quinta-feira, 16 de novembro de 2017

'Não há bem que sempre dure, nem mal que nunca se acabe'

A lembrança frequente de minha mãe, cuja enorme e doída saudade só aumenta com o tempo, me trouxe de volta, no último fim de semana, chuvoso e frio, o provérbio do título destas linhas. Ela não se cansava de repeti-lo e, ao fazê-lo, queria apenas despertar nos filhos a esperança em dias melhores. Arrematava-o sempre, depois de profundo suspiro, com este outro: “De hora em hora, Deus melhora”. Dizia assim – concluí muitos anos depois – com a intenção de nos proporcionar um pouco mais de conforto diante de nossas dificuldades escolares. Eram estas (bons tempos!) nossas maiores preocupações, que se avolumavam de acordo com o passar dos anos. Na realidade, ela sofria a nosso lado e, por isso, o que dizia mexia com nossos brios.

Lembrei-me desses dois provérbios em conversas descontraídas com alguns amigos. Não há prosa, porém, atualmente, em qualquer roda, e por mais descontraída que seja, que, num átimo, não deságue na preocupação com o futuro de nosso país, que, para muitos de nós que já dobramos o cabo da Boa Esperança, vive sua mais grave crise – na economia, na política, mas, sobretudo, na ética. Ao que parece, e assim nos pareceu, chegou ao fim a safra dos grandes homens públicos que se preocupavam com o trabalho em prol do bem comum.

Não sei se tais provérbios podem servir hoje de alento aos brasileiros. A conversa, que imaginávamos fosse de esperança num futuro melhor ou menos aterrador, encerrou-se com a certeza de que, além de sua generosa natureza e de seu povo sofrido e humilde, que sacrifica um leão por dia para sobreviver à fome, não há nada, rigorosamente nada, em nosso país, que justifique, por parte dos brasileiros, qualquer comemoração. Vivemos agora, como nunca, na proximidade do abismo que tanto temor nos tem infundido ao longo de anos. E se nós, eleitores, não soubermos neutralizar essa estéril e estúpida polarização entre Lula e Bolsonaro, o sonho de nos tornarmos um país fraterno, menos injusto e menos desigual, estará comprometido por muitos e muitos anos. E é isso que nossos políticos não enxergam.

O mau exemplo agora está por conta do PSDB – um partido que, em sua fundação, propunha instalar no país a social-democracia, distanciando-se, assim, da (podre) costela da qual se originou. Empolgou com essa bandeira alguns de nossos maiores intelectuais. Na prática, não conseguiu nem se distanciar “das benesses oficiais”, nem se aproximar do “pulsar das ruas”, como pregou Franco Montoro, ex-governador de São Paulo e um de seus principais idealizadores. Depois de ocupar a Presidência da República por duas vezes e vários governos estaduais, parte de seus integrantes optou pela aceitação de ministérios e cargos de relevo no governo Michel Temer. Essa iniciativa dividiu o partido, e isso poderá levá-lo a um trágico final.

Sobra-nos, enfim, leitor, o conselho da escritora Ana Maria Machado, que terminou assim seu último artigo no jornal “O Globo”: “Caindo na real, na certa vamos ter de nos juntar em torno a algo que pode não ter a beleza pura de cada sonho e não vai ser o ideal de cada um, nem em termos de coincidência ideológica, nem de imaculada inflexibilidade. Aqui e ali, talvez exija que se tape um pouco o nariz ou ventile o ambiente. Mas talvez seja a única forma de escapar da polarização que insufla melindres e ressentimentos, num revanchismo odioso e autocrático que pode até adiar a prisão de uns e outros, mas não pode fazer bem ao país”.

Uma verdadeira lição de política!