terça-feira, 1 de março de 2016

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Será Dilma o bode expiatório da crise brasileira?

Os analistas políticos concordam cada vez mais sobre a necessidade da sociedade brasileira de resolver a crise através de uma catarse coletiva, que implicaria, segundo a psicologia e a antropologia, a escolha de um bode expiatório no qual descarregar todas as frustrações. Seria a presidenta Dilma Rousseff a possível escolhida? Ou seria o ex-presidente Lula, para citar as duas personalidades mais emblemáticas da política brasileira?

“Se há uma palavra que o Brasil necessita é catarse”,escreveu Juan Onís neste jornal. Uma catarse capaz de expulsar seu mal-estar social e aliviar as tensões do grupo.

Analistas políticos afirmam que a crescente irritação produzida pelo aumento dos casos de corrupção que salpicam as mais altas esferas da política, do Governo e do empresariado poderia gerar a necessidade de recorrer a um bode expiatório com seu mecanismo de “culpa deslocada”, transferida por meio de um rito de expiação.

O mecanismo de transferência de tensões e culpas de uma família ou coletividade, através da escolha de alguém que é feito responsável por elas, não supõe a total inocência do grupo. O bode expiatório tampouco é sempre merecedor de arcar com o peso de todas as culpas.

Com esse rito de expiação, a sociedade pode desencadear sentimentos narcisistas de superioridade moral. A culpa seria apenas do sacrificado no altar das vítimas.

No caso concreto do Brasil, essa mesma sociedade que, segundo os especialistas, estaria buscando um bode expiatório, poderia se perguntar se ela também não é culpada por seus silêncios do passado frente à corrupção e sua condescendência com os piores políticos a quem sempre reelege.

Lembram-se da pergunta inquietante de anos atrás (“Por que não há indignados no Brasil?”), enquanto as praças de outros países se enchiam de manifestantes exigindo a renovação da velha política.

A vítima escolhida como bode expiatório costuma ser a pessoa mais vulnerável do grupo, que acaba aceitando sua missão salvadora, mas também pode ser escolhido um sujeito ativo e até mesmo altaneiro, que nunca aceitaria sua condição de vítima. Nesse caso, a condição seria imposta pela comunidade.

Se os analistas estão certos, parece evidente que esse rito expiatório, que atenuaria a tensão e produziria uma catarse, seria a saída da presidenta Dilma.

Neste momento, é a pessoa que apresenta, de fato, maior tendência de solidão e isolamento. Sua aprovação popular é das mais baixas na história dos presidentes; boa parte dos que votaram na reeleição hoje se diz arrependida. Existe a crença de que ela mentiu para poder se reeleger, ocultando os problemas que o país já sofria. Está a ponto de ser abandonada por seu partido, como ficou claro quando não quis comparecer à comemoração do trigésimo sexto aniversário de sua fundação. O PT, que a elegeu, apresentou um programa econômico oposto ao do Governo.

Talvez seja a primeira vez que um presidente da República se vê estigmatizado por seu próprio partido, enquanto a maior formação da coalizão governista, o PMDB, exibiu ao país um programa de propaganda eleitoral de oposição e quase de ruptura com o Governo. Quem restou para apoiá-la?

Dilma é consciente de que tudo caminha para que ela seja o bode expiatório que deveria ser sacrificado para apaziguar a sociedade irritada e descontente. Daí suas repetidas frases apelando à sua inocência, à sua retidão ética, ao “não tenho contas na Suíça”, embora hoje essa afirmação venha manchada pela detenção de seu marqueteiro e assessor de todas as horas, João Santana, e de sua esposa, que tinham contas ocultas na Suíça que talvez serviram, com ou sem conhecimento de Dilma, para ajudá-la a se reeleger.

O “se”, o “como” e o “quando” a presidenta poderia se ver obrigada a deixar o poder é um longo caminho, político e judicial, que poderá ser melhor conhecido com a adesão ou não da sociedade ao protesto convocado para o dia 13, com a participação de partidos da oposição, para pedir sua saída da Presidência.

A espada de Dâmocles continua ameaçadora sobre a cabeça de Dilma. Será ela capaz de sair ilesa da batalha, como já fez outras vezes? O problema é que não depende só de sua tenacidade, nem sequer de sua suposta inocência, e sim da constatação coletiva de que, com ela, o país poderá seguir ingovernável e cada vez mais empobrecido.

Os que ainda a defendem chamam isso de “golpe”. Para a psicologia, é “uma transferência de culpa por meio de um rito expiatório”.

Onde ficaram os velhos sonhos de um Brasil que acreditava ter alcançado o futuro, mas que ainda se vê preso num presente cada vez mais incerto e obscuro?

O que o Príapo da república pixuleca teme é a nossa liberdade

Se for necessário, se vocês entenderem que a manutenção do projeto corre risco, estarei com 72 anos e tesão de 30 para ser presidente da República”. 
Como Hilda Hilst, quero brincar de ver beleza nas coisas, numa resistência ao vício do jeca em enfear tudo com esse priapismo vigarista.

“Vocês” se refere à escumalha militante no aniversário flácido do PT; o caudilho não se importa com o tesão da nação, se ela está no clima ou não. E ela não está. Ou está sim, mas não com o fauno grotesco. O “não” que ela tem lhe dito, traduzido em pesquisas e que temos de reafirmar no dia 13 de março, soa como charminho golpista para o macho mais incivilizado da história da política brasileira. Claro, ele só satisfaz as deformações da libido autoritária no primitivismo, pois dar no couro como democrata que é bom, esqueça.

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Julga o estado de direito democrático uma preliminar dispensável, de tal modo que a tentativa de bolinar a Polícia Federal via Ministério da Justiça, as espertezas para não encarar o procurador Cassio Conserino e as ameaças transmitidas por eunucos morais de convulsionar o país se a Justiça cumprir o dever evidenciam não só a impossibilidade de atestar uma honestidade fictícia, mas sobretudo a percepção do jeca como alguém cuja conduta não há parâmetro ou ser terrenos ou divinos dignos de avaliar.

É mais do que estar acima da lei, nessa condição se pretendem Cunha, Calheiros, o casal marqueteiro – ao Priapo da república pixuleca sequer ocorreu que um dia seria necessário invocar o status que acredita inerente. Não sei que parte do “não” ele ainda não entendeu, mas a nação pode deixar ainda mais claras a consoante e as duas vogais no dia 13.

Não é só pelo fim de um governo cuja remoção é indispensável para o Brasil se reconstruir, ter a si como assunto e projeto, é também pela defesa das investigações, da Política Federal, do Ministério Público, contra o qual Lula tenta um estupro bolivariano enquanto mente que “lutamos” para tê-lo forte, “e não fazendo o jogo da Veja”. Ora, o jogo da revista é o do país que presta, como no fundo sabem ressentidos que apregoam, nas redes sociais, uma súbita sedução da revista pelo PT e convencem gente chegada a uma conspiração de boteco virtual.

Pesquisas mostram que Eduardo Cunha na presidência da Câmara desanima muitos brasileiros a irem para as ruas defender o impeachment, numa lógica desossada determinando que, por não se remover um patife menor, preserva-se o maior; além do tal não-adianta-nada. Por favor, não há mais território para esses medos e, conforme ensinou Nietzsche, do outro lado do medo está a liberdade. O que o jeca teme é nossa liberdade, é descobrirmo-nos livres – apesar de Cunha e do que mais for – para brincar de ver a beleza em mandar para a cadeia um garanhão tosco de alma senil porque para ele (parafraseando Roberto Freire), com ou sem tesão, não há solução. Um beijo

Lula, o mais honesto do mundo, deveria erguer as mãos para o céu

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está por aí, a derrubar ministros, pintando e bordando, mas deveria, por enquanto ao menos, ser grato à Força Tarefa e a Rodrigo Janot em particular. No que lhe diz respeito, a coisa está saindo é muito barata, não é mesmo?

Lula é, por enquanto, um quase-investigado. E, para ficar nos termos de sua turma, há uma apuração, chamemos a coisa assim, envolvendo seu nome em razão de um apartamento “fubango” — que foi como Marco Aurélio Garcia classificou o tríplex — e um sítio até modesto, quando a gente leva em consideração o tamanho do gigante.

Na madrugada desta terça-feira, a estrada que dá acesso ao sítio Santa Bárbara, em Atibaia — aquele que Lula diz ter ganhado “de presente” de Jacó Bittar — amanheceu pichada. Com se vê na foto acima, de Avener Prado (Folhapress), os manifestantes escreveram “SÍTIO DO LULA LADRÃO” e, segundo informa reportagem da Folha, também “LULA NA CADEIA”. Tempos difíceis para o companheiro.
A estrada que dá acesso ao sítio Santa Bárbara, em Atibaia — aquele que Lula diz ter ganhado “de presente” de Jacó Bittar —, amanheceu pichada. Os manifestantes escreveram “SÍTIO DO LULA LADRÃO” e, segundo informa reportagem da Folha, também “LULA NA CADEIA”.

Em manifestação ao STF, afirmaram os procuradores da Lava Jato:
“No que tange ao PIC [Procedimento Investigatório Criminal] conduzido pelo MPF, as provas em cognição sumária são no sentido de que os fatos sob apuração, além de reproduzirem tipologia criminosa de lavagem de capitais já denunciada no âmbito da Operação Lava Jato, envolvem José Carlos Bumlai, executivos da construtora Odebrecht e executivos da construtora OAS, todos investigados e muitos dos quais já denunciados no esquema de corrupção que assolou a Petrobras”.
E se informa, então, que se apura se parte de vantagens indevidas foi recebida por Lula no exercício do mandato.

Lula nega que o apartamento seja seu. Para o sítio, ele arranjou a mais exótica de todas as justificativas: teria sido um “presente” de seu amigo e ex-sindicalista Jacó Bittar, embora a propriedade esteja no nome de Fernando Bittar (filho de Jacó) e Jonas Suassuna, ambos sócios de Fábio Luís da Silva, o Lulinha. Os demais presentes, das empreiteiras, vieram depois. Até uma antena 3G foi posta no local pela Oi. Presentes.

O ex-presidente deveria é dar graças a Deus. Eu até hoje não entendi por que não existe um inquérito para investigar a sua atuação no empréstimo de dinheiro que o grupo Schahin fez ao PT, que teve José Carlos Bumlai como laranja. Quando a dívida estava em R$ 60 milhões, o grupo assinou um contrato de US$ 1,6 bilhão para a operação do navio-sonda “Vitória 10.000”, da Petrobras. E o passivo com o partido foi perdoado. Duas delações premiadas — a de Nestor Cerveró e a de Fernando Baiano — asseguram que Lula sabia de tudo. Salim Shahin, um dos diretores do grupo, admite a relação de troca. Bumlai assume que foi laranja — o mesmo Bumlai que, segundo Lula, resolveu por conta própria reformar o tal sítio que pertenceria aos amigos de Lulinha… Tenham a santa paciência.

Lula sabe que a história não cola. A pesquisa Datafolha deixou isso muito claro. Mas ele também não tem alternativa. Mais uma vez, ele já avisou que não vai depor ao Ministério Público Estadual. Quando se chegou a pensar que poderia haver condução coercitiva, seus advogados decidiram até entrar com pedido de habeas corpus preventivo.

Ora, ele tem consciência de que se negar a depor prejudica um pouco mais a sua reputação. Mas, nesse caso, meus caros, trata-se de escolher, do seu ponto de vista, o mal menor.

A cabeça de Lula deve estar presa a uma espécie de nó. Depois de tudo, como é que ele se tornou referem de um apartamento “fubango” e de um sítio que, se fosse seu também não papel, não geraria estranhamento nenhum — desde, é claro, que não houvesse os favores de duas empreiteiras e de uma empresa de telefonia?

Lula deve supor que o homem mais honesto do mundo, que é o que diz de si mesmo, não precisaria ter receio de falar aos promotores de São Paulo. E por que ele não fala, então?

PT ataca a ruína que ajudou a produzir

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Hoje, reduzido à condição de organização partidária com fins lucrativos, o Partido dos Trabalhadores, 100% financiado pelo déficit público, virou a principal evidência de que o poder longevo pode levar qualquer agremiação a atingir a perfeição da ineficiência impudente. Com os ideais dissolvidos em corrupção, o PT dedica-se a desfazer o que ele mesmo fez. É um caso raro de autodissolução 
Josias de Souza

Entrevista comigo mesmo

Oi, Arnaldo, tudo bem?

– Tudo bem, Arnaldo....

– Por que esta entrevista consigo mesmo?

– É que eu não estou entendendo mais nada do país nem de mim mesmo. É a crise na alma. Preciso saber quem eu sou. Ando numa recessão mental.

– Por quê?

– Porque recessão causa recessão mental. Esses caras, além de arrasarem nossa infraestrutura econômica, acabam também com nossa infraestrutura psíquica.

– Você lembra como era o Brasil?

– Sim. Era uma merda. Sempre foi, mas havia um doce panorama de ilusões que nos mantinha vivos. Eram ilusões ingênuas, mas simpáticas; havia uma precariedade poética, havia um sonho de futuro, mesmo bobo. Um dia, eles chegaram – como uma porcada magra que invade o batatal –, acabaram com nossas esperanças e não puseram nada no lugar. A catástrofe do governo do PT, ironicamente, acabou com nosso sonho de futuro em nome de um “futuro” inventado por eles, chupado das cartilhas leninistas que mal leram. Transformaram Marx em bolivariano. 


A minha tristeza é que minha geração sempre teve um “fim”. Não conseguíamos raciocinar sem alguma finalidade histórica ou política, sempre em busca de uma felicidade romântica, que acenava para um futuro de paz e harmonia.

– Você é um babaca, Arnaldo...

– Sou sim, xará, nós dois somos babacas românticos finalistas, sem dúvida, mas, veja um exemplo da loucura dessa gangue: os comunas que entraram no poder eram radicalmente contra o chamado “imperialismo norte-americano”. Aí, nos trancaram num nacionalismo burro, bolivo-brizolista e estatizante. Falimos. Resultado: o imperialismo norte-americano agora chegou, comprando nossa indústria sucateada por preço de banana. Dilma e PT sempre quiseram acabar com o capitalismo. Pois é... Conseguiram! O PT nos trouxe o imperialismo!

– Para de sofrer, Arnaldo...

– Não consigo. Não posso ver o país sendo destruído, nem por guerra, nem por catástrofes naturais inesperadas, mas pela estupidez. O Brasil está sendo destruído pelos delírios primitivos de um bando de idiotas. Suas neuroses pautam o país. Nem falo da roubalheira, mas da bobagem. Vejam a cara do Rui Falcão, por exemplo. Vejam ali a insistência no erro, querendo refazer a política que nos ferrou. E não nos deixam fazer nada, nem reformas, nada. Os petistas, cutistas e petrolistas não deixam. Ou seja, f*&#ram com tudo e não deixam consertar. É uma cag*da com perda total. 

Agora sou obrigado a pensar o insolúvel, a escrever sobre o que fazer com o país e ainda ter de ouvir de intelectuais idiotas que “Lula nos trouxe inegáveis avanços sociais”. Que avanços? O Bolsa Família, agora com correção monetária? Avançaram na Petrobras e fundos de pensão, isso sim. Os avanços sociais foram só para os milhares de petistas aparelhados nas frestas do Estado.

– Você também está muito pessimista...

– Já passei por inúmeros sintomas, para ver se me salvava a cuca.

Já fui obsessivo (“tenho de ajudar a salvar esse país com meus artigos!”). Passei pelo masoquismo... (“tenho mais é de sofrer mesmo, a culpa é de todos nós”).

Cheguei ao narcisismo assumido... (“quer saber? F&*dam-se; vou cultivar meu jardim”). Fiquei ansioso, tive arritmia, pensamentos invasivos e até com a namorada na cama fico pensando no PMDB. Pode?

– Como foi mesmo seu pesadelo outro dia? Conte para os leitores.

– Eu fugia de um enorme urubu que me perseguia em voos rasantes; quase me bicava e era a cara do Cunha, mas depois mudava para a cara do Temer, usando a linda cabeleira branca do Delcídio. Eu corria e me via diante das cúpulas do Congresso que tinham virado umas bolhas de gelatina verde e amarela que tremiam e afundavam para os plenários sob uma chuva de perucas acaju e bigodes nordestinos, e um grande pixuleco do Lula rodopiando ali na praça dos 3 Poderes. Acordei entre o medo e um alívio vingativo.

– E aí?

– Aí, continuou o pesadelo acordado. Vi programas políticos com as horrendas carantonhas dos candidatos mentindo, enquanto meninos miseráveis fazem malabarismo nos sinais de trânsito, enquanto cariocas de porre falam de política, e paulistas de porre falam de mercado, com o Estado loteado por pelegos.

Deprimo quando vejo a militância dos ignorantes, a burrice com fome de sentido, balas perdidas acertando crianças, imagens do rio São Francisco com obras paradas e secas sem fim, o trem bala de bilhões atropelando escolas e hospitais falidos, caixas de banco abertas à dinamite, declarações de pobres conformados com sua desgraça na TV.

– E aí? – repito para mim mesmo.

– Eu só consigo pensar em fantasias de vingança. Fantasio que sou do “esquadrão da morte aos políticos”. Já imaginei que invadia o Congresso, vestido de homem-bomba, e explodia o Conselho de Ética. Mas, como bom bipolar, vario para baixo e tenho vontade de entrar num grande buraco e ficar sem os cinco sentidos: não ouvir as negaças dos advogados, não ver a cara do Lula fingindo tranquilidade, não sentir o tato na mão ansiando para dar bofetadas, não quero sentir gosto de merda na boca, não quero ter olfato para o cheiro da lama que escorre em Brasília. Isso – eu quero o nada, nessas horas: os cinco sentidos apagados, e eu vagando no espaço sideral de minha mente. Ando na rua em busca de brasilidade e vejo que há algo muito inquietante nas multidões deprimidas.

– Como assim? – pergunto-me como nos diálogos de maus filmes.

– É que antes havia uma naturalidade mínima na vontade popular. Hoje só vemos projetos desencontrados, sonhos impossíveis, desejos sem rumo, entusiasmos banais.

A crise atinge a todos, menos a duas camadas da sociedade: os muito ricos e os muito pobres. Uns pairam em Miami de bermudas, enquanto os miseráveis nem sabem de crise alguma, pois já vivem no alívio da desesperança.

– Afinal, o que descobriu sobre você, xará?

– Estou de saco cheio de mim mesmo, dessa minha esperançazinha “démodé” e iluminista de articulista do “bem”, impotente diante do cinismo vencedor de criminosos políticos. A única solução é o PT sair. É impossível, é insuportável isso durar mais três anos.

– Em suma, você quer o impeachment?

– Sim.

A hora é agora

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Vivemos uma quadra histórica decisiva. Retirar Dilma Rousseff do Palácio do Planalto é um imperativo de sobrevivência para o nosso país. E esta é a hora. Afastar Eduardo Cunha da presidência da Câmara é o primeiro passo para viabilizar o impeachment. Sua permanência é um elemento que enfraquece a legitimidade de todo o processo. É absurdo um réu no Supremo Tribunal Federal conduzir uma ação de moralização da coisa pública. Sem esquecer que ele desmoraliza também a ação que corre no Tribunal Superior Eleitoral, que pode anular o pleito de 2014 e convocar novas eleições em 90 dias. Quem assume, neste caso, a Presidência da República? Eduardo Cunha. Diria Bussunda: “Fala sério!”

Depois de hibernar por um decênio, a oposição acordou. Criou um comitê pró-impeachment suprapartidário com participação da sociedade civil. Mobilizou seus parlamentares e as estruturas partidárias. Assumiu o compromisso de ir — finalmente! — às ruas. E serão as manifestações populares que vão dar a temperatura para a luta parlamentar. A ponte entre o Parlamento e as ruas é essencial para o sucesso do impeachment: é a conexão da cidadania com seus representantes. Daí a importância de cada brasileiro acompanhar como votará o seu deputado no momento da autorização da abertura do processo do impeachment.

Já o empresariado continua em silêncio. Registre-se a honrosa exceção da Fiesp, que, em dezembro do ano passado, se manifestou em defesa do impeachment. As outras federações estaduais ficaram caladas. A CNI fez cara de paisagem. As entidades vinculadas ao agronegócio, os banqueiros e representantes do setor terciário da economia, até agora, se omitiram. Isto em plena recessão de -4% em 2015 e, provavelmente, também em 2016, podendo se aproximar de -5%. Em meio à depressão, os dirigentes empresariais optaram por coonestar, através do silêncio, a “macrodelinquência governamental,” tão bem definida pelo ministro Celso de Mello. Estão descolados de suas bases, pois os reclamos são diários. Agem como os velhos pelegos, usufruem das benesses dos sindicatos e das associações — aguardam a solução da crise de braços cruzados e de costas para seus representados.

O brilhante trabalho da 13ª Vara Federal do Paraná não pode ser o principal — e quase único — instrumento de moralização da coisa pública. A Justiça está fazendo o seu papel. Agora cabe aos políticos tomarem a liderança do processo, rompendo com a inércia e não ficar esperando — oportunisticamente — o desgaste do governo, pois, assim como o hábito não faz o monge, a crise, por si só, não levará a queda do petismo.

O governo não governa. Está paralisado — assim como o país. Dilma Rousseff não tem mais qualquer capacidade permanente de interlocução com o Congresso e nem com os setores empresariais. Com a sociedade em geral, nem se fala. É um zumbi. O isolamento é tão patente que inclui o seu próprio partido, o PT. Seus principais ministros — como o da Fazenda ou da Casa Civil — desapareceram do noticiário.

A presidente se sustenta no vazio e aprofunda o desastre econômico. Perdeu a capacidade de governar. Quanto mais cedo sair, melhor para o Brasil. Não há mais qualquer possibilidade de que possa politicamente se recuperar. A agonia do PT não pode ser a agonia do Brasil.

Desde já é fundamental construir as condições de governabilidade, dar previsibilidade ao Brasil pós-PT. Esta é uma tarefa muito importante. Apesar de ser tão evidente, cabe demonstrar, especialmente aos agentes econômicos, que a manutenção de Dilma Rousseff à frente da Presidência da República significa a permanência do caos econômico-financeiro e, mais ainda, sem perspectiva, a médio prazo, de saída para a crise que vivemos, a mais grave da história republicana.

A busca de um consenso, abrindo condições para um curto mandato presidencial, aproxima-se do cenário de 1992, quando da crise que levou à renúncia de Fernando Collor. Porém, hoje, a conjuntura é mais complexa. Michel Temer não é Itamar Franco — inclusive, Temer, pode ser cassado pelo TSE. Projeto pessoais — mais que partidários — obstaculizam a construção de um governo de transição. A necessidade de que o novo governo adote medidas econômicas urgentes — e, nem sempre populares — é mais um complicador. O receio — exagerado — de que o PT na oposição saia fortalecido não passa de uma falácia. Hoje, o problema central do PT é com a Justiça e não com a política — e só não teve cancelado o seu registro partidário, como dispõe a lei 9.096/95, artigo 28, inciso III, porque o TSE é leniente com o crime eleitoral.

A solução política da crise não pode — novamente — frustrar os brasileiros. É essencial que as instituições efetivamente funcionem. E para isso a punição dos responsáveis pelo petrolão é fundamental — mesmo que, entre eles, possa ter um ex-presidente da República. Não é mais possível aceitar uma conciliação que ignore os valores republicanos, que rasgue a Constituição.

O processo iniciado com a redemocratização, em 1985, está incompleto. São absolutamente incompatíveis democracia e petrolão. O estado democrático de direito não pode ser o apanágio dos corruptos, como nos últimos 30 anos. Identificar as mazelas brasileiras é somente um momento neste movimento. Cabe construir as condições para que a administração da coisa pública saia do noticiário policial e volte às páginas de política. O primeiro passo é retirar Dilma Rousseff e o projeto criminoso do poder. E quanto mais rápido, melhor. Só há um grande interessado em postergar a solução da crise: é o PT.

Marco Antonio Villa

Um Verão inesquecível

Hoje estão sob investigação a presidente e o vice; três ex-presidentes da República; presidentes do Senado e da Câmara e mais 25% dos deputados e senadores


Nunca houve um fim de verão como este. Na chegada das águas de março, assiste-se à perplexidade da elite política brasileira com o inédito e incômodo desafio de provar sua inocência.

Neste 1º de março estão sob investigação em tribunais e delegacias de polícia: a presidente Dilma Rousseff e o vice Michel Temer; três ex-presidentes da República (Lula, Fernando Henrique Cardoso e Fernando Collor de Mello); os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Eduardo Cunha, e mais 25% dos senadores e deputados federais.

As acusações têm natureza diversa. Assim, não é recomendável comparar os casos de Dilma e Collor, nem o de Lula e Fernando Henrique. Em telas de Botticelli ou Dalí, por exemplo, eles habitariam diferentes círculos, vales e esferas do inferno — da luxúria à fraude, no caos ordenado e bem-humorado de Dante Alighieri em “Divina comédia”.

Em Brasília, amanhã, o Supremo Tribunal Federal começa a decidir se o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, será processado por corrupção e lavagem de dinheiro subtraído dos cofres da Petrobras, a maior entre companhias estatais e de capital aberto no país.

A tendência é Cunha virar réu e, nesse caso, o Supremo precisará decidir sobre o seu afastamento da presidência da Câmara. Ele é o primeiro na linha de sucessão presidencial, depois do vice-presidente Michel Temer. Se o STF afastar Cunha, haverá eleição imediata do substituto na Câmara, porque “a República não pode ficar banguela na linha sucessória”, lembra o deputado Miro Teixeira (Rede-RJ).

Também amanhã abre-se uma etapa decisiva em Curitiba, 1.400 quilômetros ao sul do Planalto. O juiz federal Sérgio Moro começa a escrever a sentença sobre o caso de Marcelo Odebrecht, acionista e ex-presidente, e de diretores do Grupo Odebrecht, líder entre as empreiteiras de obras públicas. São acusados de corrupção, lavagem de dinheiro e financiamento ilegal de campanhas eleitorais para obter R$ 7 bilhões em contratos com a Petrobras.

No próximo dia 17, completam-se dois anos de investigação sobre as estranhas transações desse condomínio de poder, que partilhava o Orçamento da União, planos de investimentos das empresas estatais e acesso privilegiado às reservas financeiras líquidas dos fundos de pensão e bancos públicos, como o BNDES.

O inquérito levou, até agora, 179 pessoas ao banco dos réus. Dissolveu uma era de delírios político-empresariais. E lançou no limbo uma presidente recém-reeleita. Hoje ela anuncia o centésimo ministro em cinco anos. Na melhor hipótese, seu governo deve atravessar o próximo triênio arrastando correntes entre o Palácio da Alvorada e a Praça dos Três Poderes, em Brasília.

Ironia da história: as 84 sentenças já proferidas, cujas penas somam 825 anos de prisão, foram escritas numa corte da outrora Nossa Senhora da Luz dos Pinhais de Curitiba, vilarejo formado à volta de um pelourinho plantado três séculos e meio atrás pelo sertanista Gabriel de Lara. Era o símbolo de sua autoridade na defesa dos interesses do Erário português sobre a lavra de ouro.

José Casado

Lula inicia o golpe do bonapartimo civil: preparem-se

“Vão ter que me enfrentar na rua”, estabeleceu Lula em discurso-desabafo na festa de aniversário do PT.

Sabem o que isso quer dizer?

Lula vai peitar o MPF, o MP paulista e a Lava Jato, que o investigam. Vai peitar nas ruas, com massa de manobra.

É um velho golpe dos caudilhos esse: atacar as instituições de direito com massa física, disposta a tudo nas ruas.

Lula está anunciando um golpe bonapartista.

O termo “bonapartismo” é classicamente empregado na obra O 18 de Brumário de Luís Bonaparte, escrito entre dezembro de 1851 e março de 1852 , e publicado originalmente por Karl Marx na revista Die Revolution.

Marx, chamado derrisoriamente pela sua mulher, Jenny, de The Old Nick ( o velho satanás) escreveu:
“A tradição de todas as gerações mortas pesa sobre o cérebro dos vivos como um pesadelo. E mesmo quando estes parecem ocupados a revolucionar-se, a si e às coisas, mesmo a criar algo de ainda não existente, é precisamente nestas épocas de crise revolucionária que esconjuram temerosamente em seu auxílio os espíritos do passado, tomam emprestados os seus nomes, as suas palavras de ordem de combate, a sua roupagem, para, com este disfarce de velhice venerável e esta linguagem emprestada, representar a nova cena da história universal”.
Nosso espírito do passado é o bonapartismo brazuca.

Usado por FHC e Maria Victoria Benevides para definir Jânio Quadros, o termo “bonapartista” é uma referência a dois golpes de Estado: o de Napoleão Bonaparte em 1799, que descartou as conquistas republicanas da Revolução Francesa e instaurou um governo ditatorial, e o de seu sobrinho Luís Napoleão em 1851, quando era presidente da República proclamada em 1848.

O bonapartismo ocorre quando a autoridade do líder se articula a um partido de massas que intervém em todas as esferas da sociedade civil: sindicatos, associações patronais, grupos de jovens e de mulheres.

É o mundo sobre o qual o PT entesourou apoio.

É o que Lula vai fazer agora: preparem-se.

Pau que dá em Chico

... dá em Francisco. A política brasileira atual confirma este dito popular. A cena é corriqueira na Câmara dos Deputados: à direita do plenário, oradores do PSDB e do DEM se sucedem, denunciando os escândalos do petrolão, recordando o mensalão e pedindo explicações ao ex-presidente Lula sobre obras no triplex do Guarujá e no sítio de Atibaia, que ele jura que nunca foram seus.

À esquerda, oradores do PT, do PC doB e Sílvio Costa, o mais intimorato dos governistas, ex-PTB e ex-PSC (nem sei em que partido está agora), relembram o escândalo do trensalão e do merendão, e pedem explicações ao ex-presidente FHC sobre o pagamento de pensão à jornalista (cujo filho assumiu) através da empresa Brasif, que ele jura que jamais aconteceu.

No centro do palco, presidindo os trabalhos, o impávido Eduardo Cunha, do PMDB, que deve se tornar réu no STF esta semana, acusado de corrupção passiva, recebimento de propina e lavagem de dinheiro. Sua Excelência nega tudo.

Debate (Foto: Arquivo Google)

No roteiro em que sujo fala do mal lavado, é evidente que os volumes dos desvios são mais pesados sobre os ombros do PT, que está no governo desde 2003. Mas a ética pública também foi bastante sovada em épocas anteriores. Combater a corrupção sistêmica, estrutural, é um imperativo que poucos assumem, tantos são os rabos presos. Tem razão meu velho amigo Aldir Blanc, em seu artigo “Máscaras e cinzas”, publicado em O Globo no último domingo. Reclama ele que esse Fla-Flu “é Fla-Fla, só um time joga, dá pontapés. (...) não acontece nada com os crapulosos tucanos”. E acrescenta, no seu estilo ferino, sobre uma eventual prisão de Lula: “se ele for criminoso, tudo certo, mas, em nome da decência, prendam o Azeredo, a quadrilha do Paraná, os espancadores de esposas”...

“O mal de certos políticos não é a falta de persistência, mas a persistência na falta”, já dizia o grande Barão de Itararé. Tem razão o Apparício: mesmo com a prisão do marqueteiro João Santana e o recrudescimento da crise do governo, o assunto predominante nos elevadores privativos dos deputados tem sido... pescaria! Sim, só se fala em “fisgar peixes com boa isca” ou “manter os samburás bem fechados, para não perder os seus”. Com a janela do troca-troca aberta, trata-se de conquistar deputados para suas legendas. Paulinho da Força, dono do Solidariedade, comentou que “passe” de deputado está valendo R$ 3 milhões! Dizem que um dos que mais conquistarão Excelências é o PP, atingidíssimo na Lava Jato.

Estamos mesmo no fundo do poço. Que ele seja o ponto de partida para darmos o impulso que tirará o país do buraco tenebroso em que está.

Chico Alencar

Treze razões para perseguir o PT


O pessoal mais à esquerda diz que o Partido dos Trabalhadores está sendo perseguido. Sim. Está sim. Abaixo, enumero treze razões pelas quais a maioria dos protestos, das ações policiais e dos processos judiciais terem como alvo o PT e seus líderes.

Samba de uma tecla só

1° – É o PT, não outro partido, que ocupa a presidência da república há 13 anos;

2° – Foram Lula e Dilma que assinaram a desastrosa política econômica que resultou no maior período de recessão da história brasileira;

3° – Todas as alianças partidárias que mantiveram a base de apoio ao governo partiram do PT;

4° – O monstruoso aparelhamento do estado é resultado dessas alianças, o que faz do PT corresponsável por cada pessoa nomeada por outros partidos para ocupar cargos em empresas e instituições públicas.

5° – Os maiores fundos de pensão de empresas estatais são administrados por pessoas indicadas pelo PT e em função de interesses políticos e ideológicos, tornando o partido diretamente responsável pelo rombo de dezenas de bilhões de reais.

6° – Os principais casos de corrupção que estão sendo desvendados pela polícia têm como beneficiário final o PT, principalmente Lula e Dilma, cujas campanhas eleitorais foram bancadas com dinheiro de corrupção.

7° – Apenas a presidência da república tem poder para fazer do BNDES, da Caixa Econômica e do Banco do Brasil ferramentas políticas, utilizando esses bancos para favorecer empresas e militância alinhadas ao PT.

8° – Foi o PT, não outro partido, que fez da Petrobrás uma ferramenta política de intervenção econômica, representado preços e privilegiando empresas em função do projeto nacionalista que causou atual crise econômica.

9° – Projetos como os da Usina de Belo Monte, da Transposição do Rio São Francisco e de refinarias, entre outros, todos ainda em construção e que já consumiram o dobro ou o triplo do orçamento original, foram idealizadas, anunciadas, financiadas e festejadas por Lula e Dilma.

10° – Foi o PT, não outro partido, que empenhou grandes esforços políticos e financeiros para a realização da Copa do Mundo, facilitando todo tipo de esquema obscuro para a construção dos estádios, cuja metade, hoje, se encontra sem uso.

11° – Foram Lula e Dilma os responsáveis por todos os acordos do Brasil com regimes autoritários e que resultaram em grandes prejuízos à sociedade brasileira.

12° – É o PT, não outro partido, que se vangloria de ter acabado com a pobreza e de ter melhorado a educação, a saúde e a segurança dos brasileiros, sendo que a realidade ao nosso redor é completamente diferente.

13° – Lula tornou-se alvo de operações da Polícia Federal e do Ministério Público porque delatores citam seu nome; porque grande parte das pessoas investigadas, indiciadas e presas eram diretamente ligadas a ele; porque diversas movimentações financeiras das empresas incriminadas passam pelas empresas de fachada de seus filhos; porque o apartamento em Guarujá e o sítio em Atibaia indicam que tais imóveis eram utilizados por ele mesmo, não por mim, nem por você leitor, nem pelo Aécio Neves, nem pelo Fernando Henrique Cardoso, nem por Jair Bolsonaro, nem pelo Donald Trump; e que as obras nesses imóveis foram realizadas pelas mesmas construtoras acusadas de terem sido beneficiadas em contratos com o governo.

Com toda a certeza, o crescente movimento de direita brasileiro adoraria jogar o PSDB e o Aécio Neves no mesmo saco onde estão os petistas, porém, para cada tucano citado por um delator, existem dezenas de citações, indícios e provas contra petistas. Os casos de corrupção envolvendo o PSDB restringem-se as esferas estaduais, que não tem poder de desmantelar a economia do país como os casos organizados pelo PT na esfera federal.

Devemos considerar também que o próprio PT, através de seus líderes e militantes, até pouco tempo atrás vangloriava-se de que “nunca antes na história do Brasil” a corrupção havia sido tão combatida. Esse discurso foi deixado de lado na medida em que as operações da Polícia Federal se aproximavam de Lula e indicavam que a campanha de Dilma à reeleição foi bancada com dinheiro sujo. Agora, os petistas assumidos ou não, dizem que há uma grande conspiração das “elites econômicas” contra o partido. Não há. Até porque, os maiores bancos e as maiores empresas do país apoiam o atual governo. A realidade é que “nunca antes na história do Brasil” um partido organizou e se beneficiou de uma rede de corrupção tão grande em valores, em tamanho e com consequências tão prejudiciais à sociedade.

Portanto, o Partido dos Trabalhadores, Lula e Dilma devem, sim, ser o foco de nossa luta.

Na incapacidade de se combater todos os inimigos (PSDB, PSOL, PMDB, PCdoB, PP, DEM etc) numa única luta, precisamos enfrentar um inimigo por vez e a partir de suas responsabilidades. Por ter a seu serviço um exército de militantes e uma gigantesca máquina de propaganda financiada com dinheiro público, o Partido dos Trabalhadores é o inimigo que mais nos ameaça. É o inimigo que devemos hoje, agora, destruir.

Quando outro inimigo assumir o governo, iniciaremos outra luta.

Todos querem mudança

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As sociedades latino-americanas sempre foram muito controladas. Agora já não bastam o subsídio, a política paternalista, os caudilhos, o populismo. (...) As pessoas querem o fim da corrupção, que a representação seja mais ampla, mais igualdade perante a lei. Atinge a esquerda, mas não é ela a responsável. A causa é o desenvolvimento tardio da democracia. 70% da população da América Latina diz que a democracia não trouxe garantias sociais, acesso à moradia, saúde, educação. 
Marta Lagos, diretora há 20 anos do Latinobarómetro

Monopólio e crise dos jornais?

No Seminário O Papel do Jornal, havido em Brasília, em 27 de novembro de 1996, o jornalista Alberto Dines declarou que a imprensa vive uma de suas maiores crises de identidade; está debilitada pela TV e pelos que apregoam o ajustamento do jornalismo impresso aos padrões do telejornalismo. Temerosa da ameaça da melhoria tecnológica, que promete atingi-la na própria estrutura, vai caindo no vício da leviandade e cresce em arrogância.

E desfila as razões. Aponta a imensa concentração das empresas do ramo em mãos de pouca gente, com a queda do pluralismo e do exercício democrático no processo da informação. Liberdade de expressão é singularmente plural. “A liberdade de expressão pressupõe a existência de contrastes entre os emissores, pressupõe a variedade de opções, a multiplicidade de opiniões, a diversidade de comportamentos que vêm sendo progressivamente eliminados pelo solerte processo de copiagem, imitação, homogeneização e equalização”, disse.

As empresas caíram e vão caindo na posse de gente desligada de compromisso com a cultura. Editoras de jornal se lançam na exploração da TV, e disso resulta desastre em um e em outro campo. Surgiram cartéis internacionais de informação, mantidos pelo dinheiro do capitalismo selvagem, com suas ações-lixo, que atingiram extraordinário valor e se precipitaram no vazio do crime. Em informação coletiva, vigora a legenda “do nada se cria, tudo se copia”. Órgãos de informação exercitam deslavado modismo e praticam copiagem, imitação. É a ressurreição da Gillete Press, de meio século atrás.

O conhecimento do que se passa no mundo vem dos despachos das agências de notícias, sujeitas ou ligadas ao pensamento do dinheiro que as mantêm. Nos países democráticos, o dinheiro está na elite dirigente, enquanto está, nas ditaduras, na mão dos autocratas. De qualquer modo, textos e fotos estão tisnados pelo interesse da posição do provedor de informações. O que os leitores e vedores sabem é o que as fontes admitem. O melhor exemplo da distorção universal neste quadrante está em discutir-se qual a verdadeira causa da última guerra mundial. Grande massa humana conhece apenas um lado dessa questão; e, se você expõe o outro lado, contesta a validade, porque jamais conheceu diferente fonte do saber. A versão vitoriosa na quantidade virou coisa julgada.

Outro artifício dessa treta de modernidade – Dines afirma – é a ilusão da tecnologia como remédio para tudo. Ocorre que ela não qualifica produto ou serviço, apenas conserta um pouco da casca, não mexe no cerne da coisa; pode alterar a embalagem, mas o conteúdo permanece insosso. Parece que todos os anos os grandes jornais trombeteiam o aluguel de um técnico equatoriano, com 33 anos de perícia, e que vai pôr para quebrar na modificação da folha, reforma após reforma, novo formato, mais um caderno para sensaborias.

Perdendo tempo

Os analistas internacionais estão perplexos com o fato de o Brasil ter passado de “queridinho” dos mercados para, em cinco anos de governo Dilma, descer à condição de “patinho feio” entre as nações emergentes em face de grave recessão econômica e empobrecimento social. Quando a crise financeira mundial iniciada nos Estados Unidos (EUA) em 2007 e agravada em 2008 começou a atingir a Europa e espalhou seus efeitos para quase todo o mundo, os mesmos analistas ficaram surpresos pelo Brasil ter se saído bem, sem problemas de insolvência de bancos. A boa resistência do Brasil levou o presidente Lula a vangloriar-se e dizer que aqui a crise era uma pequena marola.

O fato é que o Brasil estava com elevadas reservas internacionais em dólar, basicamente pelo bom desempenho das exportações sob a elevação dos preços das commodities exportadas, o Produto Interno Bruto (PIB) estava crescendo, a inflação estava sob controle, as contas fiscais estavam equilibradas e a dívida pública estava controlada em bom nível. Como o sistema bancário brasileiro é pouco integrado aos mercados financeiros internacionais, os bancos nacionais não tinham dinheiro aplicado nas instituições que vieram a falir, nem em outras que tomaram prejuízos com os títulos tóxicos vinculados às causas da crise.
 O Brasil desperdiçou os anos de abundância em gastos perdulários e supérfluos no setor público 

Nos últimos tempos, passados cinco anos do governo Dilma e em meio a uma profunda crise econômica, as causas de mudanças bruscas rumo ao fracasso e o empobrecimento da população começam a ser entendidos. O primeiro elemento foi o fim do ciclo de alta dos preços dos produtos brasileiros exportados e o fim da possibilidade de financiar a expansão interna com o dinheiro dos consumidores do resto do mundo. O segundo elemento foi a descoberta de que o Brasil desperdiçou os anos de abundância em gastos perdulários e supérfluos no setor público, não cuidou de aumentar a produtividade da economia e abandonou as propostas de reformas estruturais claramente necessárias.

Para piorar esse quadro, a presidente Dilma resolveu patrocinar uma invenção, à qual deu o nome de “nova matriz econômica” – na prática, o abandono do tripé que sustentou a política econômica de Fernando Henrique e do primeiro mandato de Lula: metas de inflação, superávit primário e câmbio flutuante. Esse tripé obrigava o governo a ter superávit primário (necessário para combater a inflação, evitar elevação da taxa de juros e impedir o crescimento da dívida pública), a fixar a meta da inflação e tomar as medidas para atingi-la, e deixar o preço do dólar flutuar segundo o desempenho do balanço de pagamentos (contas referentes às relações com o resto do mundo).

Pela tal nova matriz econômica, o governo Dilma represou preços de energia, combustíveis e transportes, estourou as contas do governo, criou déficits fiscais elevados, descuidou do controle da inflação, deixou a dívida pública subir, não fez reformas estruturais e, ajudada pela crise internacional, viu o país descer ano a ano e terminar numa recessão gravíssima. Para piorar tudo, a crise política, as confusões nas empresas estatais, a descoberta de corrupção em alta escala e a perda de apoio no Congresso levaram o governo a perder poder de manobra e de ação.

Um dos problemas derivados da crise é que o Brasil está perdendo tempo precioso, vendo a população crescer e a economia diminuir. Já entramos no último mês do primeiro trimestre deste ano e nada indica que algo vai mudar tão cedo. O país está parado e arrisca perder também o ano de 2016.

O mal dos produtos feitos para estragar

Alguma vez sua cafeteira ou impressora já pifou logo que o período de garantia acabou? Você já tentou trocar a bateria constantemente descarregada do seu smartphone? E quem sabe você já ouviu que trocar uma peça do seu computador sairia mais caro do que comprar um novo?

Se a resposta para qualquer uma das perguntas anteriores for "sim", você conhece bem a chamada obsolescência programada. Para fabricantes, faz sentido criar um produto com um tempo de vida limitado. Isso significa que o processo produtivo é mais barato e que, no futuro, o consumidor vai precisar adquirir novos produtos e pagar por serviços que a empresa oferece como substitutos para os antigos.

Tal prática tem consequências devastadoras. Os consumidores são constantemente forçados a jogar fora aparelhos e peças que deixaram de funcionar e comprar novos. E a mentalidade do descarte significa mais lixo eletrônico de países industrializados se acumulando em aterros de países em desenvolvimento.


Stefan Schridde administra o site murks-nein-danke.de (defeituoso, não, obrigado), no qual consumidores frustrados descrevem suas experiências com produtos que são feitos para estragar depois de um certo tempo.

A maioria das reclamações no site é relacionada a empresas dos setores de eletrônicos, informática e telecomunicações. Nomes de peso como Samsung, Philips, Apple, HP, Sony e Canon estão entre os mais mencionados.

Segundo Schridde, a maioria da obsolescência é provocada por peças pequenas e baratas para as quais as empresas frequentemente usam "plástico em vez de metal" para reduzir os custos.

"Empresas nem sempre usam produtos que são particularmente duráveis", afirma Dominik Enste, economista do Instituto de Pesquisa Econômica de Colônia. Tais práticas não apenas contradizem o conceito de sustentabilidade, diz ele, mas também mostram que essas companhias não levam sua responsabilidade social a sério.

Schridde afirma que a longevidade não parece importar para o desenvolvimento de produtos. Em vez disso, fabricantes investem "somente o dinheiro necessário para que o produto sobreviva por três anos". Depois disso, o período de garantia expira, e um aparelho de nova geração é lançado, diz.