segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

A Terra é chata

Um novo planeta foi descoberto por um satélite da Nasa. Fica na primeira galáxia à direita depois do Sol, a cem anos-luz daqui. É um pouquinho maior que a Terra e, como se constatou, redondo, em forma de globo.

Também como a Terra, gira em torno de si mesmo e de uma estrela e é dilatado nos polos e achatado no equador, ou vice-versa. Eles o estão chamando de TOI 700 d, sendo TOI a sigla em inglês para “Objeto de Interesse do Tess”. Tess é a nova sensação das varreduras espaciais: um satélite caça-planetas. Desde que entrou em ação, em 2018, já achou três.

Para descobrir um planeta, o Tess passa 27 dias observando uma estrela, de olho em qualquer oscilação de seu brilho. O que, se acontecer, terá sido provocado pela passagem de um corpo celeste —um planeta— ao redor dela. A vida é meio parada no espaço, donde não há outras opções. Mas, para não restar dúvida, exige-se que tal oscilação se dê pelo menos três vezes. Cada operação congrega um batalhão de cientistas, quase todos nóbeis, fazendo cálculos fora do alcance da nossa aritmética escolar.

Pois é armado dessa aritmética de ábaco e de contar nos dedos que um grupo de novos pitecantropos afirma que a Terra é plana, não esférica. São os terraplanistas. Indiferentes a 2.500 anos de ensinamentos por gente como Pitágoras, Aristóteles, Copérnico, Kepler, Galileu, Newton e Einstein, seus argumentos são os de uma criança de babador. Para eles, a Terra é chata e em forma de pizza, como se pode constatar, dizem, olhando pela janela do avião.

Os cientistas de toda parte e de todos os tempos nos mentiram. As estações espaciais que, lá de cima, nos veem redondos e esféricos, não existem. A Nasa é um estúdio de efeitos especiais. A Lua também é chata. Marte, Vênus, Júpiter, idem. Eles acreditam nisso.

Estou propenso a concordar. Mas, antes, meu cérebro também terá de virar uma pizza.
Ruy Castro

Esmiuçando um país

Um país não é aquela roupa velha que se veste de quando em quando, longe dos estranhos, na intimidade.

Um país não é uma saudade, sequer uma nostalgia miúda. Não é uma música que seu pai cantava enquanto preparava o cigarro de palha. Não é a lembrança que sua mãe mantém de um antigo amante.

Não é uma tarde com crianças correndo no quintal. Igualmente não são dois vizinhos batendo papo pela janela de suas casas.

Um país não é uma bola na trave. Não é um grito inesperado daquele homem que caminha em silêncio. Qualquer muleta abandonada na calçada é apenas uma potencial metáfora para o país.

Por mais que se pense que um país seja suas sextas-feiras e feriados, ele não é isso. Tampouco é o domingo, no qual velhos casais reencontram o desejo.


Um país, veja bem, não é o conjunto de suas desgraças. Não é o sorriso do velho banguela ao ver seu neto banguela rindo do vento que lhe assopra o rostinho.

Um país não é nem a chuva ruidosa (muito menos a garoa) nem a mulher que, no meio da rua, parece chorar e ao mesmo tempo sorrir. Não é a gargalhada de um grupo de adolescentes.

Alguns querem que um país seja o aplauso comovido para aquela cantora cuja voz é apenas um fiapo da voz de quando ela estava no auge. Esqueçam. Um país não é a vassoura que varre a calçada.

Um país está longe de ser um assalto a banco. Do mesmo modo, está longe de ser um ato altruísta de um mendigo. Até poderia ser, mas não é, um beijo que o senhor violento, às escondidas, dá em uma flor cujo cheiro é mais intenso que a cor. Um país não é a sua literatura ou seus muros pichados.

Um país não é uma greve geral. Não é um dia sem consumir carne ou um dia sem consumir ou um dia em que se vai de visita ao túmulo dos pais.

Um país não são as crianças na escola. Não são os jovens na escola. Não são os adultos empregados. Não são nossas certezas ou sonhos.

Um país não é um filme de terror — ainda que um filme de terror possa ser um país; ainda que uma comédia possa ser um país. Ainda que a tristeza possa representar o país. Ainda que a alegria faça parte das saudades de um país.

Um país não é a sabedoria. Não são os acepipes servidos em reuniões festivas. Não são as quitandas cuja receita é anterior ao próprio país. Um país não são seus tambores e festas.

Um país não tem o rosto que os mapas dizem que ele tem.

Um país — o nosso — é um daqui a pouco urgente.

Na Secom, Bolsonaro queima junto com assessor

O incêndio que arde na Secretaria de Comunicação da Presidência da República não para de crescer. Avolumam-se as evidências de que o chefe do órgão, Fabio Wajngarten, meteu-se num conflito de interesses que carboniza sua reputação e pode resultar em processo por improbidade administrativa. Como empresário, presta serviços a emissoras de TV e agências de publicidade. Como secretário, gerencia o rateio das verbas publicitárias..

A Comissão de Ética da Presidência da República analisa a encrenca no dia 28. O Tribunal de Contas da União se equipa para perscrutar os contratos firmados por Wajngarten. A oposição prepara representação a ser protocolada na Procuradoria-Geral da República. E discute com aliados do centrão a hipótese de arrastar o secretário para uma inquirição no Congresso.

Alheio à movimentação, Bolsonaro lida com o incêndio à moda de um personagem de anedota de português. Nela, após incêndio no interior de um prédio, os bombeiros verificam os destroços. Encontram apenas um morto: Jair Manoel.


Ele estava de ponta-cabeça, com o dedo indicador apontando para um dos cantos do ambiente. Ao lado de Jair Manoel, havia um extintor de incêndio com a seguinte instrução: "Em caso de incêndio, vire para baixo e aponte para a chama.".

Bolsonaro ficou de cabeça para baixo no instante em que, a despeito do cheiro de queimado, anunciou que manterá Wajngarten no cargo. "Se foi ilegal a gente vê lá na frente", declarou.

No momento, dispondo da caneta presidencial, único extintor capaz de deter o fogo, o capitão limita-se a apontar para as labaredas, sem se dar conta de que está sendo chamuscado.

Brasil, ralo amado


Os riscos fatais do planeta Terra

Quando será tarde demais? A pergunta que precisa ser feita diante do aumento do perigo, qualquer perigo, tem que estar conosco como uma inseparável companheira na era da emergência climática. Quando será tarde demais? Fiz essa pergunta a cientistas ingleses quando visitei o Met Office, o Inpe inglês, em 2009. Eles me mostraram as projeções, os cenários, os riscos, os tipping points. Um dos deflagradores desse ponto, a partir do qual nada mais é possível fazer, disseram eles, é a perda da floresta amazônica. O Inpe contou de novo que o desmatamento continua a crescer. Subiu 85,3% de janeiro a dezembro de 2019, comparado com 2018.

Foi exatamente o Deter, sistema de detecção de desmatamento em tempo real, que foi atacado pelo governo, a ponto de o presidente da República demitir o diretor do instituto. E o que o instituto alertou aconteceu. O Prodes já havia mostrado quase 30% de aumento. Esse sistema tem dados mais consolidados sobre 12 meses que terminam em julho de cada ano. O Deter é sistema de alerta, vai na frente, vai avisando. Na semana passada, ele divulgou os números do ano inteiro, de janeiro a dezembro, o primeiro desse governo que deliberada e abertamente estimula o desmatamento.


A economia foi atravessada por essa emergência e não há escolha que possa ser feita sem ter em vista esse perigo. O Brasil subsidia combustível fóssil, reduz imposto sobre diesel, gasta R$ 1 bilhão do dinheiro dos nossos impostos, todos os anos, subsidiando térmica a carvão. O ministro das Minas e Energia, Bento Albuquerque, me disse que o subsídio irá, pelo Plano Nacional de Energia, até 2027. Então a sociedade brasileira gastará R$ 8 bilhões até lá e só no segundo mandato presidencial depois do atual é que acabará esse gasto. Ou não. O governo Bolsonaro quer que o BNDES volte a financiar térmicas a carvão. O ministro me disse que não é para construir novas térmicas. É apenas para elas instalarem novas tecnologias. A decisão do banco, na gestão de Maria Silvia, foi não financiar e ponto. Recursos públicos seriam emprestados apenas para energias limpas e novas. Mas o que preocupa alguns economistas brasileiros são incentivos dados, e que existem em todos os países, à energia solar, limpa e sustentável. Eles nunca se incomodaram com o do carvão ou dos derivados de petróleo. Curiosa inversão do olhar.

“Os riscos diante de nós demandam imediata ação coletiva”. A frase, que poderia estar na boca de um ambientalista, foi escrita em documento divulgado pelo Fórum Econômico Mundial. Quase todos os riscos de longo prazo vistos nos cenários feitos pelos economistas e executivos da economia global são climáticos. Eventos climáticos extremos, grande perda de biodiversidade, crimes ambientais, falha na mitigação, são esses alguns dos problemas apontados por 750 especialistas e tomadores de decisão que responderam ao questionário do Fórum que acontece em Davos.

Se todos eles, que tomam decisões, acham que o perigo é este, se tantas ruas do mundo estão ocupadas por manifestantes, se líderes jovens estão alertando, com uma maturidade que nem deveriam ter, por que mesmo o mundo continua errando?

Em 2009, quando visitei o Met Office, um prédio nas proximidades de Londres com detalhes que lembram seu fundador, o comandante do navio de Charles Darvin, o mundo estava se preparando para a COP-15 de Copenhague. Havia muita esperança de um acordo global do clima que tivesse poder de lei nos países. O desmatamento da Amazônia estava caindo havia vários anos. Grandes empresários, executivos das principais empresas globais ouviam os alertas dos cientistas. Parecia ser o momento em que o mundo começaria a se afastar do perigo extremo. A reunião fracassou. Em Paris, anos depois, se conseguiu fechar o acordo do clima. Mas o governo americano passou a ser ocupado por um negacionista. O brasileiro, também. O mundo andou para trás desde Paris. Nós também. A reunião de Madri, em dezembro, foi melancólica.

Quando será tarde demais? Essa é a pergunta que a humanidade precisa encarar agora porque terá que respondê-la para as gerações que herdarão a Terra. O que estamos entregando aos nossos filhos, aos nossos netos?

Um terreno comum

Sensatez em uma área não é incompatível com sanidade em outra. É possível apoiar o combate a milícias e querer a privatização da Cedae, por exemplo. Ser de centro esquerda e defender votos dissidentes como o de Tabata no caso da Previdência e o de Freixo no pacote anticrime. Ou considerar que alguns excessos ultrapassam linhas a respeitar mas também ter certeza de que a Lava-Jato faz bem em ser firme no combate à corrupção de quem foi convivente e não inocente.

Exercer autoridade sem abuso pressupõe seguir as leis. Mas não significa blindar poderoso. Criticar arbitrariedades na investigação não impede de reconhecer corrupção sistêmica e querer sua punição. Sem jogadas marotas.

Na realidade complexa, circulamos em esferas distintas. Alguém pode ao mesmo tempo querer proteção às reservas indígenas, ser ateu e exigir respeito a quem tem crença. Ou, religioso, pode defender que não se misture fé e política e que igreja pague imposto como todos nós. Garantir o direito de defesa mas exigir que criminosos sejam punidos. Ser ativista dos direitos humanos e admitir que condenado em segunda instância comece a cumprir pena, como em quase toda democracia. Estar alerta para a urgência da questão ambiental, ver que trabalhador rural precisa de amparo e distinguir o agronegócio de sua escória. Ser a favor da autonomia universitária, contra cortes na educação e perceber que sem reformar a Previdência não há dinheiro para investir. Preocupar-se com o desemprego e enxergar que isso não se deve à reforma trabalhista.

Uma coisa não impede a outra. Defender o direito ao aborto não é incompatível com rigor no controle fiscal. Rejeitar discriminação sexual, racial ou religiosa não cega para ver as estruturas de patrimonialismo, clientelismo e corporativismo que mantêm a desigualdade econômica e social — e combatê-las sem populismo.

Ideias progressistas ou virtudes éticas não são monopólio de um só lado. Um terreno racional comum é indispensável para se construir um país melhor.

A semana em que 47 povos indígenas se uniram por um manifesto antigenocídio

Em um momento de pouco diálogo e muitas brigas no meio político internacional, 47 povos indígenas brasileiros se reuniram entre os dias 14 e 17 de janeiro para dar uma aula de diplomacia. O Encontro dos Povos Mebengokrê e Lideranças Indígenas do Brasil era um desejo que o cacique Raoni Metuktire nutria há três anos: um momento em que as diferentes lideranças de povos indígenas que vivem espalhados pelo território brasileiro estivessem finalmente juntos e que, em união, pudessem assinar um compromisso de defesa de seus direitos. Intitulado Manifesto do Piaraçu - das Lideranças Indígenas e Caciques do Brasil na Piaraçu, o documento de quatro páginas sintetiza as principais demandas de todos os signatários e o compromisso de esforço coletivo para construção de uma agenda política nacional e internacional em defesa da natureza.


A construção do texto final se assemelhou aos procedimentos diplomáticos para assinatura de acordos internacionais. Primeiro foram realizadas mesas de conversa por três dias. As grandes pautas abordadas foram os assassinatos de lideranças; os empreendimentos governamentais previstos para serem construídos sobre as Terras Indígenas; a atividade garimpeira e do mercado de mineração; a ação de madeireiros ilegais; a municipalização do sistema de saúde indígena, que ignora o tratamento especial dado atualmente a essas comunidades; e o desmonte da Funai.

O relatório original de trinta páginas foi então finalmente convertido por jovens indígenas formados em Direito em um documento enxuto, apresentado em português, por meio do qual eles denunciavam o “projeto político do Governo brasileiro de genocídio, etnocídio e ecocídio”. “As ameaças e as falas de ódio do atual governo estão promovendo a violência contra os povos indígenas, os assassinatos de nossas lideranças e a invasão de nossas terras", afirma o relatório. “O atual presidente da República está ameaçando os nossos direitos, a nossa saúde e o nosso território. (...) O governo atual está nos atacando, querendo tirar a terra de nossas mãos.”

Sob a cobertura de palha da Casa dos Homens, espaço que usado como plenária ao longo do encontro, Raoni estava cercado de outros caciques Kayapó enquanto os jovens liam a primeira proposta do texto. Os anciões pediram que os 47 povos pudessem se organizar em delegações ―pequenos grupos que se reuniram em rodas pela aldeia―, formados pelos anciões de cada povo e um jovem que pudesse traduzir o documento do português para a língua nativa de cada um. Após cada delegação ouvir a tradução em seu idioma, as lideranças fizeram uma lista de propostas de emenda ao documento.


Com as mudanças solicitadas em mãos, todos os líderes se reuniram mais uma vez na Casa dos Homens e as propostas foram votadas uma a uma. Entre elas, que fosse incluída a frase: “Não admitimos que o Brasil seja colocado à venda para outros países que têm interesse de explorar o nosso território”. Também houve muito debate sobre o título, que foi definido por consenso de forma a deixar claro que as afirmativas ali partiam de inúmeros líderes indígenas, que reconhecem Raoni como a liderança de todos. “Só nós podemos falar sobre nós e por nós mesmos. Não admitimos que nossos caciques sejam desrespeitados, assim como Bolsonaro fez em 2019 em seu discurso durante o encontro na ONU contra o cacique Raoni. Afirmamos que o Cacique Raoni é SIM [em letras maiúculas] a nossa liderança. Ele nos representa!", continua o texto.

Os líderes indígenas também decidiram em unanimidade dar destaque para a defesa dos territórios, o combate à atividade minerária, de garimpo e de madeireiras e ao arrendamento de terras. “Nós não aceitaremos garimpo, mineração, agronegócio e arrendamento em nossas terras, não aceitamos madeireiros, pescadores ilegais, hidrelétricas ou outros empreendimentos, como Ferrogrão, que venham nos impactar de forma direta e irreversível”, afirmou o documento. Por fim, as nações indígenas reiteraram esperar que as palavras redigidas em papel ecoem pelas ruas, por meio de manifestações no Brasil e no exterior. “2020 será um ano de muita luta, (...) de muitas mobilizações (...) em Brasília e nas ruas do mundo todo”, diz o documento.

E assim, após nove horas de negociação entre os povos, o texto final foi assinado pelas principais lideranças. Três mulheres kayapó (Maialu, Mayal e Moé) fizeram a relatoria do documento. Maialu, filha do cacique Megaron Metuktire, braço direito de Raoni, foi quem encerrou a mesa. Uma dança marcou a conclusão da elaboração do manifesto e a retomada da aliança dos povos da floresta. O momento retratou a união entre povos fisicamente distantes, do Rio Grande do Sul ao Pará, e de reconciliação oficial entre nações que já tiveram desavenças, agora deixadas para trás.

Pensamento do Dia


Bolsonaro promove a política da presepada

O que acontece quando chega ao governo federal um conjunto de ressentidos que passou a vida gramando para tirar uma nota C na prova, achava que bons modos eram coisa de pessoas frescas e sobrevivia das migalhas do poder?

Acontece o governo Jair Bolsonaro.

A insciência passa a ser vendida como virtude, e o insulto, como método de comunicação. Mas, porque competência não se improvisa, a presepada amiúde vira a resultante do entrechoque entre habilidade de menos e testosterona de mais.

A dicção imperial de Roberto Alvim a interpretar o arauto genocida do 3º Reich, embolado numa maçaroca simbólica, talvez não ache rival na escala de cenas ridículas já originadas na Esplanada dos Ministérios. Mas a distância para outras quixotadas deste governo é apenas de grau.

No Carnaval passado, o presidente veiculou imagens obscenas a pretexto de denunciar o que considera indecência. A escatologia —as alusões a detritos e excrementos— nunca frequentou tanto a expressão de um chefe de Estado brasileiro, o que é tema para psicanalistas.

Grosserias com adversários e profissionais da imprensa se tornaram moeda corrente, cunhada no Palácio do Planalto. Também vem de cima o desapreço pela técnica, pelo estudo, pela argumentação e pelo vernáculo. É apenas consequência um ministro da Educação ignorante do tema, que massacra a língua portuguesa e escoiceia os seus críticos.

Como são mal dotados também de sintaxe institucional, muitos quadros do Executivo apenas dissipam energia governamental. Dão com os burros n`água no Congresso, no Supremo Tribunal Federal e nos demais órgãos de controle. Nem bem se refizeram da trombada de ontem e já se abalam de novo contra o muro.

A estultice resfria o vapor autoritário que lhes sai pelas ventas. A inépcia atenua o efeito da brutalidade e deixa a patetice de subproduto. Mas em quatro anos até camundongo aprende. De pancada em pancada, o bicho começa a acertar os movimentos. Aí é que mora o perigo.

O Real Resiste

Autoritarismo não existe Sectarismo não existe Xenofobia não existe Fanatismo não existe Bruxa fantasma bicho papão O real resiste É só pesadelo, depois passa Na fumaça de um rojão É só ilusão, não, não Deve ser ilusão, não não É só ilusão, não, não Só pode ser ilusão Miliciano não existe Torturador não existe Fundamentalista não existe Terraplanista não existe Monstro vampiro assombração O real resiste É só pesadelo, depois passa Múmia zumbi medo depressão não, não, não, não não, não, não, não não, não, não, não não, não, não, não Trabalho escravo não existe Desmatamento não existe Homofobia não existe Extermínio não existe Mula sem cabeça demônio dragão O real resiste É só pesadelo, depois passa Como o estrondo de um trovão É só ilusão, não, não Deve ser ilusão, não não É só ilusão, não, não Só pode ser ilusão Esquadrão da morte não existe Ku Klux Klan não existe Neonazismo não existe O inferno não existe Tirania eleita pela multidão O real resiste É só pesadelo, depois passa Lobisomem horror opressão não, não, não, não não, não, não, não não, não, não, não não, não, não, não

Arnaldo Antunes

Árvores da Amazônia são mais sensíveis ao fogo, diz estudo de Yale e do Ipam

Estudo de um time internacional de cientistas aponta que a casca das árvores em florestas tropicais, “consistentemente mais fina”, torna a região amazônica mais sensível a incêndios. O grupo inclui pesquisadores da Universidade de Yale, nos EUA, e do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), com sede em Belém.

“Os incêndios representam uma acelerada ameaça para a floresta tropical da Amazônia. No período de seca, podem afetar áreas ainda maiores. Neste estudo, mostramos o quanto a casca mais espessa pode proteger as árvores do fogo, mas em florestas tropicais as cascas são consistentemente mais finas”, afirma o texto dos pesquisadores.


O levantamento foi produzido pela professora norte-americana de ecologia e evolução biológica Ann Carla Staver, de Yale, e pelo brasileiro Paulo Brando, do Ipam, além de cientistas colaboradores. Segundo o estudo, a casca mais fina aumenta a mortalidade das árvores pelo fogo – especialmente nas matas mais úmidas.

“A intensidade do fogo afeta claramente a mortalidade das árvores, mas, mesmo assim, diversas florestas podem reagir de maneira diferente a uma intensidade de fogo semelhante. […] As reduções na mortalidade de caules entre árvores com casca mais espessa têm sido extensivamente descritas em áreas mais inflamáveis”, afirma o estudo dos cientistas.

Os pesquisadores explicam que a espessura dessa casca nos troncos varia com as particularidades de cada floresta. Áreas mais úmidas, por exemplo, resultam em árvores com casca mais fina.

Essa diferença é perceptível mesmo considerando um único bioma. Segundo o estudo, as árvores do projeto Tanguro em uma área amazônica do Mato Grosso, por exemplo, são mais resistentes ao fogo que aquelas da região de Manaus, no Amazonas.

O fogo, de acordo com os cientistas, se transformou na principal ameaça às florestas tropicais ao longo das últimas três décadas. O cenário é reflexo de uma combinação entre o desmatamento e o aumento da frequência das secas.

“Ao longo do século 20, os incêndios foram amplamente restritos a áreas com desmatamento ou áreas desmatadas para manutenção agrícola, mas agora os incêndios podem se espalhar prontamente por florestas que não foram perturbadas, aumentando drasticamente as áreas queimadas”, sublinham.

Entre 2000 e 2013, os pesquisadores mediram a espessura média de cascas de árvores em 13 diferentes pontos da Amazônia. Em cada local, os cientistas consideravam uma área total de 1 hectare (10 mil metros quadrados).

A partir da análise por imagens de satélites, percebendo o comportamento de cada uma dessas áreas em caso de incêndios, foi possível compreender como se dava a taxa de mortalidade das árvores locais ao terem contato com o fogo.

Os pesquisadores concluíram, a partir desses dados, que onde havia árvores com cascas mais espessas, o fogo se alastrava com menor propulsão, ou seja, mais lentamente.

Medido no período que vai de agosto de um ano a julho do ano seguinte, o desmatamento na Amazônia aumentou em 15% no acumulado dos 12 meses de 2019 em relação ao mesmo período no ano anterior, em 2018.

Os dados são do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) do Imazon, instituto que não é ligado ao governo. A área desmatada nos últimos 12 meses chegou a 5.054 km².

Já para o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), a Amazônia registrou o índice mais alto de queimadas dos últimos quatro anos, com 30% mais focos de incêndio.
Matheus Leitão