terça-feira, 9 de janeiro de 2024
Tolerância com valores autoritários resistiu ao fracasso do 8/1
O fracasso da tentativa de golpe, a punição aos invasores e a relativa tranquilidade desde 8 de janeiro de 2023 não eliminaram um fator que foi determinante para os ataques e que se incorporou ao ideário de agentes políticos e de um largo contingente de eleitores: a tolerância com princípios antidemocráticos.
A ascensão do bolsonarismo elevou a uma posição central no debate público uma doutrina baseada em tendências autoritárias. O líder, seus auxiliares e muitos apoiadores seguiram uma linha que rejeitava controles institucionais, admitia o atropelo das regras do jogo e considerava o uso da força para fazer valer suas vontades políticas.
Grupos dominantes da direita brasileira mantêm essas preferências ou exibem complacência exagerada em relação a esses valores. A dependência da força política de Jair Bolsonaro e a ausência de um polo alternativo nesse campo une extremistas convictos, beneficiários políticos do radicalismo e aqueles que temem desafiar o ex-presidente.
A normalização, ao longo de quatro anos, dessas disposições autoritárias facilitou a disseminação da ideia de que aquele era um caminho legítimo ou, ao menos, uma transgressão aceitável quando usada a favor de um propósito político. Anabolizada por informações falsas, essa distorção foi absorvida por uma fatia ampla do eleitorado.
Esse é o efeito de um certo tipo de populismo. Nos EUA, uma pesquisa do Democracy Fund mostrou que 58% dos eleitores republicanos concordavam, em 2019, que Donald Trump poderia agir fora da Constituição se soubesse que era "a coisa certa". Só 12% dos simpatizantes do mesmo partido diziam, em 2022, que Joe Biden poderia fazer o mesmo.
No Brasil, a desconfiança artificial sobre o processo democrático e o antagonismo fabricado em relação às instituições estão sedimentados entre os bolsonaristas mais fiéis. A exclusão do ex-presidente do jogo eleitoral e a condenação de golpistas dificilmente mudará esse quadro de um ano para outro.
A ascensão do bolsonarismo elevou a uma posição central no debate público uma doutrina baseada em tendências autoritárias. O líder, seus auxiliares e muitos apoiadores seguiram uma linha que rejeitava controles institucionais, admitia o atropelo das regras do jogo e considerava o uso da força para fazer valer suas vontades políticas.
Grupos dominantes da direita brasileira mantêm essas preferências ou exibem complacência exagerada em relação a esses valores. A dependência da força política de Jair Bolsonaro e a ausência de um polo alternativo nesse campo une extremistas convictos, beneficiários políticos do radicalismo e aqueles que temem desafiar o ex-presidente.
A normalização, ao longo de quatro anos, dessas disposições autoritárias facilitou a disseminação da ideia de que aquele era um caminho legítimo ou, ao menos, uma transgressão aceitável quando usada a favor de um propósito político. Anabolizada por informações falsas, essa distorção foi absorvida por uma fatia ampla do eleitorado.
Esse é o efeito de um certo tipo de populismo. Nos EUA, uma pesquisa do Democracy Fund mostrou que 58% dos eleitores republicanos concordavam, em 2019, que Donald Trump poderia agir fora da Constituição se soubesse que era "a coisa certa". Só 12% dos simpatizantes do mesmo partido diziam, em 2022, que Joe Biden poderia fazer o mesmo.
No Brasil, a desconfiança artificial sobre o processo democrático e o antagonismo fabricado em relação às instituições estão sedimentados entre os bolsonaristas mais fiéis. A exclusão do ex-presidente do jogo eleitoral e a condenação de golpistas dificilmente mudará esse quadro de um ano para outro.
Para sobreviver em 2024
Passado o ano, as listas pessoais de desejos, nada mais a fazer do que encarar a realidade. Mesmo um tipo de realidade sobre a qual nada podemos fazer: as eleições nos Estados Unidos, o esforço da China para anexar Taiwan. Até na guerra no Oriente Médio, tudo o que pudemos fazer foi sofrer e reclamar, exceto, é claro, a iniciativa oficial de trazer brasileiros de Israel, da Cisjordânia e da Faixa de Gaza.
O ano entrou com o terremoto no Japão. É um ano de eleições municipais no Brasil. Pensei em ligar o progresso japonês em prevenção e resposta aos grandes eventos naturais a um debate sobre as cidades brasileiras. As mudanças climáticas estão aí, é preciso tirar gente de área de risco, preparar comunidades para uma resposta de emergência.
No primeiro artigo que escrevi no ano cheguei a sugerir que bons planos nesse campo poderiam sonhar com financiamento internacional. Afinal, é o esforço de adaptação às mudanças, e já no Acordo do Paris se falou numa verba para financiá-lo.
Confesso que senti uma ducha de água fria quando vi o Congresso aprovar uma verba de quase R$ 5 bilhões para financiar a campanha eleitoral. É algo distante de nossa realidade e muito distante também de quem se dispõe a considerar as mudanças climáticas e a necessidade de transitar para outro tipo de economia, outro tipo de produção e consumo.
Os gastos eleitorais são previstos como se tivéssemos uma fortuna para esbanjar, como se a tecnologia não tivesse simplificado a relação com o eleitor, como se imaginação fosse banida das eleições e houvesse lugar apenas para grana, muita grana.
A esta altura, creio, já não adianta reclamar. As coisas acontecem, surgem rapidamente no noticiário, desaparecem, e você se torna um chato se ficar repisando.
As mudanças climáticas e o El Niño não nos darão trégua neste ano. Será preciso insistir em algumas teses, ainda que os políticos não as ouçam. É preciso se adaptar, fazer planos, fortalecer a Defesa Civil, educar a população, sobretudo em áreas vulneráveis.
Outro dia, numa reunião no Senado, soube que a Defesa Civil de Santa Catarina se inspira no Japão. Reconheço que não podemos transplantar a mentalidade japonesa, muito menos investir como eles na resiliência urbana.
Existem algumas ilusões que precisam ser desfeitas. Uma delas é supor que temos muito poucos recursos para realizar esses planos. Podemos não ter abundância, mas existem recursos, e mais existiriam se aceitássemos a realidade e os usássemos racionalmente.
Outra ilusão é supor que os brasileiros sejam totalmente refratários à preparação para desastres. Ela parte do princípio de que a indisciplina faz parte de nossa natureza.
Entrevistando algumas brasileiras no Japão, ouvi delas que estão perfeitamente integradas ao trabalho de resposta rápida, fazem simulações e seguem à risca todo protocolo que os japoneses adotam. Isso é válido para toda a colônia brasileira no Japão.
Se começarmos um trabalho de treinamento nas escolas, as próprias crianças podem transmitir ensinamentos para suas famílias. Quando deputado, apresentei um projeto nesse sentido. Não foi aprovado, mas creio que funcionaria melhor se fosse uma disposição das próprias cidades. Talvez nem precise de lei, mas de estímulo, uma espécie de concurso entre escolas.
No encontro no Senado, Esperidião Amin lançou a ideia de premiar cidades com os melhores planos de prevenção e resposta. Se for algo substancial, pode atrair prefeitos. Tudo vale para mudar o quadro no Brasil. Anualmente, somos atingidos pelos eventos naturais, perdemos gente e quase não nos sentamos, como fazem os japoneses, para avaliar nossa vulnerabilidade e tentar reduzi-la.
O ano eleitoral começou com um terremoto à distância e previsões pessimistas sobre o El Niño, num contexto de aquecimento global. Não importam as dificuldades nem o perigo de parecer chato, mas é necessário insistir com políticos e eleitores. Alguma coisa está acontecendo. Por favor, tragam seus guarda-chuvas para a tempestade que nos espera.
O ano entrou com o terremoto no Japão. É um ano de eleições municipais no Brasil. Pensei em ligar o progresso japonês em prevenção e resposta aos grandes eventos naturais a um debate sobre as cidades brasileiras. As mudanças climáticas estão aí, é preciso tirar gente de área de risco, preparar comunidades para uma resposta de emergência.
No primeiro artigo que escrevi no ano cheguei a sugerir que bons planos nesse campo poderiam sonhar com financiamento internacional. Afinal, é o esforço de adaptação às mudanças, e já no Acordo do Paris se falou numa verba para financiá-lo.
Confesso que senti uma ducha de água fria quando vi o Congresso aprovar uma verba de quase R$ 5 bilhões para financiar a campanha eleitoral. É algo distante de nossa realidade e muito distante também de quem se dispõe a considerar as mudanças climáticas e a necessidade de transitar para outro tipo de economia, outro tipo de produção e consumo.
Os gastos eleitorais são previstos como se tivéssemos uma fortuna para esbanjar, como se a tecnologia não tivesse simplificado a relação com o eleitor, como se imaginação fosse banida das eleições e houvesse lugar apenas para grana, muita grana.
A esta altura, creio, já não adianta reclamar. As coisas acontecem, surgem rapidamente no noticiário, desaparecem, e você se torna um chato se ficar repisando.
As mudanças climáticas e o El Niño não nos darão trégua neste ano. Será preciso insistir em algumas teses, ainda que os políticos não as ouçam. É preciso se adaptar, fazer planos, fortalecer a Defesa Civil, educar a população, sobretudo em áreas vulneráveis.
Outro dia, numa reunião no Senado, soube que a Defesa Civil de Santa Catarina se inspira no Japão. Reconheço que não podemos transplantar a mentalidade japonesa, muito menos investir como eles na resiliência urbana.
Existem algumas ilusões que precisam ser desfeitas. Uma delas é supor que temos muito poucos recursos para realizar esses planos. Podemos não ter abundância, mas existem recursos, e mais existiriam se aceitássemos a realidade e os usássemos racionalmente.
Outra ilusão é supor que os brasileiros sejam totalmente refratários à preparação para desastres. Ela parte do princípio de que a indisciplina faz parte de nossa natureza.
Entrevistando algumas brasileiras no Japão, ouvi delas que estão perfeitamente integradas ao trabalho de resposta rápida, fazem simulações e seguem à risca todo protocolo que os japoneses adotam. Isso é válido para toda a colônia brasileira no Japão.
Se começarmos um trabalho de treinamento nas escolas, as próprias crianças podem transmitir ensinamentos para suas famílias. Quando deputado, apresentei um projeto nesse sentido. Não foi aprovado, mas creio que funcionaria melhor se fosse uma disposição das próprias cidades. Talvez nem precise de lei, mas de estímulo, uma espécie de concurso entre escolas.
No encontro no Senado, Esperidião Amin lançou a ideia de premiar cidades com os melhores planos de prevenção e resposta. Se for algo substancial, pode atrair prefeitos. Tudo vale para mudar o quadro no Brasil. Anualmente, somos atingidos pelos eventos naturais, perdemos gente e quase não nos sentamos, como fazem os japoneses, para avaliar nossa vulnerabilidade e tentar reduzi-la.
O ano eleitoral começou com um terremoto à distância e previsões pessimistas sobre o El Niño, num contexto de aquecimento global. Não importam as dificuldades nem o perigo de parecer chato, mas é necessário insistir com políticos e eleitores. Alguma coisa está acontecendo. Por favor, tragam seus guarda-chuvas para a tempestade que nos espera.
A extrema-direita continua à espreita
A tentativa de golpe e os crimes do ex-presidente Jair Bolsonaro são nítidos para a bolha progressista. Critica-se a lentidão da Justiça para julgar os peixes grandes e uma ação mais efetiva do governo Lula para enquadrar os militares. Entretanto, pesquisas mostram que essa é uma realidade de nicho. E que a rede de desinformação da extrema-direita está funcionando com eficiência.
Bolsonaro teve influência nos atos antidemocráticos do 8/1? Parece uma resposta óbvia, mas para a pesquisa Quaest, 43% dos entrevistados não enxergam relação entre os criminosos e o ex-presidente. 47% culpam Bolsonaro. A maioria (51%) acredita que os participantes da invasão são radicais e não representam os eleitores de Jair Bolsonaro.
Outro dado da pesquisa. Em um ano, recuou em 5% – de 94% para 89% – a porcentagem de entrevistados que condenam a destruição dos edifícios na Praça dos Três Poderes.
Certa vez ouvi uma bolsonarista dizer a uma amiga que criticava o ex-presidente: “Você está se informando pelos lugares errados. A Globo e os grandes jornais só mentem”. E certamente ela não falava da Jovem Pan. Quem não lembra das campanhas, com posts do ex-presidente inclusive, para que seus apoiadores seguissem apenas seus canais de informação?
A inaceitável fake news do vídeo de conteúdo sexual com o Padre Júlio Lancellotti é mais um exemplo de como as milícias digitais funcionam. Por mais que os veículos apontem as fraudes e mentiras, elas alcançam um número muito menor de pessoas. Há um método comum. Atacar personagens da esquerda com elementos conservadores: relação com a criminalidade, misoginia, sexo, etc.. E tudo isso com a conveniência ou a omissão das redes sociais. O algoritmo tem partido.
Bolsonaro está inelegível, mas enquanto o ex-presidente, empresários, militares e políticos envolvidos no 8 de janeiro e nos crimes da pandemia não forem à Justiça, legitimará o discurso da extrema-direita que nada foi tão grave assim, e que na verdade não passa do discurso ideológico da esquerda.
Sem passar esses episódios a limpo, a extrema-direita continuará à espreita, apenas aguardando um novo Bolsonaro surgir ou o próprio renascer. A anistia de 1979 continua viva e novamente protege criminosos.
Bolsonaro teve influência nos atos antidemocráticos do 8/1? Parece uma resposta óbvia, mas para a pesquisa Quaest, 43% dos entrevistados não enxergam relação entre os criminosos e o ex-presidente. 47% culpam Bolsonaro. A maioria (51%) acredita que os participantes da invasão são radicais e não representam os eleitores de Jair Bolsonaro.
Outro dado da pesquisa. Em um ano, recuou em 5% – de 94% para 89% – a porcentagem de entrevistados que condenam a destruição dos edifícios na Praça dos Três Poderes.
Certa vez ouvi uma bolsonarista dizer a uma amiga que criticava o ex-presidente: “Você está se informando pelos lugares errados. A Globo e os grandes jornais só mentem”. E certamente ela não falava da Jovem Pan. Quem não lembra das campanhas, com posts do ex-presidente inclusive, para que seus apoiadores seguissem apenas seus canais de informação?
A inaceitável fake news do vídeo de conteúdo sexual com o Padre Júlio Lancellotti é mais um exemplo de como as milícias digitais funcionam. Por mais que os veículos apontem as fraudes e mentiras, elas alcançam um número muito menor de pessoas. Há um método comum. Atacar personagens da esquerda com elementos conservadores: relação com a criminalidade, misoginia, sexo, etc.. E tudo isso com a conveniência ou a omissão das redes sociais. O algoritmo tem partido.
Bolsonaro está inelegível, mas enquanto o ex-presidente, empresários, militares e políticos envolvidos no 8 de janeiro e nos crimes da pandemia não forem à Justiça, legitimará o discurso da extrema-direita que nada foi tão grave assim, e que na verdade não passa do discurso ideológico da esquerda.
Sem passar esses episódios a limpo, a extrema-direita continuará à espreita, apenas aguardando um novo Bolsonaro surgir ou o próprio renascer. A anistia de 1979 continua viva e novamente protege criminosos.
O perseguido
Actualmente, estou a tentar fazer amigos fora do Facebook … mas usando os mesmos princípios.
Todos os dias saio à rua e durante alguns metros acompanho as pessoas que passam e explico-lhes o que comi, como me sinto, o que fiz ontem, o que vou fazer mais tarde, o que vou comer esta noite e mais coisas.
Entrego-lhes fotos da minha mulher, da minha filha, do meu cão, minhas no jardim, na piscina, e fotos do que fizemos no fim de semana.
Também caminho atrás das pessoas, a curta distância, ouço as suas conversas e depois aproximo-me e digo-lhes que “gosto” do que ouvi, peço-lhes que a partir de agora sejamos amigos e também faço algum comentário sobre o que ouvi. Mais tarde, partilho tudo quando falo com outras pessoas.
E funciona…Já tenho 3 pessoas que me seguem…
São dois polícias e um psiquiatra.
Todos os dias saio à rua e durante alguns metros acompanho as pessoas que passam e explico-lhes o que comi, como me sinto, o que fiz ontem, o que vou fazer mais tarde, o que vou comer esta noite e mais coisas.
Entrego-lhes fotos da minha mulher, da minha filha, do meu cão, minhas no jardim, na piscina, e fotos do que fizemos no fim de semana.
Também caminho atrás das pessoas, a curta distância, ouço as suas conversas e depois aproximo-me e digo-lhes que “gosto” do que ouvi, peço-lhes que a partir de agora sejamos amigos e também faço algum comentário sobre o que ouvi. Mais tarde, partilho tudo quando falo com outras pessoas.
E funciona…Já tenho 3 pessoas que me seguem…
São dois polícias e um psiquiatra.
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