terça-feira, 19 de dezembro de 2017

Educação versus corrupção

Faz sucesso há mais de dez anos o texto da capixaba Elisa Lucinda que foi recitado pela cantora Ana Carolina durante um show. O título é curioso: “Só de sacanagem”. Na penúltima estrofe a poetisa escreveu: “Com o tempo, a gente consegue ser livre, ético e o escambau. Dirão: É inútil, todo o mundo aqui é corrupto, desde o primeiro homem que veio de Portugal. Eu direi, não admito, a minha esperança é imortal! Eu repito, ouviram? É imortal!”.

De fato, diante de tudo o que temos visto, haja esperança! A corrupção é o principal motivo de angústia para 62% dos brasileiros, à frente de itens como saúde, segurança, desemprego e pobreza. Curiosamente, a educação pública ocupa somente o sétimo lugar nessa lista de preocupações. A educação incomoda apenas um dentre quatro brasileiros. Esses dados da FGV são interessantes, pois mostram que os brasileiros não associam diretamente a educação precária aos demais problemas que enfrentamos no dia a dia, inclusive a corrupção. E os fatos estão juntos e misturados.

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Conforme os resultados divulgados em 2017 da Avaliação Nacional de Alfabetização (ANA), focada nos alunos do 3º ano do ensino fundamental, somente 45,3% das crianças entre 8 e 9 anos de idade estão alfabetizadas. Os testes foram aplicados em 2016 e envolveram 2,1 milhões de estudantes em 48 mil escolas. Em Matemática, a metade dos alunos não conseguiu acertar a soma de 112 + 93, tendo como opções de respostas a) 105; b) 115; c) 205 e d) 21.

Quando o nível de aprendizado brasileiro é confrontado com o de outros países, a diferença é alarmante. No último Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, cuja sigla é Pisa, coordenado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), os alunos brasileiros (entre 15/16 anos de idade) revelaram elevado grau de insuficiência. Em Ciências, 57% ficaram abaixo do limite considerado como satisfatório. Em Leitura (51%) e Matemática (70%), a maioria dos estudantes também não atingiu o padrão básico mínimo.

A correlação existente entre os países com melhores resultados na educação e os países menos corruptos é alta. A ilha de Cingapura, a melhor colocada no Pisa/2015, é a sétima melhor colocada no Índice de Percepção da Corrupção (IPC), divulgado em 2016 pela ONG Transparência Internacional. Os três países com as maiores notas no IPC, ou seja, os menos corruptos (Dinamarca, Nova Zelândia e Finlândia) estão entre os 14 melhores no Pisa. O Brasil está ruim em ambos indicadores. Foi o 79º no IPC e o 62º na média das notas do Pisa (Matemática, Ciências e Leitura).

A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) estima que a corrupção brasileira anual situa-se entre 1,4% e 2,3% do PIB. Em valores atualizados, o montante pode chegar a R$ 150 bilhões por ano, o suficiente, por exemplo, para a construção de 42 mil escolas ou 79 mil creches.

O combate à corrupção no Brasil tem que passar pela punição exemplar dos corruptos e, necessariamente, pelo aprimoramento da Educação, em todos os seus níveis, como prevenção primária. O aprofundamento das desigualdades sociais, o aumento da violência, a precariedade da saúde, a baixa produtividade e o crescimento pífio da economia também são consequências da má educação que condena a nação ao atraso.

Mas há luzes além das salas de aulas. O Estado de Pernambuco possui os melhores resultados do país no ensino médio (Goiás é o segundo colocado), etapa em que o Brasil é mal classificado internacionalmente. No Ceará, 18% do ICMS são destinados à educação e distribuídos aos 184 municípios conforme a eficiência das prefeituras na questão escolar. Os professores são premiados com o 14º salário, se atingirem metas. Há cooperação entre o estado e os municípios para formação de professores e apoio pedagógico. O nível de aprendizado dos alunos é sistematicamente acompanhado, as famílias são integradas às escolas, e a gestão escolar possui critérios técnicos, sem descontinuidade por politicagem. A percentagem de crianças analfabetas caiu de 32% para 0,7% em menos de dez anos. Não por acaso, de acordo com o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), 77 escolas cearenses estão entre as cem melhores do país. São exemplos que precisam ser difundidos, compartilhados e ampliados para que tenham escala nacional.

Voltando ao texto da Elisa Lucinda sobre a corrupção e a sua esperança em ver esse cenário ser alterado, penso na educação e leio o último verso: “Sei que não dá para mudar o começo, mas se a gente quiser, vai dar para mudar o final”. Educação já!

2018 começará mais realista

No início de 2017, economistas e agentes de mercado transpiravam, digamos assim, ''otimismo'' com as perspectivas que tinham do país. Após o impeachment, o presidente Temer, supostamente, assumira o controle da situação econômica e política que degringolara sob Dilma Rousseff; dizia-se que retirara o Brasil de uma curva acedente, cuja perspectiva era de caos.

Lembro-me de ter participado de um debate, no Rio de Janeiro, no início do ano: eu, sinceramente, não compartilhava de tanta fé; reconhecia a desgraça forjada pelos equívocos de Dilma, mas alertava que um impeachment não é algo corriqueiro, deixa marcas; que o governo tinha problemas. Que, além disso, o sistema político colapsara; precisaria de muita liderança para colocá-lo em OUTRO e necessário eixo. Não enxergava isto naquele contexto.

Naturalmente, tomei uma bela espinafrada de um dos laureados economistas presentes na plateia. Ele irritara-se com meu '''pessimismo' em relação ao governo que mais reformas fez na história do Brasil'', dizia. Acreditava que, com Michel Temer, o país superara o precipício e as reformas que, então, viriam por gravidade; o sistema político, aliás, estaria constrangido a faze-las.

Em resposta, apenas argumentei que ''otimismo'' e ''pessimismo'' não são categorias de análise. A questão mais importante seria verificar se minhas premissas estavam corretas ou não. Uma vez incorretas, antes de ''pessimista'', eu estaria errado. E ponto. Mas, entendo o raciocínio que sustentava a irritação.

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Com efeito, Dilma Rousseff trocara os pés pelas mãos: na apertada vitória eleitoral que tivera, não reconhecera a derrota política e o teor das críticas econômicas que sofrera. Em seus discursos de vitória e de pose, sequer mencionou os adversários; um erro crasso.

Do alto de um orgulho pueril, a presidente reeleita centralizava decisões, não unificava o país dividido, nem sinalizava para necessárias alterações de rota impostas pelas crises — política e econômica — que lhe batiam à porta. Externava a convicção típica daqueles que ignoram a realidade.

Dilma convocou Joaquim Levy para o ministério da Fazenda por acreditar-se capaz de operar na ambiguidade, habilidade dos políticos muito experientes: a cada espaço admitido a Levy, permitia que seus antagonistas internos o desautorizassem para além do próprio governo.

Imaginou que seria invulnerável, que as urnas bastariam para pairar sobre contradições inconciliáveis. E ensina a história que as urnas nunca bastam…

No campo da política parlamentar, permitiu-se lutar contra Eduardo Cunha em pleno mar aberto, sem perceber que sua suposta esquadra — a base que julgava possuir — bandeara-se para armada do inimigo. Rapidamente, foi envolvida pela agenda negativa que permitiu crescer em seu quintal. Deu no que deu — para Dilma e para Cunha.

Filho da lógica do baixo clero, Michel Temer se notabilizou por compreender a linguagem daquilo a que o Parlamento, ao longo dos anos, se tornou. Melhor que Dilma, sabia sua força e seus limites. Rapidamente aglutinou maioria a seu favor. Distribuiu o espólio de recursos deixado pelo PT, expulso do governo; alegrou antigos e novos aliados. Mais uma vez, apostou no ''é dando que se recebe''.

Ao mesmo tempo, reuniu um corpo econômico qualificado, apresentou e provou medidas de impacto, cujo maior símbolo foi o teto dos gatos públicos. Fechou 2016 em euforia e, precocemente, exibiu o sorriso dos triunfantes. Foi neste ponto que começou 2017.

Escrevi exaustivamente neste mesmo espaço as razões que me levavam a não compartilhar do ''otimismo'' do início deste ano. Na verdade, confiei nas premissas de que partia. Muitos colegas não enxergaram a realidade do mesmo modo. Estão no seu direito.

Mas, nenhuma das minhas premissas parte de razões de ordem pessoal: trato o governo — e qualquer governo — como ''coisa'', um objeto a analisar. Olho para o cardápio e verifico ''o que se tem para hoje''. Há muito tempo, deixei de comer nesse tipo de restaurante. Só isso.

Se não posso afirmar que o presidente e seu governo que me agradam, tampouco poderia dizer que seus antecessores me retiravam suspiros. Pelo contrário. Basta ler o que produzi ao longo dos anos. Sou uma espécie de açougueiro que enjoou de carne. Verificando as fibras do sistema, percebe-se a deterioração; mais cedo ou mais tarde, trará problemas a quem o consome.

O fato é que o governo Temer, cuja equipe econômica logrou, sim, alguns avanços no ano passado e ao longo deste, não apenas se recusou a alterar a lógica fisiológica do atual parlamento, como a aprofundou. Raspava do tacho restos do que já se esgotara.

E não o fez apenas por necessidade, mas também por adesão incondicional — como um padrão mental, mesmo — ao funcionamento do sistema; atavismo, típico dos que acreditam que algo deva ser de determinado modo apenas porque sempre foi assim.

Mas, estava claro que o sistema cobraria taxas crescentes de fisiologismo para entregar o que o governo lhe pedia. E, como se sabe, o que o governo lhe pediu foi cada vez mais dramático; elevando os riscos, aumentava os ''prêmios''. Não importa se a banca pode ou não quebrar.

Mas, enfim, os ''otimistas'' do início de 2017, acreditavam que o modus operandi que se observava e ainda se observa seria absolutamente normal: ''desde que o mundo, é mundo a política é assim''; tudo seria, portanto muito natural; o sistema viria por gravidade.

Pode até ser que, a preços sempre crescentes, o governo em 2018, consiga aprovar a necessária reforma na Previdência. Nada é impossível em política e o jogo está longe de acabar; a chama queima até a última tonelada de carvão fóssil. Mas, ao mesmo tempo, nada é muito simples. E assim, o ''otimista'' de 2017 termina melancólico, porém muito mais realista.

Carlos Melo 

Gente fora do mapa

Supremo antecipa o Natal dos políticos encrencados

Diga-se em favor do ministro Gilmar Mendes que foi pesado seu expediente de ontem no Supremo Tribunal Federal (STF).

Primeiro, ele ajudou a arquivar denúncias de corrupção contra quatro parlamentares oferecidas pela Procuradoria Geral da República. Uma delas, por sinal, aceita pelo ex-ministro Teori Zavaski.

Segundo, em decisão monocrática, Gilmar suspendeu o inquérito aberto contra o governador Beto Richa (PSDB), do Paraná, suspeito de corrupção.

Terceiro, mandou soltar a advogada Adriana Ancelmo, mulher do ex-governador Sérgio Cabral, também acusada de corrupção.

Há milhares de mulheres presas nas mesmas condições de Adriana que poderiam estar em casa cuidando dos filhos enquanto a Justiça não decide a sua sorte.

Mas elas não dispõem de bons advogados. Na maioria das vezes, de advogado nenhum. Nem pertencem à mesma classe social de Adriana.

O dia nacional da impunidade foi ontem, caso se queira uma data para celebrar um dos piores costumes nacionais.

Contra os quatro parlamentares, havia fortes indícios de que prevaricaram. Havia documentos. E havia até um vídeo. Mesmo assim puderam festejar o Natal antes do tempo.

Por dois votos (Gilmar e o ministro Dias Toffoli) contra um (ministro Edson Fachin), ausentes Ricardo Lewandowisk e Celso de Mello, 2ª Turma do STF desprezou tudo o que a Polícia Federal havia apurado.

Não se julgava se o bando dos quatro deveria ser absolvido ou condenado, mas se cabia autorizar a abertura de processos. Gilmar e Toffoli entenderam que as denúncias se basearam apenas na palavra de delatores. Ao lixo com elas, pois.

O combate contra a corrupção sofreu mais um golpe. E certamente não será o último. O Brasil velho de guerra estrebucha na maca e ameaça levantar-se.

Soneto de Natal

Um homem – era aquela noite amiga,
Noite cristã, berço do Nazareno –
Ao relembrar os dias de pequeno,
E a viva dança, e a lépida cantiga,

Quis transportar ao verso doce e ameno
As sensações de sua idade antiga
Naquela mesma velha noite amiga
Noite cristã, berço do Nazareno.

Escolheu o soneto… A folha branca
Pede-lhe a inspiração; mas frouxa e manca,
A pena não acode ao gesto seu.

E em vão lutando contra o metro adverso,
Só lhe saiu este pequeno verso:
“Mudaria o Natal ou mudei eu?”
Machado de Assis

País da desesperança

Os dados da Síntese de Indicadores Sociais 2017, divulgados ontem pelo IBGE, deveriam servir de ponto de partida para todos os que vão disputar a sucessão presidencial no ano que vem. De acordo com o estudo, um quarto da população, ou 52,2 milhões de brasileiros, estava abaixo da linha da pobreza em 2016, conforme parâmetros estabelecidos pelo Banco Mundial no mês passado. Um contingente que corresponde a cinco vezes e pouco a população de Portugal ou a da Grécia, perto de nove vezes a da Dinamarca, ou tanta gente quanto tem a África do Sul.

Desses 52,2 milhões que viviam com renda domiciliar per capita diária inferior a US$ 5,50 (R$ 387,07 por mês), quase 18 milhões eram crianças de zero a 14 anos.

Ainda conforme os dados do IBGE, 43,1% dos habitantes do Norte e 43,5% dos moradores do Nordeste vivem com renda igual ou inferior a essa, contra 25,4% da média nacional.


Torna-se, portanto, possível buscar a explicação política da grande aceitação da candidatura de Lula nas Regiões Norte e Nordeste. O ex-presidente conseguiu carimbar em si a marca de um administrador que melhorou a renda das famílias. E não há nenhum segredo para isso. Se a renda é baixa, quaisquer acréscimos, como os obtidos com o Bolsa Família, são vistos como algo miraculoso. Embora o embrião do programa tenha sido criado no governo de Fernando Henrique Cardoso, pela Lei 10.219, de 11 de abril de 2001, no imaginário da população a autoria foi de Lula, um expert em vencer a guerra da comunicação. Não houve Operação Lava Jato que mudasse isso.

Quando Lula volta às ruas e diz que fará um governo muito melhor do que os anteriores, com muito mais distribuição de renda, ele encarna a figura de um Messias que se propõe a salvá-las da miséria absoluta. É um discurso pra lá de demagógico, mas funciona porque no momento não existe nenhum melhor.

O estudo do IBGE também fornece pistas para o surgimento do fenômeno Jair Bolsonaro, que em todas as pesquisas sobre as intenções de votos para a eleição presidencial aparece sempre consolidado em segundo lugar, atrás de Lula. E, por estranho que possa parecer, os governos petistas têm responsabilidade nisso.

Porque foram os governos de Lula e de Dilma Rousseff que cooptaram os movimentos sociais e sindicais, como o MST, a CUT, a UNE e outros. Com isso, os movimentos deixaram as ruas e foram fazer a luta política nos gabinetes. O lugar deles nas periferias e no ativismo social e político, como bem reconheceu Guilherme Boulos, líder do Movimento dos Sem Teto (MTST), no jornal Valor Econômico de ontem, passou a ser ocupado pelas igrejas pentecostais. Jair Bolsonaro tem forte presença nesse meio.

Um outro fator também aproxima Bolsonaro das periferias, principalmente entre os jovens. A violência que aterroriza a classe média, e a faz se fechar atrás de muros e sistemas de vigilância, horroriza as comunidades pobres, pois as fazem ter em seu dia a dia o contato trágico com as organizações criminosas. Inúmeras famílias são obrigadas a pagar mensalidades aos bandidos para que seus parentes não sejam violentados sexualmente ou mortos nas cadeias.

Diante desse quadro, torna-se impensável alguém querer vencer uma eleição sem abordar, em primeiro lugar, a questão da pobreza. Não com paliativos demagógicos, mas com a busca de programas de geração de empregos, educação, saúde, transportes e segurança que façam essa parcela da população brasileira passar a se sentir cidadã.

Um país que tem um quarto de sua população jogada na desesperança não tem como ter esperanças de melhorias no futuro, por mais bem intencionados que sejam os seus dirigentes.

Sintomas de psicose

O ex-presidente Lula vai acabando mal este 2017, o ano em que foi condenado a nove anos e meio de cadeia por corrupção e, com isso, sofreu o pior desastre de toda a sua carreira política. A imagem que deixa aos olhos de todos é a de um rosto irado, chamando o Brasil para a briga a cada vez que abre a boca, numa gritaria permanente contra as leis do país, insultos ao sistema de justiça que o deixou nu e ameaças de se vingar de todos os inimigos imaginários que cria, o tempo todo, para explicar a si mesmo por que despencou de tão alto para tão baixo. Nunca lhe passa ela cabeça que o seu principal inimigo foi ele mesmo, e que seu engano fatal foi deixar-se cegar pela soberba – tomou, sozinho, todas as decisões políticas que arrasaram a sua vida e decidiu, também sozinho, que era um ser divino incapaz de errar.

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Lula chegou, agora, a essa caricatura que todo mundo está podendo ver: uma espécie de Mussolini meia-boca, que deixaram solto depois que caiu do governo, tentando chamar de volta as multidões para transformá-lo de novo num homem poderoso e dar-lhe a posição de condutor vitalício do povo brasileiro. Mas a sua demagogia está aguada, muito distante da flama manejada com tanta destreza pelo modelo original. É um Mussolini sem as promessas de um grande futuro e sem a massa lotando as praças. O que diz já foi dito, o que promete é incompreensível (se vai fazer, porque já não fez nos quase catorze anos em que mandou no país?), e a sua praça só tem as camisetas com o vermelho cansado do PT. Virou, pelo visto em suas últimas aparições, um beato que continua anunciando o fim do mundo, ficou repetitivo e está em mau estado de conservação.

Toda a aposta de Lula e seu partido, hoje, se resume numa coisa só: uma virada de mesa, feita pelos poderosos que tanto criticam e com os quais se entendem tão bem, que lhe forneça algum tipo de anistia e lhe permita esconder-se num “foro privilegiado” qualquer. A partir daí, é contar com os institutos de pesquisa e jogar na chance de que a ignorância, a inconsciência e a desinformação continuem influindo nas decisões da maioria do eleitorado. Aí vai valer tudo. As mentiras que Lula tem usado, e que já estão num nível próximo à alucinação, prometem deixar para trás, a cada dia que passar, qualquer volume já anotado na história política do Brasil. Talvez já nem possam mais ser descritas como mentiras. Lula, ultimamente, parece estar regredindo ao “padrão Dilma” de discurso público, no qual é inútil a tentativa de entender alguma coisa – o que se diz simplesmente não tem pé nem cabeça.

Lula passa de 2017 para 2018 como uma ruína. Ninguém entre os 100% de puxa-sacos que o cercam lhe diz isso, é claro. Ele próprio, por sua conta, obviamente nunca tentará se informar. Em situações assim, é comum os psiquiatras começarem a notar sintomas de psicose. Mas aí quem paga a conta, sempre, é a população em geral – que terá na costas, durante pelo menos mais um ano inteiro, um líder neurótico e seu partido fazendo tudo o que podem para prejudicar o país. É a única maneira que veem para sobreviver – e quem sabe, como diz o filósofo paulista Luís Felipe Pondé, criar um dia por aqui a sua “Ditadura dos Ofendidos”.

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Patagônia

Aqui não é o Brasil

Pode ser fake news, pois a notícia apareceu e cresceu nas mídias independentes. “Isto aqui não é o Brasil” foi um dos gritos de guerra dos argentinos que, na quinta-feira, 14, protestaram e impediram a votação da reforma da Previdência deles lá.

Fake ou não, a frase tem seu valor. Os hermanos estão lascados até mais tempo que nós, mas não são carneiros. Apanham mas dão forra. Só ver a quantidade de torturadores que botaram na cadeia – dos mais aos menos graduados. Gente desumana que, nos anos de chumbo de lá, “desapareceram” com 30 mil pessoas. A maioria ainda longe de fazer 30 anos. Jovens que, talvez, hoje fizessem diferente o cenário político lá e cá.

Lá e cá, as vidas dos assassinados não serão devolvidas, mas as histórias reveladas marcam para a História quem e como mandou e executou.

Lá, a tenacidade de gente como as Madres de la Plaza de Mayo devolve dignidade aos mortos não enterrados e resgata seus filhos roubados. Na Argentina o tempo não apagou a barbárie, ela tem sido nominada e não fica impune. Só por isso já poderiam gritar: Aqui não é o Brasil.

Pena que o Brasil de agora seja exemplo de mau exemplo, coisa a ser evitada, terra de muito vale tudo de gente que não vale nada. Quem sabe roubamos o mote e usamos a frase como nosso grito de basta: Isto que estamos vivendo não é o Brasil. É pesadelo real. Desgraceira armada neste ano do Galo que, segundo o horóscopo chinês, comanda 2017, o ano que partirá sem deixar saudades.

Há quem diga que 2018 pode ser pior.


Como é tempo de Natal, que implica renascimento, vamos mandar um vá-de-retro pras temeridades todas vividas e as ameaças pairantes sobre nossas exaustas cabeças. Bora festejar o fim do 17 e o recomeço prometido a cada novo ano.

2018 será melhor.

A partir de fevereiro, quando fecha o ano chinês, o cão vai substituir o mando do galo, ruinzinho que só. O ano do cão é definido como de grandes projetos. Por isso pode ser também de grandes decepções. Depende de como usaremos a energia canina.

Ano do cão não é ano de cão, mas tempo de reflexão. De decisões pensadas. Também de calor humano e de fraternidade. A tradição chinesa ensina que o ano do cão é dominado pelo elemento Terra – será movimentado e, principalmente, marcado pelo retorno aos valores humanistas. No individual e no coletivo, será ano para renascimento da cumplicidade e de solidariedade entre nós humanos. Ó só que notícia boa? Solidariedade anda peça rara. Valores humanistas padecem de desuso. Pois vai que muda o disco?

Podemos ser melhores em 2018. Energias sobre-humanas conspiram para devolver solidariedade e compaixão. Se o galo desuniu, o cão pode juntar. Um era da desavença, o outro será da compreensão e da parceria, É o prometido pela milenar sabedoria chinesa.

Se botar fé e antenar, não vai rolar decepção,

2018 terá Copa e eleição. Com é o ano do galo, pode haver bloqueios e obstáculos a vencer. Será preciso concentração e sabedoria para, primeiro eliminar o difícil e, então, ver claro o caminho a seguir. Podemos usar a receita para passar pelos dois.

Na Copa, pode acontecer um lava alma do 7 a 1 cravado na nossa garganta. Na eleição, vai que a gente ganha o direito de começar de novo, lavando tudo que rolou de ruim?

Poder pode. Tudo. Principalmente imitar os argentinos na tenacidade e na resistência. Isso que estamos vivendo não é o Brasil. É fake. O Brasil é melhor que isso. Muito melhor.

As dissidências podem acabar quando, solidários e reumanizados, enxergarmos o inimigo comum – o de 95% de desaprovação. No ano do cão, no voto, podemos mandar pra Transilvânia – de onde nunca deveriam ter saído – esses todos que, no ano do Galo, abusaram da nossa paciência. Eles passarão.

No fim de semana, um texto fake, atribuído ao Papa Francisco, bombardeou o WhatsApp. Lembrava que nada é perfeito – nem família, nem pais, nem filhos, nem amigos, nem nós mesmos. Relembrando nossas humanas imperfeiçoes, pregava o perdão, o zerar de mágoas e dos ressentimentos tóxicos. A proposta não era do Francisco, mas é boa. Suave na nave, vamos celebrar o Natal, que é tempo de paz e de fraternidade. Coisas que, no Brasil que não é o Brasil, temos esquecido de praticar. Bora lembrar?

A quem a inércia favorece?

Crise econômica, crise política, crise administrativa, ameaças de (maior) conturbação da ordem pública, incitamento à violência, à baderna e à desobediência civil: o país não sabe com que balanço encerrará este 2017 nem, tampouco, que ano será para nós o de 2018.

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Há quase quatro anos nossas perspectivas estão sendo moldadas ou são dependentes das ações das operações da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e de uma parcela do Judiciário que prende, investiga, julga e depois confirma, quase sempre nessa ordem. E têm feito bem tais grupos, até porque bilhões de dólares já retornaram à Petrobras, ao Tesouro Nacional, ou estão bloqueados no exterior à espera da ordem para retornar aos caixas de onde saíram criminosamente. Com quase uma centena de bandidos presos ou monitorados, num quadro de resultados mais positivos do que qualquer outro, está viva a esperança de que a corrupção estará doravante mais vigiada. E, portanto, menor e mais contida. Agora a sociedade tem olhos para os deslizes praticados nas grandes estatais, por grandes empreiteiras, nas grandes obras e, portanto, para os grandes roubos, aqueles que só cabem em contêineres de rodonas, movimentados em múltiplas viagens. Tem também para coisinhas, essas que andam em malas de rodinhas, partindo direto de frigoríficos e de pizzarias. Há mais medo, mais cuidado, sente-se, em receber ajudas para campanhas e para pagar advogados.

Mas falta muito para que o país deixe de funcionar somente a poder do dinheiro de quem paga para fazer as coisas acontecerem ou não. E para isso ainda há muita água para passar por baixo da ponte. Há muito processo parado nas prateleiras do Judiciário, um Poder sem compromisso com o tempo e, muitas vezes, desleixado em suas decisões, o que de alguma forma ajuda a consolidar a máxima de que, no Brasil, o crime compensa.

Apenas como exemplo, as questões que envolvem o viaduto Batalha dos Guararapes, que desabou na região da Pampulha na tarde de 3 de julho de 2014. Tem mais de três anos esse ocorrido, e até hoje nem sequer as perícias técnicas foram concluídas pela Polícia Civil. Duas pessoas morreram, outras ficaram mutiladas, toneladas de concreto e de aço e mão de obra desperdiçadas, e nada anda, nada acontece para que sejam responsabilizados, civil e criminalmente, aqueles que naquela obra atuaram com sua imperícia e desleixo na elaboração de projetos e propriamente em sua execução. Nesse mesmo desastrado trecho de obras, avenida Pedro I, circulou também a suspeita de que 38 km de cabos elétricos sumiram, e ninguém sabe, e ninguém viu, e ninguém foi atrás. Meu Deus! Onde estão os investigadores e peritos desses casos, onde está o Ministério Público para acelerar suas denúncias, onde está o Judiciário? Vão permitir que tudo isso prescreva e ninguém mais possa pagar por seus crimes?

Trabalhando para pagar

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O contribuinte é o único que trabalha para o governo sem ter que prestar concurso
Ronald Reagan

Povo rohingya: o êxodo perpétuo dos apátridas

As tendas de campanha no campo de refugiados de Kutupalong, no leste de Bangladesh, se transformaram na paisagem habitual daquela região. São habitadas majoritariamente por pessoas da etnia rohingya que fogem de Myanmar, seu país de origem. O êxodo começou há mais de cinco décadas. Uma perseguição religiosa – iniciada pela Junta Militar que governa a antiga Birmânia desde 1962 – provocou o corre-corre. E nada o conteve, nem sequer a abertura política birmanesa dos últimos tempos. Neste ano, o fluxo se multiplicou de forma dramática. Segundo a ONG Médicos sem Fronteiras (MSF), até 622.000 pessoas cruzaram a fronteira nos últimos quatro meses, e pelo menos 6.700 rohingyas morreram por causa da violência em agosto e setembro deste ano. Essas cifras alarmantes agravam uma crise social e alimentar que já existia há meia década, quando foi feita a foto que acompanham este artigo.

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De lá para cá, a paisagem não mudou, e as condições não melhoraram. A migração dos rohingyas nunca para. Esta comunidade muçulmana é apátrida. Sem terra nem direitos. Em Myanmar, que não os reconhece como cidadãos, eles são ameaçados, expulsos das suas casas e vítimas de estupros. Os integrantes da onda mais recente de refugiados apresentam ferimentos de bala, desnutrição e queimaduras. “As condições de vida nos assentamentos improvisados continuam sendo extremamente precárias e perigosas, o que coloca as pessoas em um risco ainda maior. Se a situação não melhorar, existe a possibilidade de uma emergência de saúde pública”, alerta o MSF.

O MSF já atendeu mais de 62.000 pacientes nos 15 postos de saúde construídos desde 25 de agosto. Todos estão distribuídos pela região de Cox’s Bazar, coração do turismo local. Aos seus 126.000 moradores (segundo um censo de 2007) somam-se mais de dois milhões da região, limite natural com Myanmar e principal zona de passagem para migrantes rohingyas. Um mapa fornecido pelas entidades humanitárias que trabalham em Bangladesh indica sete acampamentos: seis nesta província (cujo principal núcleo urbano é Chittagong, com 2,6 milhões de habitantes) e um na região de Daca, a capital bengalesa. Kutupalong está no primeiro grupo. Prevê-se que a população total desses assentamentos em breve superará um milhão. Em 2009, eram 50.000 pessoas. Um terço deles eram crianças, conforme recorda Javier Arcenillas, que registrou a comunidade rohingya na ocasião.

“Havia muito mais gente distribuída pelo país”, observa o fotógrafo. “Em Daca se falava do tráfico infantil para trabalhos sexuais, e outros se dedicavam a conduzir riquixás motorizados a ou trabalhos mais duros e menos remunerados. Havia como um sistema de castas.” A mesma impressão teve Olmo Calvo Rodríguez neste ano. O fotógrafo freelance foi a Bangladesh documentar a explosão migratória. Suas fotos dão calafrios: uma mulher jaz deprimida em meio a um campo ermo; uma família carrega um cadáver entre arrozais; centenas de mãos se elevam sob a chuva para conseguir água ou comida. Nas duas semanas de viagem, ele se comoveu com a enorme quantidade de gente por todos os lados. “Havia filas para tudo, e barracos eram construídos com canos, plásticos ou chapas – o que encontrassem no meio dos esgotos a céu aberto. Era um caos avassalador e completamente incontrolável”, relembra.

Calvo menciona também o leito do rio Naf, que delimita a fronteira entre Bangladesh e Myanmar. Milhares de rohingyas se amontoam diariamente às suas margens, esperando para cruzá-lo ou para ir a algum dos campos. Seus 62 quilômetros servem como uma separação natural entre estas duas nações do golfo de Bengala. A Junta Militar birmanesa e os líderes budistas do país acusam os rohingyas de serem oriundos dessa região, o que faria deles “imigrantes ilegais trazidos pelo Império britânico” e protagonistas de “uma invasão muçulmana”, como apontava, num artigo de 2013, Ashin Wirathu, principal monge de um templo de Mandalay, capital religiosa de Myanmar. Nem mesmo Aung San Suu Kyii, ganhadora do Nobel da Paz e hoje a principal autoridade do país, se pronunciou contra a limpeza étnica. E todos os ouvidos estavam atentos às palavras do papa Francisco quando ele visitou recentemente este país asiático; no final, o pontífice falou genericamente de respeito às minorias, mas só mencionou a palavra “rohingya” em uma reunião privada, e não no discurso oficial.

“Calcula-se que ainda restem 150.000 deles em Myanmar”, diz María Simón, coordenadora de emergências do MSF. A comunidade rohingya, em todo caso, não se concentra apenas em Myanmar, onde representam 6% dos 52 milhões de habitantes. Há também 200.000 deles residindo no Paquistão, outros 200.000 na Arábia Saudita, e 100.000 refugiados entre Malásia, Indonésia e Tailândia.

Simón, que voltou em setembro da região, narra os problemas no acolhimento e a desinformação. “A cada semana passam 7.000, e não se sabe o que vai acontecer”, afirma. “Os antigos refugiados e os novos estão misturados. Tenta-se que as famílias fiquem juntas porque é claro que vão permanecer neste país por meses”, lamenta, numa conversa por telefônica. As necessidades, argumenta, são de todo tipo: moradia, comida, água, saneamento, remédios. Felizmente, Bangladesh mantém uma política “de braços abertos” frente à opacidade birmanesa. “Contam histórias de povoados queimados, de massacres. Os depoimentos são muito fortes. Fogem desesperados da violência, mas com as condições daqui pode haver um surto de cólera ou de outra doença epidêmica”.