quinta-feira, 24 de setembro de 2015

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Eu quero ir para Plutão

Para o cidadão Gilmar Mendes

Quando Mario Batalha soltou essa frase no seu tom rabugento-beligerante, eu pensei que ele estivesse bêbado. Mas qual, o velho estava em forma e, como ele fala pausadamente, você fica intrigado com a próxima frase, que pode declamar um poema ou anunciar o fim do mundo. Olhamos para ele com os olhos de fora um tanto esbugalhados; enquanto os de Capitu tentavam adivinhar o que viria.

— Plutão! Na ausência de saída desta infindável crise cujo centro está brasileiramente em quem pode terminá-la, pensemos não em Platão ou Pluto, o cachorro do camundongo Mickey (isso é que é democracia: um rato ter um cachorro, enquanto aqui os ratos são também cachorros). Falo — continuou sem alegria Mario Batalha — no planeta mais longínquo, o que era tão desconhecido como os valores de um político nacional. Aliás — continuou —, as fotos de Dilma depois da tenebrosa perda do grau do investimento revelam olhos bonitos e um tanto plutônicos, como que situados na fronteira do nosso miúdo sistema político-planetário...

— Apaixonou-se pela presidente? — perguntou o gozador Beto Molhoterno, especialista nas plutônicas gatunagens da Petrobras.

— Não, não, e não! — reverberou Mario Batalha, falando ainda mais pausadamente.

Pensei no permanente drama do aluno deslumbrado pela professora, no legislador preso pela lei que proclamou, na cozinheira que come a própria comida, na mulher irresistível que não resiste a si mesma e não dá pra ninguém, no país que faz guerra em nome da paz e no partido que enriquece em nome do povo. Em suma, do criador arrebatado (e paradoxalmente encarcerado) pela criatura que inventou, a qual, uma vez fabricada, ganha presença e autonomia e faz suas exigências, embaraçando — como no velho mito — o criador. Galatea, relembro, logo que como estátua recebeu dos deuses o dom da existência, exigiu do seu ex-escultor apaixonado que ele raspasse a barba. Tal como as mulheres exigem um carinho esquecido, e o nosso Brasil — essa Galatea em forma de coração — demanda apego e, sobretudo, uma babaquice chamada honestidade. Que dizem ser coisa pra “trouxas”!

Nós, como o mitológico Pigmalião, esculpimos uma democracia que transforma floristas analfabetas (como na peça de Bernard Shaw) em duquesas; e operários em presidentes. Sua incomensurável bonança abrange toda a sociedade, pois é isso que a distingue da aristocracia. Nela, não há segmentações estabelecidas, mas papéis e cargos a serem preenchidos por mérito. Sendo inclusiva, nela os excluídos são um problema, inclusive esse planeta Plutão que hoje faz parte do nosso conhecimento astronômico. O campo da democracia é imenso e nele nascem tanto mentira quanto verdade. Como o tão malfalado mercado, ela aceita tudo e, por isso, tem que ser medida e vigiada. No seu seio todos — f.d.p e planetas — são agasalhados.

Mas, como criatura e instituição, ela faz suas demandas. Tem, como Gelatea, suas cobranças. Uma delas é o limite do tempo de governo; outra é a honestidade; uma outra — dificílima num país de índole aristocrática — é a eficiência e o senso de limite ou de justiça.

— Governos democrático-liberais — prosseguiu — são irritantes porque eles têm um laço forte com o mercado autorregulado (que estabelece responsabilidade) e com um paralelo ao teste das urnas, o qual se decide por números mas se convalida pela eficácia e pela sinceridade, pelo chamado “bem-estar geral” que, graças a Dilma, acabou no Brasil.

E o que isso tem a ver com Plutão? — perguntaram a um só tempo o velho Perdigão, ao lado do Miroca e do Sivoca.

Tem tudo a ver. O planeta menos conhecido e bom porque estava longe faz agora parte do nosso mundo. Tornou-se parte da nossa consciência. Com isso, ele desmancha fantasias, revelando-se em sua realidade rochosa e infértil. Tal como a distante democracia liberal — que era um sonho numa sociedade de barões e milicos autoritários, bem como de gente que virava político para ser servido e não para servi-la e honrá-la — espanta ldarões difarçados de pais do povo.

A essa altura, Mario Batalha tomou um largo gole de uísque e olhou nos nossos olhos lavados de velhos. Chuck Snake, o americano que nada entendia de Brasil e pensava que o lulopetismo fosse igual ao tal “liberalismo ianque”, quis sair da roda mas eu o acalmei. “Take it easy”, disse.

— E como iremos para Plutão? — questionou o Miroca com um sorriso sacana.

— Vamos com gosto, tomando do bom e do ruim, mas obedecendo às demandas da nossa criatura, tal como o fazemos com o espirito arrolhado nessa bela garrafa — respondeu veloz um sério Mario Batalha.

Roberto DaMatta

A quem interessava enfraquecer o juiz Sérgio Moro?

Para começar a investigar um crime, os detetives de antigamente costumavam se fazer a mesma pergunta: “A quem interessa?” Ou seja: “Quem mais tiraria vantagens do crime?”

A pergunta pode ser aplicada também para elucidar ou pelo menos iluminar outros enigmas.

Por exemplo: por sete votos a três, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu fatiar a Operação Lava-Jato, subtraindo poderes do juiz Sérgio Moro, o comandante da operação até aqui.


Continuarão com Moro somente os processos que tenham conexão direta e robusta com a roubalheira na Petrobras. Os demais poderão ser repassados a outros juízes país a fora.

Montar um quebra-cabeça com muitas peças é um desafio complicado. Torna-se impossível de ser vencido quando faltam peças.

O relator da decisão do STF foi o ministro Dias Tóffili, ex-advogado de Lula, ex-assessor de José Dirceu, um petista de raiz. Tóffili desabafou irritado a certa altura do julgamento:

- Há Polícia Federal e há juiz federal em todos os estados do Brasil. Não há que se dizer que só haja um juízo que tenha idoneidade para fazer investigação ou para seu julgamento. Só há um juiz no Brasil?

Não, há muitos. Mas Moro já demonstrou à farta sua competência na condução do caso e seu rigor na aplicação das leis. Nada mais precisa provar.

Não existe outro juiz que conheça tão bem como Moro o que a Lava Jato investiga. Nem que opere como ele em tão fina sintonia com a Polícia Federal.

Embora sem esse nome, a Lava Jato começou em 2009. E seu objetivo inicial foi o de apurar lavagem de dinheiro entre empresas ligadas ao deputado José Janene (PP-PR), que já morreu.

A apuração levou à descoberta de um posto de gasolina, em Brasília, que lavava dinheiro. E em seguida ao doleiro que fazia a lavagem e que se escondia sob o nome de Primo.

Por conta do posto de gasolina foi que a operação ganhou o nome de Lava Jato.

Primo era o doleiro Alberto Yousseff. E foi por meio dele que se chegou a Paulo Roberto Costa, então diretor de Abastecimento da Petrobras. O resto é história conhecida.

Portanto, é falsa a afirmação de que a Lava Jato, por vocação e em respeito ao seu escopo original, deve limitar seu interesse à roubalheira na Petrobras.

Como desvincular o que aconteceu na Petrobras com o que aconteceu em outras empresas e órgãos dos governos Lula e Dilma?

Os personagens, em várias ocasiões, foram os mesmos. Os crimes de igual natureza. E o produto deles serviu ao mesmo propósito – o de manter no poder quem nele queria se conservar.
A quem interessou a decisão do STF relatada por Tóffili?

Ela foi celebrada pelos advogados de presos, de ex-presos, de suspeitos e de quem mais receia cair nas malhas da Lava Jato.

Por que? Ora. Seguramente porque aumentam as chances de eles se darem bem.

No Congresso, ontem à noite, deputados e senadores não escondiam seu alívio com o enfraquecimento de Moro.

A blindagem da Lava Jato foi rompida pela primeira vez. Doravante será mais fácil rompê-la sempre que necessário.

Esperem para ver.

A inquilina

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Minha mãe, quando viva, na pressa de alugar um imóvel ao lado de onde morava, acabou colocando um estelionatário profissional como seu vizinho. O cara só pagou o primeiro aluguel e montou um bordel no local. Junto com as “meninas”, vieram os bandidos, os traficantes e a coisa se transformou numa zona de meretrício.

Num misto de justiça lenta com excesso de proteção ao inquilino, aquela desgraceira durou dois anos. Não sem antes minha mãe gastar uma pequena fortuna com advogados, ser acusada pelo resto do conjunto residencial onde morava de ser “dona de bordel” e entrar na fila do “fiel depositário” na prefeitura, pois o vigarista deixou mobília no imóvel, que tem que ser fotografada e retirada com a supervisão da prefeitura, sob o risco de cadeia para o proprietário, é mole?

Não restou a ela outra alternativa que não vender o imóvel para pagar as contas de água e luz deixadas para trás, as ligações clandestinas feitas pelo bandidão e outros prejuízos igualmente indecentes, impostos a uma “senhora exploradora do sistema” . Quem estiver pensando: “Puxa, que azar. Ainda bem que não foi comigo”, pode tirar seu cavalinho da chuva, que está molhando a crina.

É essa, exatamente essa, a história do Brasil. Ou alguém aqui acha que a inquilina daquele palácio está fazendo algo diferente do estelionatário que invadiu a casa de minha falecida mãe? O bordel é o mesmo, as ligações clandestinas as mesmas… Trabalho de profissionais do crime, meus caros. Gente disposta a não sair do lombo nunca. E com uma justiça ainda aparelhada em favor da criminalidade reinante.


Precisa comparar mais? O que dizer dos extintores? Alguém engoliu a tramóia? Coube ao “ministro das cidades” dar a boa notícia ao público pagante. O mesmo, por sinal, que nos meteu um “Controlar” no lombo, lembram-se? Ou será que a gente esquece fácil o desfile de gatunos que passaram pela nossa vida? O fato é que escancaram que o método é “aplicar um golpe”, para fazer o cidadão idefeso pagar uma conta qualquer. Voltaram atrás nessa vergonha escancarada, mas e nas outras?

E a inquilina, roubando água e luz dos brasileirinhos, afirmando que não fez nada de errado para ser defenestrada rampa abaixo? O Brasil precisa de uma limpeza ampla, geral e irrestrita, meus amigos. Se bobear, as duas poltronas deixadas para trás pelo vigarista profissional que atacou minha mãe anos atrás ainda dormem em algum galpão da prefeitura. Tudo pago com o meu, o seu, o nosso dinheiro. É uma afronta. Um embuste. Uma picaretagem. Até quando?
Vlady Oliver

A verdade dividida

A porta da verdade estava aberta
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.

Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só conseguia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.

Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia os seus fogos.
Era dividida em duas metades
diferentes uma da outra.

Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era perfeitamente bela.
E era preciso optar. Cada um optou
conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia.

Carlos Drummond de Andrade 

Sangue de barata

Quando a sociedade se vê ameaçada por prenúncios de desorganização do Estado, as instituições, por seus agentes, em muitas ocasiões como esta que vivemos se excitam em espasmos de arrogância ou de indiferença. Ou em ensaios de autoritarismo.

Quem não sabe como lidar com essas coisas e já se acha no salve-se quem puder, farinha pouca meu pirão primeiro, estufa o peito e pigarreia todo dono ou dona da autoridade que já não mais lhe resolve, mas que precisa ostentar.

Aí a compaixão é tangenciada junto com a cidadania. As leis do direito se desgarram da moral e da ética. O processo civilizatório não estanca, mas decai. A interpretação das normas só conhece a conclusão ignóbil – é até certo que o fato não se reveste de moral, mas o que fazer se não é legal?

E assim as leis do direito, editadas sob pressupostos morais e éticos, vão sendo desgarradas dos bons costumes que as inspiraram e servindo à facilidade de julgamentos que dispensam da inteligência humana o compromisso com a paz social, pois com injustiças, maus exemplos e impunidades não há sociedade que se segure organizada.

A justiça não pode ser aquela temeridade. Há que ser preservada como a cidadela em que todos possam depositar confiadamente as suas esperanças. Sobre ela não pode pairar a mínima suspeita de desconfiança. É operada por seres humanos e porque somos todos humanos nos resumimos a uma única meta – a perfeição. Se não a alcançamos conclusivamente, é nosso dever seguir perseguindo. Só assim nos aprimoramos como criaturas de Deus.

Se nos descuidamos podemos parecer que somos maus. Mas não basta parecer. Temos que acreditar na força do bem, praticar o bem do qual somos aliados porque só com atitudes firmes das pessoas de bem é possível estancar a enxurrada do mal cujos operadores são incansáveis.

Ora, quem iria imaginar que de um simples posto de lava jato se tiraria a ponta do enorme novelo dessa novela quase interminável? Gangues com imensa capilaridade pelo país a furtarem fortunas dos cofres públicos e a repassarem propinas milionárias a políticos, a candidatos e a partidos?

E os que embolsaram as propinas comprando eleições e a se investirem em mandatos sem legitimidade popular nenhuma se entregando ao desserviço à democracia. Não sabem e nem querem saber o sacrifício que deu e o trabalho que ainda está dando restabelecer no Brasil a plenitude democrática.

Os milicos do golpe militar de 64 acharam que cassando, exilando, enfim, deletando toda a geração dos políticos de então – gerações formadas sob valores firmes brotados da tradição secular tradição judaico-cristã, acharam aquelas pessoas que banindo o que ainda tínhamos de melhor, raras exceções à parte, ensejariam o surgimento de novas gerações de políticos dotados de mais espirito publico e imantados de firme patriotismo. É só olharmos os partidos da chamada primeira linha e os seus quadros, raríssimas exceções à parte.

Toda corrupção com o dinheiro publico no que temos de mais publico e notório brotou das maquinações dessa gente.

Toda essa onda que desnuda cenários e figuras insuspeitas até há algum tempo atrás, muitas das quais se igualam nos dias e noites dos cárceres, dizem as pitonisas do Estadão e da Folha, essa onde não passará tão cedo.

PS. A Dilma lê discurso na abertura da Assembleia Geral da ONU. O texto guardado a sete chaves lhe será entregue pouco antes dela subir à tribuna. Há medos enormes que ela resolva improvisar em dilmês. Constrangimento maior já se iguala ao Mercadante, que está inarredável. O Brasil, que ainda se imagina em cadeira permanente no Conselho de Segurança, deve à ONU a bagatela de 184 milhões de dólares.

Edson Vidigal

Coxinha e caviar

“Coxinha” e “esquerda caviar” são estereótipos que prestam um desserviço ao debate político no Brasil, e pelos mesmos motivos. Estereótipos reduzem as complexidades, as muitas e variadas singularidades que coexistem dentro de um determinado conjunto a uma só substância negativa, alardeada como se fosse a essência mesma de tal conjunto.

Possuem função cognitiva, isto é, não são meros filtros que distorcem a posteriori uma realidade apreendida objetivamente, mas parte integrante da própria moldura perceptiva dentro da qual o sujeito apreende aquilo que lhe parecerá então digno de repúdio. Ajudam a criar e sustentar preconceitos.


Gíria paulistana, “coxinha” inicialmente designava o sujeito rico, arrumadinho e careta. Ressignificada em meio à recente turbulência política do país, tornou-se instrumento retórico via de regra empregado para desqualificar de antemão quem quer que se manifeste contra o governo, nas ruas ou em redes sociais.

Como se os protestos não comportassem insatisfações legítimas, oriundas de diversos estratos da sociedade, mas fossem apenas expressões de uma elite desde sempre autorreferida, carcomida pela ignorância de quem é incapaz de estender sua empatia para além do mundinho particular em que vive. É contra o PT? Coxinha.

A expressão “esquerda caviar”, cunhada na França dos anos 80, pretende denunciar o que seria a hipocrisia constitutiva da esquerda: condenar o capitalismo mas aproveitar suas benesses, vivendo de modo a contradizer os valores que prega.

A expressão não apenas pressupõe como também faz parecer que há algo como “a esquerda”, um bloco monolítico eminentemente socialista ou comunista. Nada mais distante da realidade. Basta pensar nas diversas formas de esquerda social-democrata existentes — os liberais americanos ou os quadros mais sóbrios do PSDB, por exemplo — e a suposta contradição ou hipocrisia que a expressão denota desaparece.

Além disso, como observou Francisco Bosco em coluna publicada no GLOBO, “a crítica é um princípio democrático de aperfeiçoamento, e não um instrumento de negação absoluta”. Critica-se o capitalismo para melhorá-lo, o que, na perspectiva de esquerda, significa principalmente reduzir as desigualdades que produz. Não importa: se é esquerda, só pode ser comunista; portanto, não pode usufruir dos frutos do capitalismo sem cair em contradição. Esquerda caviar.

Polemistas, profissionais ou amadores, dependem da repetição de estereótipos para avançar seu trabalho de desqualificação do outro ideológico. Ao martelar incessantemente tais expressões em jornais, revistas e blogs, não estão apenas criticando algo de que discordam, mas ajudando a criar uma atmosfera hostil a este outro, com o intuito de negar inteligibilidade à sua visão de mundo.

Uma vez sedimentado um terreno discursivo suficientemente maniqueísta, qualquer coisa que o outro diga será recebida já dentro dos termos de uma percepção distorcida, preconceituosa porque sistematicamente estereotipada. Anula-se, assim, a possibilidade de um diálogo racional, pois os interlocutores passam a se comportar não como adversários honestamente permeáveis às opiniões uns dos outros, mas como inimigos cuja “ladainha” sequer deveria vir a público.

De modo geral, discursos estruturados por sobre estereótipos como “coxinha” e “esquerda caviar” renunciam à difícil tarefa de tentar compreender a realidade em toda a sua complexidade. Transformam posições políticas legítimas em espantalhos, para então enxovalhá-las justamente por isso. Contribuem para a polarização estéril do debate, pois que é próprio do preconceito reproduzir o antagonismo do qual é um sintoma.

Antonio Engelke 

Integramos um teatro que torna mais real a nossa própria realidade

Em minhas longas noites de insônia, além da conversa silenciosa que costumo manter com os “meus mortos”, sinto a aguda sensação de que todos, vivos e mortos, fazemos parte de uma grande e miserável peça de teatro que torna mais real a nossa própria realidade.

De vez em quando, rompe o silêncio dessas noites a figura fantasmagórica da presidente Dilma, que está muito viva, mas que se parece cada vez mais com um zumbi, a perambular de bicicleta pelos suntuosos palácios de Brasília, acompanhada pelo ex-presidente Lula. Aproveito a oportunidade para lhe dizer coisas que ninguém lhe diz, nem mesmo o seu criador, e a primeira que me vem à mente, leitor, já deve ter passado infinitas vezes pela sua: o cargo de presidente da República nunca lhe pertenceu, foi-lhe delegado por voto direto pela maior parte do povo brasileiro, que acreditou nas suas promessas, embora tanto ela quanto ele e seus asseclas, ao fazê-las, sabiam que mentiam. Lembro-lhe que o apego ao mandato, além de perigoso, é masoquismo. E que o Brasil é muitíssimo maior do que os seus eventuais governantes.


Digo-lhe que o italiano Giacomo Puccini, que viveu entre 1858 e 1924, jamais imaginou que a ária “Nessun Dorma”, da sua ópera “Turandot”, serviria hoje para titular um dos atos desse teatro miserável, que leva o nome de operação Lava Jato, o mais importante de todos – passados, presentes e futuros. Digo-lhe, também, que o ex-presidente deve botar suas barbas de molho e refletir sobre a afirmação, feita em entrevista pelo procurador Fernando dos Santos Lima, de que o mensalão, o petrolão e a corrupção na Eletronuclear tiveram origem na (sua) Casa Civil, chefiada então por José Dirceu, preso pela segunda vez. E sugiro-lhe conhecer o papel que desempenha na ária o príncipe Calaf.

Ou a presidente ainda não dedicou nem um minuto sequer à reflexão para concluir que já foi longe demais nessa sua viagem? Não percebeu que é responsável pelo sacrifício de milhões de brasileiros?

Lembro-lhe, então, que a Presidência da República lhe caiu nas mãos de graça, mas quem a recomendou – um mestre na astúcia – nunca a quis senão até o seu retorno, com pompa e glória (que ela, em boa hora, simplesmente impediu), e sem compromisso com ninguém, ao cargo que deixou há quase cinco anos. E que o seu criador, na verdade, jamais lhe foi leal e, como se fosse dono do país, nunca escondeu seus reais objetivos. Mesmo assim, ela aceitou que, juntos, praticassem falta gravíssima ao contrair dívida absurda e cruel em nosso nome, e ainda jogaram no lixo os fundamentos éticos que nortearam a maioria dos fundadores do Partido dos Trabalhadores – um partido que, sem dúvida, reacendeu a fé e a esperança em milhões de brasileiros, sobretudo pobres. Praticaram, à luz do dia, um verdadeiro estelionato!

Ou a presidente não se convenceu, definitivamente, de que não pode mais contar com o apoio (que um dia recebeu) dos 54 milhões de votos que lhe foram concedidos, provenientes dos que foram iludidos pelas suas mentiras? A presidente está, afinal, à espera de quê?

Encerro essa noite insone suplicando ao criador e à criatura que, para o bem de todos, reconheçam os erros imperdoáveis que praticaram e deem um adeus definitivo ao sofrido povo brasileiro. E aceitem, finalmente, que nosso país siga feliz e em paz o seu destino, empurrado pela tenacidade da sua gente e pela riqueza da sua natureza!

Os brasileiros têm o direito de tentar uma nova era!

“Sursum corda”!

De quatro

Que povo este! Fazem-lhe tudo, tiram-lhe tudo, negam-lhe tudo, e continua a ajoelhar-se quando passa a procissão
Miguel Torga

Democracia refém

Desde 2008, o Ibope pergunta à população em idade de votar quão satisfeita ela está com o funcionamento da democracia no Brasil. Os resultados nunca foram brilhantes, ainda menos se comparados a países latino-americanos como Uruguai e Argentina, mas jamais haviam sido tão chocantes quanto agora. Só 15% de brasileiros se dizem “satisfeitos” (14%) ou “muito satisfeitos” (1%) com o jeito que o regime democrático funciona no País.

Isso significa que um em cada três está “pouco satisfeito” (36%) e, pior, 45% estão “nada satisfeitos”. Não há taxa parecida na série histórica, nada com tal nível de insatisfação. O mais alto havia sido em 2013. Após a onda de protestos de rua, os “nada satisfeitos” cresceram para 29%. A taxa baixou para 22% no ano passado e dobrou agora, chegando a quase metade da população.

É uma insatisfação manifestada pelo pobre e pelo rico, pelo semi-analfabeto a por quem fez faculdade, homens e mulheres, brancos e negros, católicos e evangélicos. Vai das capitais ao interior, passando pelas periferias das metrópoles. Atinge cidades grandes, pequenas e médias. Viaja de Norte a Sul, via Sudeste e Centro-Oeste, com uma pequena inflexão no Nordeste.

Só em 2007, no Paraguai, pouco antes da eleição de Fernando Lugo – que sofreria impeachment cinco anos depois –, houve nível similar de insatisfação (48%) ao que há hoje no País. A parcela dos “nada satisfeitos” nas pesquisas mais recentes do Latino Barômetro (2013) no continente revelam números muito mais baixos que o do Brasil: 22% na Venezuela, 20% no Paraguai, 11% na Bolívia, 10% na Argentina e Chile e 0% no Uruguai.

De onde se conclui que a democracia brasileira é a mais insatisfatória aos olhos de seus próprios cidadãos entre todos os vizinhos pesquisados. Por que há tantos insatisfeitos?

A primeira hipótese é a crise política. Afinal, os governantes e políticos em geral raramente foram tão mal avaliados quanto são agora. A popularidade da presidente Dilma Rousseff bateu em um fundo de poço tão escuro quanto os mais impopulares presidentes brasileiros. Ela luta para não perder o mandato. Governadores e prefeitos também sofrem com a desaprovação. O Congresso e os partidos políticos são inconfiáveis para a maioria da população.

Esses fatos mostram como a democracia brasileira chegou a esse nível crítico de insatisfação, mas não revelam o porquê. É possível usá-los para descrever o processo de deterioração do funcionamento da democracia, mas não explicam o motivo de tanta desconfiança. É a corrupção, a sucessão de escândalos, as condenações, os bilhões desviados, os milhões em propina?

Em parte, sim. O brasileiro está certamente indignado com as revelações da Lava Jato. Mas estará ele surpreso? Era algo completamente inesperado? Ou, ao contrário, essa sempre foi a suspeita nacional? Afinal, nomes de políticos há décadas viram verbo ou adjetivo como sinônimos de roubar. Por que só agora houve reflexo negativo na imagem da democracia, se a novela de escândalos começou dez anos atrás e se arrasta desde então?

Por causa da decepção com a economia. Quem acreditou que estava melhorando de vida viu o processo parar de repente. Por causa do desemprego e dos aumentos de tarifas, o consumo diminuiu ou passou a ser controlado. Quem comprou carro não usa todo dia porque a gasolina ficou cara, quem comprou eletrodoméstico não liga para não aumentar a conta de luz. A frustração ricocheteia nos governantes e acerta a democracia.

“É sinal de que os valores democráticos não estão arraigados. A democracia só vai bem se a economia vai bem. É um risco real. Incentiva o populismo”, diz Marcia Cavallari, CEO do Ibope Inteligência. A saída é fortalecer a política, para ela deixar de ser escrava da economia. Reformá-la para libertá-la. Mas o Congresso preferiu remendá-la para mantê-la cativa

O 'pacote' de Dilma e seus jovens ministros

Afinal de contas, não é tão ruim assim ser mais velha e ter estudado ou vivido episódios da história do Brasil.
O anúncio do “pacote” do governo me fez voltar no tempo. Aliás, houve ali um momento muito interessante de verdadeiro ato falho: o ministro Joaquim Levy, ao citar exemplos no mundo de quem vem propondo medidas semelhantes, não teve como segurar e revelou: “aliás, como vem sendo feito por vários governos conservadores, a saber, o do ministro Cameron na Inglaterra, dentre outros”. Quer maior candura que isso? Os dois ministros, Levy e Barbosa, são absolutamente crus em matéria de informação histórica e jurídica. Mas os jornalistas que os interrogavam – com exceção apenas do último a perguntar – pouco sabiam sobre os assuntos que estavam sendo propostos.


O anúncio de um monte de medidas de uma só vez – ninguém no auditório se lembrou disso – produziu em mim a horrível impressão de ter voltado ao tempo dos “pacotes” dos governos militares. “Pacote de Abril”, para lembrar um que ficou célebre, quando Geisel mandou fechar o Congresso e mudou as regras do jogo eleitoral, para resolver o problema do resultado das eleições de 1974 (quando o MDB derrotou fragorosamente a Arena em todo o país). Pois o “pacote da d. Dilma” tem todas as características desse aí. Inclusive porque dificilmente passa no Congresso – a menos que ela se arrogue o direito de fechá-lo ou que os governadores e os prefeitos ajudem querendo o aumento da alíquota para tirar sua casquinha. Afinal, estão todos quebrados.

A chiadeira já começou mal terminou o anúncio das medidas. Um mundaréu de gente contra. A começar, é claro, pelo ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Armando Monteiro, que falou grosso em nome dos empresários contra a remessa de recursos do Sistema S para a Previdência Social. Memória curta tem d. Dilma. E ela, pela idade, deveria se lembrar. Foi no governo Figueiredo que aconteceu a primeira e única vez em que um decreto-lei foi editado e revogado no curto espaço de um mês. E o motivo, absolutamente idêntico ao de agora: seu governo tentou passar recursos do Sistema S para a Previdência e teve de recuar diante da gritaria dos empresários. Pegou mal também que o corte de gastos tenha vindo incompleto: quais ministérios serão fundidos com outros ou simplesmente desaparecerão? Antigos e malandríssimos políticos costumavam dizer que você nunca deve nomear quem não pode demitir. Como é que ela vai fazer para despachar os ilustres representantes da montoeira de representantes dos mais diferentes partidos que conformam o “cordão da bola preta” que a elegeu e garantiu a reeleição? A começar pelo próprio PT, que antigamente (ah, o PT de antigamente!) rejeitava qualquer cooptação de movimentos sociais com a criação de secretarias disso ou daquilo – como foi o caso em Minas, quando Tancredo Neves criou pela primeira vez, creio, uma Secretaria das Mulheres e entregou esse confeito de bolo para alguma sigla cooptável... Tristes tempos os de agora!

Sandra Starling

Patrulha gayzista e feminazi chega ao Colégio Pedro II

A escola federal, informa o jornal O Globo, já está submetida à ditadura das patrulhas dos grupos gays e feminazis, que pretendem, atenção!, “suprimir o gênero” das palavras no singular ou no plural quando elas designarem tanto homens como mulheres. Assim, no lugar do “o” e do “a”, entra uma letra “x”.

Você vai falar com médicos e médicas? Então, meu amigo, você está se dirigindo a “médicxs”. O grupo consonantal nem tem expressão sonora possível em português. Mas e daí? Os militantes, como sabemos, podem mudar até a gramática. A matemática…, bem, essa eles já mataram faz tempo.

Num comunicado do colégio, os “alunxs” recebem instruções especiais em razão de uma reforma no prédio. As provas também trazem o espaço para que o “alunx” coloque o seu nome.

A boçalidade é de tal ordem que, no tal comunicado, lê-se o seguinte:

“A entrada dos alunxs do turno da tarde”… Ora, “dos” é a contração da preposição “de” com o artigo definido, masculino e plural “os”. Logo, a se levar a cabo a estupidez, dever-se-ia escrever “a entrada dxs alunxs”.
Ora vejam! Os nossos gayzistas e as nossas feminazis se preocuparam com o “a” e com “o” dos substantivos e adjetivos, mas se esqueceram dos artigos. Como se fará no caso dos substantivos comuns de dois gêneros? Quando nos referirmos a estudantes homens e mulheres, escreveremos “dxs estudantes”?

Infelizmente para o gayzismo e para o feminazismo, não temos o “the”, do inglês, como artigo…

Isso é de uma estupidez sem limite. De resto, se formos proceder a um estudo das origens latinas do gênero em português, muita coisa se explicará pela evolução da língua e nada têm de discriminação de gênero.

A ideologia de gênero, que tenta se impor na porrada nas escolas, sob o patrocínio do petismo e de esquerdismos ainda mais mixurucas, é que tem de ser combatida. Até porque o gayzismos e o feminizanismo representam apenas a si mesmos. Não são expressões da vontade nem dos gays nem das mulheres.
A propósito, a gente diz “os gays” ou “xs gays”?
Reinaldo Azevedo