quarta-feira, 5 de abril de 2017
Reforma em dois tempos
Se a política é a arte do possível, como afirmava Otto Von Bismarck, se faz necessário convergir para uma reforma política consistente e palatável à opinião pública, para que não se aprofunde mais ainda o fosso entre a sociedade e seus representantes. O desafio é dar passos na direção de uma reforma capaz de contribuir para a superação da gravíssima crise de representação.
A reforma política entrou na ordem dia menos por uma consciência dos partidos e parlamentares do estado de putrefação do nosso sistema político e mais por instinto de sobrevivência. Para os arrolados nas denúncias e investigações a conquista de um novo mandato em 2018 passou a ser uma questão de vida ou morte.
Nem por isso a reforma política deixa de ser necessária. A questão é saber a quem ela servirá. Se ao país ou a quem está de olho apenas na conquista de um novo mandato para continuar usufruindo do foro privilegiado.
O risco de uma reforma mambembe é real, sobretudo se for levada em consideração a frase de James Freeman Clarke, segundo a qual o político pensa na próxima eleição, enquanto o estadista – essa espécie em extinção em nosso país – pensa na próxima geração.
Pensar em uma reforma voltada para o futuro e para a oxigenação da vida política nacional implica em definir qual o seu ponto de chegada e qual o seu ponto de partida, entendendo-a como um processo que pode ter vários atos. Idealmente, deveríamos marchar para o parlamentarismo, mas hoje não se vislumbra essa hipótese até onde a vista alcança.
Se o ideal não está ao alcance das mãos, vamos ao factível.
No atual estágio o mais prudente seria adotar uma reforma política em duas etapas, como sugeriu o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, tendo como meta a adoção do voto distrital misto em 2022, quando aí sim seria admissível o voto em lista (fechada ou flexível) e o financiamento público de campanha-, como existe em países de larga tradição democrática.
Em seu primeiro ato, a reforma deveria se limitar em criar as condições para a implantação do voto distrital misto no médio prazo. Dito de maneira clara: para 2018 a reforma se limitaria a adoção da cláusula de barreira e o fim das coligações proporcionais, com vistas a colocar um fim na miríade de partidos.
Essa é a pedra de toque de qualquer reforma minimamente séria. O Brasil tem hoje 35 legendas partidárias informes e gelatinosas do ponto de vista ideológico ou pragmático.
Há uma fábrica de produção em linha de partidos políticos. O site do TSE registra 57 em formação. Dois deles estão prontos para sair em formação em tempo hábil para disputar a eleição do ano que vem. Temos até partido-satélite, o Muda Brasil, linha auxiliar do PR de Waldemar da Costa Neto.
Com esse caleidoscópio partidário é inviável não apenas a governabilidade mas, o próprio saneamento dos costumes e da cultura política nacional. Não é possível adotar o voto em lista preordenada, onde os caciques e a burocracia partidária definirão quem serão os primeiros da lista, e o financiamento público de campanha em meio a tamanho caos.
A reforma por etapas teria outra vantagem. Daria à sociedade a oportunidade de se esclarecer e dirimir suas suspeitas de que a adoção do voto em lista tem por objetivo fornecer um refúgio para parlamentares arrolados na Lava jato continuarem usufruindo do fórum privilegiado.
A assimilação de qualquer reforma pelos brasileiros está na razão direta da sua transparência. O Plano Real logrou sucesso por ter essa virtude. Concebido com regras claras por meia dúzia de economistas intelectualmente capacitados, foi explicado com detalhes e aplicado com muita competência por uma equipe técnica eficiente, liderada por políticos corajosos que tinham fibra, convicção e argumentos para confrontar divergentes.
Esse é o ponto. Se for um pacote casuístico enfiado goela à baixo da sociedade, a percepção da população sobre a reforma será que estão subtraindo o direito de escolher o seu representante. Em vez de diminuir, a reforma ampliará mais ainda o fosso já abismal entre representantes e representados.
Seus efeitos perversos se farão sentir nas urnas em 2018. O desencanto pode levar a um número astronômico de abstenção, voto nulo e branco. Nessas circunstâncias, a crise de representação só se agravaria, face a possibilidade real de termos um legislativo com parlamentares eleitos às escondidas do eleitor e por um número reduzido de eleitores.
Tudo o que o Brasil não precisa é uma reforma-Lampedusa, onde algo é preciso mudar para continuar como está.
A reforma política entrou na ordem dia menos por uma consciência dos partidos e parlamentares do estado de putrefação do nosso sistema político e mais por instinto de sobrevivência. Para os arrolados nas denúncias e investigações a conquista de um novo mandato em 2018 passou a ser uma questão de vida ou morte.
O risco de uma reforma mambembe é real, sobretudo se for levada em consideração a frase de James Freeman Clarke, segundo a qual o político pensa na próxima eleição, enquanto o estadista – essa espécie em extinção em nosso país – pensa na próxima geração.
Pensar em uma reforma voltada para o futuro e para a oxigenação da vida política nacional implica em definir qual o seu ponto de chegada e qual o seu ponto de partida, entendendo-a como um processo que pode ter vários atos. Idealmente, deveríamos marchar para o parlamentarismo, mas hoje não se vislumbra essa hipótese até onde a vista alcança.
Se o ideal não está ao alcance das mãos, vamos ao factível.
No atual estágio o mais prudente seria adotar uma reforma política em duas etapas, como sugeriu o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, tendo como meta a adoção do voto distrital misto em 2022, quando aí sim seria admissível o voto em lista (fechada ou flexível) e o financiamento público de campanha-, como existe em países de larga tradição democrática.
Em seu primeiro ato, a reforma deveria se limitar em criar as condições para a implantação do voto distrital misto no médio prazo. Dito de maneira clara: para 2018 a reforma se limitaria a adoção da cláusula de barreira e o fim das coligações proporcionais, com vistas a colocar um fim na miríade de partidos.
Essa é a pedra de toque de qualquer reforma minimamente séria. O Brasil tem hoje 35 legendas partidárias informes e gelatinosas do ponto de vista ideológico ou pragmático.
Há uma fábrica de produção em linha de partidos políticos. O site do TSE registra 57 em formação. Dois deles estão prontos para sair em formação em tempo hábil para disputar a eleição do ano que vem. Temos até partido-satélite, o Muda Brasil, linha auxiliar do PR de Waldemar da Costa Neto.
Com esse caleidoscópio partidário é inviável não apenas a governabilidade mas, o próprio saneamento dos costumes e da cultura política nacional. Não é possível adotar o voto em lista preordenada, onde os caciques e a burocracia partidária definirão quem serão os primeiros da lista, e o financiamento público de campanha em meio a tamanho caos.
A reforma por etapas teria outra vantagem. Daria à sociedade a oportunidade de se esclarecer e dirimir suas suspeitas de que a adoção do voto em lista tem por objetivo fornecer um refúgio para parlamentares arrolados na Lava jato continuarem usufruindo do fórum privilegiado.
A assimilação de qualquer reforma pelos brasileiros está na razão direta da sua transparência. O Plano Real logrou sucesso por ter essa virtude. Concebido com regras claras por meia dúzia de economistas intelectualmente capacitados, foi explicado com detalhes e aplicado com muita competência por uma equipe técnica eficiente, liderada por políticos corajosos que tinham fibra, convicção e argumentos para confrontar divergentes.
Esse é o ponto. Se for um pacote casuístico enfiado goela à baixo da sociedade, a percepção da população sobre a reforma será que estão subtraindo o direito de escolher o seu representante. Em vez de diminuir, a reforma ampliará mais ainda o fosso já abismal entre representantes e representados.
Seus efeitos perversos se farão sentir nas urnas em 2018. O desencanto pode levar a um número astronômico de abstenção, voto nulo e branco. Nessas circunstâncias, a crise de representação só se agravaria, face a possibilidade real de termos um legislativo com parlamentares eleitos às escondidas do eleitor e por um número reduzido de eleitores.
Tudo o que o Brasil não precisa é uma reforma-Lampedusa, onde algo é preciso mudar para continuar como está.
O Estado podre e a Nação emparedada
“Há algo de podre
no reino da Dinamarca”William Shakespeare (‘Hamlet’)
O estágio de decomposição moral vivido no Brasil oficial hoje resulta de muitos anos – o correto seria dizer séculos – de completa devassidão e absoluta impunidade gozadas por nossas elites dirigentes política e econômica. No entanto, chegamos agora a um ponto, inusitado em nossa História, em que o cinismo ultrapassou todos os limites da decência e da normalidade. A dimensão do rombo na economia pode ser imaginada após a leitura da chamada de primeira página do Estado de anteontem, Ações da Lava Jato pedem R$ 70 bilhões de indenização, ou seja, cerca de metade do déficit previsto para o Orçamento da República este ano.
Parlamentares, membros do Executivo, dirigentes partidários do governo e da oposição e agora fiscais da atuação destes no Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro foram pilhados cobrando propinas de empresas que prestam serviços a estatais, em troca do atendimento a suas reivindicações e seus interesses. E lhes propiciaram lucros exorbitantes em obras não executadas ou mal realizadas. O noticiário acompanha dia a dia o esvaziamento metódico e solerte de todos os cofres do erário, tudo feito com a maior desfaçatez.
O novo caso revela o extremo desse desplante. Parlamentares permitiam que empresas fizessem leis a seu talante e governantes lhes abriam os cofres para que deles fizessem o que bem pretendessem. E pelo menos uma das “cortes” que deveriam auditar as contas de um Estado também foi calada por propinas. Pode-se afirmar que nunca antes na História deste país (e quiçá do inteiro gênero humano) foi praticado o que se executou nestes 14 anos: um assalto de enormes proporções sem que nenhuma providência prática tenha sido adotada para pôr fim a tanta bandalheira. E embora não seja possível conviver mais com isso, é difícil imaginar como pode ser feito, pois o Estado, em franco apodrecimento, emparedou a Nação para impedir que esta aja.
Neste pântano em que o Brasil oficial afundou o País real, a constatação ganha ares (melhor dizer miasmas) de rigidez cadavérica pelo fato de que os três Poderes republicanos agem para acobertar os criminosos, impedindo que eles sejam devidamente processados e punidos, na medida em que possam fazê-lo. É bem verdade que não vige mais entre nós o preceito que destina só aos três pês – prostitutas, pobres e pretos – o inferno prisional. Nas masmorras da “república de Curitiba” o príncipe dos empreiteiros brasileiros, da fina-flor do empresariado, Marcelo Odebrecht, cumpre dolorosa pena. E outros tiveram de apelar para a delação premiada a fim de evitar o mesmo destino. Essa, contudo, não é a regra.
Neste momento, urge dar outro passo histórico. Um dos beneficiários do clube dos acobertados pelo manto da impunidade garantida vem de ser condenado a 15 anos e 4 meses de prisão pelo juiz Sergio Moro, o principal responsável pela revolução presente. Ex-presidente da Câmara dos Deputados e principal responsável pela abertura do processo do impeachment – mais que indispensável, necessário – da petista Dilma Rousseff, Eduardo Cunha recorreu ao cinismo, à truculência e, sobretudo, a chicanas jurídicas e regimentais do Parlamento para se livrar das penas da lei. Mas terminou sendo investigado, preso, processado e condenado pelos rigores da primeira instância, deixando de se valer da tolerância máxima permitida pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
No momento em que isso ocorre, contudo, mais de uma centena de seus colegas de poder partidário usufruem a benesse do sigilo, sob o qual reina a impunidade garantida pela benemerência do relator da Lava Jato na Corte, Luiz Edson Fachin. Entre tais privilegiados está o presidente nacional do PSDB, Aécio Neves, que execra a “delação seletiva” de que foi vítima e clama pela divulgação, da qual não escapará.
O cidadão sem foro exige saber quais são os gatunos que dilapidam o patrimônio coletivo para manter poder e fortuna. Pois esse tempo é empregado “noturna e diuturnamente” (sic), como diria dona Dilma, por eles mesmos para tornar legais os próprios delitos.
O senador Roberto Requião (PMDB-PR), criador impune do falso pistoleiro Ferreirinha, protagonista da fraude eleitoral que o alçou ao governo de seu Estado, relata um projeto dito de abuso de autoridade, mas que deveria ser chamado de garantia da impunidade. O deputado Vicente Cândido (PT-SP) prepara uma lei mais sórdida, pois tira completamente do cidadão o direito de escolher os próprios representantes no sistema (já em si defeituoso) proporcional vigente no Brasil. A lista fechada, sonho de consumo de dirigentes de partidos, pois abole a consulta ao eleitor, isolaria mais a sociedade do Poder que finge representá-la. Na Venezuela, esse sistema espúrio levou a Hugo Chávez e a Nicolás Maduro, que ora golpeia a democracia usando títeres no Judiciário. Tem sido vã a insistência em aprovar uma lei em que os coleguinhas políticos que tungaram o Fisco se anistiam e jogam no lixo da História o princípio da igualdade de todos perante a lei, já que a sonegação de impostos continuaria sendo vedada a empresários, mas permitida apenas para políticos. Só que, com a Nação emparedada e desmobilizada, a autoanistia é pule de dez no Congresso de malandros com mandato.
O Estado-pântano esforça-se para apodrecer tudo e confirmar a sabedoria popular, segundo a qual uma maçã vencida estraga todas as outras frutas, sãs, de um cesto. E encaminha a Nação para um beco sem saída, cujo muro final só poderá ser ultrapassado pela Constituinte independente, sem nenhum mandatário atual entre seus membros, como sugere o professor Modesto Carvalhosa. De preferência adotando performance bonds, que os ianques usam para impedir que empreiteiros de obras, políticos e burocratas corruptos se comuniquem. O resto é palha.
Neste pântano em que o Brasil oficial afundou o País real, a constatação ganha ares (melhor dizer miasmas) de rigidez cadavérica pelo fato de que os três Poderes republicanos agem para acobertar os criminosos, impedindo que eles sejam devidamente processados e punidos, na medida em que possam fazê-lo. É bem verdade que não vige mais entre nós o preceito que destina só aos três pês – prostitutas, pobres e pretos – o inferno prisional. Nas masmorras da “república de Curitiba” o príncipe dos empreiteiros brasileiros, da fina-flor do empresariado, Marcelo Odebrecht, cumpre dolorosa pena. E outros tiveram de apelar para a delação premiada a fim de evitar o mesmo destino. Essa, contudo, não é a regra.
Neste momento, urge dar outro passo histórico. Um dos beneficiários do clube dos acobertados pelo manto da impunidade garantida vem de ser condenado a 15 anos e 4 meses de prisão pelo juiz Sergio Moro, o principal responsável pela revolução presente. Ex-presidente da Câmara dos Deputados e principal responsável pela abertura do processo do impeachment – mais que indispensável, necessário – da petista Dilma Rousseff, Eduardo Cunha recorreu ao cinismo, à truculência e, sobretudo, a chicanas jurídicas e regimentais do Parlamento para se livrar das penas da lei. Mas terminou sendo investigado, preso, processado e condenado pelos rigores da primeira instância, deixando de se valer da tolerância máxima permitida pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
No momento em que isso ocorre, contudo, mais de uma centena de seus colegas de poder partidário usufruem a benesse do sigilo, sob o qual reina a impunidade garantida pela benemerência do relator da Lava Jato na Corte, Luiz Edson Fachin. Entre tais privilegiados está o presidente nacional do PSDB, Aécio Neves, que execra a “delação seletiva” de que foi vítima e clama pela divulgação, da qual não escapará.
O cidadão sem foro exige saber quais são os gatunos que dilapidam o patrimônio coletivo para manter poder e fortuna. Pois esse tempo é empregado “noturna e diuturnamente” (sic), como diria dona Dilma, por eles mesmos para tornar legais os próprios delitos.
O senador Roberto Requião (PMDB-PR), criador impune do falso pistoleiro Ferreirinha, protagonista da fraude eleitoral que o alçou ao governo de seu Estado, relata um projeto dito de abuso de autoridade, mas que deveria ser chamado de garantia da impunidade. O deputado Vicente Cândido (PT-SP) prepara uma lei mais sórdida, pois tira completamente do cidadão o direito de escolher os próprios representantes no sistema (já em si defeituoso) proporcional vigente no Brasil. A lista fechada, sonho de consumo de dirigentes de partidos, pois abole a consulta ao eleitor, isolaria mais a sociedade do Poder que finge representá-la. Na Venezuela, esse sistema espúrio levou a Hugo Chávez e a Nicolás Maduro, que ora golpeia a democracia usando títeres no Judiciário. Tem sido vã a insistência em aprovar uma lei em que os coleguinhas políticos que tungaram o Fisco se anistiam e jogam no lixo da História o princípio da igualdade de todos perante a lei, já que a sonegação de impostos continuaria sendo vedada a empresários, mas permitida apenas para políticos. Só que, com a Nação emparedada e desmobilizada, a autoanistia é pule de dez no Congresso de malandros com mandato.
O Estado-pântano esforça-se para apodrecer tudo e confirmar a sabedoria popular, segundo a qual uma maçã vencida estraga todas as outras frutas, sãs, de um cesto. E encaminha a Nação para um beco sem saída, cujo muro final só poderá ser ultrapassado pela Constituinte independente, sem nenhum mandatário atual entre seus membros, como sugere o professor Modesto Carvalhosa. De preferência adotando performance bonds, que os ianques usam para impedir que empreiteiros de obras, políticos e burocratas corruptos se comuniquem. O resto é palha.
Deboche judicial
Após três anos de uma investigação que desmascara as cínicas relações de poder no Brasil, a postura do magistrado ganhou um tom de deboche e indiferença a um país machucado pelo pouco caso que a homens públicos têm dado à letra da lei. Vejam a quantidade de políticos, ministros, empresários bilionários, e tribunais sujos com a lama da Lava JatoCarla Jiménez
A Justiça em julgamento
Quando a Justiça, como aconteceu ontem por aqui, simplesmente se recusa a decidir é porque está de acordo com o que aconteceu. Se não está, imagina pelo menos que haveria maior risco em julgar o que aconteceu do que em deixar por isso mesmo. Elementar, meus caros.
Quase três anos depois da eleição presidencial de 2014, o país ainda não sabe se elas foram legítimas. E se não foram legítimas, quais foram os responsáveis pelos crimes cometidos, capazes de anular os resultados. Enquanto isso, na Coreia do Sul...
Por lá, em meados do ano passado, a então presidente Park Geun-hye, a primeira mulher a governar aquele país, eleita com votação recorde, foi acusada de abusar dos seus poderes para receber subornos das empresas ou para violar o princípio da liberdade de gestão empresarial.
O escândalo levou a Assembleia Nacional (o Congresso da Coreia do Sul) a destituir a presidente em dezembro. O impeachment foi confirmado pela Justiça em março. No último dia 31, Park Geun-hye foi presa preventivamente. Presa ficará por até 20 dias. Será julgada depois.
Ela é o terceiro ex-chefe de Estado da Coreia do Sul detido por um caso de corrupção nos últimos 20 anos. Chun Doo-Hwan e Roh Tae-Woo cumpriram penas de prisão nos anos 90 do século passado. Investigado por corrupção, o ex-presidente Roh Moo-Hyun cometeu suicídio em 2009.
Aqui, suspeitos, acusados e os raros condenados por corrupção não só não se suicidam como se beneficiam de uma Justiça que é cega não porque é isenta, mas porque prefere não ver. Só no fim deste ano haverá um desfecho para o processo que se arrasta desde dezembro de 2014.
Até lá, três dos atuais sete ministros do Tribunal Superior Eleitoral, inclusive o relator do caso, terão sido trocados por outros. Se a chapa Dilma-Temer for cassada por abuso de poder econômico, caberá recursos da decisão. O próximo ano se esgotará sem que tenha havido uma solução.
Então o país já terá um novo presidente eleito pelo voto popular. E o caso da chapa impugnada será considerado prejudicado. O país do jeitinho é também – e não poderia ser diferente – o país da Justiça que sempre dá um jeitinho quando se trata de punir poderosos.
O distinto público já julgou o Executivo e o Legislativo com base em tudo que viu ao longo dos últimos anos. A Justiça também não escapará de ser julgada.
Quase três anos depois da eleição presidencial de 2014, o país ainda não sabe se elas foram legítimas. E se não foram legítimas, quais foram os responsáveis pelos crimes cometidos, capazes de anular os resultados. Enquanto isso, na Coreia do Sul...
Por lá, em meados do ano passado, a então presidente Park Geun-hye, a primeira mulher a governar aquele país, eleita com votação recorde, foi acusada de abusar dos seus poderes para receber subornos das empresas ou para violar o princípio da liberdade de gestão empresarial.
O escândalo levou a Assembleia Nacional (o Congresso da Coreia do Sul) a destituir a presidente em dezembro. O impeachment foi confirmado pela Justiça em março. No último dia 31, Park Geun-hye foi presa preventivamente. Presa ficará por até 20 dias. Será julgada depois.
Ela é o terceiro ex-chefe de Estado da Coreia do Sul detido por um caso de corrupção nos últimos 20 anos. Chun Doo-Hwan e Roh Tae-Woo cumpriram penas de prisão nos anos 90 do século passado. Investigado por corrupção, o ex-presidente Roh Moo-Hyun cometeu suicídio em 2009.
Aqui, suspeitos, acusados e os raros condenados por corrupção não só não se suicidam como se beneficiam de uma Justiça que é cega não porque é isenta, mas porque prefere não ver. Só no fim deste ano haverá um desfecho para o processo que se arrasta desde dezembro de 2014.
Até lá, três dos atuais sete ministros do Tribunal Superior Eleitoral, inclusive o relator do caso, terão sido trocados por outros. Se a chapa Dilma-Temer for cassada por abuso de poder econômico, caberá recursos da decisão. O próximo ano se esgotará sem que tenha havido uma solução.
Então o país já terá um novo presidente eleito pelo voto popular. E o caso da chapa impugnada será considerado prejudicado. O país do jeitinho é também – e não poderia ser diferente – o país da Justiça que sempre dá um jeitinho quando se trata de punir poderosos.
O distinto público já julgou o Executivo e o Legislativo com base em tudo que viu ao longo dos últimos anos. A Justiça também não escapará de ser julgada.
Paradoxo: quanto mais provas, menor é o risco
O julgamento do processo sobre a cassação da chapa Dilma-Temer vai se tornando uma novela cada vez mais paradoxal. Ao decidir colher novos depoimentos, sobretudo do marqueteiro João Santana e da mulher dele Monica Moura, agora convertidos em delatores da Lava Jato, o Tribunal Superior Eleitoral abriu a perspectiva de empurrar para dentro do processo novas provas. Mas para que essas provas sejam obtidas, o tribunal atrasou o calendário do julgamento, exatamente como desejava Michel Temer.
As provas já existentes no processo são mais do que suficientes para justificar a cassação de Temer e a decretação da inelegibilidade de Dilma. As revelações feitas pelos delatores da Odebrecht não deixam dúvidas quanto ao abuso do poder econômico praticado pela chapa vitoriosa na disputa presidencial de 2014. Mas há um esforço de agentes políticos, econômicos e até de magistrados para encontrar uma porta de emergência por onde Temer possa ser retirado do meio do incêndio.
Hoje, não há político nem empresário que aposte na interrupção da Presidência de Temer. As chances de afastamento do presidente diminuem na proporção direta da aproximação do ano eleitoral de 2018. Ainda que fosse cassado pelo TSE, o que parece improvável, Temer ainda poderia recorrer ao Supremo Tribunal Federal. A conveniência econômica talvez condene a história brasileira a conviver com o incômodo de um crime eleitoral sem punição. Por sorte, o brasileiro já se habituou a olhar para sua história como um passageiro que viaja num avião sabendo que sua bagagem viaja em outra aeronave.
Hoje, não há político nem empresário que aposte na interrupção da Presidência de Temer. As chances de afastamento do presidente diminuem na proporção direta da aproximação do ano eleitoral de 2018. Ainda que fosse cassado pelo TSE, o que parece improvável, Temer ainda poderia recorrer ao Supremo Tribunal Federal. A conveniência econômica talvez condene a história brasileira a conviver com o incômodo de um crime eleitoral sem punição. Por sorte, o brasileiro já se habituou a olhar para sua história como um passageiro que viaja num avião sabendo que sua bagagem viaja em outra aeronave.
Uma Lava Jato para investigar os sindicatos?
Há no Brasil 16.393 sindicatos, e poderiam ser até mais do que isso, segundo informações da imprensa. Para que tantos sindicatos? Nos Estados Unidos, por exemplo, existem 130; na Alemanha, 11; no Reino Unido, 168; e na Argentina, bem ao lado e bastante sindicalizada, 91. A cada dia, além disso, surge um novo sindicato. Só as igrejas evangélicas, que nascem a cada hora, registram um crescimento maior do que esse. Pode parecer brincadeira, mas existe até mesmo “o sindicato dos trabalhadores de sindicatos”. A lei foi sancionada em 2006 pelo então presidente e ex-sindicalista Lula da Silva.
Todo mundo fala na necessidade de uma lei de reforma eleitoral como antídoto contra a corrupção que se aninhou na classe política e contra a loucura que significa haver 30 partidos representados no Congresso. Seria esse mar de sindicatos o mais numeroso do mundo? E o imposto sindical obrigatório que retira um dia de salário por ano de todos os trabalhadores, sindicalizados ou não, com uma arrecadação anual de mais de 3 bilhões de reais? Com o fato adicional de que as organizações sindicais ainda gozam da prerrogativa de não ter de prestar contas dessa arrecadação bilionária a nenhuma autoridade do Estado ou do Governo, outro presente que lhes foi dado pelo ex-sindicalista Lula.
Com essa montanha de sindicatos para os trabalhadores privilegiados que têm seu posto de trabalho garantido, quem se ocupa dos 14 milhões de desempregados, abandonados à sua própria sorte? Segundo alguns especialistas, a obrigatoriedade do imposto sindical para trabalhadores não sindicalizados fere a liberdade, a autonomia do trabalhador e a liberdade sindical. Além disso, hoje, os dirigentes sindicais acabam virando também políticos ou politizados, expostos aos pecados da corrupção. Quantas campanhas eleitorais não terão sido sustentadas ilegalmente com dinheiro sindical?
Há quem diga que haverá, por isso, uma nova Lava Jato que mergulharia nas entranhas financeiras do meio sindical, para que a sociedade pudesse conhecer como são usados esses bilhões provenientes dos trabalhadores. O Brasil está tentando promover uma faxina no mundo político para abrir novos caminhos legais para o financiamento das campanhas, muitas delas, pelo que se revela nos tribunais, fruto de dinheiro sujo das empresas. Por que não fazer algo semelhante no mundo das finanças sindicais? É um dever para com a sociedade como um todo e em especial com os trabalhadores. Um dever para com esses milhões de pessoas que sofrem com o peso do desemprego, que já provocou dezenas de suicídios.
Seria injusto e doloroso para esses desempregados descobrir que o dinheiro sindical, do qual lhes chegam apenas algumas migalhas, corre solto pelos atalhos da ilegalidade. Trabalhadores e desempregados têm o direito sagrado de conhecer com toda transparência como é usado esse dinheiro gerado pelo seu esforço.
Todo mundo fala na necessidade de uma lei de reforma eleitoral como antídoto contra a corrupção que se aninhou na classe política e contra a loucura que significa haver 30 partidos representados no Congresso. Seria esse mar de sindicatos o mais numeroso do mundo? E o imposto sindical obrigatório que retira um dia de salário por ano de todos os trabalhadores, sindicalizados ou não, com uma arrecadação anual de mais de 3 bilhões de reais? Com o fato adicional de que as organizações sindicais ainda gozam da prerrogativa de não ter de prestar contas dessa arrecadação bilionária a nenhuma autoridade do Estado ou do Governo, outro presente que lhes foi dado pelo ex-sindicalista Lula.
Com essa montanha de sindicatos para os trabalhadores privilegiados que têm seu posto de trabalho garantido, quem se ocupa dos 14 milhões de desempregados, abandonados à sua própria sorte? Segundo alguns especialistas, a obrigatoriedade do imposto sindical para trabalhadores não sindicalizados fere a liberdade, a autonomia do trabalhador e a liberdade sindical. Além disso, hoje, os dirigentes sindicais acabam virando também políticos ou politizados, expostos aos pecados da corrupção. Quantas campanhas eleitorais não terão sido sustentadas ilegalmente com dinheiro sindical?
Há quem diga que haverá, por isso, uma nova Lava Jato que mergulharia nas entranhas financeiras do meio sindical, para que a sociedade pudesse conhecer como são usados esses bilhões provenientes dos trabalhadores. O Brasil está tentando promover uma faxina no mundo político para abrir novos caminhos legais para o financiamento das campanhas, muitas delas, pelo que se revela nos tribunais, fruto de dinheiro sujo das empresas. Por que não fazer algo semelhante no mundo das finanças sindicais? É um dever para com a sociedade como um todo e em especial com os trabalhadores. Um dever para com esses milhões de pessoas que sofrem com o peso do desemprego, que já provocou dezenas de suicídios.
Seria injusto e doloroso para esses desempregados descobrir que o dinheiro sindical, do qual lhes chegam apenas algumas migalhas, corre solto pelos atalhos da ilegalidade. Trabalhadores e desempregados têm o direito sagrado de conhecer com toda transparência como é usado esse dinheiro gerado pelo seu esforço.
A desigualdade de renda no serviço público: as lições da Islândia
A Islândia é uma ilha no Atlântico Norte que vive - bem - da pesca e do turismo. Com cerca de 340 mil habitantes, essa pequena nação nórdica costuma chamar pouca atenção, mas sempre aparece com destaque em rankings sobre igualdade social.
O país tem a melhor distribuição de renda em um ranking de 44 países listados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Já o Brasil aparece em antepenúltimo lugar - atrás apenas de Colômbia e África do Sul -, mesmo após a redução da desigualdade ocorrida em décadas recentes.
Mas como se comparam os salários do funcionalismo nesses dois países? A diferença na distribuição de renda ocorre também nesse setor - em que o Estado, como empregador único, supostamente dá condições iguais a todos os seus funcionários?
Para fazer essa comparação, a BBC Brasil realizou, em parceria com a FGV-SP, um levantamento dos salários dos servidores públicos brasileiros e islandeses.
O resultado mostra que, em média, na Islândia, os cargos de gestão do setor público ganham o dobro das posições mais baixas. Enquanto isto, no Brasil, essa diferença é cinco vezes maior.
"Há uma distribuição de renda muito concentrada nas mãos de poucos no Brasil, e isto está aparecendo no setor público também", comenta Nelson Marconi, professor e coordenador do Fórum de Economia da FGV-SP, que colaborou com a compilação e análise dos dados.
Os números são do Centro para Estatísticas Oficiais da Islândia, o Statice, e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE. Eles comparam as variações salariais médias de oito ocupações, por nível hierárquico, nos dois países.
Os cargos de gestão abrangem desde o de presidente e ministros ao de diretores e gerentes de várias áreas. A base compreende as chamadas ocupações elementares, ou seja, profissionais de limpeza, alimentação, manutenção e outros.
Na Islândia, a média salarial mensal dos gestores é de 851 mil coroas islandesas (R$ 24 mil); na posição elementar, é de 400 mil (R$ 11 mil). No Brasil, a média é de R$ 5.707 para o mais alto, e R$ 1.139, no mais baixo.
A distribuição de renda no serviço público da Islândia é mais justa não apenas quando se olha do cargo mais alto ao mais baixo. Há distorções salariais tanto entre os níveis de governo (governo federal, estadual e municípios) como dentro de uma mesma ocupação, segundo o levantamento.
Na Islândia, por exemplo, um profissional de nível técnico pode ganhar em média 50% a mais que outro profissional da mesma posição. No Brasil, esse trabalhador pode ganhar o triplo de outro da mesma hierarquia.
Além disso, no país nórdico, um profissional da ocupação elementar no nível federal ganha apenas 2% a mais que o do nível municipal - o país não tem estrutura estadual. No Brasil, a diferença é de 137% entre o federal e municipal para esse mesmo cargo.
Entre os gestores islandeses, o governo federal paga 34% a mais que o municipal. No caso dos brasileiros, 150% a mais. Outros resultados do levantamento seguem essa mesma linha.
A desigualdade no funcionalismo público brasileiro pode ser, na realidade, ainda maior que a traduzida pelos números oficiais. Como a Pnad se baseia na declaração de entrevistados, é provável que benefícios indiretos de altos funcionários do governo, como por exemplo o auxílio-moradia ou transporte, não estejam computados, lembra Marconi.
O país tem a melhor distribuição de renda em um ranking de 44 países listados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Já o Brasil aparece em antepenúltimo lugar - atrás apenas de Colômbia e África do Sul -, mesmo após a redução da desigualdade ocorrida em décadas recentes.
Manifestação islandesa no Dia do Trabalho |
Para fazer essa comparação, a BBC Brasil realizou, em parceria com a FGV-SP, um levantamento dos salários dos servidores públicos brasileiros e islandeses.
O resultado mostra que, em média, na Islândia, os cargos de gestão do setor público ganham o dobro das posições mais baixas. Enquanto isto, no Brasil, essa diferença é cinco vezes maior.
"Há uma distribuição de renda muito concentrada nas mãos de poucos no Brasil, e isto está aparecendo no setor público também", comenta Nelson Marconi, professor e coordenador do Fórum de Economia da FGV-SP, que colaborou com a compilação e análise dos dados.
Os números são do Centro para Estatísticas Oficiais da Islândia, o Statice, e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE. Eles comparam as variações salariais médias de oito ocupações, por nível hierárquico, nos dois países.
Os cargos de gestão abrangem desde o de presidente e ministros ao de diretores e gerentes de várias áreas. A base compreende as chamadas ocupações elementares, ou seja, profissionais de limpeza, alimentação, manutenção e outros.
Na Islândia, a média salarial mensal dos gestores é de 851 mil coroas islandesas (R$ 24 mil); na posição elementar, é de 400 mil (R$ 11 mil). No Brasil, a média é de R$ 5.707 para o mais alto, e R$ 1.139, no mais baixo.
A distribuição de renda no serviço público da Islândia é mais justa não apenas quando se olha do cargo mais alto ao mais baixo. Há distorções salariais tanto entre os níveis de governo (governo federal, estadual e municípios) como dentro de uma mesma ocupação, segundo o levantamento.
Na Islândia, por exemplo, um profissional de nível técnico pode ganhar em média 50% a mais que outro profissional da mesma posição. No Brasil, esse trabalhador pode ganhar o triplo de outro da mesma hierarquia.
Além disso, no país nórdico, um profissional da ocupação elementar no nível federal ganha apenas 2% a mais que o do nível municipal - o país não tem estrutura estadual. No Brasil, a diferença é de 137% entre o federal e municipal para esse mesmo cargo.
Entre os gestores islandeses, o governo federal paga 34% a mais que o municipal. No caso dos brasileiros, 150% a mais. Outros resultados do levantamento seguem essa mesma linha.
A desigualdade no funcionalismo público brasileiro pode ser, na realidade, ainda maior que a traduzida pelos números oficiais. Como a Pnad se baseia na declaração de entrevistados, é provável que benefícios indiretos de altos funcionários do governo, como por exemplo o auxílio-moradia ou transporte, não estejam computados, lembra Marconi.
Ainda com os diabos
Eu queria fazer uma única e solitária crônica sobre o diabo, mas eis que, canhotamente, ele me escapa. A culpa é da argúcia de Machado de Assis.
Fora do teológico essa indignação seria abusada caso não fosse fruto de uma visada marcada pelo estudo do exótico e do absurdo. Essas coisas que a nossa gloriosa civilização tocada à luta de classe, holocausto, guerras, alta tecnologia e supremacia do mercado ensina a superar mesmo liquidando o planeta...
Hoje, devemos tanto que nossas almas nada valem. O Estado deve tudo à sociedade — honra, vergonha e competência — como é o caso do nosso amado Brasil. Esse Brasil que nunca foi tanto “o país do futuro" como nestes tempos presentes.
Tentar compreender sem acusar, leva a simpatizar com o exótico e a estranhar o rotineiro. A descoberta mais importante, porém, não é saber que o “outro” é um estranho. É deparar como é difícil sair da canhotice que, nos canhotos, surge com a mesma naturalidade de uma língua que se aprende sem saber. O problema da diferença é como abandoná-la.
A diferença é o apanágio da literatura. Com ela, aprendemos que diferentemente dos demônios de outras terras, o diabo brasileiro de Machado de Assis não se contenta em adquirir almas.
No Brasil, ele deseja vencer o bem fundando uma igreja. Tal como fazemos quando pensamos que basta uma lei para liquidar a corrupção ou a desonestidade que mancha a política e os seus matrimônios com uma economia de compadres-campeões. Sancionando leis que tudo resolvem, criamos uma quadrilha de governantes-meliantes-psicopatas, todos seguidores da lei porque transformam o “Estado" numa igreja.
Hoje vivemos o trauma de descobrir que o ruim não acaba com um messias, um partido, uma lei ou um ministério. Esse modo ingênuo de enfrentar desvios com o formalismo institucional é o erro do diabo machadiano. Por isso ele não recorre ao familiar engodo de uma troca sem reciprocidade, no melhor estilo de Marcel Mauss. Troca na qual o dinheiro entesourado, apodrecido e ligado à morte, é permutado por almas. O diabo brasileiro — tal como todos nós (incluindo este humilde cronista) funda uma instituição destinada a "resolver" de uma vez por todas o problema do bem. Ou no caso deste diabo, do bem como um problema.
Se os satanases de Grimm, Irving, Benét, Blatty são faustianos e individualistas, fiéis à tradição inventada por Lúcifer, vale lembrar que Lúcifer é o inventor da revolta (que divide o todo) e convém recordar que ele não chegou à revolução (que refaz o todo de modo contrário). Contentou-se lúcifer com o inferno e a fazer o mal por atacado: com insinuações malandras e bastante razoáveis no contexto de nossa humanidade. Quando, entretanto, descobre que sem uma “igreja” seria um eterno perdedor, surge a esperança.
É este projeto revolucionário que distingue o diabo sem nome de Machado de Assis. Indo além dos indivíduos, ele planeja agir através de uma igreja. Uma igreja baseada na transformação de vícios em virtudes. Feliz com a descoberta, ele a anuncia a um Criador curiosamente indiferente.
Agora, imagina o capeta, a luta do Mal contra o Bem se equilibrava. Mas logo o demônio descobre que, nas rotinas do pecado, virtudes subversivas insinuavam-se e eram praticadas na sua igreja. É quando constata que ele é também uma vítima da “eterna ingratidão humana" — essa ativação do canhoto na direita tão bem conhecida de Deus. Essa inversão capaz de desmoralizar dualismos, partidos e ideologias.
Diabos tradicionais são exorcizados. Atacam os inferiores estruturais como os pobres e as adolescentes em fase pré-menstrual. Mas uma igreja do diabo é algo absolutamente singular. Nela, o demônio tem doutrina, rituais e eclesiásticos. Ele — esse é o ponto — tanto quanto nós, acredita que um aparato externo vai resolver. Mas conforme eu tenho remarcado aqui e acolá, instituições precisam de seguidores. De nada vale uma constituição francesa sem franceses para segui-la!
A “eterna ingratidão humana" do diabo machadiano é a descoberta de que não basta uma ideologia. É preciso, como acontece com um idioma, de falantes. Tal como a poesia precisa de cantores e um drama de atores. O mundo, ensina o bruxo do Cosme Velho, jamais vai liquidar o mal valendo-se somente de leis, igrejas e partidos. Pela mesma fórmula, o bem jamais vai deixar de surgir como uma franja do mal. A dualidaade que desequilibra é a mesma que equilibra.
Mas, para enxergar isso, será preciso livrar-se da ilusão segundo a qual basta uma penada ou um ministério. O mundo que é bem mais complicado do que imaginava o nosso diabo.
Roberto DaMatta
Fora do teológico essa indignação seria abusada caso não fosse fruto de uma visada marcada pelo estudo do exótico e do absurdo. Essas coisas que a nossa gloriosa civilização tocada à luta de classe, holocausto, guerras, alta tecnologia e supremacia do mercado ensina a superar mesmo liquidando o planeta...
Hoje, devemos tanto que nossas almas nada valem. O Estado deve tudo à sociedade — honra, vergonha e competência — como é o caso do nosso amado Brasil. Esse Brasil que nunca foi tanto “o país do futuro" como nestes tempos presentes.
Tentar compreender sem acusar, leva a simpatizar com o exótico e a estranhar o rotineiro. A descoberta mais importante, porém, não é saber que o “outro” é um estranho. É deparar como é difícil sair da canhotice que, nos canhotos, surge com a mesma naturalidade de uma língua que se aprende sem saber. O problema da diferença é como abandoná-la.
A diferença é o apanágio da literatura. Com ela, aprendemos que diferentemente dos demônios de outras terras, o diabo brasileiro de Machado de Assis não se contenta em adquirir almas.
Hoje vivemos o trauma de descobrir que o ruim não acaba com um messias, um partido, uma lei ou um ministério. Esse modo ingênuo de enfrentar desvios com o formalismo institucional é o erro do diabo machadiano. Por isso ele não recorre ao familiar engodo de uma troca sem reciprocidade, no melhor estilo de Marcel Mauss. Troca na qual o dinheiro entesourado, apodrecido e ligado à morte, é permutado por almas. O diabo brasileiro — tal como todos nós (incluindo este humilde cronista) funda uma instituição destinada a "resolver" de uma vez por todas o problema do bem. Ou no caso deste diabo, do bem como um problema.
Se os satanases de Grimm, Irving, Benét, Blatty são faustianos e individualistas, fiéis à tradição inventada por Lúcifer, vale lembrar que Lúcifer é o inventor da revolta (que divide o todo) e convém recordar que ele não chegou à revolução (que refaz o todo de modo contrário). Contentou-se lúcifer com o inferno e a fazer o mal por atacado: com insinuações malandras e bastante razoáveis no contexto de nossa humanidade. Quando, entretanto, descobre que sem uma “igreja” seria um eterno perdedor, surge a esperança.
É este projeto revolucionário que distingue o diabo sem nome de Machado de Assis. Indo além dos indivíduos, ele planeja agir através de uma igreja. Uma igreja baseada na transformação de vícios em virtudes. Feliz com a descoberta, ele a anuncia a um Criador curiosamente indiferente.
Agora, imagina o capeta, a luta do Mal contra o Bem se equilibrava. Mas logo o demônio descobre que, nas rotinas do pecado, virtudes subversivas insinuavam-se e eram praticadas na sua igreja. É quando constata que ele é também uma vítima da “eterna ingratidão humana" — essa ativação do canhoto na direita tão bem conhecida de Deus. Essa inversão capaz de desmoralizar dualismos, partidos e ideologias.
Diabos tradicionais são exorcizados. Atacam os inferiores estruturais como os pobres e as adolescentes em fase pré-menstrual. Mas uma igreja do diabo é algo absolutamente singular. Nela, o demônio tem doutrina, rituais e eclesiásticos. Ele — esse é o ponto — tanto quanto nós, acredita que um aparato externo vai resolver. Mas conforme eu tenho remarcado aqui e acolá, instituições precisam de seguidores. De nada vale uma constituição francesa sem franceses para segui-la!
A “eterna ingratidão humana" do diabo machadiano é a descoberta de que não basta uma ideologia. É preciso, como acontece com um idioma, de falantes. Tal como a poesia precisa de cantores e um drama de atores. O mundo, ensina o bruxo do Cosme Velho, jamais vai liquidar o mal valendo-se somente de leis, igrejas e partidos. Pela mesma fórmula, o bem jamais vai deixar de surgir como uma franja do mal. A dualidaade que desequilibra é a mesma que equilibra.
Mas, para enxergar isso, será preciso livrar-se da ilusão segundo a qual basta uma penada ou um ministério. O mundo que é bem mais complicado do que imaginava o nosso diabo.
Roberto DaMatta
Pezão foi condenado a viver a ruína
Tendo vivido o esplendor da ilusão cabralina, quando foi secretário de obras e vice-governador, Luiz Fernando Pezão está condenado a viver sua própria ruína. Aquele teleférico do Morro do Alemão, que foi inaugurado duas vezes, está parado (Ele se entristecia quando era exposto ao ridículo das duas inaugurações). A política de segurança do xerife José Mariano Beltrame ruiu, as contas públicas jogaram o governador para a condição de pedinte, e os cidadãos a um período de decadência jamais visto. Sérgio Cabral está em Bangu, decidindo entre uma cana de 40 anos e a possibilidade de colaborar com a Viúva, cuja bolsa repetidamente assaltou. O coral dos poderosos da ilusão cabralina já tem dois doleiros, um ex-presidente do Tribunal de Contas, seu filho, e mais gente na fila.
Pezão está na situação dos hierarcas do stalinismo que moravam num imponente edifício perto do Kremlin. À noite, quando o elevador fazia barulho, os comissários acordavam temendo que tivessem vindo buscá-los. A administração do Rio está parada. Fica a impressão de que só dois gabinetes funcionam: o do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal, e o do ministro Felix Fischer, do Superior Tribunal de Justiça. Um encanou Cabral. O outro ouviu a melodia da colaboração de Jonas Lopes e de seu filho. O doutor Jonas presidiu o Tribunal de Contas do Estado, e sua cantoria resultou na prisão de cinco conselheiros (Em tempo, não se deveria chamar essas comissões de contas de “tribunal”, pois não o são).
Admitindo-se que Pezão tenha sido secretário de Obras e vice de Cabral sem ter desconfiado de nada, nem dos cortes de seus ternos Ermenegildo Zegna “su misura", Jonas e seu filho jogaram o governador na frigideira. O pai contou que, em 2013, Pezão mediou em sua casa uma acalorada discussão para definir o rachuncho das propinas. Num lance, em 2015, cada felizardo receberia R$ 60 mil mensais. Noutro, mordiam a comida dos presidiários.
Jonas Filho diz ter ouvido que parte do dinheiro mandado aos conselheiros foi desviada para atender a despesas pessoais de Pezão. Coisa de R$ 900 mil. Nesse aspecto, a suspeita é a um só tempo frágil e meritória. Frágil, porque nasce de um “ouvir dizer”. Meritória porque se Pezão recebesse apenas R$ 900 mil para cobrir despesas pessoais, seria um anacoreta na corte de Sérgio, o Magnifico.
O capilé de R$ 900 mil teria sido revelado a Jonas por Marcelo Santos Amorim, o Marcelinho, subsecretário de Comunicação do governador. Ele estava no lote de celebridades estaduais levadas para a Polícia Federal na semana passada. Se a história do capilé é ou não verdadeira, só Marcelinho poderá dizer. De qualquer forma, ele terá algo a contar sobre o milagre da comunicação de Pezão, que navegava num estado falido com a pose dos canoeiros de Oxford.
Pezão e Marcelinho negam que tenham praticado qualquer malfeito e queixam-se da falta de acesso às narrativas de quem os acusa.
Graças ao juiz Bretas e ao ministro Fischer, a administração do Rio de Janeiro pode garantir ao detento Sérgio Cabral que ficou mais difícil roubar em cima das verbas de alimentação dos presidiários.
Elio Gaspari
Pezão está na situação dos hierarcas do stalinismo que moravam num imponente edifício perto do Kremlin. À noite, quando o elevador fazia barulho, os comissários acordavam temendo que tivessem vindo buscá-los. A administração do Rio está parada. Fica a impressão de que só dois gabinetes funcionam: o do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal, e o do ministro Felix Fischer, do Superior Tribunal de Justiça. Um encanou Cabral. O outro ouviu a melodia da colaboração de Jonas Lopes e de seu filho. O doutor Jonas presidiu o Tribunal de Contas do Estado, e sua cantoria resultou na prisão de cinco conselheiros (Em tempo, não se deveria chamar essas comissões de contas de “tribunal”, pois não o são).
Admitindo-se que Pezão tenha sido secretário de Obras e vice de Cabral sem ter desconfiado de nada, nem dos cortes de seus ternos Ermenegildo Zegna “su misura", Jonas e seu filho jogaram o governador na frigideira. O pai contou que, em 2013, Pezão mediou em sua casa uma acalorada discussão para definir o rachuncho das propinas. Num lance, em 2015, cada felizardo receberia R$ 60 mil mensais. Noutro, mordiam a comida dos presidiários.
Jonas Filho diz ter ouvido que parte do dinheiro mandado aos conselheiros foi desviada para atender a despesas pessoais de Pezão. Coisa de R$ 900 mil. Nesse aspecto, a suspeita é a um só tempo frágil e meritória. Frágil, porque nasce de um “ouvir dizer”. Meritória porque se Pezão recebesse apenas R$ 900 mil para cobrir despesas pessoais, seria um anacoreta na corte de Sérgio, o Magnifico.
O capilé de R$ 900 mil teria sido revelado a Jonas por Marcelo Santos Amorim, o Marcelinho, subsecretário de Comunicação do governador. Ele estava no lote de celebridades estaduais levadas para a Polícia Federal na semana passada. Se a história do capilé é ou não verdadeira, só Marcelinho poderá dizer. De qualquer forma, ele terá algo a contar sobre o milagre da comunicação de Pezão, que navegava num estado falido com a pose dos canoeiros de Oxford.
Pezão e Marcelinho negam que tenham praticado qualquer malfeito e queixam-se da falta de acesso às narrativas de quem os acusa.
Graças ao juiz Bretas e ao ministro Fischer, a administração do Rio de Janeiro pode garantir ao detento Sérgio Cabral que ficou mais difícil roubar em cima das verbas de alimentação dos presidiários.
Elio Gaspari
Governo arma privatização dos Correios, que até nos EUA ainda é estatal
Há alguns dias ouvi uma entrevista do presidente dos Correios, ex-deputado federal Guilherme Campos, ao jornalista Carlos Alberto Sardenberg, âncora da rádio CBN. O político dizia, entre outras meias verdades, que a ECT teria ficado alheia à modernização das comunicações no mundo e não se desenvolveu tecnologicamente para encarar o momento atual. Caramba, mentira revoltante! Desde 2001, existe o Departamento de Negócios na Internet, criado por volta de 2001, destinado a desenvolver serviços postais pela web, e os Correios até se tornaram um dos sócios fundadores da Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico.
Foi criado também o Projeto CorreiosNet, que ia muito além do shopping virtual, endereço eletrônico e terminal de acesso, pois estavam em adiantado estágio de desenvolvimento um Portal de Pagamentos e Multiserviços, a Mensageria Eletrônica e um serviço voltado exclusivamente para compra e entrega de ingressos de cinema, teatro, estádios etc., via internet. Mas todas essas iniciativas começarem a ser boicotadas desde o início do governo Lula, em 2003.
O ex-deputado federal Guilherme Campos, que teve de deixar a presidência do PSD para assumir o comando da ECT, tem a missão inequívoca de destruir a estatal para facilitar a privatização dos Correios, serviço considerado estratégico e que nem mesmo os Estados Unidos ousaram privatizar, mantendo o United States Postal Service (USPS).
Ao mesmo tempo que afirma que a ECT está quebrando, o próprio Guilherme Campos reduziu o tradicional patrocínio de esportes nobres e populares, mas fez questão de que a empresa continuasse a patrocinar a prática do rugby de Roraima, para agradar ao famoso empresário esportivo Luís Cláudio Lula da Silva, vejam a que ponto chegamos.
Ou seja, Guilherme Campos, que está sendo investigado pela Polícia Federal por utilização de assinaturas falsas de eleitores para criação do PSD, tenta apagar o passado e fingir que o desmonte dos Correios não está ocorrendo de modo proposital e sistemático.
Dilapidado por dirigentes corruptos nomeados nos governos petistas, o Postalis, fundo de pensão dos empregados dos Correios, inicia este mês um equacionamento para cobrir o rombo de R$ 1,5 bilhão registrado em 2015. Com isso, os participantes farão contribuições extraordinárias de 2,73% sobre o valor do Benefício Proporcional Saldado, onerando os empregados ativos, aposentados e pensionistas. Os descontos cobrirão metade do rombo e R$ 750 milhões restantes serão pagos pelos Correios.
No ano passado, a Polícia Federal prendeu Adilson Florêncio da Costa, ex-diretor financeiro do Postalis. Também foram presos os sócios do Grupo Galileu, de quem o Postalis e a Petros, a fundação dos funcionários da Petrobras, compraram R$ 100 milhões em debêntures com a promessa de recuperar a quase falida Universidade Gama Filho. O negócio se mostrou terrível para os fundos de pensão, que em 2016 registraram deficit acumulado de R$ 71,7 bilhões em 2016, e pelo menos 80 entidades de previdência privada tiveram resultado negativo em 205 planos de benefícios. Mas quem se interessa?
Carlos Newton
Foi criado também o Projeto CorreiosNet, que ia muito além do shopping virtual, endereço eletrônico e terminal de acesso, pois estavam em adiantado estágio de desenvolvimento um Portal de Pagamentos e Multiserviços, a Mensageria Eletrônica e um serviço voltado exclusivamente para compra e entrega de ingressos de cinema, teatro, estádios etc., via internet. Mas todas essas iniciativas começarem a ser boicotadas desde o início do governo Lula, em 2003.
Ao mesmo tempo que afirma que a ECT está quebrando, o próprio Guilherme Campos reduziu o tradicional patrocínio de esportes nobres e populares, mas fez questão de que a empresa continuasse a patrocinar a prática do rugby de Roraima, para agradar ao famoso empresário esportivo Luís Cláudio Lula da Silva, vejam a que ponto chegamos.
Ou seja, Guilherme Campos, que está sendo investigado pela Polícia Federal por utilização de assinaturas falsas de eleitores para criação do PSD, tenta apagar o passado e fingir que o desmonte dos Correios não está ocorrendo de modo proposital e sistemático.
Dilapidado por dirigentes corruptos nomeados nos governos petistas, o Postalis, fundo de pensão dos empregados dos Correios, inicia este mês um equacionamento para cobrir o rombo de R$ 1,5 bilhão registrado em 2015. Com isso, os participantes farão contribuições extraordinárias de 2,73% sobre o valor do Benefício Proporcional Saldado, onerando os empregados ativos, aposentados e pensionistas. Os descontos cobrirão metade do rombo e R$ 750 milhões restantes serão pagos pelos Correios.
No ano passado, a Polícia Federal prendeu Adilson Florêncio da Costa, ex-diretor financeiro do Postalis. Também foram presos os sócios do Grupo Galileu, de quem o Postalis e a Petros, a fundação dos funcionários da Petrobras, compraram R$ 100 milhões em debêntures com a promessa de recuperar a quase falida Universidade Gama Filho. O negócio se mostrou terrível para os fundos de pensão, que em 2016 registraram deficit acumulado de R$ 71,7 bilhões em 2016, e pelo menos 80 entidades de previdência privada tiveram resultado negativo em 205 planos de benefícios. Mas quem se interessa?
Carlos Newton
Safadeza pública
A causa, tudo pela causa!
Meu amigo dedica a vida a uma causa. Refere-se a Fidel como "El comandante". Encimando a porta de sua casa há uma placa onde se lê "Sierra Maestra". Aclamou a ascensão do chavismo como a "primavera venezuelana". Vendeu o carro para apoiar a construção do memorial de Luiz Carlos Prestes. Está convencido de que os bandidos são vítimas dos males sociais e só falta chamá-los de "meu bem". Internou-se com mal súbito no impeachment de Dilma. Ama Luiz Inácio, odeia Sergio Moro.
Seu círculo ideológico é tão fechado, que qualquer outro sentiria claustrofobia. Ele não. Seu projeto de vida é simples. Basta-lhe seguir o líder. É fiel escudeiro de Lula para o ataque e para a defesa. Naqueles anos em que o chefe, ainda inexperiente, num mesmo discurso afirmava A e o contrário de A, era ele que puxava os aplausos nas duas pontas. Colou cartazes na porta do Teatro Municipal do Rio de Janeiro quando o líder se posicionou contra os pagamentos ao FMI. E foi para a primeira fila no sindicato dos metalúrgicos do ABC quando Lula presidente festejou haver quitado a conta.
O problema é que essa vida moral simples, em que o bem e o mal são definidos pela utilidade à causa, dissipou-se num estrondoso Big Bang às avessas, numa voragem em que o radioso horizonte foi consumido como a imagem de um fotograma de celuloide que queima dentro do projetor. Em pouco tempo, travou o filme e o futuro ardeu na tela. Tudo se complicou. O receituário socialista de Marilena Chauí, Marco Aurélio Garcia, João Pedro Stédile, Leonardo Boff, Paulo Freire, Dilma Rousseff, depositou o Brasil no fundo do poço, removeu a corda e jogou fora a caçamba. Sobrou escândalo, polícia na porta, recessão e desemprego. A experiência abriu novo capítulo no volumoso catálogo dos insucessos da esquerda universal.
Meu amigo sofre. Jogou todas as fichas de sua existência numa aposta perdedora. Pior que isso, funesta. Mas não esmorece porque a causa é maior do que o infortúnio e ele traz gravada na consciência a afirmação de Lênin sobre a renitente teimosia dos fatos. Ora, a teimosia só se dobra ante uma teimosia maior.
A partir dessa observação, passei a entender melhor muito do que tenho lido do jornalismo companheiro. Suas conhecidas posições sobre temas nacionais caíram em descrédito. Tornou-se inviável, também, oferecer ao público doses maiores de receitas que levaram o país à perdição. A cena internacional virou, então, seu novo campo de doutrinação. O que dizem da política mundo afora é o que diriam do Brasil se fossem críveis. Preste atenção e depois me conte.
O estratagema adequado a tais embaraços tem aplicação de largo espectro e vai do futebol à guerra convencional: se não podes vencer, impede que teu adversário avance. Então, pau na direita! E foi o que passou a fazer verdadeira multidão de formadores de opinião. Observe-os, leitor. No vocabulário deles, tudo que está à direita da esquerda passou a ser tratado como radical, fascista, brutamontes. Contudo, a direita não quebra vidraças; não tem black blocs; não faz pichações; não queima pneus nem lixeiras; não invade propriedades públicas ou privadas; respeita a Constituição Federal mesmo discordando; não enfrenta a polícia, valoriza-a. Mas é dita "violenta, radical e fascista". Ora, fascista é como os comunistas sempre chamam os não comunistas. Portanto, ao rotular os adversários de algo que não são, estão a classificar a si mesmos como aquilo que são. A linguagem e a lógica fazem essas coisas.
Ah, tem mais! Na sua percepção sobre a criminalidade, a vítima é a opressora e o bandido é oprimido, agente da revolução. E, por assim pensar, veem a si mesmos como os mais benevolentes e generosos dentre os seres humanos. Mas saiba: é a causa. É tudo pela causa.
Seu círculo ideológico é tão fechado, que qualquer outro sentiria claustrofobia. Ele não. Seu projeto de vida é simples. Basta-lhe seguir o líder. É fiel escudeiro de Lula para o ataque e para a defesa. Naqueles anos em que o chefe, ainda inexperiente, num mesmo discurso afirmava A e o contrário de A, era ele que puxava os aplausos nas duas pontas. Colou cartazes na porta do Teatro Municipal do Rio de Janeiro quando o líder se posicionou contra os pagamentos ao FMI. E foi para a primeira fila no sindicato dos metalúrgicos do ABC quando Lula presidente festejou haver quitado a conta.
O problema é que essa vida moral simples, em que o bem e o mal são definidos pela utilidade à causa, dissipou-se num estrondoso Big Bang às avessas, numa voragem em que o radioso horizonte foi consumido como a imagem de um fotograma de celuloide que queima dentro do projetor. Em pouco tempo, travou o filme e o futuro ardeu na tela. Tudo se complicou. O receituário socialista de Marilena Chauí, Marco Aurélio Garcia, João Pedro Stédile, Leonardo Boff, Paulo Freire, Dilma Rousseff, depositou o Brasil no fundo do poço, removeu a corda e jogou fora a caçamba. Sobrou escândalo, polícia na porta, recessão e desemprego. A experiência abriu novo capítulo no volumoso catálogo dos insucessos da esquerda universal.
A partir dessa observação, passei a entender melhor muito do que tenho lido do jornalismo companheiro. Suas conhecidas posições sobre temas nacionais caíram em descrédito. Tornou-se inviável, também, oferecer ao público doses maiores de receitas que levaram o país à perdição. A cena internacional virou, então, seu novo campo de doutrinação. O que dizem da política mundo afora é o que diriam do Brasil se fossem críveis. Preste atenção e depois me conte.
O estratagema adequado a tais embaraços tem aplicação de largo espectro e vai do futebol à guerra convencional: se não podes vencer, impede que teu adversário avance. Então, pau na direita! E foi o que passou a fazer verdadeira multidão de formadores de opinião. Observe-os, leitor. No vocabulário deles, tudo que está à direita da esquerda passou a ser tratado como radical, fascista, brutamontes. Contudo, a direita não quebra vidraças; não tem black blocs; não faz pichações; não queima pneus nem lixeiras; não invade propriedades públicas ou privadas; respeita a Constituição Federal mesmo discordando; não enfrenta a polícia, valoriza-a. Mas é dita "violenta, radical e fascista". Ora, fascista é como os comunistas sempre chamam os não comunistas. Portanto, ao rotular os adversários de algo que não são, estão a classificar a si mesmos como aquilo que são. A linguagem e a lógica fazem essas coisas.
Ah, tem mais! Na sua percepção sobre a criminalidade, a vítima é a opressora e o bandido é oprimido, agente da revolução. E, por assim pensar, veem a si mesmos como os mais benevolentes e generosos dentre os seres humanos. Mas saiba: é a causa. É tudo pela causa.
Começar tudo de novo?
Fazer o quê, diante desse festival de corrupção envolvendo o Rio de Janeiro? Do ex-governador Sérgio Cabral aos seis entre sete Conselheiros do Tribunal de Contas, cinco deles também presos por meterem a mão nos dinheiros públicos, não sobra nem o Pezão. Para não falar no presidente da Assembleia Legislativa.
A Federação morreu. Para cada unidade que a nação se volte, a conclusão será a mesma: lama de Norte a Sul.
Adiantaria muito pouco estabelecer um Estado Unitário, abolindo-se a República Federativa do Brasil. Getúlio Vargas, em 1937, falhou quando mandou queimar as bandeiras e as partituras dos hinos estaduais. Os generais-presidentes fracassaram da mesma forma, ao nomear governadores sem representatividade nem poder. Suprimir os Estados Federados redundaria em nada. Reimplantar a Monarquia também não dá.
Fazer o quê, então, para substituir a corrupção e o roubo?
Fica uma alternativa: começar tudo de novo, com um adendo: ampliar o número de cadeias e criar a prisão perpétua.
Melhor seria dissolver o Estado do Rio, cassando os direitos políticos de seus representantes no Executivo e no Legislativo, sem esquecer de uma faxina em regra no Judiciário. Mas fixar atenções apenas neles? O que dizer de outros Estados, igualmente atingidos pelas mesmas práticas celeradas em suas instituições e em seus poderes?
A Federação morreu. Para cada unidade que a nação se volte, a conclusão será a mesma: lama de Norte a Sul.
Adiantaria muito pouco estabelecer um Estado Unitário, abolindo-se a República Federativa do Brasil. Getúlio Vargas, em 1937, falhou quando mandou queimar as bandeiras e as partituras dos hinos estaduais. Os generais-presidentes fracassaram da mesma forma, ao nomear governadores sem representatividade nem poder. Suprimir os Estados Federados redundaria em nada. Reimplantar a Monarquia também não dá.
Fazer o quê, então, para substituir a corrupção e o roubo?
Fica uma alternativa: começar tudo de novo, com um adendo: ampliar o número de cadeias e criar a prisão perpétua.
Edmundo, o cético
Naquele tempo, nós não sabíamos o que fosse ceticismo. Mas Edmundo era cético. As pessoas aborreciam-se e chamavam-no de teimoso. Era uma grande injustiça e uma definição errada.
Ele queria quebrar com os dentes os caroços de ameixa, para chupar um melzinho que há lá dentro. As pessoas diziam-lhe que os caroços eram mais duros que os seus dentes. Ele quebrou os dentes com a verificação. Mas verificou. E nós todos aprendemos à sua custa. (O cepticismo também tem o seu valor!)
Disseram-lhe que, mergulhando de cabeça na pipa d’água do quintal, podia morrer afogado. Não se assustou com a idéia da morte: queria saber é se lhe diziam a verdade. E só não morreu porque o jardineiro andava perto.
Na lição de catecismo, quando lhe disseram que os sábios desprezam os bens deste mundo, ele perguntou lá do fundo da sala: “E o rei Salomão?” Foi preciso a professora fazer uma conferência sobre o assunto; e ele não saiu convencido. Dizia: “Só vendo.” E em certas ocasiões, depois de lhe mostrarem tudo o que queria ver, ainda duvidava. “Talvez eu não tenha visto direito. Eles sempre atrapalham.” (Eles eram os adultos.)
Edmundo foi aluno muito difícil. Até os colegas perdiam a paciência com as suas dúvidas. Alguém devia ter tentado enganá-lo, um dia, para que ele assim desconfiasse de tudo e de todos. Mas de si, não; pois foi a primeira pessoa que me disse estar a ponto de inventar o moto contínuo, invenção que naquele tempo andava muito em moda, mais ou menos como, hoje, as aventuras espaciais.
Edmundo estava sempre em guarda contra os adultos: eram os nossos permanentes adversários. Só diziam mentiras. Tinham a força ao seu dispor (representada por várias formas de agressão, da palmada ao quarto escuro, passando por várias etapas muito variadas). Edmundo reconhecia a sua inutilidade de lutar; mas tinha o brio de não se deixar vencer facilmente.
Numa festa de aniversário, apareceu, entre números de piano e canto (ah! delícias dos saraus de outrora!), apareceu um mágico com a sua cartola, o seu lenço, bigodes retorcidos e flor na lapela. Nenhum de nós se importaria muito com a verdade: era tão engraçado ver saírem cinqüenta fitas de dentro de uma só… e o copo d’água ficar cheio de vinho…
Edmundo resistiu um pouco. Depois, achou que todos estávamos ficando bobos demais. Disse: “Eu não acredito!” Foi mexer no arsenal do mágico e não pudemos ver mais as moedas entrarem por um ouvido e saírem pelo outro, nem da cartola vazia debandar um pombo voando… (Edmundo estragava tudo. Edmundo não admitia a mentira. Edmundo morreu cedo. E quem sabe, meu Deus, com que verdades
Ele queria quebrar com os dentes os caroços de ameixa, para chupar um melzinho que há lá dentro. As pessoas diziam-lhe que os caroços eram mais duros que os seus dentes. Ele quebrou os dentes com a verificação. Mas verificou. E nós todos aprendemos à sua custa. (O cepticismo também tem o seu valor!)
Disseram-lhe que, mergulhando de cabeça na pipa d’água do quintal, podia morrer afogado. Não se assustou com a idéia da morte: queria saber é se lhe diziam a verdade. E só não morreu porque o jardineiro andava perto.
Na lição de catecismo, quando lhe disseram que os sábios desprezam os bens deste mundo, ele perguntou lá do fundo da sala: “E o rei Salomão?” Foi preciso a professora fazer uma conferência sobre o assunto; e ele não saiu convencido. Dizia: “Só vendo.” E em certas ocasiões, depois de lhe mostrarem tudo o que queria ver, ainda duvidava. “Talvez eu não tenha visto direito. Eles sempre atrapalham.” (Eles eram os adultos.)
Edmundo foi aluno muito difícil. Até os colegas perdiam a paciência com as suas dúvidas. Alguém devia ter tentado enganá-lo, um dia, para que ele assim desconfiasse de tudo e de todos. Mas de si, não; pois foi a primeira pessoa que me disse estar a ponto de inventar o moto contínuo, invenção que naquele tempo andava muito em moda, mais ou menos como, hoje, as aventuras espaciais.
Edmundo estava sempre em guarda contra os adultos: eram os nossos permanentes adversários. Só diziam mentiras. Tinham a força ao seu dispor (representada por várias formas de agressão, da palmada ao quarto escuro, passando por várias etapas muito variadas). Edmundo reconhecia a sua inutilidade de lutar; mas tinha o brio de não se deixar vencer facilmente.
Numa festa de aniversário, apareceu, entre números de piano e canto (ah! delícias dos saraus de outrora!), apareceu um mágico com a sua cartola, o seu lenço, bigodes retorcidos e flor na lapela. Nenhum de nós se importaria muito com a verdade: era tão engraçado ver saírem cinqüenta fitas de dentro de uma só… e o copo d’água ficar cheio de vinho…
Edmundo resistiu um pouco. Depois, achou que todos estávamos ficando bobos demais. Disse: “Eu não acredito!” Foi mexer no arsenal do mágico e não pudemos ver mais as moedas entrarem por um ouvido e saírem pelo outro, nem da cartola vazia debandar um pombo voando… (Edmundo estragava tudo. Edmundo não admitia a mentira. Edmundo morreu cedo. E quem sabe, meu Deus, com que verdades
Cecília Meireles
O STF e o calvário dos trabalhadores
“O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nessa quinta-feira (30), que a administração pública não é responsável pelo pagamento de eventuais dívidas trabalhistas de empresas terceirizadas contratadas por órgãos públicos” (portal G1, Brasília).
Isso depois de o Superior Tribunal do Trabalho, por sua Sexta Turma, haver considerado subsistente a responsabilidade solidária da administração pública – como, aliás, ocorria ao tempo em que fui secretária executiva do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). É uma tragédia a decisão do STF porque tem repercussão geral (aplicável, pois, a todos os casos de agora em diante); a maioria se formou com os votos da presidente Cármen Lúcia, de Luiz Fux, Marco Aurélio, Dias Toffoli e Gilmar Mendes, além do recém-empossado ministro Alexandre de Moraes.
Caiu agora por terra aquilo que eu havia aprendido nos bancos da Faculdade de Direito da UFMG e que se denominava “culpa in eligendo”, isto é, a administração pública tinha de pagar aos terceirizados que mantivesse, caso a empresa que fornecia aquela mão de obra não o fizesse, pois, como expliquei na semana passada, cada órgão público contratava a empresa prestadora de serviço por escolha própria.
Imagino, agora, como há excelências felizes tanto na Esplanada dos Ministérios como em Estados da Federação e municípios brasileiros... Muitos, escondidos atrás de laranjas.
(...) o que agonia o país é a dívida com o sistema financeiro e não os gastos com trabalhadores ou aposentadoriasAdemais, aprendi no próprio MTE que as tais prestadoras de serviço apareciam e desapareciam da noite para o dia quando o administrador público tentava fazê-las assumir suas responsabilidades para com os trabalhadores. Ora tinham um nome e um proprietário, ora apareciam com outro nome, e, se você investigasse bem, iria perceber que o novo proprietário da aparente nova empresa nada mais era que o marido ou a esposa da que desaparecera. Um verdadeiro inferno para os que só obtinham esse tipo de emprego e outro tanto para os administradores que pretendiam agir com seriedade.
Estão claras as consequências do que acontecerá agora depois dessa decisão da Corte Suprema do país.
De minha parte, embora – como já revelei em artigo há mais tempo – sempre tenha julgado necessário o desmonte do sindicalismo patronal e de trabalhadores criado por inspiração fascista por Getúlio Vargas, só tenho a lamentar que ministros que eu reputava sérios e responsáveis tenham desconhecido a real miséria que se abate há anos sobre os trabalhadores brasileiros e ousem proferir opiniões que não levem em consideração os “de baixo”, os que precisam sobreviver com seus parcos salários, e procurem apenas pautar suas decisões pelos impactos econômicos do momento atual no país.
Oxalá todos eles tivessem a mesma coragem de peitar os banqueiros e de não deixar escorrer o dinheiro público para engordar os lucros financeiros, já que todos eles sabem, e muito bem, que o que agonia o país é a dívida com o sistema financeiro e não os gastos com trabalhadores ou aposentadorias.
Executivo pagou R$ 648 milhões em 'vantagens'
Além dos R$ 5,6 bilhões gastos em salários, o Executivo federal pagou, apenas no mês de fevereiro, mais R$ 648 milhões extras, a título de “vantagens eventuais” e “verbas indenizatórias” a 554 mil servidores, cerca de 94% do total. Os cinco primeiros colocados receberam mais em vantagens que a soma dos salários dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), valor máximo permitido pela Constituição.
As vantagens, que não são submetidas ao teto constitucional, fizeram mais de dois mil servidores receberem mais que os ministros do STF.
Em média, cada um dos servidores do Executivo recebeu R$ 1.170 em vantagens. O valor supera o do salario mínimo, atualmente em R$ 937.
O valor a ser gasto em “vantagens eventuais” e “verbas indenizatórias” este ano deve superar a soma dos orçamentos do Senado e do STF.
Impopularidade acende sinal amarelo de Temer
A última pesquisa do Ibope jogou um balde de água fria no pessoal da comunicação do Temer. E piscou a luz amarela sobre a performance do presidente daqui pra frente com a aprovação irrisória de apenas 10% do seu governo. Seus pronunciamentos e a forma insossa de se dirigir aos brasileiros precisam ser reavaliados por sua equipe se não quiser assistir a repetição das cenas de ruas que desalojaram a Dilma do poder quando tinha esses mesmos percentuais de popularidade. A inflação está controlada, mas a economia, dirigida por Henrique Meirelles, mostra fôlego apenas nos pronunciamentos oficiais do Ministro da Fazenda pois no atacado não é isso que se vê: o desemprego já está alcançando o perigoso índice de 14 milhões de pessoas sem trabalho e o país não sai da inércia econômica.
Temer parece imobilizado dentro de um carro enguiçado de uma marcha só. Suas medidas de reformas são atacadas pelos próprios parceiros dentro do PMDB. Um deles, Renan Calheiros, líder do partido no Senado, já disse que a reforma da Previdência tem que ser revista e rediscutida dentro do parlamento, assim como o projeto da terceirização. Sinaliza a dificuldade que Temer terá para aprovar os projetos do governo e tentar botar o país no rumo do desenvolvimento. Com a popularidade lá embaixo, os políticos ficam cabreiros para apoiá-lo abertamente, principalmente os do Nordeste que acompanham as pesquisas da liderança do Lula na região.
Ora, como se sabe, político tem o faro do voto. E se o Temer permanecer com essa assustadora rejeição, a debandada dos políticos nordestinos será geral. Ninguém, a pouco mais de um ano das eleições, quer acompanhar um presidente ignorado pelo povo, mesmo em inaugurações de obras. O Brasil viu o que aconteceu com a Dilma quando a sua popularidade despencou. O povo foi às ruas, os políticos desapareceram, a sua base no parlamento esfacelou-se e ela ficou isolada como se tivesse uma doença contagiosa.
A Dilma caiu. Nem a base sindical do PT conseguiu amparar a ex-presidente indo às ruas com a bandeira do golpe. O povo, soberano, sabe o momento de erguer e derrubar um governante quando necessário, como já ocorreu também com Collor. A situação do Temer ainda é pior do que a da Dilma, que tinha a resguardá-la centrais de trabalhadores. O PMDB do presidente não tem influencia nessa área e pega carona nos sindicatos anti-PT.
Ora, a situação de Temer não é nada confortável, como mostram as pesquisas. Além disso, ainda tem que juntar os cacos do seu partido no Congresso, se livrar da cassação da chapa (Dilma/Temer), reordenar a economia para gerar emprego e renda, manter a contragosto os empregos do Moreira Franco e Padilha, mesmo sabendo que eles são vigiados noite e dia pela turma da Lava Jato, e equilibrar as finanças do país destroçadas pela dupla Lula/Dilma.
Há, na verdade, um descontrole administrativo no país que ainda não foi sanado. Quando assumiu o governo, Temer disse aos ventos que iria enxugar a máquina estatal, reduzindo ministérios e demitindo os cargos comissionados ocupados pelos sindicalistas ociosos. Quase um ano depois o que se vê é exatamente o contrário. Como informou Cláudio Humberto, aqui no Diário do Poder, os reajustes salarias sancionados por Temer fizeram a despesa saltar de R$ 4,9 bilhões em maio de 2016 para os atuais R$ 5,6 bilhões mensais, mesmo demitindo 2 mil cargos comissionados. Uma titica para um país que está na bancarrota e ainda tem mais de 100 mil cargos de confiança e funções gratificadas.
Com essa carga de problemas, altíssima rejeição, uma comunicação medíocre e a timidez de sair pelo Brasil pregando um novo tempo, um novo governo, Temer não pode exigir que o povo o carregue nos braços como o salvador de um país despedaçado ética, moral e economicamente. E muitos menos esperar que os políticos que pensam em sobreviver às eleições 2018, principalmente do Norte/Nordeste, abracem as suas causas.
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