quarta-feira, 8 de junho de 2016

Não há cortinas

O decorador estranhou quando o professor comentou que nós, brasileiros, não gostamos de cortinas.

– Então vamos às persianas...

– Não, respondeu o professor, continuemos com as cortinas. Peço desculpas. Eu pensava nas “cortinas” de teatro: aquelas que marcam irremediavelmente o fim de um ato ou da peça!

– Entendo, mas ainda estou no ar.

O professor que era um velho conservador e que foi estigmatizado como homofóbico por um f.d.p., e era chamado por alguns “amigos” e alunos de golpista, explicou.

– Quando inocentemente me perguntam “o que é o Brasil?”, eu candidamente penso numa sociedade que não consegue fechar etapas, períodos, crises ou até mesmo portas! Somos das aberturas e inaugurações. Amamos as novelas: um gênero no qual, um fio produz muitos enredos, que prendem todo mundo a todo mundo. O drama reafirma uma vida social interligada na qual o fechamento é difícil.

Se nós não conseguimos nos despedir depois de um jantar ou começar ou terminar alguma coisa na hora marcada, será que fechamos o império e começamos a República?

– Deixa eu te falar uma coisa – continuou –, nos Estados Unidos, as pessoas são, como viu Tocqueville, pessimamente educadas. Dizem “até logo” num segundo e vão diretamente a um assunto. Aqui, levamos horas nos despedindo no elevador. Mas, lá, os bandidos são presos; aqui, reeleitos.

*
Nós adoramos o palco e os dramalhões. Estamos revivendo um deles. Penso que está sendo dirigido por um Carlitos – vagabundo fora do mundo, enrolado com muitos malandros.

– Há diferença entre vagabundo e malandro?

– Sem dúvida. O vagabundo recusa o sistema. O malandro usa muito bem o sistema.

*

Agora, com a devida vênia, eu pergunto ao Temer, presidente interino e constitucionalista, ao Temer professor e ao Michel poeta: quem nomeia esses atores tão lambuzados?

Seria o poeta que vive no mundo da lua? Ou é o constitucionalista que ama os axiomas da lei luso-brasileira? Temos um “Ministério da Transparência” porque, admitindo sem saber o nosso amor pelas ambiguidades do “rabo preso”, somos intransparentes. Não é preciso ler Freud!

Em todo lugar, governar é ser transparente, menos no Brasil. Aqui, governar é cuidar, enganar, roubar e mentir, mas, acima de tudo, é “se arrumar”. Se assim não fosse, o conceito de “transparência” – revelador nas suas conotações psicológicas – não seria chamado ao palco.

*

– Mas, professor, teatro é ficção, mas política tem consequências. Para muitos, ela é a única realidade. Quem não pensa o mundo politicamente é, como o senhor, reacionário. E, no entanto, todo esse realismo se tornou uma perversa ficção neste Brasil onde todos os desentendidos ocorrem de modo avassalador. Poucos não têm o “rabo preso”. Eis uma triste figura. Haveria alguém livre? Sem dúvida, mas a serem contados nos dedos. Como ser livre sem ter a capacidade de dizer não a si mesmo? Esse axioma das democracias igualitárias.
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Como sair da crise em alguém que esteja um pouco fora dela?

O velho professor não ousa responder. Tem medo de ser admoestado pelos mais puros adeptos da fantasia. Todo sistema canibaliza seus membros, mas, também, é por eles controlado. No nosso caso, seria preciso menos confusão entre atores e papéis, entre o real e a ideologia, entre o poder como meio para a riqueza à custa do povo naquilo que se chama populismo.

Afinal, como disse o laureado Paul Krugman no The New York Times, os empresários – estilo Donald e Marcelinho Odebrecht – descobriram que investir em políticos e partidos produz excelentes ganhos de capital.
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– Neste momento de “crise”, neste instante metafísico e transcendental em que vivemos, pois a crise que faz com que tudo fique próximo e distante ao mesmo tempo, não estaríamos vivendo sem querer saber, mas já sabendo, a compra do mundo pelo capitalismo? Pelo capitalismo como mais um trivial negócio capitalista? Afinal, há um capitalismo como estilo de vida, e outro que deseja ser o englobador exclusivo da vida no planeta. Para este tipo de capitalismo, nada é sagrado, exceto ele próprio. Estamos, agora, tratando de tornar a Terra um negócio. O último negócio...

Apocalypse Now?

O mundo da política vive o seu Apocalypse Now sem que se vislumbre como será o Day After, ou quem sobreviverá dos seus escombros. O pedido de prisão do ex-presidente José Sarney, do presidente do Senado, Renan Calheiros, do presidente em exercício do PMDB, Romero Jucá, e do presidente da Câmara com mandato suspenso, Eduardo Cunha, pode não ser ainda o fim do sistema político-partidário do país, mas muito provavelmente é o princípio do seu fim.

Um clima de fim de mundo tomou conta de Brasília. Entende-se a razão de tanto pavor. Em um país secularmente pautado pela impunidade, o pedido de prisão por si só abala os alicerces da velha ordem política, mesmo que ainda não tenha sido apreciado pelo ministro-relator, Teori Zavaski, e pelo pleno do STF.

Natural que a Suprema Corte seja extremamente cautelosa na análise do pedido do procurador-geral e não se deixe pautar pelo clamor da opiniião pública. Mas desde já a espada de Dâmocles paira sobre a cabeça do núcleo central do PMDB e o governo do presidente interino Michel Temer pode ser atingido pelo exocet disparado pelo Rodrigo Janot.

Não apenas o PMDB, mas também todo um sistema que foi colocado em xeque pela operação Lava-Jato. A cada momento novos elementos de imprevisibilidade são adicionados a um quadro já bastante instável. Quando se pensa que já se viu de tudo, novos fatos vêm à luz do dia. Agora foi o pedido de prisão de figuras lumina res do PMDB e da República. E nos próximos dias, o que virá?

Não sabemos. Pode ser o dilúvio: as delações premiadas de Marcelo Odebrecht e de Leo Pinheiro, com todos os seus desdobramentos. Se isto acontecer, e se suas revelações forem comprovadas, o sistema político brasileiro tal qual é hoje não sobreviverá. A depender da extensão e profundid ade de tais delações, a razia afetará a quase todos os partidos, ainda que de forma diferenciada. Claro que o PT e o PMDB serão os mais afetados, pois estiveram no poder nos últimos 13 anos. Mas o PSDB que se cuide.

É como se o mundo da política vivesse no purgatório. A velha forma de se fazer política está moribunda, mas ainda não deu lugar a uma nova prática e procedimentos republicanos. Há um gigantesco passivo para se prestarconta perante a sociedade e também perante a Justiça.

Mas o que é apocalipse para uns, é renascimento para outros. Aos poucos, e a duras penas, vai surgindo um novo Brasil e a Lava-Jato tem muito a ver com isso. A ação do Ministério Público, da Polícia Federal e da Justiça vem desconstruindo a cultura da impunidade, que levava empresários, políticos e poderosos a se apossar do dinheiro público porque se consideram inatingíveis pela lei. Quem imaginaria um dia que um presidente do Senado e um ex-presidente da República se veriam diante da possibilidade de serem presos?

Mas a mudança não será completa se não for adotado também outro padrão de governança pelas grandes empresas, particularmente na sua relação com o Estado, historicamente marcada pela intermediação de interesses, pelo tráfico de influência, pela confusão entre o público e o privado. A Lava-jato está aí para provar o quanto é nociva a prática de grupos econômicos refratários à livre concorrência, que se infiltram no aparato estatal para dele se apropriar e manter seus privilégios.

A desprivatização do Estado só será plena se dele forem desalojados tanto o clientelismo e o fisiologismo, tão próprios da forma arcaica de se fazer política. E também o capitalismo parasitário, aquele que só sobrevive a custa da reserva de mercado, da prática de cartéis, de incentivos e subsídios.

O país não está condenado ao fim apocalíptico. É possível livrar-se dessa herança perversa e construir novas relações republicanas. A Lava-Jato está aí para isso.

Corrupção alucinada, uma tragédia brasileira

O título está inspirado na obra de Theodore Dreiser, Uma Tragédia Americana, que deu margem ao filme Um Lugar ao Sol, de George Stevens, com Montgomery Cliff e Elizabeth Taylor. Uma história baseada na ambição humana. No Brasil, a tragédia, na vida real, como revela a reportagem de Jailton de Carvalho, edição de quarta-feira, no O Globo, é muito mais ampla. A corrupção generalizou-se. A honestidade tornou-se defeito. As posições se inverteram através de uma ponte tripla ligando os setores empresariais, políticos e administrativos. O prejuízo econômico causado ao Brasil é imenso.

Ultrapassou de longe todos os limites. O que era exceção, a desonestidade, transformou-se em quase uma nova regra na vida nacional. Concorrências são fraudadas, obras superfaturadas, termos aditivos exponenciados. Uma desordem total.


Congreso Gaiola Janot pede prisao de Renan Juca Sarney e cunha Cadeia cela 2

Vivemos, de fato, a atmosfera de um regime anárquico, com a velocidade dos roubos se repetindo de forma incessante. Pasadena é um exemplo, como revelou Nestor Cerveró. Mas o recorde se encontra na Refinaria Abreu Lima, em Pernambuco. Orçada em 2 bilhões de dólares, no final, custou 17 bilhões. O país foi assaltado por uma estrada de corrupção em volta da Petrobrás.

São episódios marcantes, destacando uma conivência excepcionalmente profunda. As delações premiadas sucedem-se de forma ininterrupta. A cada esquina das investigações, surge um caminho novo desvendado. O resultado foi – e está sendo –catastrófico, levando a prejuízos incalculáveis. Pois nenhum fato, no fundo, é isolado de um conjunto de adições. A economia explodiu. O desemprego disparou, o congelamento salarial é mais uma das consequências de um desastre colossal.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao STF diversas prisões. Na lista, os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha, e do Senado, Renan Calheiros.

Prisioneiro, sobretudo, de todo esse processo, está o povo brasileiro. Espoliado, perdendo renda sucessivamente diante da inflação que se acumula, sem contar com os serviços básicos de saúde, segurança, educação, longe de um horizonte que leve à esperança. A população está presa num túnel distante da saída, se houver saída, pelo menos ela levará alguns anos para se aproximar do anseio coletivo.

O que faz o governo Michel Temer, de concreto? Quase nada. Até agora, revelou somente intenções, nada de ações concretas. Pelo contrário. Recorre a retóricas evasivas que não levam a lugar algum.

Palavras no lugar de atos. É fácil concordar com intenções. O povo brasileiro entretanto, espera ações. Os últimos fatos que estão marcando o cenário do país indicam praticamente a impossibilidade do retorno da presidente Dilma Rousseff ao Palácio do Planalto. Mas tal perspectiva tem um preço muito alto.

A população não pode e sobretudo recusa-se a pagar por ela. O preço desloca-se para a omissão em outro sentido, a convivência de papeis diferentes, mas na maioria dos casos com os mesmos atores e atrizes. A forma de atuação dos personagens muda, o conteúdo não.

O objetivo final permanece o mesmo. Manter o esquema de vantagens individuais e de grupos, ultrapassando as faixas que separam a honestidade da desonestidade. Principalmente, a honestidade de propósitos. E esta deve ser a diferença maior entre os campos de atuação das correntes políticas.

Mas afinal o que representam, elas? Absolutamente nada. O presidente Michel Temer precisa agir. Em primeiro lugar, estabelecer um rumo definido ao seu mandato.

Sobre honestidade

A “presidenta honesta” vai ter que encontrar motivo melhor para denunciar o “golpe” armado contra ela pelos corruptos que “querem acabar com a Operação Lava Jato”. Marcelo Odebrecht, às vésperas de completar um ano atrás das grades, em delação premiada acusa a presidente afastada de ter exigido da maior empreiteira de obras públicas do País R$ 12 milhões de “contribuição” para a campanha presidencial do PT em 2014. Aquela eleição que ela venceu por pouco, depois de ter mentido despudoradamente, acusando a oposição de planejar medidas impopulares que ela própria tentou implementar. Com a colaboração de Marcelo Odebrecht, portanto, Dilma Rousseff ingressa na confraria dos políticos que se locupletam no poder ou são investigados sob essa suspeita. Corre o sério risco de se tornar, por decisão do Congresso e da Justiça, “ex-presidenta desonesta”.

A delação de Odebrecht, ainda não homologada pelo STF, teve parte de seu conteúdo vazado pela revista IstoÉ. De acordo com as informações, a “colaboração” de R$ 12 milhões foi solicitada ao então presidente da empreiteira pelo então tesoureiro da campanha presidencial petista, Edinho Silva. Disposto a não atender ao pedido, Marcelo Odebrecht foi diretamente a Dilma Rousseff, de quem teria recebido a ordem: “É para pagar”.

Por sua vez, o ex-diretor Internacional da Petrobrás Nestor Cerveró, condenado por seu protagonismo na farra da propina da Petrobrás em benefício do PT, garante, também em depoimento negociado com a Justiça em troca da redução de sua pena, que Dilma Rousseff “tinha todas as informações sobre a Refinaria de Pasadena”, cuja compra deu um prejuízo de R$ 800 milhões à Petrobrás. Por ocasião desse episódio, a presidente da República afastada presidia o Conselho de Administração da estatal. E quando o escândalo estourou, já chefe de governo, Dilma isentou-se de culpa alegando que aprovara a venda da refinaria com base num relatório técnico “falho” e “incompleto”.

Até o momento, a Operação Lava Jato e congêneres, que devassam a administração pública federal e revelam o mar de lama em que 13 anos de governo lulopetista afundaram o País, não encontraram provas de que Dilma Rousseff se tenha beneficiado, financeira ou patrimonialmente, de quaisquer ilicitudes. É verdade que à sua sombra vicejaram maracutaias de todo tipo, como as de que foi acusada seu braço direito, Erenice Guerra, que por esse motivo teve de se afastar da chefia da Casa Civil, que assumira em substituição à chefe. Mas, assim como aconteceu com Lula, com o aprofundamento das investigações, os ares ao redor de Dilma começam a ficar pesados e sulfurosos.

Por conta disso, Dilma ainda pode se agarrar à reputação de “mulher honesta”, contrapondo-se à imagem de corrupto que estigmatiza, por exemplo, aquele que ela considera o principal responsável pelo processo de impeachment, o deputado afastado Eduardo Cunha.

Ocorre que honestidade não é virtude, mas obrigação elementar de comportamento, especialmente para quem tem a responsabilidade de administrar a coisa pública. Além disso, ser honesto, probo, não significa apenas não roubar, meter a mão no alheio, enriquecer dilapidando o bem comum. Ser honesto na vida pública é administrar com parcimônia os recursos do Tesouro em atenção à óbvia necessidade de manter as contas do governo equilibradas para impedir que o descontrole resulte na falta de recursos para investir no que é necessário, inclusive nos programas sociais. É manter a inflação sob controle, evitar a recessão das atividades produtivas e, consequentemente, o desemprego em massa. Ser honesto é não mentir em campanha eleitoral sobre dificuldades econômicas do País, não prometer o que sabe que não poderá cumprir e muito menos não acusar os adversários de pretender tirar a comida da mesa dos pobres.

Dilma fez tudo isso na campanha eleitoral de 2014. Portanto, não é honesta. Ela é populista e o populismo é essencialmente desonesto e autoritário, porque não distingue o público do privado. O que começa a ser revelado pelas delações premiadas, no entanto, situa-se noutro plano político e moral. Prenuncia a revelação de comportamentos pessoais – por ação e ou por tolerância – que a moral e os bons costumes repudiam.

Raiva espera?

Em uma conversa dessas de todo dia, não grampeada, entre gente comum, preocupada consigo e com os outros, o tema foi saúde e afins. Está mesmo faltando vacina? O fornecimento é irregular. Atendi uma senhora com mordida na mão, estava vindo na peregrinação, de unidade em unidade, dava para ver os dentes de um lado e do outro, estava muito edemaciada. Mostra com gestos o ferimento e o inchaço. Os outros comentam: se alguma coisa todo mundo aprende na faculdade é que, se for em membros superiores e face, tem que vacinar, mesmo que o animal possa ser observado. A história é retomada. Mas nesse dia não tinha vacina, eu já sabia.

Examinei a paciente e, mesmo assim, telefonei para a secretaria. A moça que me atendeu foi burocrática, tratou como se fosse uma falha de informação. A lenga-lenga de sempre: vocês deveriam ter sido avisados. Respondi: “Nós aqui sabemos disso, estou ligando para solicitar uma orientação.” Ela sugeriu colocar a senhora numa lista de espera. Como assim? E raiva espera? (A raiva humana é letal, e o período de incubação para que a doença se manifeste é menor em casos de penetração do vírus em locais com mais terminais sensitivos). Mais informações são trocadas. Eu consegui em outra cidade, me disseram que lá tinha três doses. A paciente teve que viajar. Pausa para perplexidade. Quem diria, o programa nacional de imunizações foi a menina dos olhos da saúde no Brasil.

O assunto puxou a preocupação com os medicamentos, com o coquetel para HIV/Aids e atendimento na Olimpíada. Alguém sabe com certeza como vai ser? Houve uma reunião na Cidade Olímpica. Saiu no jornal, vai ser tudo dividido. Tem uma parte que eles chamam de família olímpica, que será atendida em um hospital privado; o pessoal da imprensa também terá assistência especial, em outro lugar, e o resto na rede pública. Será que dá certo, isso tão separadinho? E os hospitais públicos e os postos de atendimento ambulatorial, alguma coisa aconteceu? Acho que só houve umas mudancinhas. Estive em um hospital e vi obras para leitos de terapia intensiva, tinha mármore preto e tudo. Parece que chegaram mais de cem ambulâncias novas, o ministério já deu dinheiro para o funcionamento. Teve treinamento, isso eu sei. Constata-se: que pena, se valorizassem a rede pública, o Rio ficaria bem melhor. Mais interrogações. De onde veio esse dinheiro para contratar os hospitais privados? Sei lá, ouvi dizer que é exigência do COI. Será? E em Londres, o COI aceitou que o sistema público atendesse? O sistema público inglês foi a estrela da abertura da Olimpíada.

Silêncio, seguido por tentativas de explicação. Quem é que sabe o nome de algum secretário? Você lembra? São inexpressivos. Não vão botar dinheiro em nada que não renda voto; nesse ano tem eleição. Tem réplica. Por isso, deveriam se preocupar, vai ter manifestação, o SUS vai aparecer de novo nas ruas. Inicia-se uma avaliação do que é pior ainda. E o ministro interino da Saúde? Problemão, pode vir chumbo grosso em tudo que com muito esforço estava saindo debaixo do tapete: aborto, estupro, atendimento para LGBT, profissionais do sexo. Violência comendo solta, soldado do tráfico, da milícia e da polícia morrendo e matando. Vai ser punk. Morreu um parente de um conhecido meu. Guillan-Barré, e não havia imunoglobulina. Dá uma tristeza. Viu o aumento no plano? Mais que 13%, velho não consegue pagar, nem mudar para um de menor valor, é expulso. Pode ter uma secretaria das mulheres, que é contra o aborto por convicções religiosas? A inquietação com as instituições públicas vai da saúde para outros setores. E na Funai, que botaram um cara que é a favor da catequização dos indígenas, sequer aquela ambiguidade de alguns padres jesuítas do Brasil Colônia. Agora que o Ministério da Cultura voltou, temos que ser contra a fusão do da ciência e tecnologia. A SBPC está pressionando. Toda hora é abaixo-assinado. Já assinei. Como um país vai ficar sem uma instituição forte de ciência e tecnologia?

Mais uma interrupção, e mudança de rumo da prosa. Eu me sinto bem atendendo paciente, na sala de aula. Quando dá certo, não tem nada mais gratificante. Uma foto no celular passa por todos. Uma cirurgia com diversas próteses cardíacas. Assim, fica parecendo um Robocop, mas ele é jovem ganhou uma nova vida. O material é uma fortuna, mas se usar com critério... tinha que ser sempre assim. O grupo sai andando, passa por uma livraria. Conhecem? Sim é boa, mas é um pouco cara. A gente não consegue parar de comprar livro. Agora só leio e-book. Continuo com os tradicionais. Então tenta, o eletrônico fica bem mais barato, acostuma rapidinho. No dia seguinte, acordam cedo, para pegar no batente. São profissionais experientes, se formaram em uma universidade pública, querem trabalhar melhor, contribuir para que a população tenha direito à saúde. Nada demais, nem de menos, apenas a renovação do compromisso ético-político com a saúde e democracia.

Ligia Bahia

O voo da serpente

Existe um problema político aparentemente simples de se resolver mas que começou a dar muita dor de cabeça ao Michel Temer. A Casa Civil decidiu cortar as mordomias da Dilma e de seus auxiliares porque os gastos extrapolam os limites da decência. A presidente afastada, que não tem compromissos oficiais, está usando os jatinhos da FAB para produzir factoides pelo Brasil afora. Leva à bordo dezenas de auxiliares com salários de marajás para orientá-la em seus discursos e até preparar as suas chegadas festivas nos locais previamente escolhidos para falar sobre o golpe.

Pois bem, o governo decidiu limitar as viagens dela e restringir o uso dos cartões corporativos de seus auxiliares, cujas despesas continuam sob segredo de estado. Ao ser avisada que a farra estava chegando ao fim, Dilma irritou-se e usou a rede social para provocar Temer com arrogância, prepotência e autoritarismo, como trata os seus subordinados. Na queda de braço, levou a pior. A Casa Civil impediu que ela usasse o avião da FAB para um convescote em Campinas, São Paulo.

Temer não engoliu os desaforos da Dilma, que peitou a sua autoridade, com seus arroubos de sempre:

"Eu vou viajar", disse ela. "É um escândalo que eu não possa viajar para o Rio, para o Pará, para o Ceará… Isso é grave. Eu não posso, como qualquer outra pessoa, pegar um avião (comercial). Tem de ter todo um esquema garantindo a minha segurança. Estamos diante de uma situação que vai ter de ser resolvida".

Ora, existe um ditado que diz que se você não pode enfrentar o seu inimigo não o desafie. Dilma pagou para ver e recebeu o troco. O governo Temer, com razão, corta as despesas supérfluas do palácio porque constatou que ela está extrapolando ao gastar 280 mil reais com comida entre os meses de janeiro e maio deste ano, um exagero alimentar para quem vive em permanente regime para manter a silhueta. Não permitiu que ela usasse o helicóptero oficial para se deslocar do Palácio da Alvorada para a Base Aérea de Brasília, um percurso de treze quilômetros de carro, mas que, quando feito pela aeronave, onera os cofres públicos em 15 mil reais. Aí, você há de dizer: “mesquinharia, coisa pequena”. Ocorre que se você não começar a cortar os pequenos gastos que parecem insignificantes certamente vai perder o controle para as despesas maiores financiadas com o dinheiro do contribuinte. Apenas para lembrar, a Dilma gastou 60 milhões de reais só com o cartão corporativo em 2014, ano eleitoral.

O deslocamento da Dilma custa caro à nação. Se ela não tem compromissos oficiais, já que está afastada do cargo, o brasileiro não deve pagar suas viagens e mordomias com cartão, cabelereiros, jatinhos, hotéis de luxo e carros oficiais pelas suas andanças pelo país. Não se trata aqui de impedir os movimentos da presidente. Ela, como todo brasileiro, tem o direito de se locomover para qualquer lugar desde que banque as suas despesas como qualquer cidadão ou cidadã comum já que não está no exercício do poder, portanto, sem as prerrogativas de direito.

A questão mais grave é quanto ao desafio que a Dilma faz ao presidente em exercício ao deixar claro que não vai aceitar a decisão da Casa Civil de proibi-la de viajar para outros estados que não seja Porto Alegre, seu local de origem. No primeiro embate, encolheu-se. A gastança desenfreada, chamou a atenção do governo para outras de suas atividades utilizando-se da estrutura do estado. A principal delas, a de articular movimentos petistas para bradar aos ventos que foi apeada do poder por um golpe. A outra, mais estratégica, de se juntar aos blogueiros oficiais para plantar inverdades contra o governo.

A Dilma sempre alega que as suas mordomias estão amparadas por lei. Como o país vive em uma economia de guerra, Temer bem que poderia revogar esse decreto, tornar os gastos do governo mais transparentes e acabar de vez com os cartões corporativos. Com essa medida moralizadora, a Dilma iria choramingar pelos corredores até seus dias finais de ócio remunerado mas não teria como atacar o governo que corta na carne.

Esta novela, porém, ainda vai se arrastar por muito tempo. Com a palavra o STF. Até o próximo capítulo de “O voo da serpente”.

A nova República de Canudos

A propósito da afirmação do presidente interino Michel Temer, que disse que o Brasil está mergulhado em uma das grandes crises dr sua história, eu diria: a pior crise política e moral de sua história, pelo acréscimo do fator ideológico de cunho anarco-comunista com o aparecimento e a ação de grupos que seguem filosofias, no mínimo, duvidosas. Isso é ruim porque contradiz nossa formação democrática e republicana. Nada é ou poderia ser mais autêntico e salutar do que a política advinda dos costumes e das práticas da vida do seu povo.

O que vem atrapalhando e atrasando o aperfeiçoamento do que pensamos e queremos em termos de democracia é, certamente, o despreparo desses líderes. O homem inteligente, mas analfabeto, é, antes de tudo, um perigo social, pela inconsequência de seus atos. Quem já leu alguma coisa manuscrita de um Lula?


A história, não tão distante, perpetua a ação da República de Canudos, refúgio do místico Antônio Conselheiro, cuja vantagem em relação ao milagreiro do PT foi ter sido, além de líder, um místico religioso. Isso o diferencia do Lula, sua versão atual, que, servil a essa tal esquerda católica, tem a simpatia de padres e até de bispos expulsos da Igreja, para sua campanha de exploração da miséria das camadas menos favorecidas de nossa desigual sociedade, terreno fértil e frutuoso para demagogos inconsequentes.

Todavia, não fosse essa inteligência sem rumo, que faz sumir sítios e triplex, num piscar de olhos, além de uma adega inteira, auxiliada, muitas vezes, por intelectuais que ainda militam por conveniência em sua grei, poderia ser um Antônio Conselheiro dos nossos tempos, tão esquisito quanto um triângulo de quatro lados...

O mundo evoluiu, mas, na América do Sul, ainda existem lideranças assim, de gente que engana as massas porque é parte dela, como um Maduro qualquer na Venezuela ou os bolorentos irmãos Castro em Cuba, líderes que se dizem populares, mas se impõem mais pelo medo do que pelas ideias. Imaginar Lula, Evo Morales e outros tiranos que ouviram falar em Simón Bolívar politicando na Europa é imaginar o absurdo mesmo antes da Idade Média.

Muitas gerações terão de passar para que nos livremos desse ranço que nos confunde e atrasa, representado por esse bolivarianismo que tanto mal causa e fragiliza nosso continente. O futuro a que me refiro, feito mais de desejo que de certezas, ficaria mais fácil para o progresso se cuidássemos mais e melhor da educação e da saúde e menos de políticas ideológicas, com intercâmbios com o chamado Primeiro Mundo, a Europa e os Estados Unidos.

É preciso desencasquetar dessa idiotice que é a política maniqueísta Sul/Sul do PT. Nesse sentido, o Serra dá um bom sinal para nosso progresso, quando procura fazer, agora, acordos bilaterais com o Chile e a Argentina e, futuramente, com os Estados Unidos e países da Europa, se Deus quiser. E Ele há de querer...

Cerveró, Dilma e o mal que vai durar por gerações

O Brasil inteiro viu Nestor Cerveró assegurar que Dilma, a Afastada, sempre soube de tudo o que se passava com a compra da refinaria de Pasadena — que, não nos esqueçamos, rendeu pagamento de propina, sim. O próprio Paulo Roberto Costa disse ter recebido o seu quinhão, não é isso?

Cerveró assegura que Dilma sabia de tudo até porque era presidente do Conselho de Administração da Petrobras. Pois é… Rememorando: segundo o TCU, a compra gerou um prejuízo de US$ 792 milhões à estatal.

Dou de barato: os conselhos não costumam examinar no detalhe aquisições e vendas. Tendem a se contentar com os memoriais que fazem as diretorias executivas das empresas. Ocorre que Dilma não era uma presidente de conselho qualquer. Era a chefe da Casa Civil, a mãe do PAC, a especialista em energia.

A propósito: esta senhora, ao longo de sua trajetória, e já afirmei isso aqui, foi muito competente em criar a fama de competente. Olhem a pindaíba em que deixou o Brasil e agora se recordem de como ela foi vendida a partir de 2008, para brilhar na campanha eleitoral de 2010 como a gerentona, a cobradora irascível, aquela que sempre tinha todos os números na ponta da língua e que não aceitava desculpas. Santo Deus! Dilma não consegue decorar um clichê. Dilma é a comédia involuntária mais cara que o Brasil já teve.

No sábado, fui ao teatro Eva Wilma, em São Paulo, assistir ao espetáculo “Dilma do Chefe – Saudando a Mandioca”, estrelado por Márvio Lúcio, o Carioca, talvez o comediante mais sério do país. Num dado momento do espetáculo, encarnando a Afastada, Carioca lê trechos de discursos da “presidenta”. A plateia racha de rir. É tal a soma de bobagens que, naquele trecho ao menos, o artista pôde dispensar a sua criatividade. Dilma, falando como Dilma, é uma piada. Que outro partido poderia tê-la dado de presente ao país?

A afirmação de Cerveró vem nos lembrar que, em 2003, esta senhora foi oferecida ao Brasil como a grande especialista em energia e infraestrutura, em sentido amplo, com enfoque especial em petróleo e energia.

Pois bem: ao longo de 13 anos, Banânia seguiu, nessas duas áreas, as iluminações da grande pensadora, da grande gestora, da especialista inigualável. E o que temos? A Petrobras quebrada e o setor elétrico vivendo uma das maiores crises de sua história.

Dilma, a que não quer sair, não foi apenas uma estelionatária eleitoral. Ela contribuiu de forma decisiva para destruir dois setores vitais da economia brasileira.

Assim, quando Cerveró afirma que ela sabia de tudo no caso de Pasadena — o que ela voltou a negar nesta segunda; renegou até mesmo a amizade de ambos, de 15 anos —, tendo a achar que é verdade. Não exatamente porque ela era a presidente do Conselho, mas porque sempre foi considerada, e exerceu com gosto o papel, a czarina da área de energia. E deu nessa maravilha que aí está.

Só a lambança que ela fez no setor elétrico já lhe renderia uma boa acusação de crime de responsabilidade. A verdade é que o Brasil foi condescendente demais com Dilma. O mal que ela nos fez vai durar por gerações.

Alimente uma presidente

Segundo dados do Planalto, a faminta Dilma Rousseff gastou, de janeiro a maio, cerca de R$ 280 mil em seu cartão de suprimento para despesas com alimentação, média de R$ 62 mil mensais”.




O vice Temer tirou o avião e a comida da presidenta Dilma. Ela não foi julgada ainda, apesar de eles estarem apressando esse julgamento e não dando chance de defesa. Golpe dentro do golpe. Isso se chama exílio. Ela está sendo exilada. Vamos levar comida para a presidente Dilma. É um pedido que faço em nome da democracia
Tássia Camargo

O furdunço fiscal

Lei do mercado, da sociedade civil e, de resto, do mundo privado e real: se a empresa empregadora está deficitária, cortam-se custos e demitem-se trabalhadores. Lei do poder público e, de resto, de um Estado empregador irresponsável e delirante: aumentam-se os vencimentos do funcionalismo público.

Este é o mal maior e mais perverso de nossa cultura política: irresponsabilidade fiscal, um pacto generalizado de corporativismo sem limites, e sempre às custas do difuso interesse público.

A corporação dos políticos, para defender seus interesses, pactua com a corporação dos funcionários públicos a sua mútua locupletação dos recursos públicos. Sim, o problema do Brasil é cultural: “Comendo eu e meu cavalo, o resto que se dane!”. Não desta concepção de cultura estreita a que foi reduzido o movimento da corporação dos artistas de performing arts com a sua campanha “Ocupe o Minc”.

O problema do Brasil é de cultura cívica e política, concepção mais geral da cultura, e não de culturas setoriais, o que demanda uma verdadeira reforma geral das mentalidades, do imaginário social construído no espaço público da mídia.

E já que a moda é ocupar, do tipo “Ocupe escolas”, “Ocupe fazendas”, “Ocupe presídios”, “Ocupe estradas”, “Ocupe próprios públicos” e até mesmo “Ocupe palácios” (como no caso do Alvorada), só nos resta mesmo coordenar esforços da pacata “patalhada” geral dos pagadores de impostos para o maior e definitivo movimento cívico: “Ocupe Brasília”.

Pois é lá que se cultiva a irresponsabilidade geral pelo nosso furdunço fiscal: já que o Orçamento não cabe no PIB, e a solução passageira é sempre aumentar impostos definitivos de um Estado deficitário e perdulário crônico, todos correm espertos para defender a compensação de algum privilégio fiscal corporativo.

E, em terra onde todos se acham espertos, não há otários suficientes, a não ser que todos sejamos otários insuspeitos. Prevalece a irresponsabilidade política da cultura imoral do corporativismo produto da omissão cívica de nossas elites.

Cultura generalizada, seja de grupos empresariais dos mais variados portes e setores, seja de quaisquer outros empreendimentos de cunho social, partidário, religioso, cultural, artístico ou mesmo informativo. Que esbravejam publicamente contra o Leviatã da carga tributária durante o dia e, à noite, tramam por seus subsídios compensatórios setoriais.

Pois nem a imaginação fértil de George Orwell em “1984” cogitou de um Big Brother tão onipotente que pretendesse comprar com tão farta distribuição de bolsas e boquinhas fiscais a adesão ou omissão políticas de tão vasto espectro de nossas elites.

Pois não teremos salvação nacional pela ação de nenhum pacto corporativo setorial, mas apenas pela ação de segmentos mais conscientes e atuantes de cidadãos de cada uma dessas corporações, que se apresentarem no espaço simbólico da mídia em defesa efetiva do interesse público.

Pois somos todos inocentes no varejo do privado, mas culpados no atacado do desinteresse público. E beneficiários de algum tipo de subsídio, incentivo, desoneração ou renúncia fiscal.

De tão geral esta cultura suicida de transformar em regra as exceções, que não há mais possibilidade de salvação que não seja de todos. E, havendo consenso quanto ao diagnóstico de nossa doença cultural cívica e política, e calculado o total da conta da renúncia fiscal descontada da carga tributária, será que, consultados num plebiscito, não abriríamos mão em conjunto de nossas boquinhas fiscais, sem exceção?

O país não voltaria a crescer com a carga tributária de 25% do PIB que já teve um dia? Custa tentar? Tentar ainda não paga imposto!