população de 210 municípios brasileiros, como São Paulo (SP), Fortaleza (CE) e Campinas (SP).
Em 2022, o alerta máximo para contaminação da água acendeu em 28 cidades de Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Mato Grosso e Tocantins, nas quais testes de qualidade encontraram agrotóxicos na rede de abastecimento, ou em poços de uso particular, em quantidade acima do limite considerado seguro pelo Ministério da Saúde. Essa situação, segundo especialistas, representa um risco à saúde, principalmente se a água contaminada for consumida de forma contínua.
Esses são temas que deveriam preocupar a sociedade brasileira e, sobretudo, o Congresso Nacional e ensejar atuações visando uma mudança que melhor atenda aos interesses do País. No entanto, é utopia esperar que isso aconteça, uma vez que a maioria dos atuais parlamentares é comprometida com o grande capital, para o qual atuam como verdadeiros lobistas.
Resta esperar que setores mais conscientes da sociedade denunciem e pressionem por mudanças, fazendo com que eles passem a contribuir mais com o Brasil e menos com interesses particulares e pouco republicanos.
Grande civilizado
Eu penso que o riso acabou – porque a humanidade entristeceu. E entristeceu – por causa da sua imensa civilização. O Infeliz está votado ao bocejar infinito. E tem por única consolação que os jornais lhe chamem e que ele se chame a si próprio – O Grande Civilizado.Eça de Queiroz, “A Decadência do riso”
Luta de classes à maneira dos ricos
Um dia, os inquilinos do Belnord se revoltaram e resolveram entrar em greve, fazendo história; mas isso foi depois, já no final da década de 1970. O Belnord havia sido, no seu tempo, o maior e mais suntuoso edifício de apartamentos de Nova York. Construído em 1909 e ocupando um quarteirão inteiro do Upper West Side, tinha 175 apartamentos finamente decorados, com tudo o que era importante na época: salas de estar e de jantar, biblioteca, lareira, despensa, dois ou três quartos de empregada e amplo espaço na cobertura para cada unidade dispor da sua própria lavanderia — o que, na virada do século, queria dizer o seu próprio tanque, a sua própria tábua de passar e o seu próprio varal de roupas, luxo sem igual.
O Belnord fora obra de um consórcio de investidores, e trocou de mãos algumas vezes até se tornar propriedade de um único casal, os Seril. O marido morreu em 1981; a viúva ficou famosa por ser a proprietária mais incompetente do elegantíssimo Upper West Side. Lilian Seril era acusada pelos inquilinos de não só não fazer as obras de manutenção de que o prédio necessitava, como de impedi-los de fazê-las. Havia infiltrações, os elevadores não funcionavam, faltava água, o telhado era um problema, o delicado jardim interno havia sido fechado. Ela, por sua vez, acusava os inquilinos de não pagar o aluguel em dia e de vandalizar o edifício.
Os aluguéis haviam caído num desvio burocrático criado durante a Segunda Guerra para evitar especulação imobiliária, estavam congelados e custavam uma fração do seu valor de mercado.
Na verdade, todos os lados tinham razão, todos estavam errados e todos eram igualmente insuportáveis. O primeiro juiz designado para dar jeito no emaranhado de ações entre proprietária e inquilinos desistiu da causa, e disse ao New York Times, exasperado, que “as partes se mereciam”.
Sem solução à vista, os moradores entraram em greve, depositando os aluguéis em juízo; alguns aproveitaram e simplesmente deixaram de pagar. A briga só se resolveu quando, em 1994, aos 85 anos, Lilian Seril jogou a toalha e vendeu o Belnord para um grupo de investidores.
Os novos proprietários pagaram U$ 15 milhões por um edifício que, em circunstâncias normais, teria custado três vezes isso, e gastaram U$ 100 milhões na reforma. Lilian Seril continuou no seu apartamento de 300m² até morrer, em 2004: pagava um modesto aluguel (congelado) aos novos donos. Só em 2017 as unidades, reformadas, começaram a ser vendidas, as menorzinhas por pouco menos de U$ 4 milhões, as maiores por U$ 11 milhões.
A longa treta entre proprietários e inquilinos do Belnord daria uma série, mas eu só descobri isso depois de assistir — com muito atraso — a “Only murders in the building”, onde ele atende por Arconia e é apenas um dos personagens.
Fui para o computador atrás do prédio fictício e o Google me trouxe o filé-mignon da vida real.
“Only murders in the building”, comédia policial estrelada por Steve Martin, Martin Short e Selena Gomes, com participações especiais de nomes como Sting e Meryl Streep, é uma das melhores séries em cartaz. Foi lançada em 2021 no Star+ e já teve três temporadas perfeitas para maratonar: três vizinhos se transformam em improváveis podcasters e detetives tentando descobrir quem é o assassino que se esconde no seu velho edifício. A história é leve, os atores são maravilhosos, a direção é ótima e, para felicidade geral, ninguém se leva muito a sério.
O Belnord fora obra de um consórcio de investidores, e trocou de mãos algumas vezes até se tornar propriedade de um único casal, os Seril. O marido morreu em 1981; a viúva ficou famosa por ser a proprietária mais incompetente do elegantíssimo Upper West Side. Lilian Seril era acusada pelos inquilinos de não só não fazer as obras de manutenção de que o prédio necessitava, como de impedi-los de fazê-las. Havia infiltrações, os elevadores não funcionavam, faltava água, o telhado era um problema, o delicado jardim interno havia sido fechado. Ela, por sua vez, acusava os inquilinos de não pagar o aluguel em dia e de vandalizar o edifício.
Os aluguéis haviam caído num desvio burocrático criado durante a Segunda Guerra para evitar especulação imobiliária, estavam congelados e custavam uma fração do seu valor de mercado.
Na verdade, todos os lados tinham razão, todos estavam errados e todos eram igualmente insuportáveis. O primeiro juiz designado para dar jeito no emaranhado de ações entre proprietária e inquilinos desistiu da causa, e disse ao New York Times, exasperado, que “as partes se mereciam”.
Sem solução à vista, os moradores entraram em greve, depositando os aluguéis em juízo; alguns aproveitaram e simplesmente deixaram de pagar. A briga só se resolveu quando, em 1994, aos 85 anos, Lilian Seril jogou a toalha e vendeu o Belnord para um grupo de investidores.
Os novos proprietários pagaram U$ 15 milhões por um edifício que, em circunstâncias normais, teria custado três vezes isso, e gastaram U$ 100 milhões na reforma. Lilian Seril continuou no seu apartamento de 300m² até morrer, em 2004: pagava um modesto aluguel (congelado) aos novos donos. Só em 2017 as unidades, reformadas, começaram a ser vendidas, as menorzinhas por pouco menos de U$ 4 milhões, as maiores por U$ 11 milhões.
A longa treta entre proprietários e inquilinos do Belnord daria uma série, mas eu só descobri isso depois de assistir — com muito atraso — a “Only murders in the building”, onde ele atende por Arconia e é apenas um dos personagens.
Fui para o computador atrás do prédio fictício e o Google me trouxe o filé-mignon da vida real.
“Only murders in the building”, comédia policial estrelada por Steve Martin, Martin Short e Selena Gomes, com participações especiais de nomes como Sting e Meryl Streep, é uma das melhores séries em cartaz. Foi lançada em 2021 no Star+ e já teve três temporadas perfeitas para maratonar: três vizinhos se transformam em improváveis podcasters e detetives tentando descobrir quem é o assassino que se esconde no seu velho edifício. A história é leve, os atores são maravilhosos, a direção é ótima e, para felicidade geral, ninguém se leva muito a sério.
Hora do educacionismo
Na última edição de 2023 do Correio Braziliense, o jornalista Luiz Carlos Azedo provocou nominalmente este leitor a refletir sobre o papel da educação na construção do futuro do Brasil. Entre envaidecido e comprometido, respondo que apenas educação não é suficiente, mas é absolutamente necessária para construir um país rico, democrático, justo, sustentável e pacífico. A his tória mostra que, além da educação, é preciso liberdade para fazer florescer a criatividade, que a cooperação internacional é necessária para aproveitar recursos externos, e a democracia, para corrigir rumos errados, mas a educação é o eixo central para enfrentar cada problema brasileiro e construir o progresso, especialmente nestes tempos em que a economia é baseada no conhecimento.
O Brasil tem o PIB elevado, mas não sai da armadilha da baixa renda per capita, por depender de aumento na produtividade, devido sobretudo à falta de educação em geral e sua vertente profissionalizante. Temos imensa renda social por causa do tamanho da população e do potencial natural, mas não conseguimos sair de sua perversa concentração, nem da baixa renda per capita. Em consequência, temos os péssimos indicadores sociais, todos vinculados à falta de educação de base. O desemprego depende, por um lado, de investimentos para criar vagas, e, por outro, do preparo profissional para preencher vagas criadas e preparar o trabalhador a adaptar-se à evolução tecnológica. O Brasil tem potencial para ser líder na nova indústria digital e sustentável, cuja base está no desenvolvimento científico e tecnológico que exige aproveitar todos os cérebros, não deixando nenhuma criança para trás em sua educação de base.
Apesar de décadas de crescimento econômico, dezenas de conquistas trabalhistas e diversos programas de assistência social, a pobreza e a desigualdade persistem no Brasil porque a distribuição de renda e dos benefícios sociais decorre da distribuição do conhecimento, graças ao acesso à escola com a mesma qualidade, independentemente da renda e do endereço da criança. A pobreza e a desigualdade só serão enfrentadas corretamente quando o Brasil superar seu sistema escolar dividido em "escolas senzala" e "escolas casa grande".
Nos últimos anos, vimos a fragilidade de nossa democracia, porque não basta ter Constituição cidadã se ela não for internalizada na alma da nação, graças à educação com qualidade e equidade. É a educação que fortalece e humaniza a democracia, transformando-a de um texto escrito em um guia da nação. Os constituintes fazem a Constituição, mas são os professores que a incorporam na alma do povo. Depois de 40 anos, temos uma democracia bárbara que divide as cidades na apartação de condomínios e ocupações, oferece os serviços sociais de qualidade, especialmente educação, apenas à parte rica da população. Sua transformação em democracia civilizada passa por educação de qualidade para todos.
Tanto a corrupção no comportamento de políticos quanto na definição de prioridades pela política tem várias causas, mas todas têm a ver com a educação. Os políticos corruptos são doutores instruídos, mas não foram educados para a cidadania, os eleitores sem educação se submetem por necessidade à venda do voto ou são enganados mais facilmente pela demagogia. A violência urbana exige polícia e justiça eficientes, mas requer ampla educação para quebrar a desigualdade que insufla violência, e também para educar ao desarmamento e pacificar a população.
Educação não faz tudo, mas faz o que é preciso para que tudo seja feito. O Brasil já tentou independência, república, ditadura, democracia, desenvolvimentismo, marcha para o oeste, governos de direita e esquerda, mas nunca tentou o educacionismo. Só uma radical estratégia educacionista vai permitir ao Brasil dar o salto que precisa e ter condições para aproveitar seu maior recurso potencial: nossa população educada.
Talvez, os maiores entraves para isso sejam a mentalidade, que vê educação como um serviço social e não como fator de produção e de distribuição no mundo moderno, e a cultura atávica, que não vê os brasileiros como possíveis campeões em educação, nem acredita na possibilidade de os filhos dos pobres terem escolas com a qualidade dos filhos dos ricos. Os desafios do educacionismo são convencer o Brasil de que isso é preciso, é possível, esta é a hora, este é o caminho, e definir a estratégia para realizá-lo: criar um Sistema Único Nacional Público de Educação de Base com a máxima qualidade, independente da renda e do endereço da pessoa.
O Brasil tem o PIB elevado, mas não sai da armadilha da baixa renda per capita, por depender de aumento na produtividade, devido sobretudo à falta de educação em geral e sua vertente profissionalizante. Temos imensa renda social por causa do tamanho da população e do potencial natural, mas não conseguimos sair de sua perversa concentração, nem da baixa renda per capita. Em consequência, temos os péssimos indicadores sociais, todos vinculados à falta de educação de base. O desemprego depende, por um lado, de investimentos para criar vagas, e, por outro, do preparo profissional para preencher vagas criadas e preparar o trabalhador a adaptar-se à evolução tecnológica. O Brasil tem potencial para ser líder na nova indústria digital e sustentável, cuja base está no desenvolvimento científico e tecnológico que exige aproveitar todos os cérebros, não deixando nenhuma criança para trás em sua educação de base.
Apesar de décadas de crescimento econômico, dezenas de conquistas trabalhistas e diversos programas de assistência social, a pobreza e a desigualdade persistem no Brasil porque a distribuição de renda e dos benefícios sociais decorre da distribuição do conhecimento, graças ao acesso à escola com a mesma qualidade, independentemente da renda e do endereço da criança. A pobreza e a desigualdade só serão enfrentadas corretamente quando o Brasil superar seu sistema escolar dividido em "escolas senzala" e "escolas casa grande".
Nos últimos anos, vimos a fragilidade de nossa democracia, porque não basta ter Constituição cidadã se ela não for internalizada na alma da nação, graças à educação com qualidade e equidade. É a educação que fortalece e humaniza a democracia, transformando-a de um texto escrito em um guia da nação. Os constituintes fazem a Constituição, mas são os professores que a incorporam na alma do povo. Depois de 40 anos, temos uma democracia bárbara que divide as cidades na apartação de condomínios e ocupações, oferece os serviços sociais de qualidade, especialmente educação, apenas à parte rica da população. Sua transformação em democracia civilizada passa por educação de qualidade para todos.
Tanto a corrupção no comportamento de políticos quanto na definição de prioridades pela política tem várias causas, mas todas têm a ver com a educação. Os políticos corruptos são doutores instruídos, mas não foram educados para a cidadania, os eleitores sem educação se submetem por necessidade à venda do voto ou são enganados mais facilmente pela demagogia. A violência urbana exige polícia e justiça eficientes, mas requer ampla educação para quebrar a desigualdade que insufla violência, e também para educar ao desarmamento e pacificar a população.
Educação não faz tudo, mas faz o que é preciso para que tudo seja feito. O Brasil já tentou independência, república, ditadura, democracia, desenvolvimentismo, marcha para o oeste, governos de direita e esquerda, mas nunca tentou o educacionismo. Só uma radical estratégia educacionista vai permitir ao Brasil dar o salto que precisa e ter condições para aproveitar seu maior recurso potencial: nossa população educada.
Talvez, os maiores entraves para isso sejam a mentalidade, que vê educação como um serviço social e não como fator de produção e de distribuição no mundo moderno, e a cultura atávica, que não vê os brasileiros como possíveis campeões em educação, nem acredita na possibilidade de os filhos dos pobres terem escolas com a qualidade dos filhos dos ricos. Os desafios do educacionismo são convencer o Brasil de que isso é preciso, é possível, esta é a hora, este é o caminho, e definir a estratégia para realizá-lo: criar um Sistema Único Nacional Público de Educação de Base com a máxima qualidade, independente da renda e do endereço da pessoa.
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