domingo, 14 de fevereiro de 2016

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Vamos sambar, companheiro?

Tempo de carnaval e cinzas, considerado satânico por alguns, fevereiro é o mês do Partido dos Trabalhadores – do princípio e do início do fim.

Fundado com o apelo de luta e aura de vestal em 10 de fevereiro do bissexto 1980, viu-se desnudo, aos 24 anos, no escândalo Waldomiro Diniz, flagrado em vídeo pedindo propina ao bicheiro Carlinhos Cachoeira para abastecer a campanha do PT de 2002, a mesma que levou Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República.

Em 13 de fevereiro do também bissexto ano de 2004, depois de o governo Lula não conseguir desvencilhar-se da lambança do subchefe de Assuntos Parlamentares do então ministro da Casa Civil José Dirceu, o “capitão do time”, o Diário Oficial da União trazia a exoneração de Waldomiro.

O caso não só ofuscou a tradicional festa de aniversário do PT, a única realizada no Rio de Janeiro nestes 14 anos de domínio petista no governo central, como deu a largada para se desvendarem sucessivas apropriações indevidas e outras tantas indecências do partido para chegar e permanecer no poder.

De Waldomiro à CPI dos bingos e dos Correios. Delas ao Mensalão. Do Mensalão à roubalheira bilionária na Petrobrás, Eletrobrás e sabe-se lá onde mais, em todo canto.

Naquele fevereiro de 2004, um ano antes do jubileu do PT, veio à tona não um escândalo, mas a revelação do que, pouco depois, o país saberia ser um método e não um caso isolado de corrupção.

De lá para cá, o PT – Lula em especial – conseguiu driblar a opinião pública, usando e reusando a tática que repete agora: a vitimização. Sempre que as denúncias atingem os seus, os culpados de plantão são FHC e os tucanos, que sempre fizeram igual, a mídia golpista e a direita, gente que não suporta ver pobre andando de avião ou, pior ainda, um operário na Presidência.

Nada de novo na lengalenga. Foi assim desde Waldomiro e até em escândalos hoje esquecidos, como o dos cartões coorporativos, que impediu Lula de participar das comemorações dos 29 anos da legenda, em 2008, quando a Executiva festejou, sem o chefe, em Diadema, no ABC paulista.

Cabem aqui parênteses sobre as comemorações natalícias do petismo depois que o partido chegou ao Planalto. Em 2003, ano da primeira posse de Lula, a direção nacional não programou um encontro único. A festança se deu em todo o país como extensão da vitória. No ano seguinte, recolheu-se ao Hotel Glória no Rio, torcendo para não ter de dar mais detalhes sobre o assessor direto de José Dirceu, pego com a mão na botija. Voltou aos fogos e artifícios na cidade de Salvador, em 2007, depois da vitória do hoje ministro Jaques Wagner ao governo da Bahia.

De 2009 a 2012, Brasília sediou as comemorações, todas elas vinculadas a debates políticos conjunturais ou a estratégias de campanha. No biênio 2013 e 2014, o palco foi São Paulo, com destaque para a presidente Dilma Rousseff, carregando a tiracolo o ex-ministro da Saúde, Alexandre Padilha, candidato criado por Lula e derrotado na disputa ao governo do Estado.

Em 2015, com o prefeito Fernando Haddad deixando muito a desejar na capital paulista, o petismo preferiu aniversariar ao lado do governador Fernando Pimentel, que, com sua eleição, desbancara o tucanato mineiro liderado por Aécio Neves.

Naquele fevereiro, Dilma, empossada há pouco em seu segundo mandato, já sofria rejeição acelerada que alcançaria recordes históricos nos meses seguintes. As investigações da Lava-Jato avançavam, soando os alarmes de perigo em toda a alta cúpula petista.

Veio 2016, mais um ano bissexto para atormentar o PT. E desta vez, de forma infernal, talvez cobrando o preço de tantas tratativas com o diabo. Com Dilma e Lula em chamas.

Responsável direta pelo engodo que pretendeu esconder do país o esfacelamento da economia após anos seguidos de incompetência e ganância do petismo, Dilma já não existe.

Ao mesmo tempo em que empurra o PT e ela própria para o fundo mais fundo, a santidade Lula se enrola para explicar o inexplicável. Tríplex no Guarujá e sítio em Atibaia reformados por empreiteiros amigos de conveniência são histórias que não comportam a versão robin-hoodiana que esquerdóides totalitários adoram usar: roubar para salvar os que mais precisam.

Trata-se aqui de aceitar favores pessoais de poderosos com interesses em coisas do Estado. Algo imoral, mesmo que não tenham sido feitos com dinheiro sujo da Petrobras. Sem meias palavras, de locupletar.

Quanto aos 36 anos, o PT esqueceu a política. Convida devotos não para autocritica, análise ou debate sobre a conjuntura e a crise que corrói o país, mas para um show de Diogo Nogueira e a bateria da Portela, dia 27. E no Rio, terra em que os petistas são poucos, mas em que o aliado PMDB não falha.

Maquiar favela para Dilma visitar


Campanha teve até camiseta do bloco #Zicazero 
Na sua guerra contra o Aedes aegypti, Dilma visitou neste sábado a favela Caminho do Zepellin, no Rio de Janeiro. Em operação iniciada na véspera, militares, funcionários da Presidência da República e servidores da prefeitura carioca ‘maquiaram’ a comunidade. Grande ideia!

Numa movimentação atípica, infantaria da prefeitura, equipada com caminhão da empresa de limpeza urbana do Rio, realizou mutirão de higienização da favela. O grupo podou árvores, asseou as ruas, recolheu lixo num terreno baldio, limpou uma vala… Fez o diabo para poupar os olhos de Dilma de cenas desagradáveis.

“Começaram a fazer coisas que nunca fizeram aqui”, estranhou a dona de casa Diana Amorim Gonzalez, que contraiu zika há um mês. “Até sofá velho que estava aí largado há muito tempo eles tiraram”, disse Vani Pereira, diretora de uma escola particular de ensino fundamental.

Em conversa com os repórteres, Dilma pressionou o botão do otimismo: “No passado ganhamos a guerra contra a febre amarela, e vamos ganhar contra o zika vírus.” Em seguida, lamentou: “Estamos correndo atrás de décadas de abandono na questão do saneamento.” Absteve-se de esmiuçar as culpas acumuladas nos 13 anos de governos do PT.

Quatro dias antes, o ministro Gilberto Kassab (Cidades) reconhecera que o Brasil “ainda está aquém'' do razoável no provimento de saneamento básico à população. “Por mais que nos últimos anos tivemos melhorias, ainda deixamos a desejar.'' Bingo!

O governo deveria estudar a criação de um programa novo, o ‘Maquiagem sem Fronteiras’. A experiência não pode ficar restrita a uma favela carioca. Em vez de gastar dispersivamente com saúde e saneamento básico, o Tesouro aplicaria o dinheiro num grande projeto de camuflagem. Não elimina o mosquito. Mas, com uma generosa camada de blush, pode-se revolucionar a aparência dos doentes.

Numa segunda fase, o programa pode distribuir um kit de maquiagem para todos os brasileiros. Conteria base branca para tingir o rosto, batom para a pintar a boca engraçada e uma bola vermelha para realçar o nariz. Por último, o Planalto lançaria uma campanha na internet: #somostodospalhacos
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Precisa virar a página

Completando a análise que publiquei na semana passada sobre perspectivas socioeconômicas de curto prazo, acrescento: medidas demagogas são uma coisa, outra, mais grave, são medidas destruidoras, como as que foram tomadas nos últimos anos, mergulhando o país no abismo da mais séria recessão de todos os tempos.

As consequências estão prestes a explodir, o pior está por vir, e a onda de desemprego em decorrência da queda das atividades produtivas que atingem a arrecadação e os orçamentos de Estados e municípios poderá ser sentida já no mês de março. Desserviços e desemprego colocarão o governo a dura prova. A presidente deixou passar os meses de recessos do Congresso para tomar medidas. Sobreviveu pela inércia gerada pelas férias, mas, já nas próximas semanas, a conta lhe será apresentada com juros e correções.


No horizonte, os sinais perturbadores de aprofundamento dos indicadores da quebra em larga escala de empresas e de demissões em massa. O fôlego para aguardar uma retomada se esgotou, as empresas estão caindo na realidade e se desfazendo de qualquer coisa que aumente o aprofundamento.

Essa situação, para muitos, foi cavada lá atrás, na década passada, mas em 2015 a inanição serviu para agravar o que já era difícil. Perdeu-se totalmente a capacidade restante de resistência de muitas empresas. Setores inteiros foram levados a cortar pela metade sua capacidade de produção (como a construção civil, a siderurgia, a área automotiva) e em cascata os serviços e o comércio amplo que dependem dos mesmos.

Deixaram de tomar medidas inadiáveis e corretas ou foram na contramão da lógica, apertando o que precisa de fôlego e oxigênio.

Já com uma recessão acentuada, o governo insistiu em jogar a carga no prato errado da balança. Aquele do Brasil que trabalha e produz, sem aliviar suas despesas supérfluas. Exigindo botar a conta em quem as contas não consegue mais pagar, ao mesmo tempo em que pagou R$ 501 bilhões de serviços da dívida (R$ 180 bilhões a mais do valor pago em 2014).

Embora potencialmente o Brasil tenha condições que o privilegiam e o favoreçam, o país consegue desperdiçá-las por via de uma elite que acredita apenas em ganhos fartos e fáceis. Falta em número e grau quem empreenda com seriedade, e sobra quem quer tirar proveito, explorar, escalar o sucesso sem outro mérito que não seja a esperteza.

A cultura imperial portuguesa de explorar até o osso, sem dor e misericórdia, é o legado que acorrenta o sistema brasileiro. Condena a enfrentarmos falências que ciclicamente arregaçam e devastam o Brasil sério.

O fim justifica o meio, os políticos nacionais perdem em credibilidade de qualquer ente institucional. As proposições que passam pelo legislativo são de péssima qualidade. Como bem lembrado num artigo de Modesto Carvalhosa, é necessário reproduzir o que explicam os analistas italianos Barbieri e Giavazzi: “A corrupção mais grave, a que mais causa dano à sociedade, não é aquela que decorre da violação das leis, mas sim a que se encontra na corrupção das próprias leis. Trata-se das leis que são corrompidas, escritas e aprovadas a favor dos corruptos contra o interesse do Estado. Isso desarma a Justiça…”.

Dessa forma, com os poderes desautorizados, a falta de referências sólidas para a sociedade e de sinais de reação à gravidade se transformam em meios perversos de descrédito internacional. Levam legiões de jovens a olhar para fora, a pensar que aqui não vale a pena arriscar uma existência.

O Brasil não será uma nova Síria arrasada, mas os movimentos migratórios já alarmam. O descontentamento que tirou Cristina Kirchner do poder, e vem se repetindo na Venezuela, já se sente aqui.

A palavra impeachment se faz cada vez mais presente nas mesas que comentam a situação brasileira. A incapacidade e a falta de formulações que permitam animar alguém a acreditar no Brasil aumentam a cada dia o desânimo, a descrença.

O país caminha a largos passos para o caos, desgovernado, sem projetos, sem capacidade de gerar soluções ou de entendê-las; o poder legislativo só se interessa com o que pode ficar de vantagem para ele. Acostumado a mensalões, dá sinais de perdição definitiva. A economia nacional está se transformando em escombros, como um Muro de Berlim, destruída pela indigência moral.

Lamentava o imperador Marco Aurélio “a audácia de pessoas que, sem preparo algum, sem educação e sem ciência, estranhas às letras, pretendem decidir questões diante das quais, só depois de séculos, a filosofia deliberou”.

A qualidade ínfima dos ocupantes do poder calha ao Brasil atual, sentado sobre um barril de pólvora.

Para pilotar o Boeing, temos uma aeromoça; na torre de controle, o desentupidor de canos. É claro que o tráfego no espaço aéreo da política brasileira não inspira confiança. Deverá, como aconselhou o profeta, “passar a vida resignado no meio de homens mentirosos e injustos, eis o programa dos sábios”, ou deixar de serem sábios e exigirem mudanças.

A praça dos Três Poderes tem tudo para virar um campo de guerra. O protesto, assim como os desempregados, deverá encher as ruas em 2016, exigindo mudanças radicais como as que ocorreram em 1985 nas Diretas Já.

O Brasil precisa virar a página, encontrar uma nova, não tem mais o que emendar na atual.

Sites do governo 'matam' virtualmente o Aedes aegypti

Na luta contra o mosquito Aedes aegypti – que transmite os vírus da dengue, chikungunya e zika – todos os sites do governo federal estão promovendo ação interativa que “mata” o mosquito Aedes aegypti. A iniciativa é mais um campanha de conscientização de forma online.

Nas páginas oficiais do Poder Executivo, há mosquitos “sobrevoando” os sites. Quando o internauta passa o mouse por cima surge uma raquete para “matar” o mosquito. Confira a página do Planalto, por exemplo.

Ao clicar em cima do mosquito aparece um aviso: “Não adianta apenas matar o mosquito. Não podemos deixar ele nascer. E isso depende de todos nós. Saiba como fazer parte! #ZicaZero”.

Ao clicar neste alerta, o internauta é encaminhado para uma página, onde há informações gerais sobre as doenças, formas de prevenção e tratamento. Veja aqui o site com todas as informações: http://combateaedes.saude.gov.br/

Os mosquitos só desaparecem da página depois que o usuário clica em algum dos mosquitos. Caso, ocorra uma atualização ou troca para uma “subpágina”, os mosquitos Aedes aegypti voltam a aparecer na parte superior da tela.

Apesar da boa vontade do governo e da “interatividade” da campanha, há outras iniciativas no combate à dengue. A iniciativa “Coordenação Nacional da Vigilância, Prevenção e Controle da Dengue”, por exemplo, perdeu R$ 5,3 milhões de dotação ao longo do ano passado.

Da dotação autorizada de R$ 8,9  milhões apenas R$ 448,8 mil foram efetivamente gastos com o orçamento do ano. O valor liquidado, no entanto foi de R$ 8.8 milhões. A verba, de responsabilidade do Ministério da Saúde, deveria ser empregada no financiamento de estudos, pesquisas e na capacitação profissional para o combate à dengue.

Esse valor não corresponde ao total desembolsado pelo Ministério para ações que envolvam a dengue. Cerca de R$ 1 bilhão anuais são destinados aos estados e municípios, por meio do Piso Fixo de Vigilância e Promoção à Saúde. Porém, não é possível afirmar quanto do total é utilizado especificamente para a dengue.

Os recursos do piso são repassados para que os gestores locais adotem medidas de prevenção e controle de outras doenças além da dengue, como a malária e a doenças de chagas. Cabe ao gestor aplicar a verba de acordo com a realidade de cada localidade.

Para o secretário-geral do Contas Abertas, Gil Castello Branco, falta transparência nos recursos destinados para o combate à dengue. “Além dos recursos da ação específica terem diminuído em 2015, e não terem sido plenamente utilizados, não é possível saber o que efetivamente foi aplicado por cada estado ou município no combate à dengue. Esses dados deveriam ficar claros em se tratando da gravidade da doença”, explica.

Contas Abertas

Crônica da tragédia anunciada

O PT, hoje às voltas com o Código Penal, fez sua trajetória tentando impô-lo aos adversários. Se tinham ou não culpa, era um detalhe. Não tendo, cuidava de providenciá-la. Prova hoje do próprio veneno, sem que os adversários tenham nada com isso.

Se dependesse da oposição que tem – ou por outra, não tem -, o PT jamais deixaria o poder. Tem a oposição que pediu a Deus (ou ao diabo). Talvez por isso mesmo, tornou-se o maior adversário de si mesmo. Está moribundo por conta das próprias lambanças.

Não tem a quem culpar, embora, por um reflexo muscular, busque responsáveis fora de seus domínios: uma hora é a elite burguesa, que não suporta ver um operário no poder (que operário?); outra a imprensa golpista (a mesma que o projetou e, em grande parte, ainda o sustenta); ou ainda o PSDB (que o trata com uma leniência mórbida); ou, por fim, o juiz Sérgio Moro.

O PT, ao chegar ao poder, em 2003, contabilizava 23 anos de oposição implacável, na base do “hay gobierno? Soy contra”. Pouco importava se o que se propunha era bom para o país – caso da eleição indireta de Tancredo Neves, que pôs fim ao regime militar, ou do Plano Real, que pôs fim à hiperinflação e organizou as contas públicas. O partido era contra porque tinha um plano de governo infalível, que traria a redenção social e o fim da corrupção.

Nesse período, jamais se aliou a ninguém e puniu os correligionários que ousaram fazê-lo. Expulsou três deputados que votaram em Tancredo Neves e outros dois que aceitaram ser ministros de Itamar Franco. Mesmo tendo tido papel fundamental na queda de Collor, recusou-se a apoiar o governo de transição de Itamar Franco, de cujo impeachment também cogitou.

Propôs ainda o impeachment de Fernando Henrique, sob o argumento ideológico, não amparado por nenhum código legal, de que a política “neoliberal” que o acusava de praticar era lesiva aos interesses do país. Não apontava nenhum delito objetivo (confiram nos vídeos do Youtube) e, por isso mesmo, não logrou êxito.

O partido está no seu 14º ano de governo. Só dom Pedro II e Getúlio Vargas ficaram mais tempo no comando do país. Mas quatro mandatos – sempre com esmagadora maioria no Congresso – já seriam suficientes para estabelecer o paraíso terrestre prometido ao longo de mais de duas décadas. O resultado, porém, é o avesso do anunciado pela propaganda do partido.

Em vez do estabelecimento da moralidade pública, vê-se às voltas com os tribunais. Seu fundador e presidente de honra, Lula, responde a diversas e graves acusações, que vão de corrupção passiva a ocultação de patrimônio – para dizer o mínimo.

Seus principais amigos, que circularam na intimidade palaciana enquanto lá esteve, estão presos. Nem os filhos escaparam: ambos são também alvos de investigações policiais.

A própria esposa, dona Marisa, terá de dar explicações à Justiça sobre o apartamento tríplex do Guarujá e o sítio de Atibaia. A amiga Rosemary Noronha, acusada de tráfico de influência e corrupção passiva, era beneficiária de sua proteção. Não se trata de acusações vazias: cada uma delas tem denso lastro documental.

Se no campo da moral fracassou – e o Mensalão e o Petrolão estão longe de esgotar o repertório de delitos sistêmicos -, no campo da gestão o resultado é ainda mais contundente. A redenção social resultou na maior crise das últimas décadas. A maior empresa brasileira, a Petrobras, quebrou. Suas ações estão cotadas ao preço de refrigerante e deve mais do que vale.

As benesses sociais, que não tinham sustentabilidade, desfazem-se num quadro crescente de desemprego e depressão econômica. Pior, porém, que a depressão econômica é a política. O partido, que sempre investiu na demonização dos adversários – e, portanto, no descrédito de uma atividade sem a qual não há liberdade ou civilização -, procura amenizar seus pecados alegando que não é diferente dos outros; quer todos no mesmo chiqueiro.

Como não tem (nunca teve) o paraíso que prometeu, quer levar todos para o mesmo inferno – e a omissão oposicionista torna viável essa pretensão, mergulhando o país numa sinuca de bico: sem política, o que resta mesmo é o inferno de saídas golpistas.

O resultado é que o país vive uma crise gigante, operada por anões políticos. O PT não tem quadros. Lula, que governou em período de bonança da economia mundial, iludiu a muitos quanto a seus dotes de estadista. Mas seu verdadeiro tamanho expressa-se no legado que deixou: Dilma Roussef.

Quanto a esta, não é necessário dizer muita coisa – ou mesmo nada. Basta ouvir sua performance verbal, que hoje inunda as redes sociais, em posts sarcásticos e impiedosos – não tanto, porém, quanto os atos com que pretende enfrentar uma crise que, não há a menor dúvida, já a derrotou (e, por tabela, a todos nós).

O Manifesto de Atibaia

No princípio era expropriar o Estado para ficar no poder. Aí o poder foi perdendo a graça, e passamos a roubar para ficarmos ricos mesmo.

A inconfessável confissão acima não precisa ser feita. Você já sabe de tudo. Mas, por favor, não conte ao Brasil. Ele não suportaria mais essa. O país está parado, e como você não tem nada para fazer mesmo nesse marasmo, segue um passatempo: faça as contas das despesas dos guerreiros do povo brasileiro apenas com seus advogados milionários. O que esses heróis (os presos e os soltos) gastaram para se defender em dois anos de Lava-Jato acabaria com a fome no Haiti por várias gerações e compraria meio time do Barcelona. Coisa de nababo. Se não fossem pessoas tão humildes, seriam os xeques do petrolão.

Continua entediado? Expanda suas contas para os honorários da banca defensora dos mensaleiros. Você não estará somando bananas com laranjas: são todos laranjas do mesmo esquema, companheiro. Por coincidência, aquele que continua mandando no Brasil, um país de todos os que não sabiam. Faça como o golpista Sérgio Moro, inimigo número um dos coitados profissionais: siga o dinheiro. Você encontrará a anatomia completa do bando, e constatará que todas — todas — as peças se ligam de alguma forma ao palácio petista, guarnecido por Dilma Rousseff.

Conclusão: não há razão para impeachment. A não ser que você queira interromper as férias dessa gente sofrida.

Os brasileiros estão afundando na pior recessão da sua história, provocada pela DisneyLula (nem tudo é perfeito), mas não têm pressa. Estão esperando os mosqueteiros Zavascki, Barroso, Lewandowski, Janot e companhia autorizarem a criançada a processar a senhora Rousseff. Todo mundo esperando sentado, passando repelente e assistindo ao pas-de-deux de Dilma e Zika, a nova coreografia oferecida ao povo pelos reis do entretenimento tarja preta.

Enquanto isso, o país assiste ao final feliz da dinastia oprimida, com os filhos dessa gente humilde dando a volta ao mundo, faturando milhões em consultorias copiadas da internet, dando festas hollywoodianas e saboreando ostensivamente a vida boa que essa casta de perseguidos políticos lhes proporcionou com o suor das suas propinas.

E já que não há um único voluntário na plateia para apresentar o pedido de impeachment que a Lava-Jato esfregou na cara do Brasil, vamos à união nacional: todos de mãos dadas com a elite cultural que luta bravamente contra a criminalização desses pobres milionários. Está lançado o Manifesto de Atibaia.

Para os que estão bêbados de repelente e não ligaram o nome à pessoa: Atibaia é onde fica o sítio de Lula que não é de Lula. Em outro texto explicaremos quem é Lula. O que importa saber aqui é que se trata de uma pessoa boa, perseguida pelas elites invejosas que não suportam vê-lo feliz por ter um milhão de amigos que não lhe deixam faltar nada.

Esse homem bom, que inclusive é filho do Brasil, virou alvo de uma caçada cruel, e você precisa ajudá-lo. Lula é hoje alvo de uma série de investigações criminais — desumanas e neoliberais. Ele é investigado pelo Ministério Público por ocultação de patrimônio, por causa de um tríplex no Guarujá reformado pelos amigos da construtora OAS. Todas as testemunhas afirmam que o imóvel foi preparado para Lula, que acompanhou as obras, mas nós, signatários do Manifesto de Atibaia, sabemos que isso não é possível: Lula é um homem simples, que só tem amigos.

As coincidências da vida fizeram com que o mesmo amigo da OAS comprasse, na mesma loja, as cozinhas do tríplex e do sítio de Atibaia, que também não é de Lula, embora ele tenha estado lá 111 vezes desde 2012. De Lula, mesmo, só o amigo. E esse amigo não mandou a cozinha do sítio diretamente para o sítio. A mercadoria foi despachada para outro endereço em Atibaia, e de lá escoltada por receptadores até o sítio Santa Bárbara, o que não é de Lula. Parece cena de suspense policial com ocultação de pistas, mas nós, signatários do Manifesto de Atibaia, sabemos que as almas honestas não têm nada a esconder.

A Polícia Federal abriu inquérito para apurar a relação entre Lula e a OAS na montagem do sítio em Atibaia. A MPB precisa urgentemente compor um hino em defesa da invasão desse sítio, porque se Lula vive lá e é pobre, só pode ser reforma agrária. Caminhando e cantando e seguindo o cifrão.

Quem andou ajudando também na reforma do sítio que não é de Lula foi o pessoal da Odebrecht, que é amigo de Lula. E tome coincidência: o Ministério Público abriu inquérito para apurar tráfico de influência desse brasileiro humilde em favor da Odebrecht, que o contratou para as palestras mais bem pagas do mundo.

Essa gente do mal acha que o governo Dilma é o escudo da gangue de inocentes perseguidos pela operação Lava-Jato. Mas você sabe que nada disso é suficiente para o impeachment. Então, faça a sua parte: assine o Manifesto de Atibaia e ajude essa gente sofrida a continuar pagando seus advogados milionários, enviando sua contribuição cidadã para o caixa do Partido dos Trabalhadores. Em espécie, por favor.

Guilherme Fiuza

Põe na conta do PT

Dificilmente vamos conseguir, depois do processo, recuperar o que perdemos em menos de cinco, seis anos. E só vamos parar de piorar em 2017, 2018. É uma década para retomar, uma perda enorme
José Márcio Camargo lançou, no início dos anos 1990, em artigos e em reuniões no PT, a ideia de criar um programa de transferência de renda condicionado à manutenção das crianças na escola

De volta para o futuro do Brasil

Se alguém ainda duvidava da existência dos buracos negros, a semana passada tratou de sepultar crendices. Não falo do Universo nem de Einstein. Mas de nosso ontem, hoje e amanhã no Brasil. Falo das ondas gravitacionais que foram ignoradas pelo PT de Lula e Dilma com irresponsabilidade, descaso e incompetência, jogando a economia e a saúde nessa cratera negra da qual será difícil emergir.

Não foi por falta de alerta. A gastança de Brasília aumentou em ano eleitoral, as mentiras foram ditas sem pudor, as negociatas, os tríplex, os sítios, as propinas continuaram a correr soltas mesmo sob investigação. Estamos cercados por mosquitos e sanguessugas, mas o governo federal, os governadores estaduais, os prefeitos e o Congresso se recusam a assumir a emergência, a culpa e o ônus. Apelam a nós – aos impostos pagos por nós e aos pratos de vasos de planta no quintal de nossa casa.

Pode demorar 100 anos, bilhões de anos. Uma hora o marketing, a desonestidade e o obscurantismo são desmascarados e a realidade vem à tona, seja por estudos de físicos e astrônomos, seja pelos fatos crus do dia a dia. Não adianta se fazer de vítima, Lula, não adianta adiar decisões de cortes na sua máquina, Dilma. Aí estão os números da falência na Educação e as filas do desespero nos hospitais, os relatos lancinantes de pais desempregados e de mães atingidas pelo vírus zika. Tudo por falta de compromisso com o essencial. Agora os ministros de Dilma viajarão pelo país para fazer campanha contra o mosquito Aedes aegypti. Parece roteiro de filme B. É muita cara de pau. Economizem as passagens aéreas!

Acabou o recesso que nem deveria ter sido. Acabou o Carnaval. O PT comemorou tristemente, na Quarta-Feira de Cinzas, 36 anos de vida. E mesmo sob os holofotes do mundo, em ano de Olimpíadas, no meio de uma epidemia, o governo ainda não sabe onde vai cortar no Orçamento para chegar a sua fictícia meta fiscal de 2016. Adiou a decisão para março. Dilma decidiu editar um decreto provisório num país provisório, para fingir que cumprirá a meta de superavit fiscal primário de 0,5% do PIB.

Enquanto isso, a presidente pensará com sua equipe –porque em janeiro todo mundo parou de pensar – em como apertar as contas públicas. Para pagar os juros da dívida, o certo seria cortar R$ 60 bilhões do Orçamento, mas o governo diz que não poderá cortar nem R$ 20 bilhões.

“Acho que não tem mais gordura para cortar. Vai ter de cortar membro. É amputação, não é lipoaspiração”, afirmou o senador peemedebista Romero Jucá, depois de encontrar o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa.

Não há vacina contra a má gestão. Pode fazer o convênio que quiser com a universidade mais conceituada do mundo – não dará certo. Porque o pecado está na origem. Sem responsabilidade fiscal, um governo comete crime ao maquiar, nesse nível, números e promessas para se eleger. Nem vou falar do roubo continuado, em dinheiro em espécie e em transferências bancárias, de nossa maior estatal. A Petrobras acaba de ficar famosa como o segundo maior caso de corrupção no mundo, em votação promovida pela Transparência Internacional.

Economia doente, Saúde enferma. O Ministério da Saúde sabia que, só no ano passado, 1,6 milhão de brasileiros tinham contraído dengue. E adiou qualquer medida mais séria. Provavelmente porque o Brasil sempre achou ser o país do futuro, o país do milagre, do Deus brasileiro, da criatividade e alegria do povo, o país do Carnaval, do samba e das mulheres bonitas. O país da “meta flexível”, complacente e malandro. Será que Dilma está “estarrecida” com o rombo?

Milhões de inocentes úteis, que hoje andam a pé para o trabalho para economizar no ônibus, que pagam uma taxa de juros no cartão de crédito de até 411% ao ano, que veem a luz de casa cortada por inadimplência, que fecham suas empresas falidas, que perdem seus empregos, acabam de ser convocados por ministros petistas para canonizar Lula e livrar o pai dos oprimidos dos “golpes baixos” da mídia, das elites e da Justiça. “Nunca antes um ex-presidente foi tão caluniado, difamado e injuriado”, escreveu Rui Falcão, o presidente do PT. O slogan “Somos todos Lula”, proposto por militantes, só pode ser brincadeira de mau gosto.

Nos Estados Unidos, após detectar as ondas gravitacionais com seus equipamentos de última geração, os cientistas comemoraram: “Poderemos ver coisas que nunca vimos antes!”. Segundo alguns físicos otimistas, daqui a um século talvez possamos viajar no tempo, como no filme De volta para o futuro. No Brasil flexível, onde tudo é relativo, também estamos vendo coisas que nunca vimos antes. Talvez seja melhor não esperar 100 anos para rever decisões do passado e mudar presente e futuro.

Onde está Lula?

Fantasia e realidade

Hoje deixo de comentar a situação internacional, assim como o torvelinho político, econômico e institucional do Brasil. O país volta à realidade. Emerge lentamente de um Carnaval gigantesco. Praticamente cinco dias, desde a sexta-feira passada, em que a população se deixa dominar por seus sentimentos imediatistas e por desejos reprimidos. O importante é pôr para fora as inibições e as frustrações de cada um e se liberar com o ritmo, os desfiles e a proximidade da multidão. São milhões de pessoas que se arrastam pelas ruas das cidades, embalados por carros de som, dos quais só se escutam mesmo os batuques: a melodia se perde na imensidade do espaço urbano. As latas de cerveja e de refrigerantes amontoadas nas ruas testemunham a falta de respeito ao espaço público dos chamados "foliões".

Nos desfiles das escolas de samba, prevalece a manifestação do luxo utópico dos participantes, majoritariamente vindo de lugares modestos da cidade. Mas quem recebe o destaque na verdade são as artistas das novelas de televisão, que se produzem de tal forma que mesmo sua beleza e sensualidade acabam se escondendo detrás de plumas e de roupas coloridas.

Como bem observa Roberto DaMatta, em seu magistral Carnaval, Malandros e Heróis, que me dediquei a reler durante as festividades, a individualidade do brasileiro "é fortemente marcada pelo Carnaval como um momento onde se pode totalizar todo um conjunto de gestos, atitudes e relações que são vividas e percebidas como instituindo e constituindo o nosso próprio coração". Para DaMatta, o Carnaval representa "nossa própria continuidade como grupo (...) um reflexo complexo, um comentário complicado sobre o mundo social brasileiro, e não um reflexo direto de sua estrutura social".


Antes havia o contraste entre o Carnaval de rua, das classes menos favorecidas, e o Carnaval dos clubes, onde ricos e celebridades brincavam animados porwhisky escocês e champagne francês. Hoje esse contraste diminuiu. Há muito menos ênfase no "Carnaval de clubes". A rua se assenhoreou quase que completamente das festas!

Até este ano, os presidentes, governadores, prefeitos, políticos em geral se mostravam nos camarotes oficiais para ver os desfiles, sorrir e se identificar com o povo. Este ano, preferiram não aparecer, talvez para evitar vaias. Tampouco vieram grandes celebridades, artistas de cinema estrangeiro que logo viravam objeto de desejo dos bonitões nacionais, que acabavam encontrando maneira de filtrar que com elas (ou com eles no caso das bonitonas) haviam tido intimidades inesquecíveis. E o público se orgulhava do fato de que algum ou alguma de nós fosse capaz de frequentar a intimidade de celebridades estrangeiras, rendidas ao charme latino. Durante semanas, jornais e revistas publicavam notas e fotos dando a entender quem levou quem para seus braços durante o Carnaval.

Isso aparentemente mudou neste ano da zika e da chikungunya. As más notícias sobre graves doenças infecciosas terão desestimulado potenciais visitantes mais precavidos, sobretudo depois que se passou a noticiar que poderiam ser transmitidas por relações sexuais.

O que aparentemente não mudou foi o espírito profundo da festa: o "tríduo momesco", como se dizia anteriormente. Nem mesmo cheguei a ver destaque para a coroação de algum volumoso senhor como Rei Momo. O dicionário Houaiss ensina que Momo vem do grego momos e do latim momus, Deus filho da noite, personificação da maledicência, comediante, farsante. Não sei como esta ideia acabou sendo associada ao personagem que preside a celebração do Carnaval no Brasil, que antes, inclusive, chegava a receber ritualmente as chaves da cidade pelas mãos do prefeito de turno para que reinasse durante os dias do Carnaval com autoridade própria. Não sei tampouco como uma festa de origem religiosa — Carnaval vem do latim carne vale, que quer dizer "adeus à carne", ou seja, os dias em que os cristãos saciavam o apetite com a carne que não poderiam comer durante a Quaresma — veio a se transformar no que passou a ser no Brasil.

O que não mudou também, pelo menos no Rio de Janeiro, foi a encenação das relações entre senhores e escravos. Antes, os proprietários de escravos deixavam que suas "peças", como eram chamados, andassem pelas ruas e festejassem uma certa liberdade, que logo voltariam a perder na Quarta-feira de Cinzas. Uma fotografia publicada no jornal do desfile de uma grande Escola de Samba do Rio, porém, despertou-me alguma inquietação quanto à possível permanência da antitética relação que prevalecia entre senhores e escravos. O tema do desfile era o Marquês de Sapucaí, nome da rua onde veio a se construir o Sambódromo. Sapucaí, atuou em diversas posições na Corte, tendo sido Senador por Minas Gerais por onze legislaturas. Foi tutor de Pedro II em literatura e ciência, ministro da Fazenda e dos Negócios do Império. Desempenhou-se como presidente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro por 28 anos. Típico representante da elites monárquicas brasileiras, Sapucaí acabou curiosamente associado ao samba. No domingo de Carnaval apareceu na primeira página de um grande jornal do Rio vestido de branco, ostentando um olhar soberbo, coberto por um longo manto azul e ouro, carregado por sambistas fantasiados de escravos em símbolo de reverência...

Estranho país é o nosso em que a infâmia da escravidão — que nos penaliza pesadamente até hoje — ainda é usada em alegorias benignas. Refletir sobre este significativo aspecto da personalidade brasileira associada ao Carnaval é como entrar num emaranhado de percepções desencontradas sobre elitismo, conformismo e, sobretudo, quanto à razão mais profunda do nosso subdesenvolvimento: a incapacidade de relacionar as causas e os efeitos dos fenômenos políticos, econômicos e sociais que afligem um país em que muitas lideranças das classes trabalhadoras chegadas ao poder legitimamente se comportam de forma ilegítima em prejuízo dos ideais que sempre defenderam.

Enquanto isso, continuemos a brincar na beira da cratera do vulcão!