quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

Brasil sem censura


Mentiras, mais mentiras e rock'n roll

Ao longo desta semana, como em todas as semanas anteriores, o governo pôs no ar o seu show de mentiras escalafobéticas para, de novo, sucatear o estatuto da verdade, blasfemar contra a História, destruir o bom senso, promover a ignorância, banalizar o desrespeito aos fatos e desacreditar a imprensa. O roteiro é sempre igual. Na superfície, no jogo das aparências, entram em cena as mentiras canastronas, meio carnavalescas, que servem de factoides para bagunçar o debate público. Aí, as inverdades parecem meros acessos de loucura inconsequente e ridícula, mas são mais do que isso: são uma cortina de fumaça para uma operação subterrânea de minar as bases da cultura democrática, que já está muito debilitada no Brasil.

Nas profundas, no esgoto do bolsonarismo, o que existe é uma densa e betuminosa mentira essencial que instila o ódio contra todos os que podem verificar a verdade dos fatos, sejam os cientistas que detectam incêndio na floresta, sejam os professores que, dentro das universidades, ousam pensar criticamente, sejam os jornalistas, principalmente os jornalistas, cuja profissão consiste em investigar os acontecimentos e desmontar as mentiras oficiais.


O autoritarismo que se vai estruturando entre nós pode ser definido como o império da mentira e toda semana, uma depois da outra, temos as provas desse fato atroz e trucidante. Desta vez o protagonista da velha e repetida encenação, o mestre de cerimônias do show horripilante de mentiras, foi o novo presidente da Funarte, o maestro Dante Mantovani. Na superfície barulhenta, ele enunciou as mentiras canastronas. Nos subterrâneos da propaganda, pôs em marcha a mentira essencial, declarando uma vez mais a guerra de extermínio contra os verificadores da verdade factual.

Há dois ou três dias os brasileiros ficaram sabendo que Mantovani costuma declarar estultices em suas redes sociais. Exemplo: “O rock ativa a droga que ativa o sexo que ativa a indústria do aborto”. O que pode haver de mais destrambelhado? Ao mesmo tempo, o que pode haver de mais afinado com o estilo bolsonarista de bater boca? A sanha moralista é tão desmesurada que a gente tem a sensação de que, na cabeça do presidente da Funarte, os efeitos satânicos do rock atravessam o passado e o futuro, exatamente como o demo que o faz arregalar os olhos. O sujeito parece crer que, já na era de Hamurabi, todas as técnicas de interrupção da gravidez foram projetadas por essa gente cabeluda que começou a tanger a guitarra elétrica somente em meados do século 20.

Ainda no capítulo das alucinações lisérgico-reacionárias, dessas que o governo põe em circulação para desorientar o público e os pauteiros dos jornais, o maestro profissional repaginado em ordenador de despesas deu de confundir Lennon & McCartney com Lenin & Marx e assegurou que “na esfera da música popular, vieram os Beatles, para combater o capitalismo e implantar a maravilhosa sociedade comunista.” Lucy, in the sky, manda lembranças.

Mas, atenção, esse tipo de psicodélica macabra que explode na superfície é apenas metade da invencionice sistemática operada pelo bolsonarismo. A outra metade, menos espalhafatosa, é mais insidiosa. A outra metade se dissemina pelos porões imaginários dos ativistas que morrem de saudade da ditadura e toma por alvo não as bandas de heavy metal ou as canções melosas dos garotos de Liverpool, mas os institutos democráticos incumbidos de apurar os fatos, como os cientistas do Inpe e os repórteres dos jornais independentes. Por baixo das mentiras canastronas da superfície alastra-se a mentira essencial e betuminosa do poder, escalada para revogar a História e tirar do horizonte qualquer forma de registro da realidade. Aí está a vertente mais ameaçadora pela qual o governo golpeia a sociedade.

Mantovani espelha-se diligentemente em seus superiores, que já proclamaram que o nazismo era de esquerda, e afirma que o fascismo também é de esquerda. Para quê? Para reescrever a História, invertendo seus sinais. Quanto apregoa que as fake news não passam de uma invenção dos globalistas, interessados em ampliar o poder da imprensa no mundo inteiro, quer achincalhar os jornalistas profissionais. E isso funciona. De tanto insistir no ponto, os bolsonaristas estão conseguindo enfraquecer os jornais.

O poder que se instalou na Esplanada sabe que seu sucesso depende do fracasso da verdade factual. É um poder viciado nessa droga pesada chamada mentira. Seu veneno mais letal não é a intolerância, não é o seu jeito miliciano de ser, não é a incompetência crônica no trato com a política. O seu pior veneno é sua mentira essencial, que prescreve censura e violência para resolver os problemas da democracia. O presidente da República, em pessoa, já vem ensaiando investidas cada vez mais concretas contra a liberdade de expressão. E não vai parar por aí. Vai aumentar a dose. Para ele, é questão de vida ou morte. Se a mentira vencer, ele fica. Se sua máscara cair, ele cai junto, pois sua identidade se transfundiu em sua máscara.

Enganam-se os liberais de boa vontade que dizem não haver lógica nos discursos alucinatórios das autoridades federais, obcecadas pelas drogas, pelo sexo, pelo rock abortivo e pelos comunistas infiltrados no show business. Há mais do que delírio e despreparo nos despautérios do governo: há a coerência da mentira e da fraude. Isso quer dizer que existe, sim, um nexo de consequência entre a teoria do rock abortogênico e a causa maior de acabar com a imprensa.

O governo pode bater cabeça feito um lobisomem rolando a ribanceira, mas sabe muito bem o que quer destroçar. Sabe que um país onde vigora a liberdade de imprensa está mais protegido contra a mentira. Sabe que não basta levar um ou outro jornal à falência. Sabe que precisa ter a seus pés um povo incapaz de buscar a diferença entre o que é verdade e o que é mentira. É nessa trilha que o governo avança.

Na forca, Câmara tira a corda do pacote de Moro

Num plenário repleto de deputados que flertam com a forca, a Câmara aprovou uma versão desfigurada do pacote do ministro da Justiça, Sergio Moro. Excluiu do embrulho o pedaço que tinha a aparência de corda. Nada de prisão de corruptos condenados na segunda instância. Nem sinal de criminalização do caixa dois.

A suavidade dispensada à criminalidade de colarinho branco contrastou com o rigor imposto à bandidagem de pé rachado. Proibiu-se a progressão de regime para a turma do crime organizado, agravaram-se as penas para crimes hediondos seguidos de morte, elevou-se o tempo máximo de encarceramento de 30 para 40 anos.

Além de dissolver o pedaço anticorrupção do pacote de Moro num caldeirão que incluía propostas do ministro do Supremo Alexandre de Moraes, a Câmara deu uma paulada em Jair Bolsonaro. Fez isso ao rejeitar o chamado excludente de ilicitude, que ampliava o conceito de legítima defesa, para autorizar os juízes a reduzir à metade ou até perdoar a pena de policiais que puxam o gatilho movidos por "escusável medo, surpresa ou violenta emoção".

Sergio Moro trocou a 13ª Vara Federal de Curitiba pelo Ministério da Justiça sob a alegação de que estava "cansado de tomar bolas nas costas". Achava que seu trabalho na Lava Jato "era relevante, mas tudo aquilo poderia se perder se não impulsionasse reformas maiores, que não poderia fazer como juiz". Hoje, além de bolas por trás, o ex-juiz leva caneladas.

No planeta da Lava Jato, Moro era o magistrado todo-poderoso. Emitia ordens de prisão e anotava no final: "Cumpra-se". No universo brasiliense, o ex-juiz tornou-se prisioneiro do labirinto legislativo.

"A Câmara aprovou o projeto anticrime do governo federal, unificado com propostas do ministro Alexandre de Moraes", escreveu Moro no Twitter. "Há avanços importantes. Congratulações aos deputados. Há necessidade de algumas mudanças no texto. Continuaremos dialogando com Congresso Nacional, para aprimorar o projeto de lei".

O texto vai ao Senado. Se os senadores atenderem aos apelos de Moro para "aprimorar o projeto", a versão modificada retornará à Câmara. Ali, os deputados terão a oportunidade de reverter os aprimoramentos. Moro aprende da pior maneira que, em política, tem gente que faz, tem gente que manda fazer e tem gente como ele, que apenas pergunta no final: "O que está acontecendo?"

Então é Natal

Pessoas esbarrando umas nas outras nos corredores dos shoppings centers, pisadelas e xingamento. Lojas parecendo formigueiros oferecem produtos de péssima qualidade, vendidos a peso de ouro. Empurrões e filas quilométricas. Lá fora, transportes coletivos igualmente lotados e calorentos, barulho ensurdecedor e clima de excitação geral. Não há dúvida nenhuma: este purgatório é o sinal de que o Natal está chegando.

Imagine como isso não estará em mais duas semanas.

Haja néon, pisca-pisca, efeitos especiais. Quando a criatura imagina que essa experiência é a representação, na terra, do inferno de Dante, descobre que pode ficar pior: por onde você passa só escuta a voz monocórdica de Simone, a entoar, nos graves, Então é Natal. “E o que você fez?”. Até parece que os estabelecimentos do mundo inteiro se combinaram para tocar somente essa lavagem cerebral que foi gravada quando Matusalém era menino.


No início de dezembro e por todo o mês, já virou tradição: todo mundo se esquece que o Natal deve ser a comemoração do aniversário do Menino-Deus e acredita que é a festa do consumo. Ligado nessa contradição, o papa Francisco, que para mim é um servo de Deus, aproveitou os preparativos do Black Friday, ocorrido na semana passada, e mandou um recado que vale para todos os 31 dias: “Consumismo é como uma doença”.

Doença da alma. Que impede a prática da generosidade. “É uma doença séria, o consumismo, de hoje. Eu não digo que todos fazemos isso, mas gastar mais do que precisamos, é uma falta de austeridade de vida. Esse é um inimigo da generosidade”, disse o pontífice. Ele aproveitou para alertar que as pessoas procurem “fazer o bem”, em vez de gastar com supérfluos, e que ajudem umas às outras “como for possível”.

A fala de Francisco, que eu copio aqui por que tem tudo a ver com essa crônica, é um apelo corajoso. Quando diz para fazermos o contrário do que o consumismo (e a ostentação) nos impõem, ele está mostrando que nós faríamos mais negócio, acumulando prestígio junto ao dono da festa, se lembrássemos do legado que Ele nos deixou através de suas Palavras.

Francisco sugeriu uma atitude nova, simples e admirável, se considerarmos que o senso de justiça (trocar o consumo pela generosidade) precisa estar nas nossas ações diárias nesse tempo natalino. Generosidade, todos sabemos, é oferecer o que temos, em vez de só gastar. É ajudar a fazer justiça (social). Em última análise tem a ver com a compaixão de se saber colocar no lugar do outro e sentir a dor dos que necessitam.

Não é fácil fazer isso num mundo onde o consumo é prática incentivada pelos dirigentes das nações e identificada como a razão do desenvolvimento. A nossa sociedade criou doentes ao estimular a existência de pessoas consumistas baseada na teoria de que, quanto mais se consome, maior é a estabilidade econômica de uma região, de um país. (Só que não: enquanto assistimos ao crescimento desenfreado do consumismo, também constatamos que são maiores os problemas financeiros das pessoas, das famílias e dos governos).

Sem contar que existe, sim, uma relação entre o consumismo e o meio ambiente. Não estou com discurso fácil ou querendo fazer pose de ambientalista. Mas é um fato que para aumentar a demanda da produção, retira-se a matéria-prima de onde? Elementar: tudo precisa de água, energia elétrica e de transporte. A emissão de gases gera degradação e destruição de ecossistemas. Por aí vai. E enquanto mais se consome mais se gera lixo. É um ciclo.

Na contramão desse mundo contemporâneo maluco, este papa Francisco é um subversivo. É a Voz que clama no deserto da globalização. Um transgressor.

Relaxe


Salário inicial de R$ 19 mil põe elite dos servidores entre 2% mais ricos

"Você tem alto salários, estabilidade. Você vive em Brasília, é outro planeta. É Versalhes", disse o ministro da Economia, Paulo Guedes, no início de setembro, comparando as condições de trabalho dos servidores públicos federais à opulência da corte real francesa que ocupava o Palácio de Versalhes antes da derrubada da monarquia em 1789.

Sob o argumento de que o funcionalismo, em especial o da União, é caro e privilegiado, o governo de Jair Bolsonaro quer enviar ao Congresso no início de 2020 uma reforma administrativa para reformular as carreiras públicas, projeto que vem sendo chamado também de novo RH do Estado. Os gastos com pessoal ativo — que devem fechar o ano acima de R$ 300 bilhões — é o terceiro maior da União, atrás de Previdência Social e juros da dívida pública.

Guedes tem um importante aliado nessa empreitada: o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, é antigo defensor da pauta. Ambos consideram que os servidores — com destaque para carreiras exclusivas de Estado como gestão tributária, Justiça, diplomacia — já começam ganhando alto para padrões brasileiros e progridem rapidamente para o teto de remuneração de cada categoria.


Nesse sentido, eles querem uma reforma que reduza os salários iniciais, torne mais gradativa a evolução na carreira e atrele a progressão a avaliações de desempenho. Também defendem flexibilizar as regras de estabilidade para facilitar a demissão em casos de baixa produtividade — essa última proposta sofre críticas inclusive de economistas liberais que consideram o mecanismo uma defesa contra perseguição política.

No Poder Executivo, algumas das carreiras que se destacam pela elevada remuneração paga aos recém-concursados são as de delegado da Polícia Federal (R$ 23.692,74), auditor-fiscal da Receita Federal (R$ 21.029,09), advogado da União (R$ 21.014,49), diplomata (R$ 19.199,06) e analista do Banco Central ou de Planejamento e Orçamento (R$ 19.197,06). São valores que colocam esses servidores entre os brasileiros mais ricos, no instante que ingressam na carreira.

De acordo com a Oxfam, organização internacional que atua na redução de desigualdades, trabalhadores com salário mensal a partir de R$ 15 mil já estão entre os 2% de maior renda no país, quando consideradas pessoas de mais de 18 anos que possuam alguma fonte de recursos. Já uma remuneração a partir de R$ 23 mil coloca o indivíduo entre o 1% mais rico.

Esses dados foram extraídos, a pedido da BBC News Brasil, de uma calculadora criada pela Oxfam com dados oficiais do IBGE e da Receita Federal para evidenciar a diferença de renda e do peso dos impostos sobre diferentes extratos sociais no país.

Para Rodrigo Maia, os ganhos iniciais altos e a rápida progressão permitida em algumas carreiras reduzem o "estímulo" para que o servidor público se esforce mais.

"Tem uma cúpula (de servidores) dos três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) que começa já ganhando perto do teto (do funcionalismo, hoje em R$ 39 mil). Então, eu pergunto: não é correto, em vez de a pessoa começar ganhando R$ 25 mil, ela começar ganhando R$ 12 mil, R$ 15 mil, que para o Brasil já é uma grande salário?", questionou Maia, em entrevista em outubro ao programa Poder em Foco, do SBT.

Os salários pagos à elite do Poder Executivo não estão apenas muito acima da renda per capita do país (R$ 1.373, segundo o IBGE), mas superam também largamente a de pessoas altamente escolarizadas. De acordo com o Relatório Anual de Informações Sociais (Rais) do Ministério da Economia, a remuneração média de profissionais com doutorado no Brasil, seja no setor privado ou público, estava em R$ 12.141 em dezembro de 2018.

Mas há salários iniciais ainda mais altos nos Poderes Judiciário e Legislativo. A remuneração mais baixa oferecida hoje para juízes federais no Brasil é de R$ 32 mil, mesmo patamar oferecido pelo Senado Federal como salário de entrada para o cargo de consultor legislativo.

O economista Nelson Marconi, professor nos cursos de Administração Pública e Governo da FGV-SP, atribui os altos salários da elite do funcionalismo a dois fatores: capacidade maior de pressão sobre o governo e o Congresso e a proximidade do processo decisório.

"Legislativo e Judiciário sempre tiveram mais liberdade para reajustar que Executivo, pois têm um número menor pessoas, então o impacto fiscal não é tão grande. Eles acabam conseguindo reajuste e aí, na sequência, as categorias mais fortes do Executivo, como Polícia Federal e Receita, pressionam também para não ficar muito atrás", ressalta.

"E há a proximidade de vários servidores do processo decisório (do governo). Você está negociando com seus pares. É uma relação diferente do setor privado, em que há o patrão e o trabalhador. Quem no setor privado ganha R$ 19 mil no início da carreira?", compara.

No entanto, o Ministério da Economia não esclareceu se a reforma atingirá apenas os servidores da União, ao ser questionado pela BBC News Brasil. Apenas o STF e o Congresso podem dar início a projetos de lei que alterem as carreiras dos servidores do Judiciário e do Legislativo, respectivamente. No entanto, o governo tem sinalizado com o envio de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) — nesse caso, a reforma poderia atingir funcionários de todos os Poderes.

Na tentativa de reduzir resistências dentro do funcionalismo e questionamentos jurídicos sobre direitos já adquiridos, o governo tem dito que as mudanças valerão apenas para servidores contratados após a reforma. Ainda assim, a proposta vem sofrendo grande oposição dentro do funcionalismo e, por isso, seu envio ao Congresso, previsto inicialmente para outubro, foi adiado para o ano que vem.

Líderes de associações de servidores ouvidos pela BBC News Brasil reconheceram que algumas categorias têm salários de partida elevados e que é possível melhorar os sistemas de avaliação de desempenho. No entanto, argumentam que um bom patamar de remuneração é importante para atrair bons quadros para o funcionalismo e temem que a reforma defendida pelo governo precarize o serviço público prestado à população. Eles ressaltam que há pessoas que entram no serviço público já no meio da carreira, tendo experiência profissional e pós-graduação.

No governo anterior, do presidente Michel Temer, a equipe econômica chegou a defender um limite de R$ 5 mil para o salário inicial dos servidores. Segundo estimativa divulgada em outubro pelo Banco Mundial, se fosse adotado esse teto para e também alongado o tempo necessário para se chegar a ganhos mais altos, a União economizaria R$ 104 bilhões até 2030.

No mesmo documento, o Banco Mundial apontou que os os servidores públicos federais brasileiros ganham quase o dobro (96% a mais) do que os trabalhadores do setor privado com mesma escolaridade. A maioria do funcionalismo, porém, trabalha para municípios, onde os salários são similares aos do setor privado, aponta o estudo. Segundo o Ipea, os servidores municipais ganhavam em média R$ 3 mil em 2016.

O documento do Banco Mundial vem sendo citado pela equipe de Paulo Guedes para defender a reforma administrativa. Opositores da proposta do governo, por sua vez, criticam a metodologia usada no estudo argumentando que carreiras típicas de Estado não têm correspondente na iniciativa privada.

"Essa comparação é totalmente descabida. Você vai comparar um diplomata com que trabalhadores da iniciativa privada? Com quem você vai comparar um auditor da Receita Federal? Só ele tem prerrogativas da política tributária", afirma Rudinei Marques, presidente do Fonacate (Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado).

"Quem vai gerir R$ 3 trilhões (orçamento do governo federal)? É muito pagar para um servidor desse R$ 15 mil, R$ 16 mil como salário inicial? Acho que não", reforça, em referência à remuneração líquida inicial de carreiras que administram as contas federais.

Para o economista José Celso Cardoso, Presidente da Associação de Funcionários do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), a comparação feita pelo Banco Mundial "tenta jogar a população contra os servidores públicos usando uma estatística que é uma tortura de dados". Ele acusa o governo de estar focado apenas em cortar gastos, e não em uma reforma que melhore o serviço público. Embora reconheça que alguns salários iniciais são altos, Cardoso considera arriscado uma redução para R$ 5 mil, por exemplo.

"Se eu jogo o salário de entrada muito embaixo, você vai atrair profissionais menos qualificados, menos estimulados, e o resultado agregado desse movimento vai ser diminuir o custo da folha de pagamento e piorar a qualidade do serviço público. Qual o custo da piora da qualidade do serviço público? Ninguém fez essa conta", ressalta.

"Imagine um fiscal da Receita Federal que trabalhe cobrando empresários. O salário inicial líquido vai dar uns R$ 16 mil. Eu acho alto para o padrão brasileiro. Mas, se for menos, vai reduzir a corrupção? Esse cara vai ser mais ou menos facilmente capturado pelo empresário que quer burlar a fiscalização?", acrescenta.

Segregação, teu nome é Brasil

Somos um país segregado na geografia, basta ir ao Rio de Janeiro e ver quem mora nos bairros violentos e dominados pelo crime organizado e quem vive em Copacabana ou no Leblon, na zona sul. Também é um país segregado nos números, indicadores sociais. Por qualquer critério que você queira medir o Brasil, seja renda, emprego, segurança pública, existe um abismo entre oportunidades para a população branca e negra 

Infratores ambientais encontraram um caminho para o poder

Em 2013, o grileiro Rodrigo Santos foi multado por devastar uma área protegida no Acre. Furioso, ameaçou o fiscal que havia aplicado a punição: "Cadeia, a gente entra e a gente sai. Caixão não. Só tem entrada, não tem saída".

No ano seguinte, ele mudou de estratégia e tentou entrar na política para blindar suas atividades ilegais. "Se o governo quer me expulsar, eu me torno governo para ver se eles me expulsam", afirmou Santos. Ele concorreu a deputado estadual. Recebeu 594 votos e não foi eleito.

O grileiro fracassou nas urnas, mas parece ter encontrado um caminho para o poder. O repórter Fabiano Maisonnave conta que Santos integrava um grupo de infratores ambientais que foi ao gabinete do ministro Ricardo Salles, em novembro, para reclamar da fiscalização na reserva extrativista Chico Mendes.

Um dos participantes relatou à Folha que, no encontro, o chefe do instituto de conservação anunciou a suspensão de operações naquela área "devido ao abuso de autoridade" dos agentes do órgão.


O governo Jair Bolsonaro insiste que há excessos no controle ambiental no país. Em vez de discutir mudanças e analisar casos específicos, oferece uma proteção generosa a quem se beneficia de ações que ferem abertamente as regras de preservação das matas e florestas.

Só neste ano, o desmatamento naquela área cresceu mais de 200%. Produtores negociam terras ilegalmente e praticam atividades econômicas incompatíveis com a reserva.

O time do lobby que foi ao gabinete de Salles incluía um ex-procurador-geral do Acre denunciado por devastação ilegal de um pedaço de terra para abrir uma estrada. Outra integrante da equipe cria gado numa região que deveria atender apenas aos seringueiros.

O grupo foi ciceroneado por parlamentares do estado que elaboram um projeto de lei para legalizar as áreas ocupadas irregularmente pela pecuária. O texto favorece perfeitamente grileiros como Santos. Ele finalmente se tornou governo.

' 'Os sertões" tem que ser lido todos os dias, enquanto persistir a situação dos pobres brasileiros

A 17ª Festa Literária de Paraty (Flip) começou nesta quarta-feira bem ao estilo de seu homenageado, Euclides da Cunha: densa, dura e desbravadora de linguagens. Música e literatura misturaram-se em uma noite em que Walnice Nogueira Galvão, ensaísta e crítica literária, brindou o público com todos os seus conhecimentos de décadas da obra euclidiana. "Euclides viu de perto, pela primeira vez, o povo brasileiro. Viu que o povo brasileiro é mestiço, messiânico, analfabeto, e não os brancos ricos do Rio de Janeiro", afirmou, ao referir-se a Os Sertões durante uma conferência de mais de uma hora, ante uma plateia majoritariamente branca.

A atualidade da obra que narra a Guerra de Canudos (1896-1897) será debatida até este domingo (14) por 33 intelectuais —sendo 17 mulheres— de 10 nacionalidades, em áreas que vão da sociologia à fotografia e abordando temas como raça, gênero e pós-colonialismo. Os temas têm tudo a ver com o livro. "Os Sertões é uma colcha de retalhos de muitas outras narrativas", explicou Galvão, ao lembrar que, ainda que esconda o fato hermeticamente em sua obra-prima, o autor passou apenas três semanas em Canudos e valeu-se, em grande medida, do testemunho de terceiros para construir seu relato.


Euclides debruçou-se sobre o massacre de Canudos ao perceber a desonestidade dos relatos oficiais que publicavam-se à época. "Não foi Trump quem inventou as fake news. Os repórteres que cobriram Canudos eram militares, muitos deles combatentes, e publicavam notícias falsas sobre o suposto perigo que aquelas pessoas representavam", explicou a especialista. O próprio Euclides, no entanto, vinha de formação militar, o que supôs um conflito que, para Galvão, também ficou impresso no livro. "O leitor pode acompanhar na obra a tensão e o sofrimento de quem a escreve. Ele acreditava verdadeiramente em uma instituição que agora matava o povo que deveria proteger".

A especialista também compartilhou com o público detalhes curiosos do escritor. Os Sertões, publicado em 1902, bateu um recorde brasileiro à época ao ganhar três edições nos três primeiros anos de publicação. Isso deu rédea solta, de acordo com Galvão, ao "transtorno obsessivo-compulsivo emendador" de Euclides. De acordo com a especialista, durante esse período, o escritor apagou, uma por uma, cerca de mil "vírgulas vagabundas" da primeira edição.

Na abertura oficial da Flip 2019, o público também pôde deliciar-se com o espetáculo Mutação de Apoteose, inspirada em um trecho de A Terra, primeira parte do clássico de Euclides, com direção artística da atriz Camila Mota. A montagem nasceu no Teatro Oficina, que criou-a na década passada a partir de canções de nomes como Adriana Calcanhotto, Chico César, Tom Zé e Arnaldo Antunes para as adaptações das obras de Euclides.

"Euclides da Cunha é um autor que imprime muita oralidade na escrita, que inevitavelmente se transformou em música na aventura de transpor o livro para o teatro. Agora, é uma nova transposição, que parte da matéria criada pela encenação do Teatro Oficina, mas coloca novamente as palavras cantadas como motor do espetáculo”, declarou Mota à imprensa. “Voltar a Os Sertões, que revelou a força estética das insurreições, das lutas contra o martírio da terra, é muito importante neste momento, em que devemos invocar inteligência, clareza, interpretação e eloquência", concluiu.

Fazendo eco de suas palavras, Walnice Nogueira Galvão encerrou a conferência de abertura lembrando que as violências narradas na obra euclidiana perduram na sociedade brasileira atual. "Os Sertões tem que ser lido todos os dias, enquanto persistir a situação dos pobres brasileiros. Enquanto ocorrer o genocídio dos jovens negros nas favelas de São Paulo, a militarização das comunidades do Rio de Janeiro, enquanto acontecerem tragédias como as de Mariana e Brumadinho", disse, ante os aplausos da plateia. Minutos depois, o palco foi tomado por imagens da crueldade brasileira: o assassinato de Marielle Franco, os (mais de) 80 tiros que mataram Evaldo dos Santos Rosa, a morte de Marcos Vinícius, de 14 anos, baleado durante operação policial na Favela da Maré quando ia para a escola. A música que começou na sequência não suavizou a dureza da mensagem. 

Pensamento do Dia


Ai Ai Ai 5

Parece ensaiado. A intervalos, alguém do governo cita o AI-5. Depois diz que não disse, que foi mal interpretado, que foi distração etc. Um filho do presidente (não me lembro qual, ainda não decorei a lista) chamou o AI-5 de recurso da direita, caso a esquerda se levantasse e pedisse briga. Não ficou claro que tipo de ação da esquerda justificaria uma reedição do AI-5 pela direita, mas o jovem Bolsonaro se apressou a desmentir a si mesmo. Seu AI-5 era teórico, explicou, não uma ameaça. Depois foi a vez de o Paulo Guedes lembrar o AI-5 numa entrevista coletiva, en passant.



O AI-5 endureceu de vez a ditadura que o Bolsonaro diz que não houve. Com cobertura legal, fecharam o Congresso, censuraram a imprensa, torturaram e mataram presos políticos e meros opositores do regime. Quando ameaçam, mesmo distraídos, com a volta do AI-5 estão pregando a volta de um terror de Estado que nada legitima ou perdoa, nem a teoria. Quem defende o AI-5 como mal necessário — na categoria de meios lamentáveis para fins justificáveis — não sabe o que está dizendo. É ruim da cabeça ou estava inconsciente na ocasião. Tem muita gente, claro, disposta a esquecer ou ignorar os horrores daquela época, como provou a eleição do Bolsonaro. Há os que não esquecem o que nunca souberam ou ignoram o que não lhes interessa. Também existe a inconsciência induzida.

Na sutil pregação de uma volta ao AI-5 , declarada, negada, declarada outra vez e depois desdita, o ato também visa a assustar, mas não como um aviso do que pode acontecer se o governo for obrigado a fechar para enfrentar uma esquerda reativada, mas como uma mãe alertando o filho para seu mau comportamento, preâmbulo de umas palmadas corretivas. Em vez de um AI-5, um Ai Ai Ai 5.
Luis Fernando Parece ensaiado. A intervalos, alguém do governo cita o AI-5. Depois diz que não disse, que foi mal interpretado, que foi distração etc. Um filho do presidente (não me lembro qual, ainda não decorei a lista) chamou o AI-5 de recurso da direita, caso a esquerda se levantasse e pedisse briga. Não ficou claro que tipo de ação da esquerda justificaria uma reedição do AI-5 pela direita, mas o jovem Bolsonaro se apressou a desmentir a si mesmo. Seu AI-5 era teórico, explicou, não uma ameaça. Depois foi a vez de o Paulo Guedes lembrar o AI-5 numa entrevista coletiva, 
en passant.

O AI-5 endureceu de vez a ditadura que o Bolsonaro diz que não houve. Com cobertura legal, fecharam o Congresso, censuraram a imprensa, torturaram e mataram presos políticos e meros opositores do regime. Quando ameaçam, mesmo distraídos, com a volta do AI-5 estão pregando a volta de um terror de Estado que nada legitima ou perdoa, nem a teoria. Quem defende o AI-5 como mal necessário — na categoria de meios lamentáveis para fins justificáveis — não sabe o que está dizendo. É ruim da cabeça ou estava inconsciente na ocasião. Tem muita gente, claro, disposta a esquecer ou ignorar os horrores daquela época, como provou a eleição do Bolsonaro. Há os que não esquecem o que nunca souberam ou ignoram o que não lhes interessa. Também existe a inconsciência induzida.

Na sutil pregação de uma volta ao AI-5 , declarada, negada, declarada outra vez e depois desdita, o ato também visa a assustar, mas não como um aviso do que pode acontecer se o governo for obrigado a fechar para enfrentar uma esquerda reativada, mas como uma mãe alertando o filho para seu mau comportamento, preâmbulo de umas palmadas corretivas. Em vez de um AI-5, um Ai Ai Ai 5.

Reforma mantém pensão antecipada para família de militares expulsos

Ao defender a reforma das regras de pensão e aposentadoria, o governo Bolsonaro bateu na tecla de que toda a população daria sua cota de sacrifício para o ajuste das contas públicas — aposentando mais tarde ou recebendo um valor menor, por exemplo.

Mas a reforma dos militares, prestes a ser aprovada no Congresso, conseguiu preservar benefícios que até oficiais da reserva e da ativa ouvidos pela reportagem consideram privilégios injustificáveis.

É o caso da pensão paga antecipadamente às famílias dos militares que são expulsos das Forças Armadas por terem cometido crimes.

Hoje, a família de um militar demitido após cometer um crime passa a receber, em média, R$ 4.100 por mês depois da saída dele do quadro das Forças Armadas. Por ano, ao menos 595 famílias ganham, em média, R$ 53 mil.

O cálculo, feito pelo Ministério da Defesa a pedido da BBC News Brasil, considera os casos de demissão ou licenciamento de militar condenados à pena restritiva de liberdade individual superior a dois anos, conforme decisão do Superior Tribunal Militar (STM).

Segundo a regra atual, a pensão antecipada tem o mesmo valor do salário do militar. Com a chamada "morte ficta" (ou morte presumida), os dependentes recebem o benefício integral como se o militar tivesse morrido, independente da idade dele no momento do crime.

A reforma das pensões militares, enviada ao Congresso em março, não acaba com esse benefício, mas prevê que, nos próximos casos de expulsão, o valor dela passe a ser proporcional ao tempo de serviço.

Na Marinha, 312 pessoas recebem hoje esse tipo de pensão e, na Aeronáutica, 270. O Exército não informou o número total de pensionistas nessa categoria e disse apenas que 13 pensões dessa categoria foram concedidas desde 2015.

É exatamente no Exército, no entanto, que está a maior parte dos militares, com um efetivo de 225,7 mil pessoas. Isso é cerca de três vezes o efetivo de cada uma das outras duas forças: a Marinha tem 78,1 mil integrantes e a Aeronáutica, 68,1 mil.

Sob a condição de anonimato, militares da ativa e da reserva reconheceram que não é fácil justificar a existência do benefício, especialmente em um momento de aperto nos gastos do governo. A mesma avaliação é feita, nos bastidores, por integrantes da equipe econômica do governo.

Embora os integrantes das Forças Armadas rejeitem comparações com o sistema previdenciário dos civis, nesse ponto é comum fazer a relação do benefício aos militares expulsos com a aposentadoria compulsória como punição no Judiciário.

A reforma da Previdência acabou com a possibilidade de aposentadoria compulsória como punição para juízes e membros do Ministério Público. O relator da proposta dos civis, Samuel Moreira (PSDB-SP), classificou a regra como "esdrúxula". O texto foi promulgado em novembro.

No caso da reforma dos militares, que ainda está em análise pelos parlamentares, o relator da proposta na Câmara, deputado Vinicius Carvalho (Republicanos-SP), defendeu o pagamento de pensão à família do militar expulso por crime.

"Cabe esclarecer que não é o militar que tem direito à pensão, mas sim os beneficiários previstos em lei. As situações devem ser avaliadas de forma independente: o fato de o militar cometer algum crime e ser expulso das Forças Armadas não implica desconsiderar o montante das contribuições já realizadas", afirmou, em resposta encaminhada à reportagem por meio da assessoria de imprensa.

O Ministério da Defesa defende que essas pensões devem ser tratadas da mesma forma que aquelas pagas após a morte de um militar. Por meio da assessoria de imprensa, destacou também que esses benefícios não são pagos de forma automática, mas após decisão do STM.

"A instituição dessas pensões especiais cumpre decisão judicial. Então, não há porque diferenciar a pensão por decisão judicial imposta pelo Superior Tribunal Militar daquela instituída quando da morte do militar."

O Regulamento Disciplinar do Exército, que é um decreto de 2002, prevê o "licenciamento e exclusão a bem da disciplina". Isso pode acontecer quando "houver condenação transitada em julgado por crime doloso, comum ou militar", segundo o texto.

As novas regras podem virar lei ainda neste ano. Depois de ter sido aprovado pela Câmara, o projeto depende do aval do Senado, onde o relatório deve ser votado pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional na próxima terça-feira (3). A expectativa é que, logo em seguida, o presidente da Casa, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), coloque o texto em votação no plenário do Senado. Se não houver mudanças, segue para sanção de Bolsonaro.

A proposta em tramitação prevê também que, para ir para a inatividade, o tempo mínimo de serviço subirá dos atuais 30 anos para 35 anos, com pelo menos 25 anos de atividade militar, para homens e mulheres que ingressarem nas Forças Armadas.

Eles terão direito à integralidade (ou seja, remuneração igual ao último salário) e paridade (reajuste igual ao aplicado para os servidores ativos) — benefícios que já foram retirados dos servidores civis.

Outra mudança é que as contribuições referentes às pensões subirão dos atuais 7,5% da remuneração bruta para 9,5% em 2020 e 10,5% em 2021.

Por outro lado, o mesmo texto reestrutura a carreira e prevê aumentos de remuneração maiores para militares no topo da carreira do que para os de patentes mais baixas.

Críticos da proposta dizem que ela não reduz privilégios dos militares e reclamam desse aumento de salários em um momento de corte de gastos. A justificativa das Forças Armadas é que a categoria não recebe reajuste há anos, tendo ficado muito atrás dos ganhos de outras carreiras federais, como juízes, procuradores e auditores fiscais.

O Ministério da Defesa foi responsável pela elaboração da proposta da própria reforma.

O impacto nas contas públicas será de uma economia de R$ 10,45 bilhões ao longo de uma década, segundo cálculos do governo. O valor é resultado da diferença entre a previsão de aumento de gastos de R$ 86,65 bilhões em dez anos devido à reestruturação e a redução de despesas em R$ 97,3 bilhões com inativos e pensionistas.

A reforma para os servidores civis e os trabalhadores vinculados ao INSS, que já foi aprovada e promulgada, representará uma economia de cerca de R$ 800 bilhões em uma década.

Para o economista Pedro Nery, o projeto dos militares é "razoável" na parte que trata da previdência dos militares, por elevar alíquotas e aumentar o tempo de serviço exigido. Ele destaca, no entanto, que não foi o melhor momento para tratar da reestruturação salarial.

"A questão da reestruturação salarial (dos soldos) foi intempestiva e poderia quem sabe ser feita em outro momento. Ainda que haja defasagem com outras carreiras, o momento é ruim e o impacto é alto. Há pouco espaço fiscal e muita carência na área social."

Em relação à morte ficta, Nery diz que faz sentido manter um benefício assim, visto que nos outros regimes de Previdência (dos servidores civis e dos trabalhadores da iniciativa privada) há compensação entre regimes.

"Quem sai de um pode se aposentar em outro", diz o economista. "No caso do militar, como não há contribuição direta, não se fala em compensação. A morte ficta tem a mesma lógica: poder levar para fora do 'regime' um proporcional de acordo com seu tempo."

2019, o ano que não quer acabar

Todos que me acompanham (fora o pessoal do homecare) têm certeza de que o Brasil está no buraco. Um orifício tão profundo que as mineradoras poderiam procurar ouro, prata, nióbio, grafeno e outros metais bolsonobres que, assim como eu, vivem nas inexploradas profundezas do buraco brasileiro.

O brasileiro, povo indolente e mau-caráter, prefere passar o dia emaconhado ao som do roquenrrol. Esse ritmo satânico desperta em nossa juventude seus mais baixos instintos carnais. Sob os eflúvios da erva maldita e os embalos do iê-iê-iê, a nossa juventude se entrega ao sexo desenfreado e sem limites com um único e insidioso propósito: engravidar e, assim, poder praticar o aborto.


Os fetos natimortos, por sua vez, são vendidos aos laboratórios farmacêuticos multinacionais, que se utilizam de tecido fetal humano para fabricar o Viagra, o Cialis e outras substâncias eroto-eréteis que são consumidas na indústria perversa do séquisso.

E não sou só eu, Agamenon Mendes Pedreira, quem sabe desse esquema secreto do comunismo internacional. O presidente da Afundarte, organismo que não sei para que serve (mas boa coisa não deve ser, pois te FU logo no princípio), também tem ciência dessa conspiração nefasta.

Se isso fosse pouco, o presidente da avantajada Fundação Palmoles foi criticado e denegrido por afirmar que a escravidão foi uma boa para os afrocativos. Mas é claro que foi! De que outra forma o povo miserável da África subsaariana poderia conhecer a Bahia, o Caribe e a Disney sem o benefício da escravatura? Isolados no meio da floresta da Guiné, os afroafricanos jamais teriam viajado de navio transatlântico e aprendido que o planeta Terra é plano como uma mesa de sinuca com seis buracos.

A escravidão também foi uma boa para o Laurentino Gomes, que está faturando uma grana preta com os seus livros histórico-escravistas. Isso para não falar da Black Friday.

Digo e afirmo tudo isso sem temor, pois, jornalista intimorato, desconheço o sentimento do caga$%ˆ&$#ço. Não tenho medo de ser preso, mesmo porque roubei muito pouco para o Gilmar Mentes e o DiasPToffoli me soltarem depois.

Ao longo da minha vida, cobri muitas guerras e mulheres. Rigorosamente nesta ordem. Mas hoje pratico uma dieta mais modesta. Me contento em saborear a “quentinha” da Isaura, minha patroa, que, generosa, alimenta as populações de rua, cada vez mais na rua.

Portugal já está botando brasileiro pelo ladrão. Ladrão brasileiro, é claro. Daqui a pouco, o Eduardo Cunha vai virar primeiro-ministro dos portugueses. Por isso, vou me mudar para a Virgínia, onde mora o filhósofo Nãolavo Meu Carvalho. Vou trabalhar como assistente desse grande intelectual caçando ursos selvagens. Dessa forma, poderei garantir uma fonte de proteína animal sem gastar nenhum tostão. Até porque a carne no Brasil está cada vez mais cara e custando os olhos da cara. E olha que não tem inflação, os juros estão baixos, uma coisa que nem a Miriam Peitão (que também aumentou) consegue explicar.

Ao final disso tudo, pelo menos uma boa notícia: o Judiciário e o Legislativo vão entrar em recesso, o que é uma garantia de melhoria na qualidade de vida do povo brasileiro. Infelizmente, o Executivo continuará funcionando, mas pelo menos o Bolsonaro resolveu Jair mandando seus filhos para uma colônia penal de férias. Já é alguma coisa… Depois vêm o Carnaval, a Semana Santa, as Festas Juninas e Julinas, as eleições, o Natal, Ano Novo e pronto: 2020 acabou! Ufa!
Agamenon Mendes Pedreira é o único brasileiro que ficou nu em Woodstock