quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Para não por a Lava Jato a perder

Michel Temer pos o dedo na ferida ao declarar solenemente que “se houver denuncia” contra membro de seu governo na Lava Jato ele será provisoriamente afastado e se e quando houver “acolhida da denuncia e o acusado se transformar em réu o afastamento será definitivo”.

Não cabe, aqui, especular sobre quanto o PMDB de Temer gosta ou não das coisas como estão, o fato é que quem manda nesse jogo não são os políticos, é o Judiciário e, mais especificamente, a alta cupula, no STJ e no STF, as unicas autoridades habilitadas a dar o devido tratamento a bandidos com mandato. O que ha de mais deletério no empurra-empurra da Lava Jato, que é a impunidade dos “mandantes” que afronta a nação e corroi sua fé na política deixando-a exposta à tentação de aventurar-se fora dela, deve ser cobrado, portanto, do STF que, desde o “Mensalão”, mantem congelado tudo quanto subiu de Curitiba para lá. Como niguém é condenado nem absolvido a simples menção numa denuncia, espontânea ou encomendada, condena qualquer um ao limbo, o que anima as figuras mais notoriamente “carimbadas” da nossa pior política, que ha muito já poderiam e deveriam ter sido removidas, a se alvejar umas às outras com essa arma e, ao mesmo tempo, posar de vítimas. A frustração com a via legal que daí decorre anima os “justiceiros”, o que é sempre um perigo, e a exasperação geral faz com que o “patrulhamento ideológico” ocupe o espaço da razão na discussão das soluções possiveis que, é bom não esquecer, continuam dependendo fundamentalmente do engajamento do que ha de menos ruim dentro da política que temos.


É crucial a necessidade de deixar aberta a porta do apoio à Lava Jato à adesão de quem, mesmo dentro da política como ela é, gostaria de ve-la reformada. Não ha “virgens” nesse ambiente. Mas tampouco ha “militares” ou pais da pátria a quem recorrer. Por isso fechar essa porta tem sido o objetivo de todas as armadilhas manipulativas, estilo “Eu sou! Mas quem não é?” do lulismo, que marcam o processo desde o início. A questão do financiamento de campanhas foi a que obteve mais êxito. A razão é simples. O “caixa 2” sempre foi “anistiado”. Como vai ser no futuro é outra história mas não ha como negar que esteve legalizado “de facto” desde o primeiro dia da Republica. Nada poderia ser melhor para os inimigos da Lava Jato, portanto, que exigir, “em nome da moralização”, que se penalize retroativamente esse expediente de que nenhum político eleito pôde jamais abrir mão. Pois isso põe no mesmo saco coisas tão diferentes quanto os financiamentos de campanha por empresas privadas com que o país, a economia nacional e todas as democracias do mundo sempre, bem ou mal, conviveram e o saque desembestado ao estado, articulado por quem foi eleito para defende-lo, com o duplo propósito de minar as instituições da Republica e financiar um projeto de poder hegemônico com pretensões transnacionais ao qual associaram-se bandidos de colarinho branco com ambições igualmente “mega” que destruiu o Brasil e sua economia. Não apenas Curitiba, desde sempre, mas também o próprio STF, no capítulo “Mensalão”, estabeleceram claramente essa distinção. E não faltaram figuras jurídicas para condenar quem cometeu crimes. Deixar de considera-la iguala todos os doadores de campanha a Marcelo Odebrecht e todos os políticos à pior escumalha do “bas fond” do Congresso Nacional. O efeito prático foi jogar o PSDB no colo do PMDB e unir todos os partidos que não têm compromissos antidemocráticos explícitos contra “essa” Lava Jato que, desde que deixou de considerar o que distingue uns dos outros, todos passaram a precisar derrotar por questão de sobrevivência.

Tirar da Lava Jato o melhor que ela pode dar é coisa que depende essencialmente, portanto, antes de mais nada, de tirar a cupula do judiciário da sua inércia, pois a impunidade que corrói moralmente a nação é uma cadeia de cumplicidades que nada, rigorosamente nada, senão o rompimento do primeiro elo fará ruir. Sem isso, de empreendedores a “concurseiros”, o país jamais se convencerá de que não é só a bordo da nau dos exploradores que se chega à salvação, o tipo de raciocínio que, enquanto não puder ser respondido com fatos, impedirá que a democracia se instale no Brasil. Mas depende também do grau de maturidade com que encararmos essa luta épica. Não ha nenhuma diferença inata entre brasileiros e não brasileiros em matéria de corrupção. A diferença está no modo como se trata a corrupção flagrada aqui e fora daqui. O resto é puro Darwin. Sobrevive quem se adapta. O Brasil só sairá dessa crise com os políticos que tem ou, em outras palavras, se e quando entender que o que está errado não são propriamente as pessoas mas sim “o sistema” e que nem todas se deixaram corromper por ele na mesma medida.

Os sinais de que o país está pronto para essa emancipação são animadoramente persistentes. O brilho deste especial momento da nossa história está na crescente generalização da percepção de que se “a rua” continuar “falando” não ha o que possa resistir-lhe. A verdade é melhor que isso. Se “a rua” continuar “falando” a democracia se instala. A questão que importa é como institucionalizar a supremacia da voz das ruas; como dar-lhe canais e agilidade para se expressar; como viabilizar técnicamente a sua manifestação continuada até que se possa, a cada passo, executar o que ela mandar fazer sem manter o país parado e em permanente vigília física na praça publica.

As eleições distritais com direito a “recall”, e as prerrogativas de impor leis aos legislativos e “referendar” as que os legisladores baixarem por iniciativa popular são os remédios que, a partir dos municípios e dos estados, organizam e dão eficácia ao discurso inarticulado da democracia que se ensaia nas ruas do Brasil. Focar essa energia em mudar para sempre “o sistema” é a oportunidade que se nos oferece. Dirpersá-la numa gritaria meramente para sair caçando os indivíduos que ele obrigatoriamente entorta para ver quem vai herdá-lo é o jogo do inimigo.

Fernão Lara Mesquita

Imagem do Dia

A pequena Atrani, entre dois rochedos, no Mar Tirreno (Itália)

Dois momentos do ladrão

O movimento de carros era intenso na avenida do comércio. Desses que se o motorista não dirigir com cuidado ultrapassa o sinal vermelho e certamente será flagrado na infração pelo guarda ou, infalivelmente, pelo censor instalado no poste próximo da sinaleira.

A moto parou no sinal vermelho.

Apareceu como um raio, arma em punho, apontando para a cabeça.

– Passe a carteira, se tem amor à vida.

Branco de medo. Na garupa da moto a mulher chorava.

– Entregue logo, o que está esperando?

Adiante, o ladrão abriu a carteira, contou as cédulas com o dinheiro gordo. Todo risonho. Começava bem o dia.

Resultado de imagem para ladrão indenizado charge
De repente foi lançado ao ar. Caiu estatelado. A moto pegou a dele em cheio. Era aquele mesmo motoqueiro, que tinha sido antes a vítima daquele mesmo cara de cabelos grandes e olhos sanguíneos, pilotando uma moto veloz. A vítima, que de repente virou o agressor, melhor dizendo, agente, pegou a sua carteira que caiu no chão com o dinheiro gordo.

Saiu disparado na moto, a mulher na garupa cantando.

O ladrão entrou na delegacia, zangado.

O rosto inchado, o corpo doendo.

Contou o ocorrido ao delegado.

Várias costelas quebradas, o corte no rosto.

Perdeu quatro dentes, a boca ferida, a língua machucada.

Gosto de sangue pisado.

Escapou por sorte.

No final declarou:

– Quero ser indenizado.

Indenização gorda. Direito líquido, certo, inquestionável, pensou com a careta feia que fez no rosto.

Providências cabíveis deviam ser tomadas. Urgentes. O caso exigia rapidez em razão da estupidez daquele motoqueiro imprudente. Imprudência, negligência ou imperícia. Fosse o que fosse.

Cyro de Mattos

Dizem as más lendas que a gente se acostuma a tudo na vida

Dizem as más lendas que a gente se acostuma a tudo na vida. Não acredito nem desacredito nisso. Acredito, porém, que, após intenso trabalho consigo mesmo – de autodomínio, de relaxamento muscular (técnica eficiente para combater a tensão ou a ansiedade), de racionalização, de dedicação aos afazeres diários, de diversificação da rotina, de intensos exercícios físicos, além de muito exercício mental, incluindo-se aí a companhia de bons livros e de bons filmes (recomendo-lhe, por ora, leitor, dois: “La La Land” e “Lion: Uma Jornada para Casa”), a gente pode, no mínimo, tentar entender o que se passa em nosso país.

Na realidade, não deveríamos sofrer tanto (refiro-me, sobretudo, aos que conhecem um pouco da nossa história) com esses momentos difíceis por que passam os brasileiros hoje. A melhor receita, para os que nada sabem ou pouco sabem do que sempre foi nosso amantíssimo Brasil, está na recordação do seu passado mais longínquo.

Malfeitos, roubos e crimes, como esses que estamos vivenciando, diariamente, não são recentes. Na verdade, vêm sendo praticados aqui, neste país abençoado por Deus, há muitos e muitos anos, seja na iniciativa pública, seja na iniciativa privada. O domínio exercido por minoria reduzidíssima, que tomou conta do Estado e fez dele seu patrimônio, sempre impediu que viessem à tona. Simples assim.

A imagem levada ao ar pela TV Globo, quando trata da Lava Jato em seus noticiários diuturnos, me parece que é a que melhor explica, didaticamente, o que vem acontecendo. Aqueles dutos por onde escorre nosso enorme volume de dinheiro roubado nada mais são do que os intestinos do Brasil, que represam, há anos, continuadamente, matéria putrefata. Mesmo rompidos, em consequência da ação de alguns brasileiros determinados a combater a corrupção, e com forte apoio da sociedade brasileira, o excremento, para sair todo, demandará tempo.

O melhor mesmo, para todos nós, é acreditar no regime democrático como único capaz de dirimir questões como as nossas. Depois, antes de sair de casa pela manhã, é bom também admitir que o país já foi pior e que, por isso mesmo, vai melhorar. Assim, talvez consigamos enfrentar, finalmente, a terrível e desafiadora avalanche de notícias sangrentas que nos trazem todos os veículos de comunicação. Com certeza, isso nos ajudará a não jogar fora algumas noites de sono.

Pois essas notícias não cessarão tão cedo. O “jeitinho”, um expediente não só ilegal, mas totalmente imoral, se afeiçoou profundamente ao cotidiano dos brasileiros. Consertar isso não é fácil.

Prisões temporárias, preventivas ou definitivas, desde que em conformidade com a lei e o bom direito, podem ser oportunas e convincentes. As condenações também são importantes. Mas, se não se penetrar na base, isto é, na educação, nada impedirá que nosso país continue seguindo o mesmo rumo preconizado pelos seus “senhores”.

Investir pesado na educação seria a única resposta que se poderia dar à escritora Ana Maria Machado, que, no “O Globo” do último sábado, após inquirir, logo no seu início, “o que está acontecendo conosco?”, concluiu assim seu artigo: “Até quando? O que achamos que estamos construindo para o futuro?”. Por fim: “Em que isso tudo vai dar?”.

Ninguém sabe o que poderá acontecer ao país, mas sem o empurrão da educação, único meio de se construir um futuro de fato seguro, veremos já no que “isso tudo vai dar”. E não será nada bom.

O quadrado de cada um

O Supremo Tribunal Federal é composto por onze Ministros, brasileiros natos (art. 12, § 3º, IV, da CF/88), escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 e menos de 65 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada (art. 101 da CF/88). E são indicados e nomeados pelo Presidente da República, após aprovação pela maioria absoluta do Senado Federal.

Para a naturalidade e idade, basta uma certidão de nascimento.

Notável saber jurídico já deveria ter sido notado.

Reputação ilibada já deveria ter sido reputada (qualquer dúvida uma certidão de antecedentes resolveria).

Aliás, com boa vontade o Google resolveria tudo em um like.

Por que diabos então tanto lobby, tantas peregrinações a gabinetes do congresso, tanto almoços de domingo?

Só sobraram a nomeação pelo presidente (investigado no STF) e a escolha pela maioria do Senado Federal (investigada no STF).

Ainda bem que os juízes, em geral, à par de notável saber jurídico e reputação ilibada, comprovados em dificilimo concurso público, não dependem de investigados para serem nomeados.

E olha que, mesmo assim, às vezes aparece cada um…

Paisagem brasileira

Imagem relacionada
"Chuveiro" na caverna de Temimina, no Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira  (Adriano Gambarini)

Uma banda sã e outra podre

Há uma aparente contradição em termos no noticiário da semana passada. De um lado, sinais positivos começam a aparecer na economia, tornando o otimismo possível, ainda que com cautela. De outro, a pesquisa MDA/CNT flagrou a continuação de um vertiginoso desabamento do apoio popular ao governo que o promove.

“Devemos ter crescimento neste primeiro trimestre. O ponto da virada parece ter sido em dezembro”, disse o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Fabio Kanczuk, a Adriana Fernandes, do Estado. Nas contas do secretário, a reação aparece no desempenho do agronegócio, com uma safra recorde, o que não é novidade para ninguém, de vez que, apesar da tolerância do Estado brasileiro com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e outros similares, o setor continua sendo nossa galinha dos ovos de ouro. Mas, para surpresa geral, a alta burocracia da Fazenda garimpou boas novas na normalização dos estoques da indústria automobilística e no aumento do consumo, sobretudo em hiper e supermercados, para alavancar os bens não duráveis. A equipe econômica conta com a tendência de aumento de preços no mercado internacional de minério de ferro e a recuperação da construção civil por causa das medidas recentes de ampliação do programa social Minha Casa, Minha Vida. O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço também entra na lista, seja por causa da elevação para R$ 1,5 milhão do limite para compra da casa própria, seja pela injeção esperada de R$ 30 bilhões no mercado com a liberação de suas contas inativas. A manchete de capa do caderno de Economia & Negócios do Estado de sábado – Brasil registra entrada recorde de investimento estrangeiro em janeiro – pode prenunciar, além da rima, uma solução, parodiando o verso de Drummond.

Oxalá a virada, datada em dezembro último, não signifique que a economia possa ter capotado, mas que tenha chegado ao fundo do poço, a ascensão depois da queda. Aleluia!

O que, então, aconteceu nos últimos dias para a sociedade, em vez de estar aliviada com os bons indícios, ter ficado aborrecida com o governo, a ponto de manifestar o desagrado com este, caindo de 14,6% em outubro para 10,3% agora? Ou seja, levando em conta a avaliação mais recente da mesma pesquisa, o substituto está 0,9 ponto porcentual abaixo da última avaliação da antecessora, à época do desfecho do processo do impeachment dela, qual seja, de 11,2%. Mais preocupante ainda para o atual presidente, e seus aliados do PMDB e do PSDB, é que, ao contrário do que seria de esperar depois do massacre do Partido dos Trabalhadores (PT) nas urnas, Lula subiu na preferência popular para 30,5% dos cidadãos.


A 19 meses do pleito eleitoral, os números relativos à intenção de votos são, na prática, desprezíveis. Eles revelam, entretanto, enorme desconhecimento da massa acerca da absoluta responsabilidade do ex-presidente pela crise que levou o País à quebradeira das empresas, ao desemprego recorde de 12 milhões de trabalhadores desocupados, à queda da arrecadação e a todas as consequências nefastas de 13 anos, 5 meses e 12 dias de desgovernos federais petistas. O descompasso entre a realidade e a impressão popular é explicado pelo talento de comunicador do ex-dirigente sindical, posto em confronto com o amadorismo injustificável da comunicação na gestão de um governante que pretende ser reconhecido como “reformista”.

Esse profundo e evidente paradoxo poderá, de um lado, prolongar o calvário da falta de credibilidade de Temer e, de outro, servir para realizar as pretensões de volta ao poder do “sapo barbudo” de Brizola. Desde o começo a atual gestão padece de uma esquizofrenia institucional aguda: a respeitável equipe de técnicos dá duro para sanear e reconstruir a economia, enquanto a banda podre de políticos faz o diabo para escapar da cadeia.

O presidente faz juras de fidelidade ao inédito processo de depuração, que tenta dar cabo ao conúbio entre gestores corruptos da República e empresários que dilapidam o patrimônio público e desmoralizam a democracia, mas age no sentido oposto. Governa de joelhos para o País oficial e de costas para o Brasil real.

Lula, Dilma e o PT prometiam “mudar tudo o que está aí”, mas levaram aos mais sórdidos exageros a malversação do erário. Isso explica por que o petista Tarso Genro disse ao juiz Sergio Moro que sua grei pratica o caixa 2, crime nocivo às finanças públicas e à competição entre empresas, sem a qual o capitalismo perde a razão de ser. Delatado na Lava Jato como receptador de R$ 7 milhões de propinas da Odebrecht, o ministro da Indústria (!), Marcos Pereira, do PRB do bispo Edir Macedo, confessou, candidamente, que pediu doações para a campanha de seu correligionário Marcelo Crivella. O uso do cachimbo entorta a boca e, no caso, também a ética da fé que ele diz seguir – dos dez mandamentos de Deus, o que proíbe furtar.

Temer indicou e dispensou do expediente seu ministro da Justiça, durante o motim da PM capixaba, que resultaria em 149 mortes, para ocupar uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). Ele foi acusado de plágio, o que implica falta de notório saber e de reputação ilibada, e pilhado “simulando” sabatina em festa numa chalana, regada a champanhota flutuante. Mas nada abalou suas pretensões ao posto.

O presidente conseguiu ainda do amigo decano do STF autorização para blindar outro amigão das garras da primeira instância. E o abrigou à sombra da mesma Suprema Tolerância Federal em nome da prerrogativa de foro, a mais hipócrita violação da igualdade de todos os cidadãos perante a lei que se pode imaginar em qualquer Estado de Direito.

Diante disso, resta-nos rezar para a banda sã da economia prevalecer, antes que a banda podre da política a afunde no lamaçal da safadeza geral em que estamos atolados.

Não há aliens no Supremo

Resultado de imagem para alexandre de moraes piscando olho na sabatina
A aprovação de Moraes sepulta o mito de que ministros do STF são aliens de Trappist-1, sem lado nem viés. Humanos, eles formam um tribunal que é alvo de lobbies empresariais e partidários, que sofre pressão da opinião pública e faz julgamentos políticos. É tão sujeito a crises quanto o resto da praça dos Três Poderes. Para a imagem do Supremo, a Lava Jato não será outro mensalão. Os vizinhos estão vibrando. Há tempos não se sentiam tão iguais

Corrupção e ganância fazem mal à saúde

Resultado de imagem para corrupção faz mal à saúdecharge
Enquanto no Brasil a cobiça motivou a turma da Lava Jato a buscar vantagens e ganhos ilegais, apenas para atender desejos e não necessidades, o resultado de estudo realizado na Universidade de Havard sobre o Desenvolvimento Adulto adoça a alma de quem não gasta a vida correndo atrás do dinheiro, bens materiais e fama a qualquer custo. Ao contrário do que corruptos e corruptores podem acreditar, nada disso mantém a saúde, garante vida boa, longa e felicidade pelos anos afora. Pelo contrário, poderão ficar doentes, dementes e morrer mais cedo do que as pessoas que despendem suas energias na manutenção de boas relações com familiares, amigos, amores e a sociedade.

Paralelamente, outra pesquisa revelou que o maior objetivo na vida de 80% dos jovens da geração” Y é ficar rico. E 50% desses jovens adultos admitiram que a fama é o que mais desejam. E a maioria enfatizou como prioridade o trabalho e trabalhar muito para concretizar esses projetos de vida. Para todos eles, essas são as coisas que se devem buscar para ter uma boa existência. Mas isso é o que se pode apurar indagando pessoas sobre seus sonhos num determinado momento das suas vidas e não ao longo dela.

Difícil mesmo, quase impossível, seria conseguir um olhar de 360 graus sobre toda a existência de uma pessoa, obter imagens de sua vida inteira, analisando as escolhas feitas e os resultados que lhe trouxeram. Mas essas dificuldades não impediram a equipe de Harvard de concluir estudo raríssimo, iniciado há 77 anos, somente possível graças à persistência de várias gerações de pesquisadores. Eles acompanharam a trajetória existencial de 724 homens, ano após ano, perguntando-lhes sobre suas vidas domésticas, seus trabalhos, saúde, sem saber como seria o desfecho de cada uma delas.

Em 1938 começaram a analisar as vidas dos integrantes de dois grupos, um que estava no segundo ano da Universidade de Havard e, o outro, de meninos pobres de um bairro de Boston. No primeiro grupo, todos terminaram os estudos durante a segunda guerra e a maioria foi servir no front. Todos os adolescentes menos favorecidos foram entrevistados, fizeram exames médicos e tiveram suas pobres casas visitadas .Alguns tornaram-se operários ,profissionais liberais e um até foi eleito Presidente dos Estados Unidos ,mas nem todos foram bem sucedidos.

Todos os homens dos dois grupos tiveram suas vidas radiografadas, com entrevistas aos filhos, parentes e mulheres sobre quais eram suas maiores preocupações. Atualmente, 60 dos 724 pesquisados continuam vivos, alguns beirando os 90 anos e começa-se a estudar seus mais de 2 mil filhos. A cada dois anos , a equipe de pesquisadores continua a entrevistá-los em suas casas para saber mais e mais sobre seu cotidiano, filmando cenas domésticas e preenchendo questionários com inúmeras questões sobre todos os aspetos das suas vidas.

A lição sobre esses 77 anos de estudos não são sobre riqueza, fama ou excesso de trabalho. Os pesquisadores concluíram que bons relacionamentos mantém as pessoas mais felizes e saudáveis. Uma das lições obtidas com a pesquisa foi que conexões sociais são boas enquanto a solidão mata. Pessoas mais conectadas familiar e socialmente são mais saudáveis e felizes. As mais isolada do que gostariam são menos felizes, a saúde declina precocemente na meia idade,o cérebro se deteriora mais cedo e vivem menos do que os que não são solitários.

Nem fama, nem riqueza nem demasiado trabalho tornou qualquer desses homens mais felizes. Com base em tudo que sabiam deles desde a juventude, os pesquisadores perceberam que não foram seus níveis de colesterol na meia idade que indicaram como seria seu envelhecimento. Os homens que estavam mais felizes nos seus relacionamentos e convivência social aos 50 eram muito mais felizes aos 80. Eles perceberam ainda que as relações saudáveis não protegeram apenas seus corpos mais seus cérebros. A passo que situações de conflito com amigos, familiares e a sociedade conduziram a resultados diferentes. As pessoas que melhor se deram bem na vida foram as que melhor se relacionaram e possuíam o respeito da família, amigos e comunidade, que é exatamente o que falta à turma da Lava Jato. Já notou como alguns dos que se tornaram réus, estão ou foram presos vem apresentando doenças graves, que nenhum dinheiro cura?

A náusea real

Waldemar das Chagas foi um poeta de São João de Meriti, município da Baixada Fluminense, da geração de Solano dos Reis e Heitor dos Prazeres, todos intelectuais à margem da academia e pioneiros do movimento negro no Rio de Janeiro, ao lado de outros negros que abriram caminhos, antes e durante o regime militar, como Abdias do Nascimento, Carlos Moura e Geraldo Rodrigues do Santos, este último na mais dura clandestinidade. Tive a honra de conviver com Waldemar como repórter, ele no O Globo e eu no O Dia, no começo dos anos 1970, quando a imprensa carioca resolveu fazer uma campanha contra as execuções do Esquadrão das Morte. É dele a poesia que intitula a coluna, um quase haikai: “O rei tirou os óculos/ escuros, os vassalos/ viram a náusea/ nos olhos do rei/ a náusea real / do rei”.

Quem já foi rei não perde a majestade. Ontem, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu, por quatro votos a um, que o juiz Sérgio Moro, da Justiça Federal no Paraná, não pode utilizar citações feitas pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado ao ex-presidente José Sarney em investigações da Operação Lava-Jato que tramitam na primeira instância. O relator da Lava-Jato no Supremo, ministro Luiz Edson Fachin, manteve decisão de Teori Zavascki, de setembro do ano passado, que havia entendido que os fatos poderiam ser analisados por Moro, mas o novo relator foi derrotado pelos pares.


Resultado de imagem para sarney foge de moro charge

No entendimento dos ministros Gilmar Mendes, presidente da Segunda Turma, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Celso de Mello, as citações a Sarney estão diretamente relacionadas a autoridades com foro privilegiado no Supremo e devem continuar sob análise no STF. Aceitaram um recurso da defesa de Sarney. Cristão novo na turma, Fachin ficou completamente isolado: “Não se trata de desmembramento dos fatos, apenas de compartilhamento das informações. Tenho por mim que essa decisão do relator atende interesse da apuração criminal”, ainda argumentou, sem sucesso.

Sarney não tem foro privilegiado no Supremo porque não é mais senador. Um inquérito aberto pelo Ministério Público Federal no começo deste mês apura se atuou para tentar obstruir as investigações da Lava-Jato, junto com os senadores Renan Calheiros (PMDB-AL) e Romero Jucá (PMDB-RR). Conversas entre eles foram gravadas por Sérgio Machado, que apresentou os fatos em seu acordo de delação premiada. Sarney, porém, foi citado em outro contexto: teria pedido ajuda financeira para manter sua base no Amapá e no Maranhão. Teria recebido R$ 16,25 milhões de propina, em dinheiro vivo, pago entre 2006 e 2014; além de ter recebido mais R$ 2,25 milhões em doações oficiais, totalizando R$ 18,5 milhões. Esse fato agora só poderia ser analisado pelo STF.

Às vésperas do carnaval, o ministro Dias Toffoli, com sua interpretação vitoriosa, abriu uma avenida para os ex-presidentes da República eventualmente citados nas delações premiadas da Odebrecht ficarem na alçada da Segunda Turma do STF. A tese: já há inquérito aberto para investigar Sarney no Supremo com outros senadores; as citações feitas por Sérgio Machado estão “imbricadas” a fatos relacionados a pessoas com foro privilegiado. “Vou agir por coerência com a minha jurisdição, no sentido de acolher o primeiro pedido, de que fique sob jurisdição desta Corte”, os termos da delação de Sérgio Machado que citam Sarney.

Não será surpresa se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva agarrar com as duas mãos essa possibilidade para sair da alçada de Sérgio Moro. Já fez várias tentativas. A decisão foi um duplo freio de arrumação: restringiu o poder de Sérgio Moro e mostrou a Fachin que as liminares do falecido ministro Teori Zavascki podem ser reformadas, mesmo contra a opinião do novo relator. Há ministros na Segunda Turma indicados por Sarney, Celso de Mello; Fernando Henrique Cardoso, Gilmar Mendes; Lula, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski; e Dilma, Fachin. Indicado por Collor de Mello, já enrolado na Lava-Jato, o ministro Marco Aurélio participa da Primeira Turma.

Luiz Carlos Azedo