domingo, 10 de dezembro de 2017
Juventude estraçalhada
Com 726.712 detentos, o Brasil é o terceiro país com mais presos no planeta. Em números absolutos só perde para os Estados Unidos, cuja população bate em 323 milhões, e para China e seus 1,6 bilhão de habitantes.
Além da quantidade de pessoas atrás das grades, quase metade ainda aguardando julgamento, e da desumana superlotação das penitenciárias, os dados divulgados pelo Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça escancaram uma calamidade ainda maior: 30% dos presos são jovens entre 18 e 24 anos, percentual que atinge pornográficos 55% se estendido aos 29 anos de idade.
Em todas as áreas as estatísticas sobre os brasileiros jovens são alarmantes. Pior ainda se forem pretos e pobres.
Mais de 1,3 milhão de adolescentes entre 15 e 17 anos abandonam a escola antes de concluir o ensino fundamental. Dos 23,6 milhões de jovens na faixa de 18 a 24 anos, 47% não frequentam o ensino médio. Nada menos de 6,6 milhões compõem a categoria nem-nem, que não estudam e não trabalham.
São recordistas na morte brutal. Dados do Mapa da Violência 2017, elaborado pelo Ipea e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, apontam que 52% das vítimas de homicídios não chegaram aos 30 anos de idade.
Jovens estraçalhados dentro de um país que negligencia a juventude.
O PT, que se autoproclama a voz do povo e, claro, dos jovens, dirá que cuidou desse grupamento ao ampliar o acesso à universidade. Mérito que se perdeu no tamanho do rombo do Fies - para a União e para os estudantes -, e na baixa qualidade do ensino oferecido na irresponsável proliferação de faculdades país afora.
Acrescenta-se aqui um dado incongruente e cruel: enquanto se gabavam de oferecer mais vagas no “Universidade para todos”, os governos petistas amargaram evasão crescente no ensino médio, sem o qual não se chega ao terceiro grau.
Mas o discurso vazio sobre políticas dirigidas aos jovens não se restringe ao PT.
Com presença ostensiva nas redes sociais, o deputado Jair Bolsonaro tem arregimentado jovens – 30% dos que pretendem votar nele têm menos de 24 anos e 60% não chegou aos 35, segundo o Datafolha. Mas nunca apresentou uma única ideia para inverter a tragédia que dia após dia abate a juventude. Ao contrário, fala em armá-los.
O mesmo ocorre com Marina Silva, da Rede, que trafega bem entre os mais cultos e descolados de até 34 anos de idade, e com Lula, que não tem o mesmo apelo de outrora, mas ainda arregimenta parcela da preferência desse público. Os demais pré-candidatos passam longe da juventude.
Jovens são charmosos em campanha. Provocam comoção no eleitor, assim como crianças e velhos, especialmente quando expostos com precisão marqueteira.
Na campanha não vão faltar colos e beijos em crianças, sorrisos de velhos e jovens poderosos. As cenas das jornadas de junho de 2013 serão lembradas independentemente do matiz partidário. Mas as questões que realmente importariam aos jovens possivelmente estarão, mais uma vez, em segundo, terceiro, enésimo plano.
A análise pragmática do colégio de votantes talvez explique tal descaso: o Brasil não é mais um país de jovens. Eles são minoria e votam cada vez menos.
Em 2016, dos 144 milhões aptos a votar, o número de jovens até 24 anos foi de 23,2 milhões, inferior aos 25,8 milhões dos eleitores acima dos 60 anos. Entre os que gozam do voto facultativo, observou-se 1,5 milhão de eleitores de 16 e 17 anos cadastrados e 4 milhões acima de 79 anos.
A faixa etária decisiva se concentra entre os 35 e 44 anos, público em idade produtiva, que, pelo menos em tese, está mais desconfiado e menos sujeito ao engodo da oferta de paraísos impalpáveis.
Essa maioria sustenta os governos, carece de melhores serviços públicos, e quer que seus filhos consigam pelo menos ultrapassar a idade da juventude. Sem violência, cadeia, bala perdida, homicídio.
Ganhará a fatura quem conseguir convencê-la. Dada a descrença geral, os indicativos são de que desta vez os candidatos vão precisar mais do que palavras ao vento para fazê-lo.
Além da quantidade de pessoas atrás das grades, quase metade ainda aguardando julgamento, e da desumana superlotação das penitenciárias, os dados divulgados pelo Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça escancaram uma calamidade ainda maior: 30% dos presos são jovens entre 18 e 24 anos, percentual que atinge pornográficos 55% se estendido aos 29 anos de idade.
Em todas as áreas as estatísticas sobre os brasileiros jovens são alarmantes. Pior ainda se forem pretos e pobres.
São recordistas na morte brutal. Dados do Mapa da Violência 2017, elaborado pelo Ipea e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, apontam que 52% das vítimas de homicídios não chegaram aos 30 anos de idade.
Jovens estraçalhados dentro de um país que negligencia a juventude.
O PT, que se autoproclama a voz do povo e, claro, dos jovens, dirá que cuidou desse grupamento ao ampliar o acesso à universidade. Mérito que se perdeu no tamanho do rombo do Fies - para a União e para os estudantes -, e na baixa qualidade do ensino oferecido na irresponsável proliferação de faculdades país afora.
Acrescenta-se aqui um dado incongruente e cruel: enquanto se gabavam de oferecer mais vagas no “Universidade para todos”, os governos petistas amargaram evasão crescente no ensino médio, sem o qual não se chega ao terceiro grau.
Mas o discurso vazio sobre políticas dirigidas aos jovens não se restringe ao PT.
Com presença ostensiva nas redes sociais, o deputado Jair Bolsonaro tem arregimentado jovens – 30% dos que pretendem votar nele têm menos de 24 anos e 60% não chegou aos 35, segundo o Datafolha. Mas nunca apresentou uma única ideia para inverter a tragédia que dia após dia abate a juventude. Ao contrário, fala em armá-los.
O mesmo ocorre com Marina Silva, da Rede, que trafega bem entre os mais cultos e descolados de até 34 anos de idade, e com Lula, que não tem o mesmo apelo de outrora, mas ainda arregimenta parcela da preferência desse público. Os demais pré-candidatos passam longe da juventude.
Jovens são charmosos em campanha. Provocam comoção no eleitor, assim como crianças e velhos, especialmente quando expostos com precisão marqueteira.
Na campanha não vão faltar colos e beijos em crianças, sorrisos de velhos e jovens poderosos. As cenas das jornadas de junho de 2013 serão lembradas independentemente do matiz partidário. Mas as questões que realmente importariam aos jovens possivelmente estarão, mais uma vez, em segundo, terceiro, enésimo plano.
A análise pragmática do colégio de votantes talvez explique tal descaso: o Brasil não é mais um país de jovens. Eles são minoria e votam cada vez menos.
Em 2016, dos 144 milhões aptos a votar, o número de jovens até 24 anos foi de 23,2 milhões, inferior aos 25,8 milhões dos eleitores acima dos 60 anos. Entre os que gozam do voto facultativo, observou-se 1,5 milhão de eleitores de 16 e 17 anos cadastrados e 4 milhões acima de 79 anos.
A faixa etária decisiva se concentra entre os 35 e 44 anos, público em idade produtiva, que, pelo menos em tese, está mais desconfiado e menos sujeito ao engodo da oferta de paraísos impalpáveis.
Essa maioria sustenta os governos, carece de melhores serviços públicos, e quer que seus filhos consigam pelo menos ultrapassar a idade da juventude. Sem violência, cadeia, bala perdida, homicídio.
Ganhará a fatura quem conseguir convencê-la. Dada a descrença geral, os indicativos são de que desta vez os candidatos vão precisar mais do que palavras ao vento para fazê-lo.
Lula, um líder vazio a bordo de um teco-teco
Lula perdeu a grande chance de ficar em casa esperando abrir a temporada oficial das eleições para se apresentar como candidato a presidente. Ao sair pelo Brasil afora foi achincalhado, insultado, ofendido e ameaçado por onde passou. O mito saiu arranhado. Viu, com surpresa, sua rejeição pular da casa dos 50%. E pelo que mostram as estatísticas, candidato com esse índice jamais chega a lugar nenhum.
A caravana lulista tentou repetir o que ocorreu há vinte anos atrás. Naquela época o ex-presidente se apresentava como uma opção ética para o país. Tinha a segui-lo centenas de jornalistas. Era abraçado efusivamente pelo povo em sua Caravana da Cidadania, denominada de Viagem ao Brasil real”, que tinha o objetivo de refazer o caminho que ele fez ao deixar Garanhuns aos sete anos com destino a São Paulo.
A caravana lulista tentou repetir o que ocorreu há vinte anos atrás. Naquela época o ex-presidente se apresentava como uma opção ética para o país. Tinha a segui-lo centenas de jornalistas. Era abraçado efusivamente pelo povo em sua Caravana da Cidadania, denominada de Viagem ao Brasil real”, que tinha o objetivo de refazer o caminho que ele fez ao deixar Garanhuns aos sete anos com destino a São Paulo.
Em casa, se tivesse optado, ainda estaria preservado. Não seria avacalhado pelo povo e poderia, dessa forma, reaparecer depois com uma nova roupagem e com um discurso condizente com o Brasil de hoje, que mesmo sendo dilapidado por políticos corruptos, renova-se e moderniza-se. Lula, espertamente, não foi em busca apenas de votos nos redutos onde ele já os tem. Ele, na verdade, quer se consolidar como candidato a presidente para pressionar os desembargadores que ratificarão – ou não – a sentença do juiz Sérgio Moro.
Não faz muito tempo, antes de ser condenado, ele também saiu por aí como um boquirroto. Ameaçava botar o “Exército Vermelho”, os sem-terra do Stédeli, nas ruas se a Dilma fosse expurgada do poder por incompetência administrativa e inaptidão para o cargo. Ela foi para casa e o líder borocohô, para seu desespero, viu o país seguir seu rumo democraticamente.
Os seguidores de Lula, com exceção de alguns fanáticos, já não se movimentam sobre as ordens do Grande Chefe que vê os sindicatos escapulirem do seu controle. A semana passada, por exemplo, as centrais abortaram uma greve contra as reformas por divergências internas. Temiam, alguns dirigentes, um fracasso retumbante nas ruas. E assim o Lula vai se diluindo, se despersonalizando e vendo a estrela apagar enquanto ele dá o último suspiro para tentar se reerguer e sair da UTI política.
Lula ainda mantém pouco mais de 30% nas pesquisas porque é candidato único declarado a presidente da república. Resultado de um recall que se mantém na cabeça do eleitorado mais pobre e menos instruído porque, na verdade, nesses grotões onde estão esses votos, nem se sabe que em 2018 terá eleição presidencial.
A partir do início do próximo ano, as peças do xadrez começam a se movimentar. E o PT do Lula será o mais sacrificado pois não conta mais com o apoio dos empresários, dos seus marqueteiro e tesoureiros presos, com as empresas públicas e nem com as alianças políticas que lhe permitia a hegemonia no horário eleitoral. O PMDB certamente vai apresentar candidato (Henrique Meirelles é forte se a economia respirar sem aparelhos no próximo ano) e os partidos nanicos – como é da tradição – vão leiloar suas legendas na base do quem der mais. E assim, para o PT, só sobra o bagaço.
Lula, se não for condenado em segunda instância e recolhido ao presídio, vai amargar uma campanha sem recursos, sem gente qualificada e sem alianças. O mais fiel dos seus aliados, o PCdoB, já se movimenta nos bastidores para sobreviver. Como a sua maior base é São Paulo, já flerta com o PSB, que governará o estado com a saída do Alckmin, para onde já migrou o ex-ministro Aldo Rebelo, titular de várias pastas na administração petista.
É assim que o Lula vai tentar atravessar a tempestade que se aproxima. Não mais com aquele boeing poderoso que ele comprou com o nosso dinheiro para fazer tour ao exterior. Mas a bordo de um teco-teco levando pelo menos duas pessoas na apertada cabine: a carismática Dilma e um padre bom de reza para garantir o destino final de cada viagem da modesta aeronave.
A verdadeira história dos super-ricos
Jeff Bezos é o homem mais rico do mundo. No final da semana passada, a fortuna do fundador da Amazon superou a barreira dos 100 bilhões de dólares (330 bilhões de reais) e, nos últimos anos, os negócios da sua empresa não pararam de crescer. Faz tempo que a amazonização aterroriza muitas companhias, e o poder de Bezos aumenta à medida que sua riqueza também cresce. No entanto, também faz tempo que a verdadeira fortuna do empresário deixou de ser tão astronomicamente grande quanto pensamos ao ouvir a cifra.
Isso porque o poder do dinheiro é medido segundo a quantidade riqueza disponível no conjunto da economia. Os Estados Unidos, país em que Bezos construiu seu patrimônio, é uma economia gigantesca. A julgar por seu tamanho, até os bilhões do fundador da Amazon parecem pouco. Toda a fortuna deste empreendedor de 53 anos representa apenas 0,5% da soma dos bens e serviços produzidos nos EUA em um ano.
O mesmo acontece com Bill Gates, fundador da Microsoft, e seus 89 bilhões de dólares (294 bilhões de reais) que, somados, equivalem somente a uma pequena parte do que se produz no país. Esse fato não muda nem quando levamos em conta os ocupantes do quarto e do quinto lugares da lista dos norte-americanos mais ricos: Mark Zuckerberg, diretor do Facebook, com 75 bilhões de dólares (248 bilhões de reais), e Larry Ellison, fundador da Oracle, com 54 bilhões de dólares (178 bilhões de reais). Juntos, os cinco homens mais abastados dos EUA alcançam a considerável quantia de 394 bilhões de dólares (1,3 trilhão de reais), mas até mesmo essa cifra não é mais do que 2,1% do PIB nacional. Nos EUA, portanto, não se pode falar de uma acumulação nociva da riqueza. Em outras economias, contudo, as coisas são bem diferentes.
Existem países onde as cinco pessoas mais ricas têm tanto dinheiro que poderiam comprar 25%, ou inclusive 33%, dos bens e serviços produzidos em um ano. Lá, os ricaços são muito mais influentes que nos EUA. Suas fortunas se traduzem em poder econômico e, com frequência, poder político. A verdadeira lista dos ricos revela essa influência; nela, as grandes fortunas são definidas em relação ao produto da atividade econômica. O jornal dominical alemão Welt am Sonntag a elaborou com base em dados do serviço financeiro da Bloomberg, que não apenas fornece informações sobre os patrimônios relativos, mas também permite tirar conclusões sobre as sociedades de onde vêm os ricos e sobre as quais estes exercem sua influência. As respectivas concentrações de riqueza mostram até que ponto as economias são dominadas pelos "oligarcas". Inclusive é possível determinar o grau de oligarquização de cada país. Quanto mais riqueza as cinco pessoas mais ricas concentram, maior é o risco de que elas possam intervir além da conta no Estado e na sociedade. É justamente assim que se define o termo oligarquia (governo de poucos): um grupo reduzido de pessoas que usa suas influências e, como regra geral, aproveita para acumular fortunas aos seus integrantes.
Normalmente, o grau de oligarquização nos países pequenos é maior do que nos grandes. O valor mais alto é registrado em duas antigas colônias britânicas: Hong Kong e Chipre. Na cidade-Estado chinesa, as fortunas das cinco pessoas mais ricas representam 33% da economia. Li Ka-shing, seu cidadão mais endinheirado, possui 34 bilhões de dólares (112 bilhões de reais), equivalentes a 10,5% do PIB. Conhecido como Superman nos meios de comunicação locais, o empresário de 89 anos governa a Hutchinson, seu grupo de empresas, como um império. Para não chegar nunca tarde, ele usa um relógio 20 minutos adiantado.
Somente Chipre apresenta uma concentração de riqueza ainda mais extrema. Lá, uma única pessoa, John Fredriksen, possui o equivalente a mais de 52% do PIB. A fortuna desse norueguês, que se fez sozinho e que em 2006 se nacionalizou cipriota por motivos fiscais, é estimada em mais de 10 bilhões de dólares (33 bilhões de reais). Além da indústria naval, o empresário tem participações no negócio petroleiro. Mas Frederiksen não é o único magnata da ilha mediterrânea. Os seguintes quatro cipriotas com grandes abastanças somam 28% do PIB.
Nos países nórdicos, que defendem justamente o equilíbrio social, a concentração de riqueza é surpreendente. Na Dinamarca, o fator de oligarquização é de 11%; na Suécia, 19%. Isso não tem a ver somente com o fato de que, aos 81 anos, Ingvar Kamprad seja uma das pessoas mais ricas da Europa, com cerca de 48 bilhões de dólares (158 bilhões de reais), quase 10% do PIB sueco. Outros compatriotas também acumularam enormes patrimônios. É o caso de Stefan Persson, dono de grande parte das ações da grife de roupas H&M, que além de outras propriedades possui 8.700 hectares de terras na Grã-Bretanha.
Apesar dessa concentração de renda, os países escandinavos não têm fama de plutocracias governadas pelo dinheiro. Talvez isso tenha a ver com sua longa tradição de sociedades burguesas com uma economia de mercado. A situação é diferente nos países que introduziram o capitalismo há pouco tempo, e sobretudo nos do antigo bloco soviético. Na República Checa, por exemplo, o fator de oligarquização é de nada menos que 12%. Andrej Babiš, um dos bilionários do país, acaba de conseguir maioria parlamentar com o movimento populista que fundou. Na verdade, sua fortuna chega a "somente" 4,1 bilhões de dólares (13,5 bilhões de reais), mas a soma equivale a mais de 2,1% da economia checa. Em comparação, a influência econômica do presidente Donald Trump parece extremamente modesta. Com seus 2,9 bilhões de dólares (9,6 bilhões de reais), segundo os cálculos da Bloomberg, Trump responde por um ínfimo 0,016% da economia de seu país.
Babiš nem sequer é o homem mais rico da República Checa. A lista dos magnatas é encabeçada pelo investidor financeiro Petr Kellner. Sua fortuna de 12,3 bilhões de dólares (40,6 bilhões de reais) equivale a 6,3% da produção de seu país em um ano. Assim como alguns russos, os oligarcas checos também se beneficiaram com a queda do Muro. Graças aos seus contatos no mundo da política, durante as privatizações eles conseguiram abocanhar uma boa fatia da economia nacional. Babiš é um exemplo de como a prosperidade econômica pode ser transformada em poder político. Em 2011, ele fundou o movimento Aliança de Cidadãos Insatisfeitos (ANO), espécie de receptáculo para os checos indignados.
Na Rússia, mãe-pátria da oligarquia, a concentração da riqueza é importante. Os cinco russos mais ricos possuem quase 7% do conjunto da produção do país. À primeira vista pode parecer pouco, mas, numa economia tão grande, representa um valor assustadoramente alto. Até 1990, também na Rússia a riqueza era repartida de modo mais ou menos igualitário. A acumulação ocorreu nos anos imediatamente posteriores. Hoje, tanto a Rússia como a República Checa apresentam os problemas da concentração extrema da riqueza, embora de diferentes maneiras. Uma característica é a tendência ao chamado capitalismo clientelista, em que um grupo reduzido de adinheirados se aproveita de seu poder, com cumplicidades, para defender seus privilégios. Relegam ao segundo plano os recém-chegados ao mundo empresarial ou os desanimam desde o início, o que prejudica o dinamismo e a capacidade de inovação da economia. Não é à toa que, após a separação, a Republica Checa ficou para trás em relação à Eslováquia, cujo fator de oligarquização é de apenas 1,3%.
A Rússia, com seu sistema de bilionários, tampouco foi tão bem-sucedida. Há 30 anos o país vive um relativo declínio. Em particular, o Kremlin não se sai muito bem na comparação com a China. Embora oficialmente comunista, a República Popular também tem muitos multimilionários e bilionários. No entanto, com seus 48 bilhões de dólares (158 bilhões de reais), Jack Mu, seu cidadão mais rico, só alcança um fator de oligarquização de 0,4%. Já Alexej Mordaschow, o russo mais rico, representa 1,5%.
No extremo oposto do planeta, chamam a atenção sobretudo o Estado petroleiro da Colômbia, com 12,5% e o México, com 10%. O bilionário Carlos Slim – barão da Telmex no México e ex-líder do ranking das pessoas mais ricas do mundo – representa sozinho 6,1% do conjunto da economia do país. Em 2018 haverá eleições no México, e lá também um populista poderia chegar ao poder.
Na Europa, raramente ocorre uma concentração de riqueza tão extrema quanto a da América Latina. Entre as grandes economias ocidentais, a França se destaca com um nível de concentração da riqueza de 6,7% –semelhante ao da Rússia. Na segunda economia da zona do euro, as famílias fundadoras de grandes marcas de luxo, como a L'Oréal, construíram fabulosas fortunas apesar de todas as guerras e mudanças políticas. Em muitos casos, as bases que permitiram essa acumulação foram lançadas já na época napoleônica.
A Alemanha, por sua vez, quase não está oligarquizada. É certo que nesse país também existem enormes fortunas familiares, como a de Dieter Schwarz, estimada em 22,9 bilhões de dólares (9,6 bilhões de reais). Mas mesmo o patrimônio do dono das redes de supermercado Lidl e Kaufland só atinge um fator de 0,66%. Ainda assim, Schwarz é um "oligarca" maior que Jeff Bezos nos EUA. Em termos estritamente percentuais.
Isso porque o poder do dinheiro é medido segundo a quantidade riqueza disponível no conjunto da economia. Os Estados Unidos, país em que Bezos construiu seu patrimônio, é uma economia gigantesca. A julgar por seu tamanho, até os bilhões do fundador da Amazon parecem pouco. Toda a fortuna deste empreendedor de 53 anos representa apenas 0,5% da soma dos bens e serviços produzidos nos EUA em um ano.
O mesmo acontece com Bill Gates, fundador da Microsoft, e seus 89 bilhões de dólares (294 bilhões de reais) que, somados, equivalem somente a uma pequena parte do que se produz no país. Esse fato não muda nem quando levamos em conta os ocupantes do quarto e do quinto lugares da lista dos norte-americanos mais ricos: Mark Zuckerberg, diretor do Facebook, com 75 bilhões de dólares (248 bilhões de reais), e Larry Ellison, fundador da Oracle, com 54 bilhões de dólares (178 bilhões de reais). Juntos, os cinco homens mais abastados dos EUA alcançam a considerável quantia de 394 bilhões de dólares (1,3 trilhão de reais), mas até mesmo essa cifra não é mais do que 2,1% do PIB nacional. Nos EUA, portanto, não se pode falar de uma acumulação nociva da riqueza. Em outras economias, contudo, as coisas são bem diferentes.
Existem países onde as cinco pessoas mais ricas têm tanto dinheiro que poderiam comprar 25%, ou inclusive 33%, dos bens e serviços produzidos em um ano. Lá, os ricaços são muito mais influentes que nos EUA. Suas fortunas se traduzem em poder econômico e, com frequência, poder político. A verdadeira lista dos ricos revela essa influência; nela, as grandes fortunas são definidas em relação ao produto da atividade econômica. O jornal dominical alemão Welt am Sonntag a elaborou com base em dados do serviço financeiro da Bloomberg, que não apenas fornece informações sobre os patrimônios relativos, mas também permite tirar conclusões sobre as sociedades de onde vêm os ricos e sobre as quais estes exercem sua influência. As respectivas concentrações de riqueza mostram até que ponto as economias são dominadas pelos "oligarcas". Inclusive é possível determinar o grau de oligarquização de cada país. Quanto mais riqueza as cinco pessoas mais ricas concentram, maior é o risco de que elas possam intervir além da conta no Estado e na sociedade. É justamente assim que se define o termo oligarquia (governo de poucos): um grupo reduzido de pessoas que usa suas influências e, como regra geral, aproveita para acumular fortunas aos seus integrantes.
Normalmente, o grau de oligarquização nos países pequenos é maior do que nos grandes. O valor mais alto é registrado em duas antigas colônias britânicas: Hong Kong e Chipre. Na cidade-Estado chinesa, as fortunas das cinco pessoas mais ricas representam 33% da economia. Li Ka-shing, seu cidadão mais endinheirado, possui 34 bilhões de dólares (112 bilhões de reais), equivalentes a 10,5% do PIB. Conhecido como Superman nos meios de comunicação locais, o empresário de 89 anos governa a Hutchinson, seu grupo de empresas, como um império. Para não chegar nunca tarde, ele usa um relógio 20 minutos adiantado.
Somente Chipre apresenta uma concentração de riqueza ainda mais extrema. Lá, uma única pessoa, John Fredriksen, possui o equivalente a mais de 52% do PIB. A fortuna desse norueguês, que se fez sozinho e que em 2006 se nacionalizou cipriota por motivos fiscais, é estimada em mais de 10 bilhões de dólares (33 bilhões de reais). Além da indústria naval, o empresário tem participações no negócio petroleiro. Mas Frederiksen não é o único magnata da ilha mediterrânea. Os seguintes quatro cipriotas com grandes abastanças somam 28% do PIB.
Nos países nórdicos, que defendem justamente o equilíbrio social, a concentração de riqueza é surpreendente. Na Dinamarca, o fator de oligarquização é de 11%; na Suécia, 19%. Isso não tem a ver somente com o fato de que, aos 81 anos, Ingvar Kamprad seja uma das pessoas mais ricas da Europa, com cerca de 48 bilhões de dólares (158 bilhões de reais), quase 10% do PIB sueco. Outros compatriotas também acumularam enormes patrimônios. É o caso de Stefan Persson, dono de grande parte das ações da grife de roupas H&M, que além de outras propriedades possui 8.700 hectares de terras na Grã-Bretanha.
Apesar dessa concentração de renda, os países escandinavos não têm fama de plutocracias governadas pelo dinheiro. Talvez isso tenha a ver com sua longa tradição de sociedades burguesas com uma economia de mercado. A situação é diferente nos países que introduziram o capitalismo há pouco tempo, e sobretudo nos do antigo bloco soviético. Na República Checa, por exemplo, o fator de oligarquização é de nada menos que 12%. Andrej Babiš, um dos bilionários do país, acaba de conseguir maioria parlamentar com o movimento populista que fundou. Na verdade, sua fortuna chega a "somente" 4,1 bilhões de dólares (13,5 bilhões de reais), mas a soma equivale a mais de 2,1% da economia checa. Em comparação, a influência econômica do presidente Donald Trump parece extremamente modesta. Com seus 2,9 bilhões de dólares (9,6 bilhões de reais), segundo os cálculos da Bloomberg, Trump responde por um ínfimo 0,016% da economia de seu país.
Babiš nem sequer é o homem mais rico da República Checa. A lista dos magnatas é encabeçada pelo investidor financeiro Petr Kellner. Sua fortuna de 12,3 bilhões de dólares (40,6 bilhões de reais) equivale a 6,3% da produção de seu país em um ano. Assim como alguns russos, os oligarcas checos também se beneficiaram com a queda do Muro. Graças aos seus contatos no mundo da política, durante as privatizações eles conseguiram abocanhar uma boa fatia da economia nacional. Babiš é um exemplo de como a prosperidade econômica pode ser transformada em poder político. Em 2011, ele fundou o movimento Aliança de Cidadãos Insatisfeitos (ANO), espécie de receptáculo para os checos indignados.
Na Rússia, mãe-pátria da oligarquia, a concentração da riqueza é importante. Os cinco russos mais ricos possuem quase 7% do conjunto da produção do país. À primeira vista pode parecer pouco, mas, numa economia tão grande, representa um valor assustadoramente alto. Até 1990, também na Rússia a riqueza era repartida de modo mais ou menos igualitário. A acumulação ocorreu nos anos imediatamente posteriores. Hoje, tanto a Rússia como a República Checa apresentam os problemas da concentração extrema da riqueza, embora de diferentes maneiras. Uma característica é a tendência ao chamado capitalismo clientelista, em que um grupo reduzido de adinheirados se aproveita de seu poder, com cumplicidades, para defender seus privilégios. Relegam ao segundo plano os recém-chegados ao mundo empresarial ou os desanimam desde o início, o que prejudica o dinamismo e a capacidade de inovação da economia. Não é à toa que, após a separação, a Republica Checa ficou para trás em relação à Eslováquia, cujo fator de oligarquização é de apenas 1,3%.
A Rússia, com seu sistema de bilionários, tampouco foi tão bem-sucedida. Há 30 anos o país vive um relativo declínio. Em particular, o Kremlin não se sai muito bem na comparação com a China. Embora oficialmente comunista, a República Popular também tem muitos multimilionários e bilionários. No entanto, com seus 48 bilhões de dólares (158 bilhões de reais), Jack Mu, seu cidadão mais rico, só alcança um fator de oligarquização de 0,4%. Já Alexej Mordaschow, o russo mais rico, representa 1,5%.
No extremo oposto do planeta, chamam a atenção sobretudo o Estado petroleiro da Colômbia, com 12,5% e o México, com 10%. O bilionário Carlos Slim – barão da Telmex no México e ex-líder do ranking das pessoas mais ricas do mundo – representa sozinho 6,1% do conjunto da economia do país. Em 2018 haverá eleições no México, e lá também um populista poderia chegar ao poder.
Na Europa, raramente ocorre uma concentração de riqueza tão extrema quanto a da América Latina. Entre as grandes economias ocidentais, a França se destaca com um nível de concentração da riqueza de 6,7% –semelhante ao da Rússia. Na segunda economia da zona do euro, as famílias fundadoras de grandes marcas de luxo, como a L'Oréal, construíram fabulosas fortunas apesar de todas as guerras e mudanças políticas. Em muitos casos, as bases que permitiram essa acumulação foram lançadas já na época napoleônica.
A Alemanha, por sua vez, quase não está oligarquizada. É certo que nesse país também existem enormes fortunas familiares, como a de Dieter Schwarz, estimada em 22,9 bilhões de dólares (9,6 bilhões de reais). Mas mesmo o patrimônio do dono das redes de supermercado Lidl e Kaufland só atinge um fator de 0,66%. Ainda assim, Schwarz é um "oligarca" maior que Jeff Bezos nos EUA. Em termos estritamente percentuais.
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