quinta-feira, 27 de agosto de 2015
Missa de réquiem celebrada pelo defunto
Certas coisas, só no Brasil. Estamos assistindo a missa de réquiem celebrada pelo próprio defunto. No caso, foi o governo que morreu, e o celebrante é a presidente Dilma. Não dá para entender como Madame fornece, dia a dia, mais argumentos para seu sacrifício. Ainda agora pediu ao Tribunal de Contas da União mais quinze dias para responder às acusações de haver extrapolado a Lei de Responsabilidade Fiscal e maquiado contas que não poderia. A presidente já havia conseguido quinze dias de prorrogação. Outro tanto seria exagero inexplicável, mas o Advogado Geral da União solicitou. Ontem, veio a recusa da maioria do plenário daquela corte, óbvia derrota do governo, capaz de fazer supor que no julgamento do mérito, repita-se o placar.
Não havia ao lado de Dilma um só assessor capaz de alertá-la para ficar quieta, sem endossar o pedido considerado abusivo? O objetivo final é é evitar a rejeição das contas
Aproxima-se a hora de o TCU decidir, e se as contas da campanha de 2014 forem consideradas irregulares, caberá ao Congresso pronunciar-se. Como pena máxima, se assim for decidido, estará a perda de mandato.
A conclusão é de que Dilma forneceu argumentos para sua degola, mesmo não se tendo certeza do julgamento final do Tribunal de Contas da União ou da disposição do Congresso de sacrificá-la. A imagem, realmente, é da missa de réquiem celebrada pelo defunto, porque da reeleição até agora, a presidente tem incorrido numa série de erros fundamentais. Negou de pés juntos que vivíamos uma crise econômica, jurou que inexistiam razões para a volta da inflação. Prometeu que não reduziria o número de seus ministros. Desautorizou o ministro da Fazenda, no qual depositara ilimitada confiança, anulando uma série de iniciativas adotadas por Joaquim Levy e depois tornadas sem efeito. Obrigou-se a engolir a renuncia do vice-presidente Michel Temer da condição de coordenador político. Suas relações com o Lula se deterioraram, ao tempo em que ao menos numa votação o PT posicionou-se contra ela. Foram várias suas derrotas no Congresso, culminando com o desembarque do presidente da Câmara. Numa palavra, graças à chefe do governo, piora a cada dia sua já instável segurança.
Não havia ao lado de Dilma um só assessor capaz de alertá-la para ficar quieta, sem endossar o pedido considerado abusivo? O objetivo final é é evitar a rejeição das contas
Aproxima-se a hora de o TCU decidir, e se as contas da campanha de 2014 forem consideradas irregulares, caberá ao Congresso pronunciar-se. Como pena máxima, se assim for decidido, estará a perda de mandato.
A conclusão é de que Dilma forneceu argumentos para sua degola, mesmo não se tendo certeza do julgamento final do Tribunal de Contas da União ou da disposição do Congresso de sacrificá-la. A imagem, realmente, é da missa de réquiem celebrada pelo defunto, porque da reeleição até agora, a presidente tem incorrido numa série de erros fundamentais. Negou de pés juntos que vivíamos uma crise econômica, jurou que inexistiam razões para a volta da inflação. Prometeu que não reduziria o número de seus ministros. Desautorizou o ministro da Fazenda, no qual depositara ilimitada confiança, anulando uma série de iniciativas adotadas por Joaquim Levy e depois tornadas sem efeito. Obrigou-se a engolir a renuncia do vice-presidente Michel Temer da condição de coordenador político. Suas relações com o Lula se deterioraram, ao tempo em que ao menos numa votação o PT posicionou-se contra ela. Foram várias suas derrotas no Congresso, culminando com o desembarque do presidente da Câmara. Numa palavra, graças à chefe do governo, piora a cada dia sua já instável segurança.
Apesar de haver ficado para o final de janeiro a recomposição ministerial, com a extinção de dez ministérios, um conselho tem chegado à presidente Dilma, daqueles praticados por Tancredo Neves quando compunha sua equipe: “jamais nomeie quem não puder demitir”.
À falta do que fazer, Dilma inventa de reformar o seu governo
Quem pedia a Dilma uma reforma ministerial? Lula, não. Ele é contra uma reforma ministerial nas atuais circunstâncias. Acha que ela só trará desarranjos. Disputas entre partidos. E ao fim e ao cabo, insatisfação generalizada.
Michel Temer, o vice-presidente da República e presidente do PMDB, pensa como Lula. Seu partido deixou de acossar Dilma atrás de mais vagas no ministério. Parece conformado com o que tem. Por que despertar o apetite do PMDB?
O PT sempre quer mais vagas no ministério. Mas não pode reclamar das que tem – 11 vagas. É o partido com maior número de ministros. Seria até capaz de se sentir atraído por uma reforma se for para ocupar mais espaço. Para perder? Não tem graça.
Se perguntarem a Gilberto Kassab, ministro de Cidades, se o seu PSD daria conta de mais ministérios, logicamente ele responderá que sim. Mas não espera ganhar novos ministérios. É novo em Brasília. Prefere ir com calma. Jamais.
Carlos Lupi, presidente do PDT, não reivindica mais ministérios. Quer ter somente o prazer de trocar Manoel Dias, ministro do Trabalho e seu correligionário, por outro nome mais sensível aos pedidos dele, Lupi. E está de bom tamanho.
Dilma anunciou que extinguirá 10 dos 38 ministérios. O que conseguiu? Que seus aliados entrassem em pânico com medo de perder os que têm. Em pânico também deixou os 22 mil ocupantes de cargos de livre nomeação ao dizer que dispensará mil deles.
Procedeu assim para quê? Para ser louvada por uma mixaria de economia? Não será. Para recuperar alguns pontinhos de popularidade? Esqueça. Para ser apontada como incoerente já que há pouco tempo chamou reforma ministerial de “panaceia”?
Durante a campanha do ano passado, toda vez que Aécio Neves ou Marina Silva falava em enxugar o governo, Dilma provocava: “Vão cortar o quê? O ministério da Igualdade Racial? O da Mulher? O dos Direitos Humanos”?
É razoável supor que nenhum desses será cortado por ela. E então? Cortará o das Relações Institucionais responsável pela coordenação política do governo? Tudo bem. Está vago. Não fará falta. E mais o quê? Acabará com o da Micro e Pequenas Empresas?
Desempregará Guilherme Afif Domingues, ministro a quem tanto considera e disso faz alarde? Sei. Adiante. Juntará os ministérios do Desenvolvimento Agrário com o da Agricultura? Faz sentido. Seria de fato recomendável.
Só que o da Agricultura representa o agronegócio. No outro está o Incra, um latifúndio do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra. Quero ver no que daria tal mistura. E o Ministério da Pesca? Desempregará o ministro que é filho do senador Jáder Barbalho?
Turismo? Pode ser incorporado por algum ministério mais encorpado da área econômica. E o que será do ministro Henrique Eduardo Alves, ex-presidente da Câmara dos Deputados pelo PMDB, indicado para o cargo por Eduardo Cunha?
Quanto ao ministério do Gabinete de Segurança Institucional: Dilma detesta o general que o ocupa. Não despacha com ele por birra. Portanto... Portanto, nada. Os militares não gostarão de perder o ministério. O da Defesa já é comandado por um civil.
Estão tendo uma ideia da encrenca que Dilma arranjou para si? Como se ela não tivesse tantas outras encrencas para administrar.
'Erro de avaliação' caro aos pobres
Mas, se a crise moral ignora ideologias, a crise econômica tem endereço certo. A presidente Dilma assumiu que o Governo falhou ao demorar a perceber que a situação do país era mais grave que imaginavam. E quem mais sofre as consequências deste “erro de avaliação” são como sempre os que dependem diretamente dos humores do mercado, ou seja, os pobres, aqueles que um dia o PT prometeu transformar a vida. A recessão que se anuncia longa – ampliada pelas fortes turbulências na China – promove a dissolução dos poucos, mas importantes, avanços sociais conquistados na última década. A Classe C, outrora emergente, vê-se acossada pelo desemprego e pela inflação, pela piora dos já péssimos serviços oferecidos nos sistemas de educação, saúde e transporte, pela violência que sitia os bairros das periferias das cidades. Mas quem se importa com isso?Luiz Ruffato
O resgate do jornalismo
Num mundo cada vez mais rápido, em que as informações se disseminam por múltiplos meios –graças ao tablet, ao celular e às mídias sociais-, o jornal tem futuro. Mas é preciso fazer a lição de casa.
O jornalismo, fustigado pelo protagonismo da internet, foi raptado pela perda de qualidade do conteúdo, pelo perigoso abandono de sua vocação pública e pela sua equivocada transformação em produto mais próprio para consumo privado.
Impõe-se resgatar o entusiasmo do “velho ofício”. É urgente investir fortemente na formação e qualificação dos profissionais. Sem jornalismo público, independente e qualificado, o futuro da democracia é incerto e preocupante.
A sobrevivência dos meios tradicionais demanda foco absoluto na qualidade de seu conteúdo. A internet é um fenômeno de desintermediação. E que futuro aguarda os meios de comunicação, assim como os partidos políticos e os sindicatos, num mundo desintermediado? Só nos resta uma saída: produzir informação de alta qualidade técnica e ética.
Apostar em boas pautas -não muitas, mas relevantes- é uma saída. É melhor cobrir magnificamente alguns temas do que atirar em todas as direções. O leitor pede reportagem. O lugar do repórter é na rua, garimpando a informação, prestando serviço ao leitor e contando boas histórias. Elas existem. Estão em cada esquina das nossas cidades. É só procurar.
Há um modelo a ser seguido? Nas experiências que acompanho, ninguém alcançou a perfeição e ninguém se equivocou totalmente.
O perceptível é que os jornais estão lentos para entender que o papel é um suporte que permite trabalhar em algo que a internet e a rede social não fazem adequadamente: a seleção de notícias, jornalismo de alta qualidade narrativa e literária. É para isso que o público está disposto a pagar. Também na internet.
A fortaleza do jornal não é dar notícia, refém do factual. É se adiantar e investir em análise, interpretação e se valer de sua credibilidade.
Para mim, o grande desafio do jornalismo é a formação dos jornalistas. Se você for a um médico e ele disser que não estuda há 25 anos, você se assusta. Mas há jornalistas que não estudam nada há 25 anos.
O jornalismo não é só rotativa ou tecnologia: o valor dele se chama informação, talento, critério. Por isso é preciso investir em jornalistas com boa formação cultural, intelectual e humanística - pessoas que leiam literatura, sejam criativas e motivadas. E, além disso, que sejam bons gestores.
As competências são demasiadas? Talvez. Mas é o que nos pede um mundo cada vez mais complexo e desafiante.
Jamais vi nosso país ser dissecado em público e com afiada disposição
Jamais vi nosso país, como se fosse um cadáver putrefato, ser dissecado em público e com afiada disposição de extirpar e punir a corrupção que se apossou dele há muitos anos. Mesmo assim, embora ciente, como você, leitor, dos tumores que surgem a cada dia, não é fácil, repito, tomar posição em meio a esse indevassável cipoal de subterfúgios e mentiras em que se meteram os envolvidos, políticos ou não. De uma coisa, porém, tenho certeza: não se pode aceitar, em nenhuma hipótese, como solução para a grave crise sob a qual sucumbimos, qualquer tentativa de golpe contra nossas instituições democráticas, duramente conquistadas ao longo dos últimos 25 anos. Da minha parte, não teria saúde para suportar mais uma porretada dentre tantas que foram desferidas contra minha geração. Não quero enumerá-las, mas apenas dizer que assisto a esse trágico filme há mais de meio século. Um horror!
Nada disso, porém, tem a ver com o péssimo governo da presidente Dilma, que, desde o início do primeiro mandato, tanto política quanto economicamente, traçou o que seria o seu fim, mas, sobretudo, o que seria o início do segundo – um desastre, simplesmente. Um enorme desastre, que, de maneira nenhuma, pode ser imposto aos brasileiros, que, desde junho de 2013, descobriram o palco das ruas.
Depois, então, dessa sua última entrevista, concedida a três jornais brasileiros, quando, ao tentar fazer um mea-culpa nada convincente, para não dizer mentiroso – “Errei ao ter demorado tanto a perceber (no ano passado) que a situação era mais grave” –, anunciou inútil corte de ministérios, a presidente perdeu até mesmo o respeito a que lhe deveria pelo honroso cargo que ocupa. Na realidade, ao dizer que errou, acolheu, tardiamente, o conselho do ex-presidente Fernando Henrique, embora, na entrevista, o tenha considerado “solução fácil”.
Quando, em 2014, rejeitou a proposta da oposição de reduzir, substancialmente, o número de ministérios, a presidente deu o seguinte troco, ao exclamar assim: “Quero saber qual ministério e quem vai fechar! Essas secretarias poderiam ter outro status? Poderiam. Não perceber a importância do status é uma cegueira tecnocrática!”. Pois bem. A presidente Dilma passou a ocupar, com honra e gala, o primeiro lugar da lista de “cegos tecnocráticos” (ou mentirosos tecnocráticos?).
Mas a nova presidente Dilma, a do mea-culpa retardatário, se superou mesmo ao afirmar que ficou “completamente surpreendida” quando soube que militantes do PT se envolveram no megaesquema de corrupção descoberto na Petrobras. E disse isso depois de defender o ex-presidente Lula: “Não acho correto o que fazem com ele. Quero manifestar em alto e bom som que não concordo. Acho que tentam diminuí-lo, tentam envolvê-lo. Passam de todos os limites”.
O ex-presidente Lula, que Dilma defende, é o mesmo que, depois de se dizer traído no episódio do mensalão (“por práticas inaceitáveis das quais nunca tive conhecimento”), apresentou várias versões: tratou-o como tentativa de golpe contra o seu governo, como farsa, para, depois, afirmar que o mensalão foi invenção da oposição.
Estamos diante de quatro alternativas: da renúncia (um gesto de grandeza que a presidente, a meu ver, jamais terá); da desaprovação, pelo TSE, das suas contas de campanha; da desaprovação, pelo TCU, das contas do seu governo; ou, enfim, da sua desastrosa permanência na Presidência por três anos e quatro meses.
A última precisa, mais que tudo, da ajuda de Deus.
Nada disso, porém, tem a ver com o péssimo governo da presidente Dilma, que, desde o início do primeiro mandato, tanto política quanto economicamente, traçou o que seria o seu fim, mas, sobretudo, o que seria o início do segundo – um desastre, simplesmente. Um enorme desastre, que, de maneira nenhuma, pode ser imposto aos brasileiros, que, desde junho de 2013, descobriram o palco das ruas.
Depois, então, dessa sua última entrevista, concedida a três jornais brasileiros, quando, ao tentar fazer um mea-culpa nada convincente, para não dizer mentiroso – “Errei ao ter demorado tanto a perceber (no ano passado) que a situação era mais grave” –, anunciou inútil corte de ministérios, a presidente perdeu até mesmo o respeito a que lhe deveria pelo honroso cargo que ocupa. Na realidade, ao dizer que errou, acolheu, tardiamente, o conselho do ex-presidente Fernando Henrique, embora, na entrevista, o tenha considerado “solução fácil”.
Quando, em 2014, rejeitou a proposta da oposição de reduzir, substancialmente, o número de ministérios, a presidente deu o seguinte troco, ao exclamar assim: “Quero saber qual ministério e quem vai fechar! Essas secretarias poderiam ter outro status? Poderiam. Não perceber a importância do status é uma cegueira tecnocrática!”. Pois bem. A presidente Dilma passou a ocupar, com honra e gala, o primeiro lugar da lista de “cegos tecnocráticos” (ou mentirosos tecnocráticos?).
Mas a nova presidente Dilma, a do mea-culpa retardatário, se superou mesmo ao afirmar que ficou “completamente surpreendida” quando soube que militantes do PT se envolveram no megaesquema de corrupção descoberto na Petrobras. E disse isso depois de defender o ex-presidente Lula: “Não acho correto o que fazem com ele. Quero manifestar em alto e bom som que não concordo. Acho que tentam diminuí-lo, tentam envolvê-lo. Passam de todos os limites”.
O ex-presidente Lula, que Dilma defende, é o mesmo que, depois de se dizer traído no episódio do mensalão (“por práticas inaceitáveis das quais nunca tive conhecimento”), apresentou várias versões: tratou-o como tentativa de golpe contra o seu governo, como farsa, para, depois, afirmar que o mensalão foi invenção da oposição.
Estamos diante de quatro alternativas: da renúncia (um gesto de grandeza que a presidente, a meu ver, jamais terá); da desaprovação, pelo TSE, das suas contas de campanha; da desaprovação, pelo TCU, das contas do seu governo; ou, enfim, da sua desastrosa permanência na Presidência por três anos e quatro meses.
A última precisa, mais que tudo, da ajuda de Deus.
A 'patriota'
O maior patriotismo é dizer ao seu país quando está se comportando de maneira desonesta, tola, perversaJohn Barnes
A caixa-preta do PT
Lula e Dilma fizeram explodir em seus mandatos o total de funcionários na administração pública federal. Juntos, os dois contrataram 129.641 servidores concursados (elevando o total para 615.621). Já o pessoal em cargos, funções de confiança e gratificações aumentou em 32.052 (para 99.850; +30%).
Depois de qualificar como "lorota" o plano da oposição na campanha eleitoral para reduzir ministérios, Dilma anuncia sem detalhamento que pode eliminar dez deles (de 39). E mil cargos de confiança. Ou seja, cortaria só 3% dos mais de 32 mil novos cargos do tipo que ela e Lula criaram.
Cerca de 75% de tudo o que entra no caixa do governo federal hoje sai diretamente para o bolso de funcionários públicos, aposentados e beneficiários de programas sociais. O governo acaba atuando, portanto, como um simples controlador de uma "grande folha de pagamentos". Entrou, saiu.
O motivo de tantos ministérios, sem que haja mais dinheiro livre para suas ações, seria um mistério não fossem eles usados apenas politicamente. Onde o pouco dinheiro livre que entra normalmente abastece aliados.
No caso de algumas pastas ligadas às áreas sociais, como a do Desenvolvimento Social, há funções claras, como averiguar se crianças do Bolsa Família vão à escola e postos de saúde. Nos da Saúde e Educação, também.
Mas não parece razoável tantos funcionários e cargos novos para lidar com apenas 25% do dinheiro que sobra da arrecadação depois dos repasses diretos.
O aumento, desproporcional aos avanços do país, é mais uma caixa-preta dos quase 13 anos do PT.
As nomenclaturas para cargos, funções de confiança e gratificações (47) são cifradas e herméticas, sem dar pistas do que toda essa gente faz, segundo documento enviado à Folha pela ONG Contas Abertas. Da quantidade de ministérios e relevância, até Dilma agora reconhece a excrescência.
O total de servidores concursados em massa é justamente uma das maiores dificuldades hoje para se reduzir despesas. Assim como fazer cortes nas 75% das despesas que são parte da "grande folha de pagamento".
Consultado, o Ministério do Planejamento argumenta que as contratações a partir de 2003 "atendem às necessidades da administração pública, adequadas às condições orçamentárias e ao cenário econômico do país".
Como sabemos, as "condições orçamentárias" e o "cenário econômico" requerem cortes profundos no momento. Eles poderiam ter sido iniciados há dez anos, quando Dilma ministra da Casa Civil qualificou como "rudimentar" proposta do Ministério da Fazenda para um plano de ajuste fiscal de longo prazo.
Coisa que a presidente quer fazer agora, de uma hora para a outra. Em condições bem mais adversas.
Depois de qualificar como "lorota" o plano da oposição na campanha eleitoral para reduzir ministérios, Dilma anuncia sem detalhamento que pode eliminar dez deles (de 39). E mil cargos de confiança. Ou seja, cortaria só 3% dos mais de 32 mil novos cargos do tipo que ela e Lula criaram.
Cerca de 75% de tudo o que entra no caixa do governo federal hoje sai diretamente para o bolso de funcionários públicos, aposentados e beneficiários de programas sociais. O governo acaba atuando, portanto, como um simples controlador de uma "grande folha de pagamentos". Entrou, saiu.
O motivo de tantos ministérios, sem que haja mais dinheiro livre para suas ações, seria um mistério não fossem eles usados apenas politicamente. Onde o pouco dinheiro livre que entra normalmente abastece aliados.
No caso de algumas pastas ligadas às áreas sociais, como a do Desenvolvimento Social, há funções claras, como averiguar se crianças do Bolsa Família vão à escola e postos de saúde. Nos da Saúde e Educação, também.
Mas não parece razoável tantos funcionários e cargos novos para lidar com apenas 25% do dinheiro que sobra da arrecadação depois dos repasses diretos.
O aumento, desproporcional aos avanços do país, é mais uma caixa-preta dos quase 13 anos do PT.
As nomenclaturas para cargos, funções de confiança e gratificações (47) são cifradas e herméticas, sem dar pistas do que toda essa gente faz, segundo documento enviado à Folha pela ONG Contas Abertas. Da quantidade de ministérios e relevância, até Dilma agora reconhece a excrescência.
O total de servidores concursados em massa é justamente uma das maiores dificuldades hoje para se reduzir despesas. Assim como fazer cortes nas 75% das despesas que são parte da "grande folha de pagamento".
Consultado, o Ministério do Planejamento argumenta que as contratações a partir de 2003 "atendem às necessidades da administração pública, adequadas às condições orçamentárias e ao cenário econômico do país".
Como sabemos, as "condições orçamentárias" e o "cenário econômico" requerem cortes profundos no momento. Eles poderiam ter sido iniciados há dez anos, quando Dilma ministra da Casa Civil qualificou como "rudimentar" proposta do Ministério da Fazenda para um plano de ajuste fiscal de longo prazo.
Coisa que a presidente quer fazer agora, de uma hora para a outra. Em condições bem mais adversas.
*
Sobre a crise, Dilma disse nesta semana que no final de 2014 "não tinha indícios de uma coisa dessa envergadura". Na melhor das hipóteses, a presidente é mal informada.
Pixuleco 171, o herói inflável
Lula ficou revoltado com Pixuleco, um boneco inflável de 12 metros de altura que apareceu em Brasília nas manifestações do dia 16. Pixuleco é uma caricatura de Lula com roupa de presidiário e a inscrição "13-171" (leia mais em Personagem da Semana). A sátira motivou uma nota oficial do Instituto Lula, afirmando que o ex-presidente nunca fez nada de errado e só foi preso na ditadura militar por defender as liberdades. Nunca antes um ex-presidente da República polemizou com um boneco inflável - que veio desinflar o mito de Lula. E, quando isso se consumar, acabará a bateria da marionete que governa o Brasil.
Lula está indignado, porque a indignação é seu disfarce perfeito. Um dia ele já se indignou de verdade, mas, quando notou que o figurino do injustiçado chorão lhe dava poderes mágicos, não vestiu mais outra roupa. Lula manda no Brasil há 12 anos e continua se queixando da opressão - fórmula perfeita para eleger uma oprimida profissional, que luta dia e noite contra uma ditadura encerrada 30 anos atrás.
Hoje, há quem diga que essa ditadura foi profética ao prender Lula: atirou no que via e acertou no que ainda não existia. É evidentemente uma piada. O autoritarismo militar não tem graça, e Lula não estava destinado a ser o Pixuleco 171.
Quem lhe reservou esse destino, quase sem querer, foi ele mesmo.
Luiz Inácio da Silva é um cara simpático, engraçado. Não tem o olhar demoníaco de um Collor, que exala prepotência e crueldade. Mas, assim como a imensa maioria dos companheiros petistas, tem uma noção visceral de sua mediocridade. Os companheiros morrem de medo de sua própria covardia. Daí o desespero com que se agarram às tetas do Estado, com a forte desconfiança de que não serão capazes de mamar em outra freguesia. Talvez até alguns fossem capazes - Lula muito mais do que Dilma, por exemplo mas eles mesmos não acreditam. E não pagam para ver. Ou melhor: pagam para não ver.
E pagam bem. A República do Pixuleco é possivelmente um dos mais formidáveis sistemas de corrupção da civilização moderna - se é que se pode chamar isso de civilização. Um sistema montado sobre um trunfo infalível em sociedades infantilizadas e sentimentaloides: a chantagem emocional. Lula da Silva chora, e os corações derretidos ficam cegos para tudo - inclusive para o saque a seus próprios bolsos. O Brasil está sendo roubado de forma obscena há 12 anos pelos coitados, e não se sabe mais quantos exemplares de Joaquim Barbosa e Sergio Moro serão necessários para o país enxotar o governo criminoso.
Não é que o impeachment de Dilma seja uma saída legítima - ele é a única saída legítima, se os brasileiros ainda quiserem salvar suas instituições da pilhagem desenfreada. A legalidade no país leva todo dia um tapa na cara das trampolinagens companheiras sucessivamente reveladas e expostas, escatologicamente, à luz do sol. Dilma é a representante oficial da pilhagem - e só os covardes duvidam disso.
Se o Brasil tiver vergonha na cara, cercará o Congresso Nacional e o "encorajará" a fazer o que tem de ser feito. Se ficar em casa chupando o dedo, talvez o país tenha de ser libertado por um boneco inflável.
Os porcos, entre nós
"A revolução dos bichos", publicado em agosto de 1945, faz 70 anos. Minha filha leu-o, avidamente, aos 11. No fim, anunciou o desejo de ler a “parte 2” – e ficou decepcionada quando informei-lhe que isso não existe. George Orwell não era um propagandista: no encerramento de sua alegoria, os porcos (os bolcheviques) já não se distinguem dos humanos (os capitalistas). A continuação que minha filha queria apareceu, porém, numa falsificação da CIA. O agente Howard Hunt comprou secretamente os direitos de adaptação cinematográfica e produziu uma versão em desenho animado. Nela, a trama ganha outro desfecho: os animais tomam de assalto a casa da fazenda ocupada pelos porcos e, com essa segunda revolução, libertam-se finalmente. Propaganda e verdade — os dois termos acompanham a trajetória de Orwell, conferindo-lhe atualidade.
Orwell aprendeu menos com os livros que com a vida. Dias na Birmânia, publicado em 1934, é uma narrativa de descoberta do imperialismo. Mas, para o jovem policial numa província da Índia Britânica, imperialismo significava algo mais decisivo que um conceito político e econômico. A sua revolta pessoal dirigia-se contra a “sujeira do Império”: os hábitos dos colonizadores. Naqueles “dias”, um tempo empapado pela ideia de raça, Orwell tatuou, entre os nós dos dedos, símbolos usados pelos birmaneses.
A jornada de libertação prosseguiu no East End londrino e na Rue du Pot de Fer, em Paris, depois da conversão do policial em escritor. Na pior em Paris e Londres, de 1933, que retoma o fio tecido por Jack London meio século antes, é o resultado de sua experiência nos pardieiros, entre os miseráveis. Nele, Orwell registra a presença de chineses, lascares de Bengala, dravidianos do Ceilão e sikhs do Punjab. Uma passagem menciona a beleza das mulheres e especula que seria fruto da “mistura de sangue”. Ele procurava a verdade, uma humanidade compartilhada, e jogava fora a armadura da “pureza racial”.
O “ato de um idiota” – assim, num restaurante de Paris, Henry Miller crismou a decisão de Orwell, seu companheiro de mesa, que já estava a caminho de engajar-se ao lado dos republicanos espanhóis antifranquistas. Miller era um cínico incorrigível; Orwell, um moralista e um asceta. Lutando na Espanha, de 1938, conta uma história clandestina, proibida, enterrada sob os espessos sedimentos de propaganda do comunismo oficial, que ganharia novos e pungentes detalhes no Memórias de um revolucionário, de Victor Serge, publicado apenas em 1951. Operando sob ordens de Moscou, o Partido Comunista Espanhol (PCE) preferia combater os anarquistas e trotskistas reunidos no Partido Operário de Unificação Marxista (Poum) a fazer a guerra contra as forças franquistas.
“Aquela foi a primeira vez que eu vi uma pessoa cuja profissão era contar mentiras — a não ser que você inclua os jornalistas”, escreveu sobre um gordo agente soviético baseado em Barcelona que se dedicava a difamar os militantes do Poum, classificando-os como espiões. Orwell temia, mais que tudo, o “evanescimento” do conceito de verdade objetiva no mundo, destroçado pelas campanhas de propaganda partidária. Desse temor, nasceram A revolução dos bichos e 1984, obras cujo foco não é tanto a política, mas a linguagem política e sua degeneração.
Os porcos estão vivos – e entre nós. Os comunistas, primeiro, e os nazistas, em seguida, descobriram que a verdade objetiva é uma película fina, vulnerável aos golpes de uma propaganda sistemática organizada em torno de vetores abstratos, mas de fácil compreensão. “Trabalhadores” versus “exploradores”, “alemães” versus “judeus”, “nacional” versus “estrangeiro”, “povo” versus “elite”, “nós” contra “eles”: a partição de uma realidade complexa em polos antagônicos bem simples é capaz de produzir o milagre da substituição do fato pela versão. A lição da propaganda partidária do totalitarismo difundiu-se no mercado da política, inspirando a gramática e as fórmulas utilizadas no marketing eleitoral. “É tudo culpa de FHC”: ao mentiroso, as batatas.
A difamação de Orwell ganhou tração no pós-guerra, logo após sua morte, por iniciativa do Grupo de Historiadores do Partido Comunista Britânico, que contava com figuras como Maurice Dobb, Cristopher Hill, Eric Hobsbawm e Edward P. Thompson. Eles não o perdoavam pela sua crítica implacável aos intelectuais de esquerda que, colocando um sinal de igual entre democracia e fascismo, tinham oferecido suporte ao Pacto Germano-Soviético de 1939.
A operação difamatória funcionava menos como vingança e mais como uma queima de arquivo. Nas vésperas da guerra, os intelectuais comunistas britânicos distribuíram panfletos celebrando a aliança entre Stalin e Hitler. Crismar Orwell com a marca do traidor era um expediente destinado a incinerar os textos perigosos, lavando as reputações dos “amigos do povo”. Thompson, em especial, consagrou-se à missão purificadora. Aproveitando-se da circunstância de que um homem morto não pode retrucar, recorreu simplesmente à mentira, acusando-o de ser “obsessivamente” sensível à “menor insinceridade” da esquerda, mas surdo e cego à “desumanidade da direita”. A ideia era relegar o alvo ao esquecimento, o exílio mais pesado para um escritor.
No fim, Orwell triunfou. É bem certo que os porcos ainda estão entre nós – continuam a se confundir com os humanos e, inclusive, se multiplicaram. Entretanto, a condenação ao exílio não funcionou. A revolução dos bichos, recusada por diversos editores britânicos e americanos que se curvavam aos interditos da esquerda oficial, converteu-se numa das obras definidoras do século 20. É uma obra especial, capaz de encantar uma criança de 11 anos que nunca ouvira falar da Revolução Russa, de Stalin, dos Processos de Moscou, da Guerra Civil Espanhola e de toda essa pilha de cadáveres insepultos nos campos de guerra das utopias ideológicas.
É tudo ou nada
Tendo passado a ser inaplicável porque, de uma maneira ou de outra, todo mundo está “fora” dela, a lei converte-se de instrumento de garantia da paz em arma de guerra.
Relatórios trocados entre as instâncias do Judiciário a que estão afetos os brasileiros “especiais” dão conta de que há pelo menos 52 políticos com mandato investigados no “petrolão”, isso sem contar a presidente da Republica que presidiu o Conselho de Administração da Petrobras ao longo de todo o período em que ela foi saqueada e o seu antecessor.
Aqui no mundo dos mortais, a Operação Lava-Jato já vai pela 18a rodada, com nomes até então tidos como poderosos sendo impiedosamente “arrastados pela Medina”. Dois anos de pressões surdas do populacho, da imprensa, da Polícia Federal e dos “lobos solitários” do Poder Judiciário não foram suficientes, porém, para que a incolumidade dos integrantes da lista dos “de cima” fosse nem de leve arranhada enquanto todos se mantiveram em silêncio sobre o que sabem uns sobre os outros.
Mas bastaram uns poucos gestos de desafio ao governo e à hegemonia da velha guarda da banda mais podre do Congresso que lhe dá sustentação para que, em menos de duas semanas, o rebelde passasse, de “nunca mencionado” a diretamente denunciado por um delator e a réu formalmente acusado pela promotoria por corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e o mais que é habitual no pacote.
Não existe, é verdade, qualquer indício por leve que seja, de que ele esteja menos incurso nesses crimes que todos os demais membros da lista dos 52 e tantos outros que nem chegaram a entrar nela. Mas ainda assim é impossível negar, pela sequência dos acontecimentos, que esta nunca tenha sido a razão para ele abrir solitariamente a fila dos “arrastados pela Medina” da turma “de cima”.
É esta a síntese do paradoxo brasileiro: quando o Brasil honesto cogita festejar uma “vitória da justiça” o outro comemora mais uma vitória do crime … e os dois estão certos. É o vácuo institucional absoluto.
Dois artigos publicados nesta página na semana passada compõem o pano de fundo. Em “Corrupção como forma de poder”, Jose Arthur Giannotti retraçava o reto alinhamento do PT com a tradição leninista de conquista do poder desde o assassinato de Celso Daniel até este ponto, conquista esta que se dá, na releitura do lulismo, pelo recurso sistemático à arma da corrupção (mas não só a ela). E isto para concluir que a situação chegou a tal ponto que a ação dos “lobos solitários” que animam a Operação Lava-Jato e seus apoiadores ganhou os contornos de “um movimento político” que congrega todos quantos, dentro ou fora do âmbito do estado, por terem profissões ou modos de vida dependentes da existência de instituições democráticas, sentem que elas desaparecerão para sempre se o PT conseguir levar a cabo o seu projeto.
O que o professor esqueceu de mencionar com a devida ênfase é que a mesmíssima asserção é verdadeira para o lado contrário: a vitória final da corrupção é um imperativo de sobrevivência para os mestres de um estilo de “fazer política” e uma vasta pletora de modos de viver e “vencer na vida” aqui fora que desaparecerão para sempre ou mofarão na cadeia se caminharmos em direção ao Império da Lei sem mais exceções ou adjetivos. E não há que subestimá-los porque são estes — os de dentro e os de fora do universo estatal — que estão no poder.
Não é, portanto, apenas a ameaça de enfrentar a tiros a massa dos brasileiros indignados feita pelo presidente da CUT de dentro do Palácio de Dilma Rousseff que confirma a radicalidade dessa aposta sem volta. A sequência de acontecimentos que leva até esta primeira “vitória da lei” contra um integrante da lista dos “de cima”, que não pode ser explicada senão com a mistura e a alternância nos papeis de “mocinho” e “bandido” de personagens até então tidos como “acima de qualquer suspeita”, indica que gente muito mais poderosa que esta que vocifera nas ruas vestida de vermelho sabe que está jogando tudo nesta parada.
A mesma manobra que faz justiça a Eduardo Cunha põe fora do alcance dela o famigerado Renan Calheiros, o único brasileiro com certificação de corrupto passada por uma das quatro grandes agências internacionais de auditoria. A sequência de reuniões secretas no Porto entre réus e juízes do “petrolão”; a recondução por uma presidente ameaçada de impeachment do titular do posto máximo da promomotoria pública; a súbita recuperação de memória de um delator; o “leite-de-pato” do TCU nas “pedaladas” presidenciais; a elevação de Renan Calheiros, que já tinha sido salvo uma vez em troca da desmontagem da Lei de Responsabilidade Fiscal, à função de porteiro do impeachment, agora também pelo STF; o engavetamento da impugnação das contas de campanha do PT pelo TSE; a nomeação para o STJ do apadrinhado do senador que relatará os processos do núcleo político do “petrolão” não é uma mera série estatisticamente trilionária de coincidências, é o “mapa” das forças inimigas.
Não tem mais volta. Escolha o seu lado. Reduzido às proporções que o Brasil pôde medir pelas “manifestações” de 5a feira passada e rolando nos escombros de uma crise que facilita a conflagração do país, o PT dobra a aposta na corrupção e no assalto final às defesas democráticas da nação. Agora é tudo ou nada.
Fernando Lara Mesquita
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