quarta-feira, 3 de maio de 2017

Gilmar, guerreiro, do povo brasileiro 
Frase nas redes sociais 

Um país em depressão

Depois de participar de quase uma centena de pesquisas qualitativas com grupos focais no Brasil nos últimos dois anos concluí que, se o nosso país se deitasse em um divã, o diagnóstico seria preciso: TDP ou transtorno depressivo persistente.

O TDP é o novo termo usado pela Associação Psiquiátrica Norte-Americana para aquilo que, no passado, se chamava distimia. É um transtorno do humor que consiste nos mesmos problemas cognitivos e físicos presentes na depressão clássica, com sintomas menos severos, porém mais duradouros.

Ele persiste por, pelo menos, dois anos e é caracterizado por baixa energia e motivação, baixa auto-estima e incapacidade de encontrar satisfação nos afazeres do dia-a-dia.

O brasileiro está fraco, mal-humorado, e não é de hoje.

Resultado de imagem para brasil em depressão  charge
São cinco os sentimentos predominantes que levam o brasileiro médio a essa patologia: o medo, o cansaço, a desconfiança (ou incerteza), a raiva e a culpa.

Temos medo do desemprego, da violência e até de ficarmos doentes por conta do caos na saúde pública.

Estamos cansados dos baixos salários, do elevado custo de vida, do noticiário monotemático e negativo, da polarização nas redes sociais e de passar horas e horas da nossa existência tentando nos transportar entre a nossa casa e o trabalho.

Não conseguimos mais projetar como ou onde estaremos no futuro e não acreditamos mais na isenção e imparcialidade dos veículos de comunicação, particularmente na imprensa tradicional. E uma novidade: essa desconfiança em relação à isenção e à imparcialidade já começa a se estender ao judiciário e a todo seu aparato.

Sentimos raiva dos políticos, da corrupção e da quebradeira dos governos que, a cada dia, vêm reduzindo ainda mais a qualidade dos serviços públicos.

Depois da raiva, vem a culpa. E a culpa surge do reconhecimento de que a crise que enfrentamos não é apenas política ou econômica. Ela é, sobretudo, uma crise de valores, uma crise moral que corrói toda a sociedade brasileira e que não está restrita a políticos ou empresários gananciosos e desonestos.

Esses sentimentos ou sintomas são causados por um hexágono de fatores interligados: a instabilidade político-institucional, a crise econômica, os governos quebrados, o noticiário político, a absurda concentração de renda do nosso país, e por último, a própria natureza, outrora mansa e otimista, do nosso povo.

Mas, esses fatores não existem por obra do acaso. São consequências de causas estruturais muito mais profundas que, há algumas décadas, condenaram o Brasil a não crescer, a não cumprir um destino civilizatório que poderia ser grandioso.

Em primeiro lugar, o acordo tácito do establishment brasileiro (sistema financeiro, indústria paulista e grandes monopólios e oligopólios privados) que faz com que, há quase 25 anos, sejamos simultaneamente o país com as maiores taxas de juros reais do mundo; o país mais protecionista do G-20; um dos países mais tolerantes com a formação e a perpetuação de monopólios e oligopólios na sua economia; o país com o sistema tributário mais complexo e um dos mais regressivos do planeta.

O sistema financeiro aceita o protecionismo comercial desde que as elevadas taxas de juros e a oligopolização do seu setor sejam mantidas.

A indústria paulista aceita as elevadas taxas de juros e ter monopólios e oligopólios como clientes (com grande poder de barganha) desde que ela permaneça protegida da competição internacional e que o mercado interno brasileiro continue seu cativo – em pleno século XXI, depois do salto econômico e social da Coreia do Sul e da China, há ainda quem argumente que as ideias de Raúl Prebisch e a política de substituição de importações sejam a chave para o nosso desenvolvimento.

Os grandes oligopólios e monopólios privados (para além do sistema financeiro) aceitam as elevadas taxas de juros e também comprar produtos caros e/ou de baixa qualidade de fornecedores nacionais desde que as autoridades que deveriam estimular a concorrência no país mantenham seus cartéis e monopólios intocáveis.

E os três grupos garantem a perpetuação do nosso sistema tributário complexo e regressivo que tem, como consequência natural, mais concentração de renda (somos o 10º país mais desigual do mundo – só estamos à frente de alguns países africanos e do Haiti) e o afastamento do investimento estrangeiro não-financeiro (elemento primordial do crescimento econômico asiático das últimas décadas).

Dentre as outras causas estruturais que levaram o brasileiro ao atual estado depressivo persistente há uma que vem sendo enfrentada (só não sabemos se com a imparcialidade devida...): a cultura da corrupção; e outras três que vêm sendo reformadas (também não sabemos se no momento ou da forma correta...): a legislação trabalhista, a previdência nacional e o sistema político-eleitoral brasileiro (personalista, fragmentado e sem partidos orgânicos).

Há ainda outros dois elementos estruturais que estão ausentes do debate nacional recente: o inchaço da máquina pública e a elevada carga tributária do país (em grande medida sustentada pela classe média assalariada); e a improdutividade do setor público que deriva, principalmente, da estabilidade no emprego e da ausência de meritocracia no serviço público do Brasil.

Ano que vem é ano de eleição presidencial e o brasileiro (um esperançoso incorrigível...) irá para as urnas, buscando um redentor. Alguém que seja capaz de lhe mostrar uma luz no fim do túnel e de lhe tirar do TDP.

Muito provavelmente, assim como em 2016, o eleitor médio brasileiro buscará essa redenção por meio de um outsider: um não-político ou uma figura reconhecidamente anti-establishment.

Nesse contexto, não há surpresa quando figuras como Lula, Bolsonaro, Marina Silva, João Doria, Ciro Gomes, e até Joaquim Barbosa e Sergio Moro surjam com mais chances de vitória que qualquer político tradicional que goze de boas e duradouras relações com o establishment do país.

A psiquiatria indica que pessoas com TDP também podem ter comportamento suicida. Esse fato tornará essa disputa eleitoral ainda mais intrigante. Ninguém terá o direito de se dizer surpreso com o resultado final das urnas.

Quem sobreviver verá.

Marcello Faulhaber

Qual é a pergunta?

Será que todo mundo tem uma pergunta? Uma “questão” — como se diz hoje em dia — transformando a curiosidade num disfarçado protesto?

Minha inspiração vem de um velho texto do antropólogo E. E. Evans-Pritchard, que, numa reflexão sobre o seu estudo clássico da bruxaria entre os azande, povo do então Sudão anglo-egípcio, lembra que “tanto na ciência, quanto na vida, só se acha o que procura”.

Usei essa fulgurante admoestação como epígrafe no meu livro “Relativizando”, no qual eu introduzia a antropologia que pratico com o temor e a entrega dos que têm na sua profissão uma razão para viver.

Todos temos perguntas-procuras e respostas-achados. Esquecidos de que o pensamento jamais é livre, pois depende de tempo e lugar: da língua e da cultura com as quais foi impingido. Quase sempre julgamos que perguntas e respostas são separadas quando, na verdade, elas se inter-relacionam. Uma implica na outra. De pouco vale perguntar — num mundo mau — se Deus é bom! É óbvio que as incertezas barrocas dos juízes do Supremo conduzem à certeza mais absoluta do Juízo Final. Este sim, livre de fórum privilegiado e, sobretudo, de prescrições.

A resposta dadas às grandes perguntas são suas imagens invertidas.


Charge O Tempo 03/05/2017

                          _____________

A maioria talvez nem chegue a saber que tem o direito (e, em certas circunstâncias, o dever) de indagar. Perguntar, diria um filósofo, e não um oráculo de segunda, como esse vosso cronista, é o embrião da liberdade. Escravos, altos funcionários públicos que recebem um absurdo do dinheiro da Previdência, lulopetistas corruptos, que compraram o Estado brasileiro e os modos de produção de emprego sem trabalho, jamais perguntam. Jamais duvidam. O autoquestionamento é a consciência — aquilo que nos faz humanos e, mais que isso, responsáveis. Essa palavra banida do vocabulário político brasileiro.

Todos passamos pela “idade das perguntas”. Por que os cães ladram, e nós falamos? Por que o Brasil é roubado pelos seus políticos — eleitos pelo povo? Quem se aposenta em menos tempo de trabalho entre nós?

____________

O que é um “pobre”?, como um dia me perguntou minha filha Maria Celeste, uma Celestinha que era um fiapo de gente e, morando desde os 3 anos de idade em Cambridge, Massachusetts, agora com 7 anos e visitando pela primeira vez a casa de seus avós maternos em Santo Antônio de Pádua, jamais tinha se confrontado com alguém pedindo comida.

— Papai — disse Celestinha chorando. — Uma mulher que se diz pobre ficou indignada porque eu perguntei a ela o que era “ser um pobre”. Ela me passou um sabão porque eu não sabia. Me xingou muito, papai...

— Os pobres são os explorados — respondi de pronto.

— Por quem? — replicou Celestinha, tirando o fôlego do sociólogo.

— Pelas classes ou camadas dominantes.

— Por gente como nós?

— Por nós, não! De jeito nenhum. Pelos capitalistas, empresários, industriais rentistas e comerciantes em geral. Nós somos professores, juízes, funcionários públicos...

__________

Quem é o pobre foi o que pesquisei num trabalho realizado nos anos 90 em São Paulo, no qual contei com a ajuda generosa de Cynthia Sarti e de Marcos Lanna. Nele, eu achei o que procurava. Vi que, sem definir o rico, seria impossível desenhar o pobre. As segmentações sociais são relativas, mas têm limites. A ausência de direitos e a legitimação da desigualdade extrema — com o escravismo negro como um dado do real até 1888; ao lado de uma enorme desvalorização do trabalho, compensada pelo empreguismo no governo como salvação para as camadas médias — engendraram um trabalhismo “antitrabalho”, mais controlador do que libertador. Ele levou à perda de direitos e, no limite, ao aniquilamento do país. Uma riqueza obtida clandestinamente pelo poder político e a ele associada permite que uma chamada “antiesquerda” tenha imobilizado o Brasil pela compra de partidos políticos, emendas parlamentares, estatais e bancos e dando emprego a um presidente da República!

É chocante ver o país espoliado por sua elite neoesquerdista e não, conforme esperávamos em minha geração, pelo imperialismo ianque! Esse imperialismo hoje em luta semelhante à nossa contra o obscurantismo e a boçalidade.

Finalmente, uma pergunta que não pode calar: qual é a alternativa para o rombo da Previdência e para a modernização das leis trabalhistas? Em política de verdade, não vale apenas ser do contra, ter uma bela cota de má-fé ou ser filho da CUT. É preciso apresentar alternativas. E se essa roubalheira tivesse ocorrido no governo de FHC? O que estamos vivendo seria revolução ou um mero golpe?

Roberto DaMatta

A insistência da boçalidade

Resultado de imagem para brasileiro não desiste

Poucas frases já me irritaram tanto como a tal “Sou brasileiro e não desisto nunca”. Fica parecendo que ser brasileiro é mesmo uma questão de insistência e persistência. Pra quê? Pra ter direito a se orgulhar da pororoca? Por que alguém lutaria tanto para demostrar ser brasileiro? Para “morrer de susto, de bala ou vício?
Reinaldo Azevedo

A 2ª Turma do STF é o caminho mais curto para a saída da cadeia

“Este é um caso complexo e triste da nossa própria história”, disse Gilmar Mendes, no início do voto que decidiria o pedido de habeas corpus de José Dirceu, preso desde 3 de agosto de 2015 e condenado por Sérgio Moro a 32 anos e um mês de prisão por corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa. Por alguns instantes, algum desavisado pode ter imaginado que o ministro do Supremo Tribunal Federal estava se referindo ao maior escândalo de corrupção já noticiado no país.

Errou, mostraria a continuação da fala que colocaria em liberdade o subchefe do mensalão e um dos protagonistas do petrolão: “Não podemos nos ater à aparente vilania dos envolvidos para decidir acerca da prisão processual. E isso remete à própria função da jurisdição em geral, da Suprema Corte em particular. A missão de um tribunal como o Supremo é aplicar a Constituição, ainda que contra a opinião majoritária”.

Ex-advogado do PT, Antônio Dias Toffoli também decidiu ajudar o antigo companheiro. “A prisão preventiva não pode ser utilizada como um instrumento antecipado de punição”, afirmou o ministro que, na semana passada, livrou da cadeia o pecuarista José Carlos Bumlai e o ex-assessor do PP João Cláudio Genu.

Terceiro voto a favor, Ricardo Lewandowski foi além: “O risco de reiteração é remotíssimo”, delirou. “Não se pode impor ao paciente que aguarde preso indefinidamente eventual condenação no segundo grau de jurisdição”.


A decisão por três votos a dois provou que o caminho mais curto entre uma cela e o portão de saída da cadeia começa e termina na sala em que delibera a 2ª Turma do STF. Na semana passada, esse atalho foi percorrido por Bumlai, o empresário vigarista que, no governo do amigo Lula, entrava sem pedir licença no Palácio do Planalto. Hoje, foi utilizado por José Dirceu.

O sonho de todo condenado em primeira instância é ser libertado antes que sejam descobertos os crimes que não confessou. É esse o caso de Bumlai e de Dirceu. Premiados com a devolução do direito de ir e vir, ambos se dedicarão em tempo integral a obstruir a Justiça e ocultar provas (ou destruí-las).

O fazendeiro espertalhão ainda mantém no baú dos pecados mortais um punhado de bandalheiras de altíssima voltagem. Sobre o assassinato do prefeito Celso Daniel, por exemplo, ele sabe muito mais do que a imprensa publicou.

O guerrilheiro de festim conhece bem o que Bumlai guarda em sigilo e muitíssimo mais. Ele foi o subchefe de Lula. É provável que só saiba menos que o comandante supremo da maior sequência de assaltos aos cofres públicos da história do Brasil.

Insegurança da população ameaça a democracia no Brasil

“Fui assaltado, mas pelo menos me deixaram vivo”. “Só peço que os bandidos não façam nada com meus filhos”. “No final tive sorte porque não me enfiaram a faca nem me deram um tiro”. “Já saio de casa preparada, pensando que posso ser assaltada”. Essas são algumas das frases que li nos jornais em crônicas de cidadãos assaltados na rua ou em suas casas. O que significam? Do ponto de visto humano, um mecanismo compreensível para suportar o medo da violência. Do ponto de vista político, representa a derrota de todos os Governos do Brasil, desde a chegada da democracia até hoje. Todos eles aparecem reprovados em matéria de segurança da população. Até quando uma democracia pode resistir a essa grave situação? Com uma polícia corrupta, sem preparo e mal remunerada, que é a que mais mata do mundo e a que mais morre, as pessoas se sentem inseguras na rua.

Resultado de imagem para insegurança  charge

A insegurança alcança a todos, em cidades grandes e pequenas, e cria uma sociedade que corre o risco de pisotear direitos humanos inalienáveis com episódios como o linchamento em praça pública de quem tenta roubar um celular. Nesse clima de fazer justiça com as próprias mãos, a polícia executa sem piedade à luz do dia e as balas perdidas matam crianças dentro das escolas ou nos braços de suas mães. Nem se trata mais de distinguir entre vítimas e carrascos. Acabamos nos transformando todos em carrascos quando aplaudimos a polícia que dispara contra pessoas desarmadas ou quando deixamos um policial ferido morrer na rua.

Na Espanha, durante a ditadura franquista, quando meus irmãos e eu encontrávamos uma patrulha policial na estrada, ficávamos com as pernas tremendo. Infundiam medo em vez de segurança. Ao contrário, na primeira vez que visitei Londres, vi que as pessoas se sentiam protegidas com a presença policial. Aterrissei no Brasil e voltei a recordar os duros tempos franquistas. Também nos brasileiros a presença da polícia infunde temor. Consideram-na corrupta e vendida ao tráfico de drogas. Para muitos, policial é sinônimo de bandido. Nas favelas, a polícia às vezes é mais temida que os traficantes.

A polícia, por sua vez, também se sente vítima e não carrasco. Para que prender vivos os bandidos se a justiça os coloca na rua no dia seguinte? É um mantra que se ouve com frequência. A reforma da polícia é talvez a tarefa mais difícil e sempre adiada por todos os Governos. O Brasil é um país perigoso e a carreira policial é amarga e sem prestígio. Em casa precisam lavar as fardas sem as expor para que nem os vizinhos saibam qual é sua profissão. Nos dias de folga, em que poderiam levar uma vida normal, é quando correm maior risco e quando mais morrem. A polícia tem fama de se corromper, de que é melhor não chamá-la quando se é agredido. “Não adianta nada”, dizem. Daí que às vezes a polícia caia na tentação de não andar com tantos escrúpulos e não se esforçar para prender os delinquentes preservando sua vida. Para quê?

A polícia brasileira, além de matar mais que qualquer outra do mundo, é também a menos preparada e a mais mal remunerada. Lembro-me de uma reportagem do jornal O Globo em que entrevistaram vários policiais que atuavam nas ruas do Rio. Queixavam-se de serem jogados na boca do lobo sem experiência e com armas que nem sabiam manejar, ou que eram obsoletas comparadas aos armamentos modernos usados pelos traficantes. “É difícil um policial brasileiro não se corromper quando ganha pouco mais que um pedreiro, não foi preparado para um trabalho de risco e tem sua vida e a de sua família sempre em perigo”, conta-me um militar aposentado.

Juntem todos esses ingredientes, acrescentem a raiva de uma sociedade que se sente abandonada em seu direito de ser defendida pelo Estado. Misturem com a impotência ou a incúria dos Governos federais e locais e terão a receita perfeita para o coquetel explosivo da falta de segurança. Vítimas ou carrascos? Ambas as coisas em partes iguais. Responsáveis? Quem teria o dever e os meios de pôr um ponto final nesse escândalo e nessa sangria que produz 60.000 homicídios a cada ano, mais mortes que em todas as guerras em curso. Mortes, na maioria, de jovens, negros e pobres. E os que conseguem viver, ao abandonar a escola são candidatos a perpetuar esse horror que envergonha uma sociedade e alguns governantes que vivem e viajam blindados e parecem resignados e anestesiados diante de todo esse horror que atinge as pessoas comuns.

Essa insatisfação com a falta de segurança, que corrói a confiança dos cidadãos no Estado, é o melhor caldo de cultivo para que um dia o país acorde com a democracia em coma, ou presidido por um apaixonado pela ideia de que todos vivamos armados como única solução contra a violência. Uma sociedade armada e blindada, abandonada à sua sorte pelo Estado que deveria protegê-la, é realmente democrática?

Gente fora do mapa

#Sombrinha...☆ Cada um protege como pode. Índia.:
Índia

A arte de enganar os eleitores

Tanto na campanha de Trump, nos Estados Unidos, quanto agora com Marie Le Pen, na França, uma promessa vai arrebanhando votos daqueles que, sem a correta informação, acreditam piamente no que ouvem. Também pudera: são eleitores que estão sofrendo com as mudanças tecnológicas e não percebem que a marcha do processo de intensificação de lucros não volta atrás. Refiro-me aos operários de setores antes muito prestigiados – como a indústria automobilística e seus componentes, aço e alumínio, entre outros.

Morei nos Estados Unidos no auge do poderio das montadoras, quando floresciam as condições salariais e o progresso parecia eterno. Hoje, quem vai às cidades do cinturão do aço, como Pittsburgh, Detroit e Cleveland, não vai acreditar que meus olhos viram o que escrevo. Tudo parecia uma festa. Agora, o desemprego e o desalento atingem a maior parte da população dessas cidades. Eleitores fiéis do Partido Democrata caíram nos braços de Trump com suas promessas de retomada daquelas indústrias com o fechamento das fronteiras do país. Lutando para ser vitoriosa no confronto do segundo turno, Le Pen faz o mesmo na França.

Doce ilusão. Os operários votam nesses vendedores de ilusões para caírem depois na desilusão, quando souberem que o tal fechamento de fronteiras será feito à custa da robotização do processo produtivo – e, portanto, sem os almejados empregos – e não haverá recuperação da pujança de antigamente.

Resultado de imagem para arte-de-enganar-os-eleitores charge

Escrevo isso porque estou acompanhando também as pesquisas sobre quem poderá vir a ser o presidente eleito no Brasil em 2018.

Ouso afirmar que não se atinge o fim que se quer se mirarmos o efeito, e não a causa, e se não compreendermos com inteireza que, para além da escolha ideológica, há condições que não se podem criar apenas pela vontade e que se circunscrevem à ação dos homens. Temo, pois, que – se afastada a hipótese de inelegibilidade de Lula – muitos apostem em sua eleição com a ideia de que voltarão a gozar do período em que foi possível elevar a renda de parte da população e levar todo mundo a crer que o país chegara ao Primeiro Mundo. Lembra-se, leitor, do Cristo Redentor na capa da revista “The Economist” subindo como um foguete? Ou da frase “Este é o cara”, com que Obama referiu-se a Lula num encontro de líderes mundiais?

O preço dessas benesses todas está agora visível nas concessões às empreiteiras e aos bancos. Seria isso repetível nas condições em que o Brasil se meteu? Poderá o governo sair distribuindo incentivos às empresas via BNDES e permitindo verdadeira farra do boi às JBSs que existem por aí e são apadrinhadas com recursos públicos? Ou terá a fonte secado de vez? Quem assegura que o próximo Congresso não será ainda pior do que o atual e que, supondo vontade política do governo futuro, aprovará suas medidas sem as usuais contrapartidas?

Espero com essas palavras estar contribuindo, minimamente, para esclarecer o divórcio entre eleitos e eleitores, de modo que 2018 não seja um mero repeteco do desastre dos dias atuais.

O fim do sonho americano: quando os filhos ganham menos que os pais

O sonho de todos os pais é que os filhos tenham uma vida melhor do que a deles. Essa ideia de superação é também a base fundamental do mito do sonho americano: se alguém o busca e trabalha duro, acabará triunfando. No entanto, os dados revelam agora que desde os anos sessenta do século passado é cada vez menor o número de trabalhadores dos Estados Unidos que acaba ganhando mais que seus pais. Os autores do estudo afirmam que somente uma redistribuição da riqueza poderia fazer reviver o american dream, sonho este que influencia outras nações, como o Brasil.

Os economistas chamam isso de "absolute income mobility" (algo como mobilidade absoluta por meio da renda) e se referem assim à proporção de filhos que acabam ganhando mais que os pais na mesma idade deles. É uma das formas mais confiáveis de medir a mobilidade social para cima e o quanto é real a igualdade de oportunidades. Embora faça parte da identidade e da crença da sociedade norte-americana, poucas vezes houve ocasião de medir quanto há de verdade e de mito nisso. É o que fez agora um grupo de sociólogos e economistas de três das universidades mais prestigiadas dos EUA: Harvard, Berkeley e Stanford.

Usando o censo da população dos EUA, suas atualizações anuais, dados da agência federal encarregada da arrecadação de impostos (IRS) e a renda antes dos impostos de 10 milhões de casais com pai (ou mãe, se houver ambos, o valor é dividido entre dois) e filho. O estudo, publicado na revista  Science, se inicia com os nascidos em 1940 e chega até os que nasceram em 1984. Compararam ano a ano a renda quando ambos tinham 30 anos e, para evitar um possível viés pela data de incorporação ao mercado de trabalho, voltaram a compará-los aos 40 anos.

"O que vemos é que por volta de 90% das crianças nascidas nos EUA em meados do século passado acabaram ganhando mais do que os pais, o que acreditamos seja um elemento importante do sonho americano”, diz o sociólogo da Universidade Harvard e coautor do estudo Robert Manduca. No entanto, este porcentual diminuiu a cerca de apenas 50% entre os nascidos mais recentemente”, acrescenta este pesquisador especializado em renda.

O que os dados dizem é que a grande maioria (exatamente 92%) dos nascidos em 1940 e que em 1970 tinham 30 anos ganhavam mais que seus pais nessa idade, ou seja, na época da Segunda Guerra Mundial, um período em que os salários não eram baixos. Esse porcentual mostra uma mobilidade absoluta via renda muito elevada. Apenas 8% tinham um salário igual ou pior que o dos pais. Mas a metade daqueles que agora estão com 30 anos e nasceram nos anos oitenta recebe menos que seus pais quando tinham a mesma idade. As comparações foram feitas neutralizando o efeito da inflação.

Tão chamativo como a distância que há entre um extremo (1940) e o outro (1984) é a tendência mostrada por essa pesquisa. Salvo alguns anos ocasionais e em meados dos anos setenta, o descenso tem sido contínuo desde 1940. Foi muito marcante até 1964, quando apenas 55% dos então nascidos superaram os pais quando chegaram aos 30 anos, coincidindo com uma das crises econômicas mais severas. Somente entre o final dos sessenta e até meados da década seguinte as cifras se recuperaram um pouco, superando 60%. Mas, salvo algum pico ocasional, não deixaram de cair desde esse período.


Resultado de imagem para detroit crack
Há muito mais desigualdade de renda do que havia em meados do século XX
Robert Manduca, sociólogo da Universidade de Harvard

O trabalho, que integra um projeto voltado para o estudo da igualdade de oportunidades nos EUA, também permite tirar conclusões da distribuição desses dados. Por um lado, por estratos sociais, os grupos de renda mais afetados foram os das classes médias. Quanto à geografia, o declínio de mobilidade absoluta via renda é maior nos Estados industriais (Michigan, Indiana, Ohio e Illinois), transformados agora em um celeiro de votos do populista Donald Trump. Os menos afetados, os Estados da costa oeste, os nortistas do leste e os Estados agrícolas das planícies, como Montana, as Dakotas, Nebraska...

"Houve duas grandes mudanças na economia nos últimos 40 anos que provavelmente influenciaram nesse declínio”, comenta Manduca. “Primeiro, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) foi mais lento do que vinha sendo, o que significa que o bolo da economia não cresce tão rápido como antes. Segundo, há muito mais desigualdade na renda do que havia em meados do século XX, o que significa que os ricos levam para casa uma parte muito maior da renda total do que antes”, explica.

Para confirmar seus argumentos, os pesquisadores simularam o que teria acontecido com os nascidos em 1980 em dois cenários: por um lado, em um entorno econômico dinâmico, com um crescimento do PIB anual de 2,5% desde então. De outro, uma simulação com o crescimento real do PIB (1,5% anualizado nas três últimas décadas), mas com o bolo distribuído como estava em 1940. Sua conclusão é que seria preciso haver um aumento do PIB de 6,4% ao ano para chegar a 80% de filhos que ganhassem mais que seus pais. Mas se a riqueza nacional fosse repartida na mesma proporção em que estava nos anos quarenta, mesmo com o ritmo de crescimento do PIB atual o número de filhos que ganhariam mais que os pais se aproximaria de 90%.

Por um fio

A era das manifestações sem povo e contra o povo vai chegando melancolicamente ao fim.

Só em Brasília, onde o “marajalato” ameaçado de desmame não tem contra quem impor-se à força, foram dispensadas as barricadas que, no resto do País, ilustraram com perfeição a nossa “luta de classes” pré-Queda do Muro: “contribuídos” x contribuintes, aposentados integrais x aposentados pela metade, barrantes x barrados, “sindicalistas” x trabalhadores. Foi uma desolação a tal “greve geral”. O dinheiro do imposto sindical ainda compra sindicalistas, mas, definitivamente, não compra mais a massa dos compulsoriamente “sindicalizados”.

É uma situação única na História essa nossa. A “jabuticaba” das “jabuticabas”. Um lado ainda tenta, mas já não cola. O outro lado só não cola porque não tenta.


Até o Congresso Nacional, que abriga os mais sensíveis narizes da raça às mais leves oscilações do vento, registrou oficialmente “a virada” nas votações da noite de 27/4. Falta ainda a confirmação por três votações do Senado e da Câmara neste país em que nem o passado é estável, é verdade, mas a “virada moral”, a rendição argumentativa, já foi votada e assinada. É um golpe de morte na essência da “privilegiatura” a queda do foro especial para 35 mil dos “pares da corte” pouco mais de um ano depois de ter sido o nosso “rei” oficialmente declarado submetido “a deus”, significando a prevalência dos fatos sobre as suas olímpicas “narrativas”, e “à lei” pela Operação Lava Jato e pelo STF. Isso e mais uma reforma trabalhista que avançou muito além do cosmético de sempre e, ainda, o “desdentamento” da Lei de Abuso de Autoridade literalmente imposto pela opinião pública à “cafajestocracia” que começa a ingressar no território do passado, definitivamente não são pouca coisa para um país indigente de comemorações como este andava.

A alegoria reacionária encenada no plenário pelos beneficiários diretos do “peleguismo” e do “trabalhismo” achacador afastados das tetas quase centenárias não deixou dúvida quanto à certeza deles próprios de estarem sendo empurrados para fora da História do Brasil. Foi a primeira brecha no dique do “amestramento” pelo Estado das instâncias básicas de representação da sociedade, que, começando com o “imposto sindical” de Getúlio Vargas, “petrificou-se” com o Fundo Partidário da Constituição de 88 e chegou ao paroxismo com o “financiamento público” de Organizações Não Governamentais Organizadas pelo Governo do “lulismo”, que fechou o País à “democracia representativa”, fez explodir a corrupção e pôs o trabalho em via de extinção em todo o território nacional.

Não existe força no mundo que possa constranger uma Câmara dos Deputados, um Senado da República e um Supremo Tribunal Federal com o retrospecto e o “pedigree” dos nossos a fazerem o que o povo realmente não quisesse que eles fizessem só porque assim lhes tivesse determinado um governo provisório desprovido de qualquer sombra de charme e sem a chancela das urnas, como nos querem fazer crer alguns dos mais notórios falsários do “horário gratuito”. Por mais que soneguem à massa as informações que realmente importam, o repúdio ao “marajalato” está posto. Só falta quem, no governo ou fora dele, nos três ou no quarto Poder, se disponha a “puxar a fila” indicando ao Brasil um caminho prático que lhe permita dar o chacoalhão que o País está louco para dar na árvore da qual pende essa fruta podre. O inimigo já reconhece na pessoa de Temer, aliás, a mão que quer arrancá-lo da teta. É a única glória do presidente interino e ele já está pagando o preço de tê-la. Mas o outro lado das barricadas não o enxerga como o instrumento da “virada”, muito mais que por seu passado, por este presente no qual ele hesita em se lhe oferecer como tal.

A “falha de comunicação” do governo está em dirigir-se à “2.ª classe”, que não recusa, ainda que não aplauda, as reformas que sabe necessárias, para repetir-lhe o que ela já está doloridíssima de saber: que se elas não forem feitas o futuro é o presente: viramos todos um imenso Rio de Janeiro. Como também não é absolutamente o caso de “explicar” à “privilegiatura” como ela está matando o Brasil – porque ela sabe exatamente o peso que tem neste desastre, conforme fica diariamente demonstrado pelo fato de seus próceres não perderem tempo argumentando suas “razões”, tratam somente de criar miragens para desviar a atenção dos fatos –, o que o governo tem de fazer é expor à minúcia o que eles tentam esconder, qual seja, a relação direta de causa e efeito entre esses privilégios e a miséria que custa sustentá-los.

Se exibir exaustivamente o gráfico e os personagens arquetípicos da “distribuição da renda” no universo da Previdência comparando a 1.ª com a 2.ª classe e, dentro da 1.ª classe, os “barnabés” com os “marajás”, o “sistema” já cai de podre. Mas se, junto com isso, mostrar, com os respectivos custos, os jatinhos e os carros de luxo ao lado dos trens de subúrbio; as mordomias ao lado dos barracos; as escolas na Inglaterra pagas aos filhos dos “marajás” pelos pais das escolas das balas perdidas; os “auxílios” mil isentos com o imposto sem correção sobre os salários quase mínimos; os planos de saúde eternos ao lado dos “hospitais” do horror; se expuser tudo isso ao lado das falcatruas em série do tipo “bolsa pesca” em Brasília; os milhões de Benefícios de Progressão Continuada pagos a gente na flor da idade dispensada de exame médico; os 9 milhões de aposentadorias do setor rural quando só há 6 milhões de pessoas em idade de se aposentar no campo, segundo o censo nacional; se o “dream team” mostrar, enfim, na ponta do lápis, que diferença tudo isso faria descontado do sacrifício extra que está pedindo aos aposentados de R$ 1.600, aí, sim, a “pelegada” toda ia ficar sabendo o que é uma MANIFESTAÇÃO DE MASSA e não demorava nem cinco minutos para que uma verdadeira reforma do Brasil, com a da Previdência dentro, fosse aprovada por unanimidade no Congresso Nacional.

Paisagem brasileira

❝ Enquanto o orgulho prefere "ter" para ser notado,  a humildade prefere "ser" para ser feliz... ❞ (Elvis Kubo):

Há no país 211 mil sub-Dirceus, presos provisórios esquecidos em calabouços

Sergio Moro costuma dizer que as críticas às prisões preventivas da Lava Jato revelam a existência no Brasil de uma “sociedade de castas”, marcada pela ausência de “igualdade republicana”. Ao colocar José Dirceu em Liberdade, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal potencializou a avaliação do juiz da Lava Jato. Destrancou-se a cela sob o argumento de a prisão de Dirceu representa um constrangimento ilegal. Alegou-se que, embora condenado um par de vezes por Moro, as sentenças contra o marquês do PT ainda não foram confirmadas por um tribunal de segunda instância. Por esses critérios, o Judiciário precisa libertar outros 221 mil brasileiros. São sub-Dirceus, presos provisórios que, segundo o Conselho Nacional de Justiça, mofam na cadeia à espera de julgamento.

Charge do dia 03/05/2017


Apenas dois detalhes diferenciam Dirceu dos sub-Dirceus. O ex-chefe da Casa Civil de Lula já coleciona duas sentenças. Juntas, somam 32 anos e um mês de prisão. Dispõe da melhor defesa que o prestígio e o dinheiro podem bancar. Os outros 221 mil presos provisórios ainda não passaram pelo crivo de nenhum juiz —nem de primeira nem de segunda instância. Permanecem atrás das grades sem sentença porque são pobres e não dispõem de advogados competentes para lembrar ao Judiciário que seus processos mofam nos escaninhos. Em janeiro, a ministra Cármen Lúcia, presidente da Suprema Corte, defendeu um “choque de jurisdição” para interromper o constrangimento ilegal a que estão sendo submetidos os presos da casta esquecida.

Dirceu ganhou a liberdade por um placar de 3 a 2. Um dos que votaram pela abertura da cela foi Dias Toffoli. Indicado para o Supremo por Lula, o ministro foi subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil na época em que a pasta era comandada por Dirceu. Entretando, guiando-se por autocritérios, Toffoli não se considera impedido de participar de julgamentos envolvendo o ex-chefe. Mandou soltá-lo por acreditar que são pequenas as chances de Dirceu voltar a praticar crimes. Realçou, de resto, que a prisão preventiva é ''uma antecipação da pena''.

Toffoli deu de ombros para o relator da Lava Jato, ministro Edson Fachin, que ecoara minutos antes palavras de Sergio Moro: “Entendo que a manutenção da prisão preventiva do paciente [Dirceu] encontra-se plenamente justificada pela lei e pela jurisprudência desta Corte, inclusive desta Segunda Turma. Rememoro que, para esta Segunda Turma, é justificada a prisão preventiva quando fundada na garantia da ordem pública, em face do risco concreto de reiteração delitiva…”

Chama-se Ricardo Lewandowski o ministro que proferiu o segundo voto a favor da soltura de Dirceu. Em agosto de 2007, quando a denúncia da Procuradoria sobre o escândalo do mensalão foi convertida pelo Supremo em ação penal, Lewandowski discordou do então relator Joaquim Barbosa quanto ao acolhimento da denúncia contra Dirceu e José Genoino por formação de quadrilha. Terminada a sessão, Lewandowski foi jantar com amigos num restaurante brasiliense chamado Expand Wine Store. Em dado momento, soou-lhe o celular. Era o irmão, Marcelo Lewandowski. O ministro levantou-se da mesa e foi para o jardim externo do restaurante.

A repórter Vera Magalhães, acomodada em mesa próxima, escutou Lewandowski declarar coisas assim: “A imprensa acuou o Supremo. […] Todo mundo votou com a faca no pescoço.” Ou assim: “A tendência era amaciar para o Dirceu”. O ministro deu a entender que, não fosse pela “faca no pescoço”, poderia ter divergido muito mais de Barbosa: “Não tenha dúvida. Eu estava tinindo nos cascos.”

Na Segunda Turma, Lewandowski tiniu a favor de Dirceu de forma aguda. Deu razão a Toffoli. Declarou que prisões como a de Dirceu, escoradas apenas em sentenças de primeira instância, são vedadas pela Constituição. “A prisão preventiva dilatada no tempo, por quase dois anos, afronta o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade”, acrescentou. Suprema ironia: na legião de sub-Dirceus, há presos encarcerados a 974 dias —são mais de dois anos e meio em cana sem uma mísera sentença condenatória. Pior: na grossa maioria dos casos, não há vestígio de uma toga que esteja tinindo nos cascos para reverter o flagelo.

Se os tubarões fossem homens

Bertold Brecht na voz de Antônio Abujamra

Déficit da Previdência só no setor público é de R$ 1,3 trilhão

Resultado de imagem para déficit público charg
O governo teme “ajustes” de última hora, na reforma da previdência, contra a necessidade de eliminar ou no reduzir drasticamente regalias e privilégios nas aposentadorias do serviço público. Afinal, em 15 anos, de 2001 a 2015, o déficit acumulado por 1 milhão de aposentadorias no setor público somou R$1,3 trilhão, valor três vezes maior que o rombo de R$450 bilhões das 29 milhões aposentadorias do setor privado. 

No Executivo, o valor médio da aposentadoria é R$9 mil, no Judiciário R$25 mil e R$28 mil no Poder Legislativo. No setor privado, R$1.600.

No Ministério Público, os inativos ganham acima dos R$30 mil. Em São Paulo, 97% os “fiscais da lei” do MP recebem acima do teto.

São gastos R$115 milhões com 1 milhão de aposentados do setor público, e R$500 milhões com 33 milhões de inativos no setor privado.

Aposentadoria do servidor público é o maior programa de transferência de renda dos pobres para ricos, no Brasil. E sem paralelo no mundo.

Rouba, mas esquece!

Ingênuo é quem pensar que a Operação Lava Jato já revelou tudo quanto havia (e há) de podre na política nacional e que nada o surpreenderá mais. O que aconteceu na semana passada mostra que a caixinha de Pandora ainda pode revelar coisas que antigamente se chamavam do arco da velha. Por exemplo: a confirmação pelo Partido Republicano da Ordem Social (PROS) do conteúdo da delação premiada de Alexandrino Alencar, ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht, dando conta de que a empreiteira comprou o tempo do horário eleitoral de cinco partidecos, entre os quais o dito-cujo.

É um caso de arrepiar os cabelos até de quem está por dentro das engrenagens podres da política no Brasil. O delator premiado contou que a empreiteira pagou pelo tempo no horário dito gratuito na programação da televisão e do rádio dos partidos PCdoB, PDT, PP, PRB e PROS. O primeiro, como é de conhecimento público, resulta de uma dissidência radical, antes seguindo a linha chinesa e agora, a albanesa (pois sim!), do Partido Comunista Brasileiro, o Partidão velho de guerra. O segundo foi fundado por Leonel Brizola para gerir a herança do “socialismo moreno” populista de Getúlio Vargas, depois que a ditadura militar entregou o PTB original a Ivete Vargas. O PP foi fundado e era antigamente controlado por Paulo Maluf, antigo ícone da corrupção na política profissional, mas que hoje se jacta de não ter sido citado na Operação Lava Jato. O PRB é o braço político da Igreja Universal do Reino de Deus, do bispo Edir Macedo.

Autorizado a funcionar em 2013, o PROS é o melhor exemplo do resultado da facilidade com que qualquer grupelho obtém autorização da Justiça Eleitoral para funcionar neste país do vai da valsa. Eurípedes Júnior era vereador de Planaltina de Goiás quando conseguiu as assinaturas necessárias para obter o registro dessa sua legenda, pela qual nem sequer conseguiu se eleger deputado federal em 2014. Sua plataforma era a amizade com Dilma e o programa de ação, servir de ponte entre Goiás e o Planalto.

Pelo tempo na campanha Alexandrino disse ter combinado com Eurípedes que a Odebrecht pagaria R$ 7 milhões. “Mas devia estar faltando aí, não sei exatamente, 500 mil reais aí, falou 500 mil reais vai o deputado vai na sua sala buscar isso aí”, contou o delator premiado. O encarregado de pegar com ele o troco que faltava foi o então deputado Salvador Zimbaldi Filho, campineiro que se iniciou na política no PSDB e em 2014 não conseguiu vaga na Câmara pelo PROS. Ele não foi encontrado pela Veja para confirmar a versão de Alencar. Mas o fizeram, à revista e ao Fantástico, da Rede Globo, no domingo, o ex-tesoureiro Niomar Calazans e o ex-presidente de honra do PROS Henrique Pinto.


É difícil saber o que é mais sórdido nesse caso: a desfaçatez com que a barganha foi feita ou a tentativa de retirá-lo da Justiça criminal pelo fato de ser histórico e ter sido sempre rotineiro. Na mesma semana em que veio a lume, o publicitário João Santana e a mulher, Mônica Moura, espécie de tesoureira informal da campanha de Dilma e Temer em 2014, narraram outros detalhes em depoimentos ao relator da ação do PSDB contra a chapa oficial por abuso de poder econômico e político no TSE, ministro Herman Benjamin.

Santana, que foi também uma espécie de espírito santo de orelha, confessor, filósofo de cabeceira e conselheiro sentimental de Dilma em suas campanhas vitoriosas, o que reforça o peso de sua delação premiada na Lava Jato, disse que o uso de caixa 2 na campanha eleitoral da gerentona malvada de Lula em 2014 reforçou sua percepção de que os políticos brasileiros sofrem de “amnésia moral”. A expressão é sofisticada, apesar de dura, mas atenuada pela generalização que a acompanhou. O baiano Patinhas assegurou no depoimento que as coligações partidárias nas eleições não passam de leilões em que se negociam interesses e cargos.

O poeta e ficcionista de talento na juventude fez uma cínica tentativa de amenizar a informação de que, apesar de ser “rainha da Inglaterra” nas finanças da campanha, Dilma, a “honestíssima” dos Pampas às Alterosas, foi informada de todas as tramoias para lavar dinheiro sujo. Mais do que isso, o que não pode passar despercebido nessa narrativa engenhosa é seu engajamento no movimento sub-reptício de transformar a corrupção numa espécie de tradição cultural brasileira, para tombá-la judicialmente e evitar a punição dos que caíram em tentação só porque repetiram os malvadões de antanho. Do ponto de vista penal, é o mesmo que inocentar o goleiro Bruno do assassínio da mãe de seu filho, Eliza Samudio, porque ele apenas teria imitado o exemplo de Caim, que matou o irmão Abel.

Segundo nosso historiador de tornozeleira, trata-se de “um esquema maior que o ‘petrolão’. Essa promiscuidade de público e privado vem do Império, passou por todas as coisas da República”. E o profeta de Tucano, no sertão baiano que Antônio Conselheiro percorreu, vaticinou: “Isso vai perdurar enquanto tiver empresário querendo corromper e político querendo ser corrompido”.

João Santana e Mônica Moura formam um casal caríssimo, comparável, por exemplo a Sérgio Cabral e Adriana Ancelmo. Seu lorotário não pode servir para tornar impunes seus cúmplices no maior assalto aos cofres públicos da História. Ao contrário, em vez de ser tombada, a corrupção tem de ser rigorosamente punida dentro da lei atual, sem necessidade de dez medidas contra a corrupção nem de lei do abuso de autoridade. Para extinguir o sistema do furto permanente e tolerado é preciso que os ladravazes flagrados paguem multas pesadas, cumpram penas previstas no Código Penal e não sejam perdoados por repetirem seus antecessores. E, para completar, não se deve nem se pode recriar todo o esquema milionário de financiamento de campanhas eleitorais, pois nele vive o pecado original. Basta de eleições milionárias.

Imagem do Dia

Os 24 lugares mais lindos do mundo  http://www.tudoporemail.com.br/content.aspx?emailid=9320:
Pedra Sigiriya (Sri Lanka)

Esqueçam o que defendi

No início dos anos 80 nascia no ABC paulista o chamado sindicalismo combativo, tendo como bandeiras a modernização das relações de trabalho por meio de livres negociações entre patrões e trabalhadores e o fim da unicidade sindical - apenas um sindicato por categoria em uma mesma base territorial – com a consequente adesão do país à Convenção 87 da Organização Internacional do Trabalho, consagradora do princípio do pluralismo sindical. Ele também pregava o fim do imposto sindical obrigatório que a recém fundada Central Única dos Trabalhadores considerou, em seu primeiro congresso, como pilar de uma “legislação sindical fascista.”

O sindicalismo moderno era então um fator de oxigenação do mundo do trabalho e expressão da transformação de um país de uma classe operária de origem agrária protegida por uma legislação paternalista – a CLT - para uma nação dotada de uma classe de trabalhadores essencialmente urbana e desenvolvida, produto do dinamismo do parque industrial brasileiro.

Para os trabalhadores modernos, a CLT engessava as relações trabalhistas, impedindo que o acordado prevalecesse sobre o legislado. A modernização da legislação trabalhista era uma bandeira comum às duas principais centrais do país – a CUT e a Força Sindical.

Naquele universo, em qualquer assembleia sindical havia sempre alguém lembrando que a CLT era uma cópia da Carta del Lavoro de Mussolini. O então metalúrgico Lula ia mais além, dizia que a CLT era o AI-5 dos trabalhadores.

Quem, naquela época, diria que, passados trinta anos, um presidente da Central Única dos Trabalhadores, Wagner Freitas, ocuparia espaço em um jornal de circulação nacional para considerar a CLT “um marco civilizatório das relações entre o capital e a classe trabalhadora”.

E quem diria que chegaria o dia em que CUT mandaria esquecer as bandeiras que defendeu e se oporia a uma reforma trabalhista na qual o acordado prevalece sobre legislado; que leva em consideração as profundas alterações do modo de se produzir e do mundo do trabalho; e que acaba com o famigerado imposto sindical.

Sim, no caso do imposto sindical, a Central Única dos Trabalhadores hoje está de braços dados com o atraso e acasalou-se com o peleguismo de sindicatos cartoriais. Não faz muito tempo, a CUT, então presidida pelo sindicalista Arthur Henrique, fez uma campanha com o slogan “Diga não ao imposto sindical”. Isto foi em 2012. Qual mudança substantiva houve para a central petista ter mudado de posição?

Na linha do esqueça o que defendi está também Lula. Sua memória seletiva está lhe levando a esquecer que como presidente propugnava a reforma trabalhista. Vamos às suas palavras na reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social (CDES), de 17 de maio 2007: “Não é possível que algumas coisas feitas em 1943 não precisem de mudanças para 2007, 2008. O mundo do trabalho mudou, houve evolução, a condição de trabalho é outra".

Certamente Lula dirá, sem apresentar um só dado, que no seu governo a reforma trabalhista não retiraria direitos, ao contrário da reforma do presidente Michel Temer, batendo na tecla da precarização do trabalho.

Não foi bem assim. Na mesma reunião do CDES, o então presidente defendeu contratos especiais de trabalho para jovens de 15 a 24 anos não incorporados ao mercado de trabalho, desdenhando dos resmungos de alguns petistas e sindicalistas que torciam o nariz para a ideia: "Tem companheiro que fala que não pode ter um contrato especial porque vai precarizar o jovem e torná-lo um trabalhador diferente. Tudo bem, mas trabalhador diferente ele já é sem trabalhar".

Por que o mesmo diagnóstico não se aplica, então, aos contratos especiais de trabalho previstos na proposta Temer?

Talvez a melhor defesa da necessidade da reforma trabalhista esteja numa cartilha da CUT, elaborada pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC para explicar o projeto de lei Acordo de Coletivo Especial, apresentado a Dilma em 2011: “Um passo fundamental para inovar no campo das relações de trabalho é reconhecer que a atual legislação não dá conta de resolver todas as demandas e conflitos, tampouco superar e atender as expectativas dos trabalhadores e empresas em situações únicas, específicas, para as quais a aplicação do direito no padrão celetista não mais alcança resultados satisfatórios".

Em outro ponto da cartilha, a CUT afirma: “a lei tolhe a autonomia dos trabalhadores e empresários, impondo uma tutela pelo Estado, que, como toda tutela, se converte em barreira para o estabelecimento de um equilíbrio mais consistente. Onde existe controle excessivo e regras engessadas, a liberdade morre.

Corretíssimo. Pena que a Central Única dos Trabalhadores só pense assim quando o partido do qual é correia de transmissão está no poder. Quando está na oposição, esquece o que defendeu. E o que escreveu.

Há na família Corleone um senso de decência que falta aos corruptos brasileiros

Imagine-se a cena. Emílio Odebrecht, maior empreiteiro do país, dono de uma fortuna de R$ 13 bilhões, bonachão e de riso fácil, está irrequieto e agoniado. Reúne sua mulher e sua filha, engole um uísque para tomar coragem, e anuncia, com a voz trêmula, que é tudo verdade. Tudo.

Há mais de 30 anos, ele vem comprando juízes, prefeitos, governadores, deputados senadores, ministros e até presidentes da República. E que vai delatar tudo, tim-tim por tim-tim. A choradeira é geral.

Mas… e depois? O que dizem a mulher e a filha de Emílio? A mulher pede o divórcio? A filha rompe com o pai? Claro que não, ninguém esperaria isso, e nem seria razoável que o fizessem. As respostas devem ter sido parecidas com: “não fique assim querido, você não fez nada demais”.

Naturalmente, se não fosse nada demais, não haveria voz trêmula, nem choradeira, nem filho na cadeia, nem delação. Apesar disso, a frase “você não fez nada demais” é, em grande medida, sincera: depois de décadas usufruindo das benesses propiciadas pela corrupção, a pessoa cria algum mecanismo mental para justificá-la e conseguir dormir à noite. (A capacidade de negação do ser humano é poderosa, haja vista os que, até hoje, acreditam que a Lava-Jato é uma operação de direita associada ao “golpe”.)


Resultado de imagem para família corleone charge
Ao transformar a corrupção em algo natural em suas vidas, corruptos e corruptores não se dão conta de que corrompem não somente a si próprios, mas também a seus parentes, seus amigos, seus empregados. Emílio corrompeu seu filho Marcelo de maneira direta, mas também corrompeu, indiretamente, seus outros parentes, obrigando-os a conviver com o crime e dele beneficiar-se — ou a romper com o patriarca.

Lula negociou uma mesada suja para o irmão; transformou dois filhos e um sobrinho em laranjas, e a mulher, em cúmplice numa fraude imobiliária. João Santana fez da mulher coletora de dinheiro ilegal; Jonas Lopes, do TCE do Rio, transformou o filho em mula. Junto a cada corrupto, há uma fieira de parentes e amigos envolvidos no crime. Acreditando ajudar seus entes queridos, esses criminosos roubam deles a honestidade, a decência e a dignidade.

Vito Corleone, de “O poderoso chefão”, de Mario Puzo, o criminoso mais inteligente já criado pela ficção, não é completamente cínico: ele sabe que pertence a uma casta inferior, e luta, com o apoio da família, para manter o caçula Michael fora do crime: é ele a esperança de redenção de todos. O chefão é uma tragédia, e Michael não escapa a seu destino trágico: acaba por ocupar o posto do pai como capo dei capi — mas passa a vida tentando tornar seu negócio legítimo.


Há nos Corleone um senso de decência que falta aos corruptos brasileiros, que chafurdam na lama com orgulho e prostituem as famílias com alegria. Emílio ensinou ao filho que corrupção não é nada demais, e, de aprendiz, Marcelo fez-se mestre, e tornou-se o maior corruptor de todos os tempos. Sentia-se tão poderoso que demorou quase um ano para entender o que lhe aconteceu.

O modelo Kübler-Ross postula que o processo da perda tem cinco estágios: negação, raiva, negociação, depressão e, finalmente, aceitação. Preso, Marcelo entrou em negação: encarou como breve contratempo, achou que logo seria solto. A cadeia se prolongou, veio a raiva: “quem esses procuradores e esse juiz pensam que são? vou acabar com eles!”. Não vimos a negociação — “a sentença vai ser curta, daqui a pouco saio e volto a presidir a empresa” —, mas é certo que ela ocorreu.

Com a primeira condenação, a 19 anos de prisão, a ficha enfim caiu, e, com ela, veio a depressão: há relatos de Marcelo varrendo a cela com os ombros encurvados e o olhar acabrunhado. Quando finalmente entendeu que havia perdido, que sua vida nunca mais seria a mesma, Marcelo aceitou. E decidiu falar.

O processo de Marcelo é o mais emblemático e visível, mas todos passam por ele. Em algum momento, a pessoa aceita que perdeu, e se pergunta: “vou me sacrificar? para salvar quem? por quê?” Delcídio é o recordista: não precisou de mais de 24 horas para ir da negação à aceitação, e à delação. Cada um tem um tempo diferente, mas, no fim, quase todos falam.

Nem digerimos a Odebrecht, e lá vem Leo Pinheiro, contando tudo e afirmando que Lula lhe pediu que destruísse provas. Palocci já avisou que vai falar, e deve explicar como o PT conseguiu movimentar bilhões de dólares em dinheiro frio, que banqueiro o ajudou.

Depois de Palocci, Vaccari, que, até agora, vem resistindo tão bravamente quanto Dirceu, não terá motivo para permanecer calado. Outros falarão, e, mais cedo ou mais tarde, juízes começarão a ser denunciados (o que talvez explique a ânsia de certo ministro do STF para desmoralizar os procuradores).

A Lava-Jato não tem data para acabar: Deltan até brincou que seu objetivo é superar o Candy Crush Saga, um videogame famoso por ter um número infinito de etapas, mas o que a Lava-Jato lembra mesmo é “Game of thrones”, em que o inverno é longo e a noite, escura e cheia de terrores.

África rejeita o 'diesel sujo' da Europa

Países da África Ocidental decidiram tomar medidas contra a importação de combustível com níveis perigosamente altos de enxofre e outras toxinas. Grande parte do chamado "diesel sujo" tem origem na Europa, de acordo com um relatório publicado no ano passado pela ONG suíça Public Eye.

O relatório revelou o que a Public Eye chama de "negócio ilegítimo" de empresas petrolíferas europeias e comerciantes de commodities que vendem combustível de baixa qualidade para a África. Enquanto as normas europeias proíbem o uso de diesel com teor de enxofre superior a 10 partes por milhão (ppm), o diesel com até 3 mil ppm é exportado regularmente para a África.

A partir de 1º de julho, o diesel vendido nas bombas do Gana e da Nigéria terá que atender a um padrão de 50 ppm.

"Estamos muito felizes de ver essa mudança na política", diz Oliver Classen, da Public Eye. "Ainda estamos esperando que outros países da África Ocidental façam o mesmo, como Costa do Marfim, Benin, Togo ou Mali."

Em uma investigação que durou três anos, a Public Eye testou o combustível colocado à venda em postos de gasolina de oito países africanos, cinco dos quais na África Ocidental. Eles descobriram que mais de dois terços das amostras analisadas tinham um nível de enxofre equivalente a 150 vezes o limite europeu.

As cidades africanas têm crescido rapidamente. Lagos, a maior da Nigéria, tem uma população de 21 milhões, e as estimativas sugerem que este número poderá quase dobrar até o ano de 2050. Cidades maiores representam um risco muito maior de poluição do ar.

Embora a rápida urbanização e a precariedade da frota de automóveis, em sua maioria de segunda mão na região, sejam parcialmente responsáveis pelos elevados níveis de poluição atmosférica, o diesel de baixa qualidade também tem um impacto significativo.


Resultado de imagem para diesel sujo charge
Poluentes oriundos de combustíveis têm sido associados ao desenvolvimento de asma, câncer de pulmão e doenças cardiovasculares. O relatório da Public Eye afirma que a mudança para um combustível com baixo teor de enxofre na África, bem como a introdução de carros com tecnologias modernas de controle de emissões, poderiam evitar 25 mil mortes prematuras em 2030 e 100 mil em 2050.

Classen explica que a Public Eye comanda uma "campanha dupla" para pressionar a mudança na indústria de combustíveis.

"Nossas organizações parceiras na África Ocidental se certificaram de que a voz das pessoas que sofrem dessas emissões sulfúricas seja ouvida por seus respectivos governos", garante. "Na Suíça, nós pressionamos as empresas que se aproveitam desses duplos padrões - descarada, impiedosa e sistematicamente."

O relatório foca em empresas comerciais suíças que utilizam um processo conhecido como "blending" para combinar combustível de baixa e alta especificação, criando uma mistura em conformidade com as fracas normas africanas. Conforme explica o relatório, "quanto mais próximo do limite de especificação do produto, maior será a margem potencial para o comerciante".

Este produto de baixo padrão, conhecido na indústria como "Qualidade Africana", não poderia ser vendido na Europa, mas não tem a venda ilegal em outros lugares. O processo de mistura –que ocorre tanto em portos europeus ou a caminho da África, através de uma transferência de "navio para navio" – complica a situação, já que o combustível de vários fornecedores pode ser misturado em um único produto.

De acordo com a Public Eye, empresas suíças também são proprietárias ou tem grande participação nas companhias que possuem grande parte da infraestrutura utilizada para misturar, transportar e distribuir combustível - como navios, tanques de armazenamento, postos de gasolina e gasodutos.

Apesar de ter reservas de petróleo significativas, a África Ocidental carece de recursos de refinaria suficientes para processar seu próprio petróleo de maior qualidade e, por isso, recebe importações mais baratas do exterior.

Após o relatório, governos de cinco países da África Ocidental se comprometeram rapidamente a uma reforma da legislação que regula os combustíveis. Gana e Nigéria foram os primeiros a cumprir a promessa. Mas e os comerciantes de commodities na Europa?
Leia mais