quarta-feira, 13 de setembro de 2017


Vícios públicos, benefícios privados

Há mais de dois séculos, a teoria econômica utilitarista definiu que se cada indivíduo procurasse o melhor para si, num sistema de interações que impõem limites ao egoísmo, todos poderiam ganhar. Não se inibiria o egoísmo de cada um; pelo contrário, seria mesmo estimulado, pois o egoísmo de um é natural limitante ao egoísmo de outro: guerra e caos não interessam a ninguém, sua perspectiva age como um corretor natural. ''Vícios privados, benefícios públicos''.

Porém, os seres humanos não são abelhas, onde tudo parece compor uma ordem natural; encontrar o equilíbrio não é obra certa; faz-se necessária a intervenção humana e a construção de outros fatores: em primeiro lugar, o desenvolvimento de sentimentos éticos; depois, a construção de instituições que saibam inibir e corrigir excessos, impondo parâmetros individuais que somem ao conjunto dos interesses ao invés de subtrair.

É, com efeito, uma visão idealista. Ainda assim, longe de ser moralista ou normativa. Apenas tenta indicar uma dinâmica social cujo resultado é racional e utilitário: a soma de interesses individuais não leva necessariamente a ganhos gerais, mas o bem-estar geral é, evidentemente, o bem de cada um. Logo, na busca do bem pessoal, todos racionalmente, voltam-se também a fazer concessões ao coletivo.

Deixando a profundidade de lado, é importante dizer que, nesta quadra histórica em que o país vive, nada parece estar mais diante da realidade. Uma rápida olhadela no noticiário faz suspeitar que, no Brasil, os benefícios privados têm levado a vícios públicos. Ou, antes, são os vícios públicos que têm levado aos benefícios privados? E nada concorre ao bem coletivo que garante a satisfação de cada ser.


Basta pegar um exemplo, o da J&F (mas não só): foram os benefícios de seus proprietários que viciaram as instituições ou foram antes os vícios institucionais que beneficiaram os Batistas? Fosse este o único caso que pudesse ser mencionado, estaríamos bem. Mas, o país tem Joesleys por aí às mancheias que corrompem e são diariamente corrompidos: o que ou quem nasceu primeiro?

No momento em que se demoniza os executivos da gigante de proteína animal, com uma CPMI no Congresso Nacional, é importante não perder de vista o processo interativo entre o sistema político, as instituições de controle e os interesses privados que sempre se confundiram no Brasil.

De fato, eles não são santos, mas, Joesleys existem também porque dezenas de atores públicos, políticos ou não, são tão profundamente viciados em benefícios particulares quanto os primeiros. O mais provável é que vários senadores e deputados presentes naquela comissão não destoem do enredo geral. Como poderiam julgar com isenção? Vícios públicos e benefícios privados conformariam hoje um contaminado esquema de interesses e conexões.

À parte disto, na sociedade, o país parece ter perdido referências éticas; ou, antes, as trocou por narrativas de autointeresse, patrulhas ideológicas e a preservação de corruptos de estimação. A intolerância que cega e faz perder o sentido do interesse geral. Não há, neste momento, preocupação em construir escadas eficientes e duradouras que retire a todos do fundo do poço que a dinâmica política abriu no meio do território nacional.

Também aqui não se trata de discurso moral; a questão passa pela salvação utilitária: é importante encontrar algum tipo de equilíbrio antes que tudo despenque pelo desfiladeiro e a sorte individual nada mais seja que o azar coletivo. Preocupados com seus filhos, cada indivíduo deve lutar pelo futuro. Praticar a arte da Política — ou aquilo que a política deveria ser — consiste em considerar a existência dos filhos do vizinho.

Carlos Melo 

Crime e casino na eleição de 2018

Adeptos do governismo, adesistas por interesses diversos, animaram-se com as notícias econômicas e político-judiciais de setembro. Acreditam que o programa liberal tem mais chance de sobreviver até a eleição de 2018 e depois.

Os motivos da animação são três.

Um, o suposto enfraquecimento da Procuradoria-Geral da República e até da Lava Jato, dada a lambança no caso Joesley, o que reduziria a probabilidade de queda de Michel Temer ou de tumulto político crítico para a economia. No limite do otimismo, essa estabilidade podre tornaria possível até a aprovação de alguma reforma da Previdência.

Dois, a derrocada de Lula tornaria improvável a vitória da esquerda em 2018.

Três, mesmo a recuperação nanoscópica da economia, com perspectiva de um crescimento de 2% e algo mais em 2018, baixaria o nível de tensão socioeconômica, o que diminuiria o apelo de candidaturas "extremistas", "populistas" etc.

Hum. Se fosse preciso jogar na Mega-Sena política nesta quarta-feira (13), não seria desarrazoado dizer que a chance de queda de Michel Temer baixou bem.

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Mas abriu-se um terceiro inquérito contra Temer; a turumbamba política, a volatilidade, continua. Além do mais, até agora o custo de evitar a decapitação do presidente tira ainda mais votos das reformas. A política ainda está no cassino dos gângsteres.

Sim, Lula está perto de sair de campo, expulso ou arrebentado. Sim, a economia tende a despiorar até 2018.

Ainda assim, cabem pelo menos duas perguntas a respeito do efeito dessas mudanças:

1) o que significa despiora?;

2) em quais termos vai se dar o debate da eleição (que é sempre político, que não depende apenas de economia)?

A diminuição do medo de perder o emprego ou de não reencontrar algum pode ser relevante (afinal, 87% da população não está desempregada).

A inflação baixa, a queda dos juros enfim chegando ao crediário e um ambiente menos desanimador podem mudar os ares de 2018 (embora as melhoras na inflação e nos juros tendam a zero ao longo do ano que vem).

Neste 2017, o PIB per capita ainda vai cair, embora a renda média dos salários comece a subir (bem menos para os mais pobres, a maioria).

Mas como o eleitor vai processar tais despioras? Não é impossível que empresas e consumidores reajam de modo extraordinário a juros, dívidas e inflação menores. Isto é, que consumam e invistam mais que o previsto. Quem sabe o crescimento vá além de 2%, 3%.

Mas a ociosidade da indústria está ainda no nível do fundo da recessão em 2016; o investimento, que poderia fazer saltar o PIB, deve ficar na retranca. O governo ainda cortará seu investimento. Os serviços públicos ainda vão minguar. Os empregos são piores.

Pouco se pensa sobre qual será a memória que ficará destes quatro anos de catástrofe social, econômica; de mentiras, descrédito, estelionatos e crimes piores na política. Pouco se pensa sobre a má fama que as reformas ganharam com Temer ou sobre o efeito do custo socialmente desigual do ajuste econômico.

O debate político de 2018 não está dado. Sim, as pesquisas parecem indicar que o eleitor quer "um novo". Até que alguém, talvez, invente um programa e uma conversa novos, de fato, que embaralhem os termos ora tidos como previsíveis da campanha eleitoral.

Lula fingindo ser Lula

Se dependesse da arte de representar eu estaria sujeito à morte por inanição. Não consigo imitar sequer a mim mesmo. Por isso, aprecio o dom e o talento dos bons imitadores, especialmente se associam essa capacidade com a produção de textos de humor para, com sua dicção, desempenharem tais habilidades.

O ex-presidente Lula tem sido um prato cheio para imitadores. Recentemente, circulou nas redes sociais um áudio em que ele estaria falando com Rui Falcão sobre o desastre que representava o depoimento de Palocci. Numa torrente de palavrões, tendo ao fundo sons do Jornal Nacional para dar foros de veracidade à gravação, o ex-presidente esbravejava contra o delator por estar "entregando tudo".

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Semana passada, a coluna Painel, da Folha, contou que o deputado Fábio Faria (PSD-RN) ligou para seu colega Dudu da Fonte (PP-PE) fingindo ser Lula e gravou a conversa. O pernambucano, ao ouvir a voz do outro lado da linha perguntando-lhe se estava em Brasília e se poderia conversar, exclamou exultante: "Presidente, que saudade!".

Ainda que Lula suscite afeto políticos, parece mais provável que tais efusões estejam referenciadas aos tempos de bonança que a conjuntura internacional proporcionou aos países em desenvolvimento nos primeiros anos deste século. Eram tempos em que se consolidou na América Ibérica o prestígio de alguns governantes com estratégias populistas semelhantes às de Lula: os Kirchner, Hugo Chávez, Evo Morales, Rafael Correa, Daniel Ortega. De todos, tirante o destino incerto do "bolivariano" refundador da Venezuela, o brasileiro é o mais encrencado, tal a teia de corrupção em que se envolveu.

O desditoso petista se tornou o pior imitador de si mesmo. Os demais que o arremedam têm o humor a seu favor. A gente os ouve e ri. Lula nem isso. O que dele se escuta é pura falsificação, hipocrisia, bazófia, num script composto para colher aplausos de um público descrente mas aprisionado na rede dos favores. Os pequenos favores ao rés do chão; os grandes favores no alto do palanque.

Percival Puggina

Gente fora do mapa

St.Johns, capital de Antígua e Barbuda, depois do furacão Irma

'Nóís' não vai ser preso

Os tempos são pródigos em estampar infames símbolos locais. O que vai volta; o escondido aparece fulgurante. Colhemos o que plantamos. O País é assombrado por uma epopeia de arranjos impensáveis pelo bom senso e rejeitados pela honestidade.

Mas tudo tem limite, esse estilo surge na obscena imagem - uma das fotografias mais pornográficas que vi em toda a minha vida - de uma batelada de dinheiro. Eis que, no chão de uma sala vazia de um prédio residencial, oito malas e quatro caixas abertas expõem despudoradamente maços de dinheiro. De “dinheiro vivo” - dinheiro nu, cru e roubado - que, sem dono ou banqueiro, jaz inerte e desamparado no vácuo de uma sala.

O cenário sugere um dinheiro com um dono tão poderoso que ele pode permanecer oculto. Tal como os tesouros enterrados por piratas, escravocratas sovinas e os administradores do patrimônio público - os donos das chaves do reino estatal - essa imensa quantidade de riqueza é impedida de circular em benefício da sociedade.


Poucas vezes na minha longa vida vi uma paisagem tão bizarra como a desse tesouro de R$ 51 milhões em busca de um dono. A cena das malas transbordantes de grana assusta na sua poética e libidinosa impessoalidade de natureza-morta. Todo dinheiro escondido, enterrado ou imobilizado pela troca antissocial (a chamada propina), transforma dinheiro em podridão. Pois o dinheiro, como o poder, só têm existência legítima quando entra em circulação e, como as palavras, é posto ao alcance de todos. Dinheiro oculto e sem dono é - como os maus sentimentos - um sintoma de pestilência. Da peste que tortura mais do que a morte, porque o nosso formidável sistema legal tem o viés da impunidade - do privilégio, dos recursos e da prescrição.

Nada se encaixa melhor com essa tonelagem de dinheiro vivo do que a morte da ética e do bom senso. Da moralidade que tem sido impiedosamente assassinada pela aliança fluida e feita de sangue - na precisa e mafiosa linguagem do companheiro ministro petista de todas as horas, Antonio Palocci, o italiano - entre o populismo sacana e as ambições empresariais que desonram e ajudam a demonizar qualquer sistema econômico. Ambos com horror à competição e ao mérito. Ambos apaixonados pela excelência monopolística e totalitária, que é o lado mais tosco de um capitalismo de compadres desse velho Brasil de todas as “Brás” que, espero, estejam nos seus estertores.

As pencas de dinheiro pornograficamente expostas são a vergonhosa contrapartida de um sistema político incapaz de domesticar afeitos, aventureiros e picaretas operadores. Esses tais doleiros encarregados da mediação entre ideologias generosas e o brasileiríssimo desejo socialmente aprovado de se arrumar por meio do Estado. Esse desejo, sejamos honestos, que sem jamais ter sido trazido à luz do dia consegue orquestrar o roubo familístico de recursos públicos como um projeto positivo. Se eu não fizer, outro vai fazê-lo - diz o mandamento.

Descobrir, como ordena o eufemismo policial e legal, quem é o dono do tesouro é mais uma história da carochinha. Pois num sistema hierárquico, no qual a República tem sido canibalizada por cargos que preservaram prerrogativas e privilégios das velhas nobrezas, todos sabem que o dinheiro é da sociedade. E foi dela afanado - eis a traição - pelos que por ela foram eleitos para administrar suas riquezas. A quebradeira do Brasil é tanto mais revoltante quando se sabe que ela foi um dos saldos daqueles que mais prometeram salvar o País.

Esse é símbolo maior desse tesouro perdido e achado num apartamento. Nele está sinalizada a urgência de que o Brasil precisa redefinir o que é de quem e, ao fazer essa atribuição, alocar sérias responsabilidades reais (e não apenas legais) a seus administradores. Não se pode mais continuar com uma leitura do público como um espaço que, sendo de todos, não é de ninguém, pois é justo nessa cultura do quanto maior o cargo menores a responsabilidade e a possibilidade de punição que surgem esses empresários capazes de comprar milhares de políticos que se colocam permanentemente à venda. São eles que - donos do poder e patrões das ideologias - proclamam em alto em bom som: nóis não vai preso! Queridos leitores, o erro crasso não é de gramática, é de democracia!

A mentira é nociva

O homem culto que conscientemente apoia o erro e é conivente com mentiras e falsidades, não age apenas contra as leis orgânicas e fundamentais da pessoa humana. Não está fazendo nada de útil a seu povo, apesar de assim parecer.

Muito ao contrário. Prejudica o povo, envenena-lhe o pensamento, viola-lhe os direitos e presta ajuda a tudo quanto lhe é nocivo e prejudicial
Hermann Hesse

Mãos limpas, Lava Jato e a natureza da corrupção

Eis como o ex-procurador italiano Gherardo Colombo resumiu o resultado da Operação Mãos Limpas, oito anos depois do início: “Do ponto de vista jurídico, a Mãos Limpas foi inútil, ou pior ainda, nociva: o fracasso quase total em garantir condenações reforçou a sensação de impunidade que reinava na Itália antes de 1992”. De lá para cá, nada mudou. “A Itália pode ser vista como um modelo fracassado dos mecanismos institucionais ordinários no combate à corrupção numa democracia”, escreveu o cientista político Alberto Vanucci, da Universidade de Pisa. Inspirada na Mãos Limpas, a Operação Lava Jato tem seguido o roteiro italiano à risca. Até mesmo nos ataques sofridos, não apenas dos políticos atingidos, mas de advogados, juristas, juízes e na própria imprensa. “Ha muita semelhança entre os dois países, inclusive a esperança de um modelo de política livre da corrupção institucionalizada”, escreve o procurador Rodrigo Chemim em Mãos Limpas e Lava Jato. “A diferença é que os italianos perceberam que muito pouco mudou na realidade corrupta da política do país. E no Brasil? O que se pode esperar?”

Charge do dia 13/09/2017

Chemim faz uma análise comparativa excepcional das duas operações. Com a sensibilidade de quem conhece de perto Brasil e Itália, vai além das semelhanças e diferenças óbvias. Todos já sabem que ambas se beneficiaram de colaborações premiadas, prisões preventivas e exposição dos escândalos. Ou que a influência da Máfia e a presença de uma figura singular como Silvio Berlusconi fazem da Itália um caso sem paralelo. Mas poucos prestaram atenção a outras características comuns, mais que coincidências: a origem em casos aparentemente banais, os métodos usados para lavar dinheiro, as falcatruas com petrolíferas e obras da Copa do Mundo, os ataques atribuindo motivações políticas a juízes e procuradores, a polarização em torno dos principais nomes (aqui, o juiz Sergio Moro; lá, o procurador Antonio Di Pietro), as justificativas idênticas dos acusados para o uso de caixa dois (“todos fazem”), as acusações de “criminalização da política”, de atuação em nome de interesses estrangeiros ou de “golpismo” – e, sobretudo, a reação contra as investigações.

Apesar das ameaças, até agora não houve por aqui a violência da Máfia, nem os suicídios (ou homicídios) em série, que voltaram a opinião pública italiana contra a Mãos Limpas. Em termos políticos, porém, a semelhança é absoluta. Parlamentares brasileiros hoje estudam a fundo a legislação aprovada nos anos seguintes à Mãos Limpas, responsável por tornar a Itália um paraíso ainda maior para os corruptos. Por enquanto, não prosperaram as tentativas de anistia para caixa dois ou de criar entraves ao trabalho de juízes, policiais e procuradores. Mas não estão paradas. Chemim elenca 23 medidas legislativas italianas em prol dos corruptos – algumas com nomes sugestivos: “decreto salva-ladrões”, “escudo fiscal”, “lei salva-corruptos” e uma anistia conhecida como “alegria no cárcere”. Poucas foram rejeitadas ou julgadas inconstitucionais. “Sanções políticas contra os envolvidos em escândalos de corrupção, tradicionalmente já bem moderadas, tornaram-se virtualmente inexistentes”, escreveu Vanucci. “A probabilidade de agentes corruptos terem sucesso em suas transações aumentou. E, se a corrupção é mais segura, há um incentivo maior a praticá-la.”

Chemim recomenda prestar atenção ao Congresso, onde políticos agem de modo sorrateiro. “O perigo aumenta à medida que a poeira baixa, e aí aumenta o risco de o Brasil seguir a mesma sina da Itália”, diz. “Compreender o que aconteceu lá é, portanto, fundamental para que não se repita aqui.” É justamente nessa compreensão que sua análise deixa a desejar. A corrupção sistêmica, como a brasileira ou italiana, tem natureza dupla, cultural e econômica. Chemim enfatiza o lado cultural: a escolha individual dos corruptos, sua estrutura moral, psíquica, até mesmo religiosa. Mas a mente dos indivíduos é uma esfera distante da ação do Estado. Transformações no campo econômico e institucional, ao contrário, estão na raiz do sucesso de países que conseguiram derrotar a corrupção, como os Estados Unidos no início do século XX. Menos estatais, mais competição, licitações transparentes e instituições mais fortes são a chave para combater o capitalismo de compadrio, no Brasil, na Itália ou em qualquer país. A corrupção sistêmica derivada dele não é um defeito moral ou uma doença, mas um sintoma natural da sociedade, diante de incentivos econômicos perversos. Para combatê-la, é preciso, portanto, mudar os incentivos. Primeiro, como sugere Colombo, acabar com a sensação de impunidade, dar às instituições o poder real de fiscalizar, investigar e punir. Segundo, criar leis que respeitem a realidade econômica. Do contrário, a realidade é que se imporá sem respeitá-las.

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Mineke Reinders

O código petista

Antonio Palocci tornou-se a figura mais execrável para militantes, dirigentes e intelectuais do PT, desde seu depoimento bomba sobre o pacto de sangue entre Lula e a Odebrecht.

A ex-presidente Dilma Rousseff o comparou aos “cachorros” da ditadura – militantes da esquerda que se bandearam para o lado da repressão e entregaram muitos dos seus companheiros assassinados.

Já Frei Beto quer queimá-lo na fogueira da inquisição e prega sua expulsão por ter maculado sua “imagem de fundador do partido”.

O expurgo pode acontecer numa questão de dias.

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Há consenso entre os petistas de que Palocci não teve a mesma estatura de José Dirceu e João Vaccari, os verdadeiros heróis da “causa proletária”.

O próprio José Dirceu encarrega-se de alimentar a lenda do seu martírio, ao dizer que prefere "morrer a rastejar e perder a dignidade“. Ou seja, ele é o herói, Palocci, a figura abjeta do traidor.

O velho guerrilheiro stalinista deu a senha para o PT traçar a linha divisória entre o herói e o traidor, ao afirmar: “Só luta por uma causa quem tem valor. Os que brigam por interesse tem preço”.

Aos poucos o PT vai construindo uma narrativa de redução de danos para que uma eventual delação de Antonio Palocci não faça uma razia em suas fileiras semelhante à do Relatório Kruschev nos partidos comunistas.

O código de conduta do PT não difere muito do código stalinista, que também tinha sua Omertá. Ramón Mercader cometeu um assassinato vil, o de Leon Trotsky. Mas como manteve o silêncio sobre sua identidade e de sua ligação com os serviços secretos de Stalin, foi condecorado com a medalha herói da União Soviética após cumprir pena de 21 anos de prisão.

Terminou seus dias cuidando de seus cachorros - sem nenhum trocadilho com os “cachorros” da ditadura e os do PT – em Cuba, a mesma Cuba na qual Dirceu se refugiou nos anos 70.

A régua petista não viu traição de Palocci quando o então Ministro da Fazenda frequentava em Brasília a mansão da “República de Ribeirão Preto”- a casa de cômodos onde se intermediavam interesses em meio de garotas de programa.

Tampouco viram o menor desvio ético no fato de seu modesto patrimônio do início dos anos 2000 ter saltado para a casa de milhões de reais, a ponto de movimentar, na conta pessoal e na de sua empresa R$ 216 milhões entre 2010 a 2015. Até aí ele era o companheiro Palocci, pai da Carta ao Povo Brasileiro, o brilhante estrategista, o “consiglieri” de Lula mesmo depois de deixar a vida pública.

O Palocci que humilhou Francenildo Costa -e usou a mão pesada do Estado para quebrar o sigilo do caseiro- contou com a solidariedade e respaldo da cúpula petista, incluindo aí a de Lula. Nisso, não viram nada demais. Tanto que ele voltou como manda-chuva na campanha e depois chefe da Casa Civil do governo Dilma.

Só foi rebaixado para o status de traidor quando revelou os pecados de Lula ao juiz Sérgio Moro. Aí o PT, bem ao gosto da cultura stalinista, começa a reescrever a história.

Enquanto endeusam a “firmeza proletária” de José Dirceu e Vaccari por terem suportado tudo em nome da causa, acusam Palocci de “jamais” (!!!) ter tido qualquer compromisso com ela.

Seu arrivismo, portanto, viria desde os seus tempos da corrente trotskista Libelu, da época em que vendia estrelinhas e camisetas do PT.

É sem pé e cabeça a história de que um é arrivista e os outros são dedicados servidores da causa. Os fatos estão aí a mostrar quão tênue é a fronteira entre quem roubou para o partido e quem roubou para benefícios pessoais.

José Dirceu está condenado por enriquecimento ilícito, por intermediação de interesses para obter vantagens pessoais. E o que há de ideológico na venda de medidas provisórias, nas palestras de Lula pagas pela Odebrecht, no sítio de Atibaia, no tríplex do Guarujá ou nos vários milhões de reais recebidos para compra de terreno e construção de seu museu/instituto?

A ideologia não tem o poder de mudar a natureza das coisas. A morte de Trotsky não deixou de ser um crime ignóbil só porque assassino teve como motor a defesa da “Mãe Pátria do Socialismo”, que Stalin julgava ameaçada enquanto seu arquirrival estivesse vivo.

Da mesma maneira, o assalto aos cofres públicos sob o patrocínio do PT não deixa de ser crime execrável só porque foi feito em nome dos supostos “interesses do povo”.

O verniz ideológico não elude o fato de terem cometido um crime muito mais grave: atentar contra a República, enganar e fraudar milhões e milhões de brasileiros.

O código de conduta petista é uma visão deformada da realidade, produto da ideologia do partido-fim. Mais precisamente na sua transformação em uma seita. Na vida real e para além da ideologia, nem José Dirceu é herói, nem Antônio Palocci é traidor. Os dois são bandidos e foram condenados como tais. Assim como a seita petista agiu como uma organização criminosa.

Paraíso perdido

Um secreto acordo, em secreta comunhão, prospera. A facilidade de transgredir e infringir leis, espécie de osmose em organismo combalido, é a prévia manifestação do delito que marca o período. Curvado à adulação e ao cifrão, tudo vem como uma escritura que atrai quem já tem em si o germe desse temperamento. A ambição é uma intuição, o interesse estrutura a intenção. O anjo cobiçoso usufrui do paraíso a qualquer preço. Beneficiários de dádivas excessivas não veem víboras na lisonja, convencidos de que o carisma que os protege é o de um rei.

O nome da dinastia é apelido. Nada freia sua mania de honorários e autopercepção das coisas. Oferta de intimidade a quem não faz questão de identidade formou público adequado à sua má percepção da realidade. Não foram obrigações do poder ou sorteios impessoai


s que azedaram. Foi um estilo de oferta inconfundível que abriu fendas na conciliação nacional e cujas provas do encontro são o ávido sigilo e o insulto que ameaça toda testemunha. Somados à soberba com que o rei largou no cadafalso seus amigos.

O estranho familiar – o beneficiário da aura e da névoa do período – é ele a prova, a saída do enigma. Mas, enquanto a conduta pessoal do julgador não contiver vigor igual à honra e não for a mesma em todas as instâncias nem à revelia da balança em que pesa seus amigos, não haverá para acusado medo de punição nem glória em reconhecer a transgressão. E, não havendo medo do erro ou orgulho de fazer o certo, não haverá arrependimento.

O sagrado negativo do período é o desfrute do afeto do poder, sem exigir vigor ao seu comportamento. O privilégio vê por fora o que a pessoa não precisa ter por dentro alimentando o sucesso indevido.

Que pare de escorrer a náusea de maus juízes, dissimulados procuradores, podres políticos, poderosos acusados. Abominavelmente, venci não é boa sina para ninguém.

Sem nenhum imporém, o caos juntou tentadoras perversões. A desordem ordenou e a ganância se uniu. O maligno concedeu familiaridade ao presunçoso, garantiu preferência ao poder estupendo do dinheiro. Tão alto erguido e logo cercado de submissão, impôs quitar sua dívida com favores, desprezando a gratidão gratuita do convicto. Não se deu conta de que para quem é doente de dinheiro, o que parece um inferno é quase um céu, até deixar de sê-lo.

E foi quando deslumbrados trapaceiros, do lado da lei e do delito, começaram a fraudar a si próprios que o procedimento do pecado se impôs e envolvidos se enrolaram.

Com a moral recurvada do perdedor nato, a Pátria assiste a seus filhos poderosos desovarem répteis sobre a honra da Nação. O puro unido ao impuro em forçosa convivência, sem que alguém dê um basta à transgressão dos influentes. Os prediletos de toga se fazem de ingênuos e continuam, de degrau em degrau, com seus pensamentos e palpites, a descer, obedientes, voluntários, à jaula de lobos vorazes, persuasivos, cravejados de compromissos.

Tudo escapa a Deus, que tudo vê, e o mal da terra se universaliza na última dinastia popular. Sem estorvo, um rei do improviso, que tudo pode, se uniu a uma regicida improvisada, que nada deve, para gozar da doçura de impor sua maneira obstinada de agradar. Sem refrear seus impulsos, deram precedência à ambição e aos seus trocos. A linguagem e a conduta pública se arruinaram.

Burlando a boa-fé do mundo culto, o pior foi oferecido como certo. Desdenhando da capacidade humana de vencer fez a grana pública parecer o fim da boa vida. Testando a glória de esmagar o pobre com o Leviatã, feroz manipulador, anunciou que renda doada era classe conquistada. E o que parecia calor de cobertor tornou-se febre. O cuspidor de fogo fez filhotes. A fanfarrice tomou conta da Nação jactando de quem sabe o mal que é direito servido como esmola.

Paixão pura sem razão, o anjo do mal se agarrou ao nosso tempo e pregou na política a queda para o abismo; fez o mal e a mentira de uma vez por todas. E rastejou como serpente para dentro do palácio dos acusadores iluminando o obediente procurador de dupla face. Escancarou na casa da justiça o compadrio agropastoril do feio traidor, do mal acusador e do fraco relator, zombeteiros frios como a noite unânime.

Exposto o dogma do período, de que pela mão de incautos governantes é difícil de alguém sair da escuridão para a celebridade, o fluxo da osmose inundou todas as células. Tirou do Parlamento o senso do dever, impôs às duas casas, do promotor e do juiz, um porte cambaleante de quem não anda bem. Tal pandemônio os levou a dar-se ao espetáculo, como se fossem manequins.

Vendo tudo falso, postiço, o pai da fraude mandou Baco lavar, e cuspir aos poucos, a hipocrisia. Mas nenhum tempero de tal culminação afeta o padrão de decisão imperfeita que brota de poder encurralado, onde seus membros não dialogam temendo conhecer do outro a confidência.

Enquanto isso, esquecendo-se de levar em conta a Carta Magna, seguem rendidos à mania de dar entrevista ambiental, internacional, policial, racial, sexual. Só pensam em serem bons, não conseguem ser legais. Esculhambados por ébrios sedutores, convocam com cuidado o bon vivant. Algemas de pelica são usadas, pantufas alisam pisos de casas visitadas. Tudo isso para proteger o dique, represar a osmose e manter seca a mão suja que autorizou a inseminação artificial de tudo o que virou crime.

As trombetas avisam: não veja nosso povo alienado, é o poder que se anestesiou de vez e mudou a natureza da admiração que tem por seu papel.

Ao perceber que é filmado, um juiz, procurador ou um político não é mais eficaz e verdadeiro. Seu gesto é uma espécie de mentira demonstrativa, como alguém que lava a louça sem olhar o prato. O juiz julgando na TV é um objeto desarrazoado. Esvanecido, vive o langor de ser visto pelo tempo concedido à consistência da manteiga.

Será árdua a regeneração numa terra onde a Justiça tem segredos e despacha em botequim. E teremos perdido o paraíso onde essa gente consegue ser elite.

STF pode elevar sua estátua ou rebaixar o teto

Os larápios estão em festa. Num instante em que a corrupção virou um pesadelo do qual a sociedade tenta acordar, o Supremo Tribunal Federal decidiu brigar consigo mesmo. Nesta quarta-feira, julgará dois pedidos de Michel Temer contra o procurador-geral Rodrigo Janot. A sessão pode elevar a estatura da Suprema Corte. Ou rebaixar o teto do tribunal.

Uma troca de farpas ocorrida nesta terça-feira na Segunda Turma do Supremo ofereceu um aperitivo do que está por vir. De um lado Gilmar Mendes. Do outro, Edson Fachin, relator da Lava Jato. No centro, um debate que teve como pano de fundo o curto-circuito que carbonizou a colaboração judicial da JBS.

Para Gilmar, que desde logo desqualifica como provas as gravações em que soam as vozes de Michel Temer e Aécio Neves, o Supremo vive um “vexame institucional”. E Fachin, “ludibriado” pela Procuradoria, flerta com a desmoralização por ter avalizado delações que não ficam em pé.

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Esforçando-se para saltar as cascas de banana lançadas pelo colega, Fachin agradeceu a preocupação com sua biografia. Mas disse estar “em paz”, pois não fez senão tomar decisões escoradas “nas provas dos autos.” Na sessão desta quarta, a plateia saberá qual é o tamanho da ala Gilmar e da banda Fachin.

O que pede a defesa de Temer? Primeiro, que o procurador-geral, tido por “inimigo capital”, seja impedido de atuar nos processos contra o presidente. Segundo, que seja suspensa a pretensão de Janot de pendurar no pescoço de Temer uma segunda denúncia.

Num ambiente pacificado, o Supremo decidiria em poucos minutos. Arquivaria o pedido de suspeição de Janot e indeferiria o pedido para cortar-lhe as asas. É certo que Janot ofereceu munição para seus inimigos. Mas seria ridículo afastá-lo dos calcanhates de vidro de Temer a quatro dias do término do seu mandato como procurador-geral.

De resto, o Supremo teria de fazer malabarismo jurídico para privar o chefe do Ministério Público Federal da prerrogativa constitucional de denunciar o presidente. Seria como desqualificar a denúncia sem conhecer os seus fundamentos. Além de absurda, a providência é desnecessária, pois caberá ao próprio Supremo avaliar a consistência da peça. Se for inepta, pode ser arquivada antes seguir para a Câmara.

Neste contexto, é prematuro e inútil o debate sobre a sobrevivência das provas no caso JBS. É prematuro porque ainda está em curso a investigação sobre a suspeita de que Marcello Miller atuou dos dois lados do balcão —como membro do MPF e assessor da JBS. É inútil porque não produzirá decisões, apenas desgaste.

O diabo é que Gilmar Mendes não perderá a oportunidade de fustigar Janot. Sem acesso ao microfone, o procurador-geral tende a apanhar indefeso. O ministro Luís Roberto Barroso, que poderia tomar-lhe as dores, voou para os Estados Unidos. Participa, na Universidade de Yale, de um encontro de juízes de supremas cortes de vários países. Coisa agendada há tempos.

Imagina-se que o decano Celso de Mello não se animará a aderir à fúria de Gilmar contra Janot. Na Procuradoria, são contabilizados como votos pró-Janot, além de Celso, pelo menos mais cinco ministros: Edson Fachin, Rosa Weber, Luiz Fux, Marco Aurélio Mello e Cármen Lúcia. A ver.

Seja como for, o brasileiro em dia com o fisco deve desanimar ao perceber que o Supremo Tribunal Federal, frequentemente acusado de judicializar a política, esteja agora tão politizado. Foro de políticos e autoridades, justamente o pedaço mais organizado do crime de colarinho branco, o STF parece mais interessado em brigar consigo mesmo do que com os assaltantes do Tesouro Nacional.

Paisagem brasileira

Ilhéus
Ilhéus (BA)

República de regalias

Toda mudança na Constituição precisa ser precedida de muito debate e reflexão porque representa uma alteração nas regras que regem nossa democracia. É como um implante permanente que se coloca no corpo responsável por movimentar o país e assegurar a democracia. Como tratar esse tipo de situação com banalidade?

No Brasil, infelizmente, as emendas constitucionais não têm sido encaradas com a reserva e a seriedade necessárias. Tanto que, desde 1988, quando foi promulgada nossa atual Constituição, já foram feitas 96 emendas. Nos EUA, cuja Constituição é de 1787, foram feitas só 27 emendas — a última, de 1992, proibiu deputados e senadores de aumentarem o próprio salário.

Tramita no Congresso uma proposta de emenda à Constituição que acaba com o foro privilegiado. Trata-se de uma demanda urgente e necessária. Afinal de contas, já se passaram 127 anos da Proclamação da República e 32 anos do fim da ditadura militar. Não faz mais sentido mantermos no arcabouço legal alguns privilégios típicos de impérios e ditaduras.

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Mas, enquanto a tramitação da PEC não chega a suas conclusões, há espaço para ampliar a discussão, aprofundando o debate sobre o tema — o que é raro acontecer no debate legislativo. A questão aqui não deveria ser, pura e simplesmente, colocar abaixo o instrumento do foro.

O uso de uma emenda à Constituição deve servir a um aperfeiçoamento maior do arcabouço jurídico. O alvo da investida deve ser todo o sistema de privilégios.

O foro privilegiado não é a única afronta à equidade de todos perante a lei. Há também a concessão indiscriminada de carros oficiais, de escoltas armadas, de viagens de avião, de auxílio-moradia, de jantares, de festas pagas com dinheiro público e vários outros exemplos.

Nessa lista estão ainda os supersalários de alguns altos servidores do Legislativo, Executivo, Judiciário e do Ministério Público, que não veem problema em receber mais do que o teto definido na lei que deveria valer para todos.

O teto se tornou ficção. Não há justificativa para alguns agentes públicos receberem verdadeiras fortunas enquanto os outros — a maioria — têm seus parcos salários atrasados e parcelados.

O grande pleito da sociedade, após os protestos de 2013 e dos movimentos pelo impeachment de Dilma e Temer, é o fim do tratamento diferenciado para os grupos que conseguiram se apropriar da lei para se blindar das suscetibilidades a que estão sujeitos todos os cidadãos.

A intenção da Constituinte jamais foi criar um “foro privilegiado” nem castas de agraciados com benefícios contrários à isonomia entre os cidadãos. Para retomar os rumos definidos na Constituição, é preciso banir as regalias e definir quais são as pouquíssimas funções que realmente requerem atenção do Judiciário contra as oscilações de adversários políticos e do mercado. Isso é proteger as instituições, não seus ocupantes.

A existência de milhares de detentores de foro e de outros privilégios, como ocorre hoje, é uma distorção cruel da lei.

Dificuldade de governar

                      1. 

Todos os dias os ministros dizem ao povo
Como é difícil governar. Sem os ministros
O trigo cresceria para baixo em vez de crescer para cima.
Nem um pedaço de carvão sairia das minas
Se o chanceler não fosse tão inteligente. Sem o ministro da Propaganda
Mais nenhuma mulher poderia ficar grávida. Sem o ministro da Guerra
Nunca mais haveria guerra. E atrever-se ia a nascer o sol
Sem a autorização do Führer?
Não é nada provável e se o fosse
Ele nasceria por certo fora do lugar.

                      2.

E também difícil, ao que nos é dito,
Dirigir uma fábrica. Sem o patrão
As paredes cairiam e as máquinas encher-se-iam de ferrugem.
Se algures fizessem um arado
Ele nunca chegaria ao campo sem
As palavras avisadas do industrial aos camponeses: quem,
De outro modo, poderia falar-lhes na existência de arados? E que
Seria da propriedade rural sem o proprietário rural?
Não há dúvida nenhuma que se semearia centeio onde já havia batatas.

                     3.

Se governar fosse fácil
Não havia necessidade de espíritos tão esclarecidos como o do Führer.
Se o operário soubesse usar a sua máquina
E se o camponês soubesse distinguir um campo de uma forma para tortas
Não haveria necessidade de patrões nem de proprietários.
E só porque toda a gente é tão estúpida
Que há necessidade de alguns tão inteligentes.

                  4.

Ou será que
Governar só é assim tão difícil porque a exploração e a mentira
São coisas que custam a aprender?

Bertolt Brecht (1898 - 1956)

Brasil está entre os que menos gastam com ensino primário, mas tem investimento 'europeu' em universidade

O Brasil é um dos países que menos gastam com alunos do ensino fundamental e médio, mas as despesas com estudantes universitários se assemelham às de países europeus, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

No estudo Um Olhar sobre a Educação, divulgou nesta terça-feira, a entidade analisa os sistemas educativos dos 35 países membros da organização, a grande maioria desenvolvidos, e de dez outras economias, como Brasil, Argentina, China e África do Sul.

O Brasil gasta anualmente US$ 3,8 mil (R$ 11,7 mil) por aluno do primeiro ciclo do ensino fundamental (até a 5ª série), informa o documento. O valor em dólar é calculado com base na Paridade do Poder de Compra (PPC) para comparação internacional.


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A cifra representa menos da metade da quantia média desembolsada por ano com cada estudante nessa fase escolar pelos países da OCDE, que é de US$ 8,7 mil. Luxemburgo, primeiro da lista, gasta US$ 21,2 mil.

Entre os países analisados no estudo, apenas seis gastam menos com alunos na faixa de dez anos de idade do que o Brasil, entre eles a Argentina (U$ 3,4 mil), o México (US$ 2,9 mil) e a Colômbia (U$ 2,5 mil). A Indonésia é o país lanterna, com gastos de apenas US$ 1,5 mil.

Nos anos finais do ensino fundamental e no médio a situação não é diferente. O Brasil gasta anualmente a mesma soma de US$ 3,8 mil por aluno desses ciclos e também está entre os últimos na lista dos 39 países que forneceram dados a respeito.

A média nos países da OCDE nos últimos anos do ensino fundamental e no médio é de US$ 10,5 mil por aluno, o que representa 176% a mais do que o Brasil.
Ensino superior

A situação no Brasil muda em relação aos gastos com estudantes universitários: a quantia passa para quase US$ 11,7 mil (R$ 36 mil), mais do que o triplo das despesas no ensino fundamental e médio.

Com esse montante, o Brasil se aproxima de alguns países europeus, como Portugal, Estônia e Espanha, com despesas, respectivamente, por aluno universitário, de US$ 11,8 mil, US$ 12,3 mil e US$ 12,5 mil, e até ultrapassa países como a Itália (US$ 11,5 mil), República Checa (US$ 10,5 mil) ou Polônia (U$ 9,7 mil).

A média nos países da OCDE é de US$ 16,1 mil, puxada por despesas mais elevadas de países como os Estados Unidos, Noruega, Luxemburgo e Reino Unido.


Os gastos no Brasil com alunos universitários também superam os da Coreia do Sul, de U$ 9,6 mil.

O país asiático, que gasta um pouco mais com o ensino fundamental (U$ 9,7 mil), está entre os primeiros do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) da OCDE. O teste mede conhecimentos de estudantes na faixa de 15 anos nas áreas de ciências, matemáticas e compreensão escrita.

Já o Brasil está entre os últimos no teste do PISA e apenas 17% dos jovens entre 25 e 34 anos têm diploma universitário, um dos índices mais baixos entre os países do estudo.

Fato inédito na História: a Polícia Federal demoliu o governo Michel Temer

Manchete principal nas edições desta terça-feira de O Estado de São Paulo e de O Globo, a Polícia Federal acusou frontalmente Michel Temer, Gedel Vieira Lima e Eduardo Cunha, além dos ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco de corrupção organizada e irrigada por um lance de propina no montante de 31 milhões de reais. No Estado de São Paulo a reportagem é de Beatriz Gulla, Fábio Serapião e Andreza Mataes, no Globo matéria de página inteira saiu sem assinatura. Mas assinada por Bruno Pires no Estadão, que destacou a versão de Joesley Batista a respeito de como subornava políticos do país.

A Polícia Federal disparou a reação provavelmente contra a iniciativa do ministro Torquato Jardim de substituir Leandro Daielo da direção geral da PF. Mas este aspecto, quanto à motivação, importa pouco. O essencial é que jamais na História do Brasil, até esta terça-feira, a Polícia Federal havia formulado denúncia tão frontal contra um presidente da República, em particular, e contra um governo de modo geral.


Causou assim um impacto da força de um vendaval que demoliu o esquema de poder, como comprova a falta de reação do Planalto a uma entidade de segundo escalão na hierarquia ministerial. O governo explodiu e a demolição tornou-se o cenário do poder. O Globo e O Estado de São Paulo que ontem circularam vão se tornar peças importantes de um triste período da vida brasileira. A Esplanada do Ministérios em Brasília foi varrida do mapa da moralidade pública.

A tal ponto que o único reflexo assinalado por Brasília foi o da indicação do deputado Carlos Marun para relator da CPMI para desinvestigar Joesley Batista e a atuação da JBS no panorama governamental. A reação descambou para o ridículo, na medida em que atribuiu a Marun uma reação impossível. Pois o deputado é o relator mas não é o único tradutor dos caminhos que a Comissão Parlamentar Mista, de Senado e Câmara, vai percorrer. A CPMI inevitavelmente terá que convocar Joesley Batista e Rodrigo Janot, sob pena de tornar-se uma tentativa frustrada, logo na decolagem para o reino da fantasia.
A representação parlamentar do governo pode incluir a maioria de senadores e deputados, mas nunca a totalidade de seus integrantes. Assim o projeto de desviar as atenções da opinião pública e a busca de diluir as denúncias não surtirão efeito favorável ao sistema de poder. Pelo contrário. As sessões do reino fantástico vão esbarrar na cortina do irrealismo implantado pela verdade dos fatos e pela consciência da população brasileira.

A manobra saiu pela culatra. O Planalto esqueceu os jornais e as emissoras de televisão que vão acompanhar o desenrolar das cenas que ficarão gravadas na memória. A exemplo das gravações de Joesley Batista e Ricardo Saud, da filmagem de Rocha Loures, da gravação do encontro noturno do controlador da JBS com o presidente da República na residência oficial de Michel Temer, no Palácio Jaburu.

A soma dos fatores conduz a um resultado péssimo para o governo, que, nesta altura dramática do desabamento, está sendo exposto com luzes fortes ao julgamento popular. Do julgamento popular surgirão reflexos que vão emoldurar o episódio desencadeado pela Polícia Federal no mapa da História do Brasil para sempre.