quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

Desempregados, mas felizes

A iniciativa da Finlândia de oferecer a desempregados uma renda mínima por dois anos não os ajudou a conseguir trabalho, informaram pesquisadores.

De janeiro de 2017 a dezembro de 2018, o programa piloto de renda mínima universal adotado pelo país pagou 560 euros (cerca de R$ 2.360) por mês a 2 mil finlandeses desempregados, selecionados aleatoriamente.

O objetivo do plano era avaliar se garantir uma rede de proteção social ajudaria as pessoas a procurar emprego e a apoiá-las se tivessem que trabalhar na chamada gig economy (baseada em trabalhadores temporários e sem vínculo empregatício).


Embora os níveis de emprego não tenham melhorado, os participantes do programa disseram que estavam mais felizes e menos estressados.

Quando lançou o projeto piloto em 2017, a Finlândia se tornou o primeiro país europeu a testar a ideia de uma renda mínima incondicional.

O projeto, conduzido pela agência finlandesa de seguridade social (Kela), atraiu imediatamente atenção internacional - mas os resultados levantaram questionamentos sobre a eficácia do sistema.
O que é 'renda mínima' e como funciona?

A renda mínima universal significa que todos recebem uma renda mensal fixa, independentemente dos recursos. O teste finlandês foi um pouco diferente, pois se concentrou em pessoas que estavam desempregadas.

Outra variação conhecida é o "serviço básico universal" - no qual, em vez de receber uma renda, serviços como educação, saúde e transporte são gratuitos para todos.

Embora esteja surfando em uma onda de popularidade, a ideia não é nova. O conceito foi descrito pela primeira vez na obra Utopia, de autoria de Thomas More, publicada em 1516 - há 503 anos.

Esquemas como esse estão sendo testados em todo o mundo. Adultos de um vilarejo no oeste do Quênia vão receber US$ 22 por mês até 2028, enquanto o governo italiano está adotando uma "renda cidadã".

A cidade de Utrecht, na Holanda, também está realizando um experimento de renda mínima chamado Weten Wat Werkt ("Saber o que funciona", em tradução livre) até outubro.

Os defensores da renda mínima geralmente acreditam que uma rede de proteção social incondicional pode ajudar as pessoas a saírem da pobreza, dando tempo para elas se candidatarem a vagas de emprego ou aprender novas habilidades essenciais. Isso é visto como cada vez mais importante na era da automação - ou seja, à medida que os robôs ocupam postos de trabalho.

O pesquisador Miska Simanainen, representante da Kela, disse à BBC News que era isso que seu governo queria testar, para "ver se seria uma maneira de reformar o sistema de Previdência social".

E funcionou? Isso depende do que você entende por "trabalho".

Ajudou os desempregados na Finlândia a encontrar emprego, como esperava o governo finlandês de centro-direita? Na verdade, não.

Simanainen diz que, embora algumas pessoas tenham encontrado trabalho, elas não se mostraram mais propensas do que o grupo de controle (de pessoas que não receberam dinheiro). Os pesquisadores ainda estão tentando descobrir exatamente o motivo disso, para inserir no relatório final, que será publicado em 2020.

Mas para muita gente, o objetivo original de inserir os finlandeses no mercado de trabalho era falho desde o início. Se, em vez disso, a meta fosse deixar as pessoas mais felizes de uma maneira geral, o projeto seria considerado um sucesso.

Um dos participantes resumiu esse pensamento quando contou à BBC News como a renda mínima afetou sua vida.

"Ainda estou desempregado", explicou o jornalista Tuomas. "Não posso dizer que a renda mínima mudou muito a minha vida. Ok, psicologicamente sim, mas financeiramente - nem tanto".

A renda mínima é uma daquelas raras questões que despertam elogios e críticas igualmente fortes de todas as partes da esfera política.

Para muitos representantes da esquerda, a renda mínima se concentra demais na riqueza pessoal e no poder de compra dos indivíduos - ou melhor, na falta deles - sem fazer nada para impedir as empresas de desperdiçar recursos produzindo muito mais do que as pessoas precisam e sobrecarregando os funcionários neste processo.

"Sem reformas estruturais fundamentais do nosso sistema econômico, a renda mínima será apenas um band-aid sobre as rachaduras", diz a escritora Grace Blakely, especializada em economia.

Outros se preocupam com o fato de que a renda mínima será usada para cortar custos, estabelecendo uma taxa muito baixa e cortando outros benefícios sujeitos à condição de recursos.

Enquanto isso, muitos representantes da direita e do centro se preocupam exatamente com o oposto - que a renda mínima seria cara demais de implementar e encorajaria uma cultura de "ganhar algo em troca de nada".

Ulrich Spiesshofer, diretor-executivo da empresa de engenharia ABB, expressou este sentimento em 2016 quando disse ao jornal Financial Times que "as recompensas econômicas [para as pessoas] devem ser baseadas na criação de valor econômico".

Os pesquisadores da Kela estão ocupados agora analisando todos os resultados do teste para descobrir o que mais podem nos dizer a respeito do uso e das lacunas da renda mínima.

Simanainen diz que não gosta da ideia de que o teste "fracassou".

Em sua opinião, "não se trata de fracasso ou sucesso - é um fato e [oferece] novos dados que não tínhamos antes desta experiência".

Pensamento do Dia


Erros do governo na Amazônia

Em termos de Amazônia, o atual governo está se especializando em criar falsas polêmicas, como se já não fossem suficientes os problemas que a região realmente enfrenta. O Planalto considera que é preciso monitorar uma reunião da Igreja Católica sobre Amazônia, porque entende que será um atentado à soberania brasileira na região se líderes católicos criticarem o governo. “Nós não damos palpite sobre o deserto do Saara, ou o Alasca”, disse ontem o general Augusto Heleno. O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, atacou um morto. Fez acusações irresponsáveis contra Chico Mendes, assassinado há 30 anos.


A vitória de Jair Bolsonaro se deveu em parte à forte militância dos líderes das igrejas evangélicas. O ideal é que nenhuma religião fizesse militância partidária e eleitoral, porque essa mistura de púlpito e palanque interfere no direito de escolha do eleitor. Contudo, qualquer denominação religiosa é livre para defender temas que achar mais coerente com seus valores. O mesmo grupo político que não se preocupou com o uso das igrejas evangélicas na caminhada eleitoral de Jair Bolsonaro agora acha perigoso o que a Igreja Católica discutirá no Sínodo sobre Amazônia a ser realizado em outubro, em Roma.

O Estado é laico. Isso todos sabem, mas é sempre bom lembrar nestes tempos em que ministros acham que podem fazer proselitismo religioso nas decisões de políticas públicas. As igrejas também são livres para terem as suas visões dos fatos. É delirante a ideia de que se houver críticas ao governo Bolsonaro a soberania do Brasil estará ameaçada. Primeiro, crítica ao governo não é atentado à pátria. Segundo, a Amazônia não é apenas brasileira, é um bioma que se espalha por nove países. Terceiro, a Igreja Católica vem alertando sobre a urgência de proteção do meio ambiente muito antes de haver o governo Bolsonaro. É de 2015 a Encíclica Laudato Si do Papa Francisco.

Em entrevista à repórter Tânia Monteiro, do “Estado de S. Paulo”, o ministro Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), admitiu que há uma preocupação do Planalto com as reuniões preparatórias do Sínodo. Disse que o assunto “vai ser objeto de estudo cuidadoso pelo GSI”. E promete: “Vamos entrar fundo nisso.”

Melhor faria o GSI se aproveitasse a experiência que o general Heleno e outros integrantes da cúpula do governo acumularam quando serviram na Amazônia para entrar fundo nos problemas reais da região: a invasão de grileiros em florestas e parques nacionais, o desmatamento ilegal e predatório, a ameaça aos indígenas, a destruição da biodiversidade, os documentos falsos de propriedade de terra, o uso da região como rota do crime organizado.

As divergências que os especialistas de diversas áreas, as entidades do terceiro setor e eventualmente integrantes do clero tenham em relação às posições do governo Bolsonaro sobre questões ambientais e climáticas são apenas isso: divergências. Uma sociedade democrática é, por natureza, plural. As pessoas divergem, discutem, se manifestam, são convencidas, convencem, mudam de ideia. Hoje os partidos que se opõem à atual administração estão enfraquecidos em grande parte por seus próprios equívocos políticos. Mas isso não significa que o governo não enfrentará, na sociedade, vozes discordantes às decisões que tomar em qualquer área, principalmente nos temas mais sensíveis.

Os militares que comandaram o Exército brasileiro na Amazônia, e que hoje estão no governo, são pessoas inteligentes, preparadas e conhecem o terreno de andar nele. Quem não demonstra entendimento mínimo é o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. A acusação que fez a Chico Mendes desqualifica o próprio ministro e não o líder seringueiro. Salles fez no Roda Viva acusação sem prova, e sem fonte, contra quem não pode se defender. Disse que “as pessoas do agro da região disseram”. E o que disseram? “Que Chico Mendes usava os seringueiros para se beneficiar e fazia manipulação de opinião.” Sem fontes, sem fatos, a aleivosia do ministro do Meio Ambiente revela muito sobre o próprio ministro e o seu caráter.

Há adversários a enfrentar na Amazônia, os militares brasileiros os conhecem porque sempre estiveram presentes na região. Não é o Vaticano. Não é Chico Mendes.

Salles: 'Que diferença faz que é Chico Mendes?'

O ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente) considera o lendário líder seringueiro Chico Mendes um personagem "irrelevante". Em entrevista ao Roda Viva, na noite de segunda-feira (11), o auxiliar de Jair Bolsonaro indagou: "Que diferença faz quem é o Chico Mendes nesse momento?". Recordou-se ao entrevistado que Chico Mendes teve a relevância reconhecida até pela ONU. E o ministro: "A ONU reconhece um monte de coisa errada também".

Chico Mendes foi injetado na conversa no final da entrevista. Como o ministro realizaria sua primeira visita à Amazônia nesta terça-feira, perguntou-se a ele o que achava do líder seringueiro. "Olha, eu não conheço o Chico Mendes e tenho certo cuidado em falar de coisas que não conheço", declarou Ricardo Salles, antes de soar descuidado na frase seguinte.

"Eu escuto histórias de todo o lado. Do lado dos ambientalistas, mais ligados à esquerda, um enaltecimento do Chico Mendes. As pessoas que são do agro, da região, dizem: olha, o Chico Mendes não era isso que é contado".


Uma das entrevistadoras indagou: O que o pessoal do 'agro' diz ao senhor? O ministro respondeu, de bate-pronto: "Que o Chico Mendes usava os seringueiros para se beneficiar, fazia uma manipulação da opinião ali".

Outro repórter emendou: Se beneficiar em quê? Ele morreu pobre! Foi nesse ponto que Ricardo Salles, já meio abespinhado, menosprezou uma das páginas mais importantes do enredo amazônico: "Que diferença faz quem é o Chico Mendes nesse momento?"

Chico Mendes, como se sabe, está no DNA da política ambiental no Brasil. Em 1977, recebeu o Prêmio Global de Preservação Ambiental da ONU. Ou seja: o personagem que o ministro tacha de "irrelevante" já era internacionalmente reconhecido há quatro décadas.

Em 1988, Chico Mendes foi passado nas armas pelo fazendeiro Darly Alves da Silva e seu filho. Os desmatadores não suportavam o convívio com um defensor de valores socioambientais. Não admitiam a pregação em favor da criação de reservas extrativistas, a salvo das motosserras —áreas em que os seringueiros conciliariam o trabalho com a preservação da floresta.

Se não tivesse sido acomodado na Esplanada dos Ministérios por Jair Bolsonaro, Ricardo Salles seria apenas um ex-secretário do governo paulista condenado por improbidade administrativa. Mas já que foi convertido em titular da pasta do Meio Ambiente, seria recomendável que evitasse espremer a biografia de Chico Mendes na bitola estreita dos sinais de trânsito: esquerda ou direita?

É certo que a história costuma ser escrita pelos vitoriosos. Mas pessoas como Ricardo Salles deveriam pelo menos simular algum respeito pelos combatentes que tombaram lutando. Do contrário, o ministro acaba reforçando no brasileiro essa incômoda sensação de que vive um enredo confuso, no qual faz o papel do passageiro que viaja num avião sabendo que sua bagagem, com tudo o que foi capaz de conquistar em sua história, viaja em outra aeronave.

Governar não é tuitar

A Constituição, em seu artigo 79, estabelece que o vice-presidente da República tem apenas uma função relevante: substituir temporariamente o presidente, se este se encontrar doente ou em viagem, ou suceder-lhe, se o cargo ficar vago. No caso de doença, por exemplo, a função presidencial obviamente deve ser exercida pelo vice enquanto o presidente não estiver restabelecido a ponto de conseguir retornar ao trabalho. Há uma razão comezinha para ser dessa forma: a administração do País e a tomada de decisões do governo não podem depender da plena recuperação da saúde do presidente, que pode demorar dias ou até meses.

É preciso que haja alguém com autoridade constitucionalmente reconhecida no exercício do cargo para deliberar sobre os assuntos do governo e orientar os ministros. Do contrário, haverá indesejável paralisia administrativa - como a que o País assiste agora em razão da prolongada internação do presidente Jair Bolsonaro.

Inexplicavelmente, Bolsonaro reassumiu seu cargo apenas 48 horas depois de uma cirurgia de sete horas de duração, realizada no dia 28 de janeiro, para a reconstituição do intestino, atingido no atentado à faca que sofreu ainda na campanha eleitoral, em setembro do ano passado. Conforme os boletins médicos, a operação foi bem-sucedida, e a equipe que o atendeu estabeleceu inicialmente um prazo de dez dias para a recuperação do presidente, mas mesmo esse prazo se mostrou otimista demais. Jair Bolsonaro continuava internado duas semanas depois da cirurgia, período em que o presidente apresentou quadro de pneumonia e febre.

Nesse meio tempo, em vez de delegar suas funções para o vice-presidente Hamilton Mourão, conforme estabelece a Constituição e manda o bom senso, Bolsonaro julgou que poderia logo retomar a dura rotina presidencial - até mesmo uma espécie de gabinete foi montado no quarto do hospital para que ele pudesse despachar. No dia 31 de janeiro, Bolsonaro chegou a fazer uma videoconferência com um ministro e a telefonar para outros, mas logo teve de interromper esse trabalho por ordens médicas - o presidente não poderia nem sequer falar, que dirá encontrar-se com ministros e tomar decisões de Estado. O repouso deveria ser absoluto.

Está claro que, nessas circunstâncias, o vice Hamilton Mourão deveria ter assumido o cargo, pois há diversas decisões à espera do aval do presidente, como a formatação da reforma da Previdência, para ficar só na mais importante. No entanto, Bolsonaro optou por manter-se no cargo mesmo sem ter condições para isso.

Não se conhecem as razões de tal decisão, mas consta que os filhos de Bolsonaro, cuja opinião é determinante para o presidente, não se dão bem com o vice-presidente. O ruído entre eles ficou ainda mais acentuado quando Hamilton Mourão resolveu dar opiniões sobre temas caros aos Bolsonaros - disse, por exemplo, que era contra a mudança da Embaixada do Brasil em Israel para Jerusalém, uma promessa de campanha. Além disso, Mourão está tentando construir uma boa relação com a imprensa, contra a qual os filhos de Bolsonaro dedicam grande virulência. Em resumo, a relação do entorno do presidente com Mourão é de desconfiança. Num país em que tantos vices assumiram o cargo de presidente por vacância, isso tende a alimentar todo tipo de especulação.

Assim, o governo hoje é exercido por alguém sem condições de saúde para tal, sofrendo influência direta e ampla dos filhos - que não receberam um único voto para presidente nem ocupam cargos de ministros. O exercício da Presidência pelo vice-presidente deve respeitar o que diz a Constituição, e não o que ditam os filhos do presidente. Não se trata de uma questão familiar, mas institucional.

Bolsonaro precisa o quanto antes se dar conta de que não está mais em campanha, quando todos os problemas do País podiam ser “resolvidos” por meio de slogans digitados em redes sociais, sob orientação dos filhos. Governar é muito diferente de tuitar: demanda presença, articulação, lucidez - isto é, tudo o que Bolsonaro, convalescente e a reboque dos filhos e dos aliados mais radicais, ainda não conseguiu oferecer ao País.

Imagem do Dia

Mateusz  Urbanowicz 

No Brasil, são todos inocentes

Confesso que estou anestesiado, e até para escrever essas poucas linhas preciso buscar ânimo onde ele não existe. O noticiário tem me provocado náuseas. O que é o Brasil? Se algum desavisado ainda não sabe, basta uma lida rápida nos jornais. E se esse desavisado tiver problema com a Lei e quiser iniciar suas negociatas por aqui, venha logo, não perca essa oportunidade!

Se quiser investir, as opções são variadas: abra uma boate sem saídas de emergência, construa um prédio com areia da praia, monte um centro de treinamento em contêineres inflamáveis. No Brasil, famílias são soterradas por lama, tudo é festa, e a impunidade reina! Doze mortos em Santa Teresa, guerra de quadrilha. Na mesa ao lado, a senhora comenta: “Eles que se matem!”. Em Ipanema, o bloco Simpatia é Quase Amor arrasta milhares de foliões! Vamos comemorar!!! Um amigo me disse que a diretoria do Flamengo está vendo nessa tragédia uma oportunidade, afinal, enquanto alguns choram outros vendem lenços.

Teria sido encomendado ao departamento de marketing um plano para sensibilizar nossos corações, principalmente o dos promotores do Ministério Público. A primeira ideia brilhante seria levar os sobreviventes do incêndio ao próximo jogo. Meninos, não aceitem isso, não deixem que esse caso seja transformado em teatro. O próprio Zico, maior ídolo do clube, pede que os culpados sejam punidos. Quem morreu não volta mais. Indenizações não podem servir de cala-boca, vidas não têm preço.

Desavisados, venham logo para esse país onde um belo dia de sol nos faz esquecer os desabrigados do Vidigal e da Rocinha, onde os temporais arrastam tudo, menos os corruptos. Aqui o prefeito defende-se, o presidente da multinacional esquiva-se, o CEO do clube popular tira da reta. No Brasil, ninguém tem culpa, são todos inocentes. Aqui a democracia dá as cartas, país da opinião livre.

***
Na bancada do Sportv, a comentarista responde sobre o que achou da contratação do Cueva pelo Santos: “É um jogador baixo, o Santos está cheio de jogadores baixos...”. Preconceito? Talento tem tamanho? E depois emenda sobre Carlos Amadeu, técnico da seleção sub 20: “É uma das maiores referências do mundo...”. Óbvio, mudei de canal.

Estamos desassistidos em todos os sentidos. No Brasil, memória é triturada em máquina de moer carne. Vanderlei Luxemburgo foi metralhado em um desses debates: “Não acha que está desatualizado?”. Que atualização é essa de que tanto falam? O técnico novo do São Paulo, de onde surgiu, o que trouxe de inovação, assim como todos esses novatos?

Atualização não é ir para a Espanha e fazer um curso maroto, atualização é vivência! A imprensa constrói os perfis da forma que bem entende: caricato, herói, genial.

Meu perfil é marrento, reclamão, ranzinza. Qual é o seu? Não importa, venha para o Brasil porque aqui você vai dar um jeitinho de encaixá-lo em algum padrão e viver livre para sempre!

Paulo Cesar Caju

Maestrina de morte

A impunidade é o que rege, o que comanda a orquestra das tragédias nacionais
Ricardo Boechat

O lucro que move montanhas de lama

O “Wall Street Journal” publicou, recentemente, uma reportagem, segundo a qual funcionários da Tüv Süd Brasil – aquela instituição externa encarregada de monitorar a segurança da barragem de Córrego do Feijão – haviam atuado também como consultores da Vale, o que configuraria conflito de interesses. A conferir.

Em uma de suas primeiras entrevistas após a tragédia, o presidente da Vale parecia estufar o peito ao falar da reputação da Tüv Süd no campo das auditorias independentes.

Recorri, então, ao site da Deutsche Welle para apurar algumas informações sobre a Tüv Süd. De acordo com a DW, a Tüv Süd não é uma entidade de auditagem independente, mas, sim, “um empreendimento que trabalha por dinheiro”, com faturamento anual de 2,4 bilhões de euros.

A conceituada agência de notícias alemã lembra que a Tüv foi fundada em 1866 como uma associação de certificação de caldeiras a vapor e que, desde então, atuaria sob o mote “independente e neutra”, certificando produtos com “segurança e qualidade, segundo critérios definidos”. Durante muito tempo, veículos só puderam circular por vias alemãs se tivessem sido previamente aprovados pela Tüv, cuja isenção não era posta em dúvida.


Ocorre – diz a Deutsche Welle – que a TÜV, originalmente uma entidade sem fins lucrativos, não existe mais. Ela foi desmembrada em diversos empreendimentos econômicos sob a forma de sociedades anônimas: a Tüv Süd, a Tüv Nord, a Tüv Rheinland, a Tüv Hessen, entre outras, que concorrem no mercado de certificação. Todas, segundo a DW, precisam fazer lucro. Desde então, avolumam-se denúncias, mundo afora, segundo as quais essas empresas já não mais levam em consideração a questão da segurança em suas atividades.

Em novembro de 2018, a Tüv Rheinland foi condenada pela Justiça francesa a indenizar mulheres que fizeram uso de um silicone para implantes mamários que se mostraram, posteriormente, nocivos à saúde e que haviam sido certificados pela TÜV Rheinland. Valor da indenização: 3 milhões de euros.

Não sei como a “Folha de S.Paulo” teve acesso ao laudo da Tüv Süd, pois a Agência Nacional de Mineração não estava divulgando os dados da inspetoria que, em meados de 2018, a empresa teria realizado na barragem de Brumadinho. Alegava, estranhamente, que “os documentos do processo minerário são sigilosos, em obediência à Lei de Propriedade Industrial”. Fui, por um tempo, presidente da comissão que elaborou esse diploma legal e não me recordo de nada em específico que trataria desse sigilo.

Fica claro, pelo menos, que “critérios definidos” de segurança têm levado em conta, sobretudo, interesses econômicos, em prejuízo da neutralidade e independência. Se a situação da barragem era preocupante, por que não recomendaram, cautelarmente, a imediata interdição e evacuação? Medo de perderem o contrato? A aplicação da ciência à produção se entrelaçaria com a necessidade de faturamento?

Como afirmou Elio Gaspari, isso só evidencia o quanto o Brasil anda precisando, urgentemente, de uma “operação Lama Jato”.