sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Pixuleco toma ponte de Sampa

O Antagonista publica, em primeira mão, 
as apavorantes imagens da mutação atômica de Pixuleco

A culpa é da bola

Num acesso de modéstia e autocrítica, a presidente Dilma confessou a três jornais que seu grande erro foi ter “demorado muito para entender a gravidade da crise”.

Mas como costuma acontecer com pessoas tão seguras de si e imersas em suas certezas, a modéstia da presidente não é tão modesta e nem a autocrítica tão autocrítica assim.

Bola Brasil (Foto: Arquivo Google)

Vocês pensam que ela pediu desculpas? Ora…

Há de haver um culpado por ter induzido tão brilhante formuladora e gestora econômica a um equívoco tão lamentável.

Embora até o mais distraído dos analistas econômicos de qualquer banco- isso para não falar da pobre Sinara Polycarpo, demitida do Santander por “não entender porra nenhuma de Brasil” (segundo a elegante avaliação do ex-presidente Lula) - percebessem a gravidade da crise, a presidente, absorta em outras enormidades, não teve tempo de preparar-se para a - ôpa! - surpresa.

Todos se prepararam, menos ela e Mantega (que, timidamente balbuciou que sabia, sim, de alguma coisa, mas falou tão baixo que quase ninguém ouviu). Ela porque estava ocupada contando lorotas em palanques para poder se reeleger, ele porque é um burocrata obediente e disciplinado.

Claro que nessa autocrítica - ma-non-troppo - era infalível que sobrasse para alguém, algum inimigo externo, algum fator superveniente, algum ente estranho, alguma ameaça vinda do exterior, pois não há governo dito de esquerda- seja da autêntica, seja da falsificada- que prescinda de um fantasma exterior em quem jogar todas as culpas.

Dilma diria eu errei com minha política de incentivar o consumo com subsídios e desonerações escolhidas a dedo que aumentaram brutalmente o custo fiscal? Jamais. A culpa é da crise externa, do subprime, da voracidade do sistema financeiro, da crise de 29, da queda do preço das commodities, da crise da Bolsa de Xangai, da queda do preço do petróleo e de todos os abalos passados e futuros que o capitalismo sofreu e que ainda venha a sofrer.

Pois a presidente que na campanha eleitoral dizia que a proposta da oposição de reduzir os ministérios para cortar gastos era “uma grande cegueira tecnocrática”, mandou um ministro dar uma coletiva dizendo que o governo “está pensando em cortar 10 dos 39 ministérios”. Quais? Quando? Onde? Para economizar quanto?

Aí vocês estão querendo saber demais.

É verdade que enquanto os cortes de gastos vão sendo fantasiados em banho-maria, o maior déficit primário mensal da história era anunciado (7,22 bilhões de reais em julho) e os arautos da desgraça pouca é bobagem começavam a fazer circular, pela milionésima vez, a ideia de ressuscitar a CPMF, o eterno pronto socorro de governos na pindaíba.

Sabe-se que Lula e Dilma juntos aumentaram em 129 mil o número de servidores públicos, que chegou a 615 mil, e que criaram 32 mil novos cargos e funções de confiança, chegando a um total de 99 mil. O mesmo ministro que anunciou o hipotético fechamento de 10 ministérios, disse que poderiam ser cortados uns mil cargos de confiança- dos 32 mil novos que foram criados.

Ou seja: a penúria do Tesouro é concreta, os cortes de gastos são hipotéticos. E mesmo que se concretizem serão pífios. Os empregos vão se esvaindo, a perspectiva de recessão estende-se para 2016, a produção industrial continua capengando, a arrecadação caindo, os gastos crescendo e a senhora presidente vem dizer que seu único erro foi ter demorado a perceber a gravidade da crise?

No meio de todo esse cenário tenebroso, o governo não encontra a saída de seu labirinto, a popularidade da presidente anda ao rés do chão, mas os últimos bastiões do governismo delirante ainda são capazes de repetir que a culpa de tudo é de gente que não gosta que pobre ande de avião.

Não é de chorar?

A pior crise do governo Dilma é a de confiança!

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É evidente que o Brasil vive uma grave crise econômica, e os números de déficit primário divulgados nesta quinta não deixam a menor dúvida a respeito. Não é menos evidente que o país vive uma crise política, iniciada, sejamos precisos, com o desmoronamento do modelo supostamente distributivista do PT, que se ancorava no incentivo ao consumo, que era garantido por fatores alheios às virtudes do petismo. A Lava-Jato veio tornar tudo muito mais grave.

É certo que a recessão estaria aí mesmo sem a tal operação; é claro que o desemprego estaria em alta; é claro que os juros estariam nas estrelas; é claro que a inflação em 12 meses estaria roçando os 10%. E não seria menos clara a indignação das pessoas.

Ocorre que a Lava-Jato veio, digamos, arrematar esses sinais explícitos de incompetência com as safadezas explicitadas. Aí, meus caros, a mistura ficou mesmo explosiva.

Essa seria, então, a hora de testar um líder — ou uma líder. E, aí, como se diz em Dois Córregos, a porca torceu o rabo. Não havia liderança nenhuma no Palácio do Planalto. Longe de se mostrar um fator de estabilidade, Dilma resolveu ser uma alimentadora de problemas.

E eis que se plasmou, então, uma crise que é pior do que a econômica e a política: a crise de confiança. Não me refiro a aspectos subjetivos, de cunho existencial. Os agentes econômicos e políticos precisam olhar para quem está no poder e saber ao menos o que essa pessoa NÃO VAI FAZER.

O episódio da CPMF evidencia que não há clareza nem sobre isso.

Eis aí. Dilma merece ser deposta por todas as transgressões à Lei 1.079. Mas vai acabar caindo porque, no fim das contas, ninguém confia nela.

A cegueira da governança


Príncipes, Reis, Imperadores, Monarcas do Mundo: vedes a ruína dos vossos Reinos, vedes as aflições e misérias dos vossos vassalos, vedes as violências, vedes as opressões, vedes os tributos, vedes as pobrezas, vedes as fomes, vedes as guerras, vedes as mortes, vedes os cativeiros, vedes a assolação de tudo? Ou o vedes ou o não vedes. Se o vedes como o não remediais? E se o não remediais, como o vedes? Estais cegos. Príncipes, Eclesiásticos, grandes, maiores, supremos, e vós, ó Prelados, que estais em seu lugar: vedes as calamidades universais e particulares da Igreja, vedes os destroços da Fé, vedes o descaimento da Religião, vedes o desprezo das Leis Divinas, vedes o abuso do costumes, vedes os pecados públicos, vedes os escândalos, vedes as simonias, vedes os sacrilégios, vedes a falta da doutrina sã, vedes a condenação e perda de tantas almas, dentro e fora da Cristandade? Ou o vedes ou não o vedes. Se o vedes, como não o remediais, e se o não remediais, como o vedes? Estais cegos. Ministros da República, da Justiça, da Guerra, do Estado, do Mar, da Terra: vedes as obrigações que se descarregam sobre vosso cuidado, vedes o peso que carrega sobre vossas consciências, vedes as desatenções do governo, vedes as injustças, vedes os roubos, vedes os descaminhos, vedes os enredos, vedes as dilações, vedes os subornos, vedes as potências dos grandes e as vexações dos pequenos, vedes as lágrimas dos pobres, os clamores e gemidos de todos? Ou o vedes ou o não vedes. Se o vedes, como o não remediais? E se o não remediais, como o vedes? Estais cegos.
António Vieira (1608 - 1697) 

Pagando os excessos

CPMF mae filho castigo quatro palavrao dilma imposto

Que o Brasil estava quebrado, rumo à desintegração, era fácil de entender ao longo de 12 anos marcados por aumentos sistêmicos de custeio da máquina pública, muito acima do crescimento do Produto Interno Bruto.

Em qualquer época há quem ganha e quem perde.

Nos primeiros meses de 2015 todos os setores produtivos (menos a agricultura) sofreram, e continuam sofrendo, queda histórica de atividades, turbinada pelo denominado ajuste fiscal.

No comando das medidas que aumentam impostos e juros apenas se conseguiu diminuir a arrecadação da União, dos Estados e dos municípios ampliando absurdamente a dívida pública, das empresas e do cidadão. Nada do que estava nos anúncios iniciais vem se realizando, e as previsões do período de crise se dilatam a cada semana. Já se pensa em mais três ou quatro semestres. Quer dizer, a fórmula não deu certo. O conteúdo da panela não dá para ser servido.

Precisa recomeçar com novos ingredientes. Temos aí, assim, a recessão em nível estúpido.

Na condução disso tem um grupo de financistas emprestados pelos maiores bancos e chefiado por Joaquim Levy (Bradesco). Fecharam-se indústrias, lojas, vagas de trabalho em volume assombroso, os setores estruturantes da economia em agonia, criando-se uma camada glacial de desempregados. Em contrapartida, o sistema bancário nacional, especulativo, contabilizou o semestre mais rentável desde a época do Descobrimento.

A presidente, que no seu primeiro mandato abusou de medidas eleitoreiras e frívolas, tentou corrigir com outro excesso, em sentido contrário, de ortodoxia e apertos. Acreditou nos banqueiros. Mais, acreditou que a vara pode se dobrar indefinidamente sem quebrar.

Sabia-se (aqui escrevi centenas de vezes nos últimos dez anos) que a economia não aceita desaforos, que as contas econômicas precisam manter o norte da “sustentabilidade” e do equilíbrio. Sem ele, é a ruína. Amanhã, depois de amanhã, levará à ruína uma família, uma empresa, um país.

Doze anos de mágicas e pedaladas, represando rombos gerados por conta de desperdícios, corrupção e equívocos gigantescos. O comércio se expandiu com as importações, possibilitadas pela moeda artificialmente valorizada, que condenou a indústria nacional a encolher e zerar sua competitividade. Perder ainda possibilidade de renovação e de inovação.

Verbas bilionárias se vaporizaram no petrolão. O país não alcançou a autossuficiência energética de baixo custo. Investiu tudo que não podia na miragem de um petróleo que, ao contrário de aumentar de preço e chegar a US$ 200 por barril, despencou para um valor abaixo de US$ 40. A esbórnia do pré-sal arrebentou a Petrobras; a ressaca é dura, e, para manter as contas da estatal, continua-se importando grande volume de gasolina, mais barata que o petróleo que se extrai e se refina do pré-sal.

O ajuste nunca se deu atacando as ineficiências, tapando ralos e rachaduras do sistema. A galinha dos ovos de ouro, o setor produtivo, que mantém uma estrutura socioeconômica de pé, gerando empregos e arrecadação, foi a mais prejudicada.

A palavra para compreender a crise em que se afundou o governo Dilma: EXCESSO.

Excessos em todos os sentidos, nas previsões absurdamente deslumbradas, nas medidas perdulárias do primeiro mandato. Incapacidade de compreender o momento, de tomar medidas corretas. Depois outros excessos no ajuste econômico, uma overdose que está colocando o Brasil em agonia.

Os ministros escalados, se não forem incompetentes, são mal-intencionados, servem apenas aos bancos que os empregam.

No primeiro mandato a presidente abusou das “comadres da Alvorada”, Miriam Belchior (ex de Celso Daniel), Ideli Salvatti, Gleisi Hoffmann e Graça Foster. Esse grupo ditou a política que arruinou o sistema energético nacional, já debilitado pelo antecessor, Petrobras e Eletrobras estão quebradas, e as contas sendo pagas a caro preço em tarifas insuportáveis para a maioria da população e das empresas. Inventaram as comadres descontos mirabolantes nas tarifas de luz, confisco de hidrelétricas, escolhendo no menu de medidas mais desestruturadoras possíveis. Vários setores que dependem de energia elétrica foram levadas sumariamente a fechar as portas e milhares de vagas. Nenhuma medida compensatória foi proposta. Ainda a maioria dos empréstimos do BNDES financiou os larápios do petrolão e se perdeu na corrupção que deixou para trás um punhado de cinza.

Embora Dilma se encontre a enfrentar o pedido de impeachment que a classe média pede nas ruas das metrópoles, indignada com as roubalheiras, poderá ser atingida e atropelada apenas quando o desemprego e as dificuldades chegarem à mesa das classes menos abastadas. E já começou a chegar.

Acreditar que as medidas de Levy tenham capacidade de consertar a crise é pouco provável. Mas, tanto para Dilma como para quem possa sucedê-la, precisará manter claro que se aumenta arrecadação e o desenvolvimento não com torniquete e burocracia, mas preservando a capacidade de produção e de trabalho.

A forma de sair da desgraça em que precipitou está no plano de “conversão ambientalmente correta, do fóssil para o renovável”, ainda na limpeza do ar, das águas e do planeta Terra, do Brasil em especial. Exatamente o contrário do que representam pré-sal e escolhas que serviram de pretexto para o maior esquema de corrupção do planeta.

Uma enorme dificuldade também deriva da ocupação dos ministérios e das estatais por figuras sem expressão, à disposição de planos de poder partidários, sem compromisso com a nação.

O momento requer grandes lideranças, motivação patriótica, união e propostas de superação. Circunstâncias difíceis e complicadas tanto pelos atores no palco quanto pela visão voltada apenas ao poder, ao interesse de setores isolados.

A presidente vem perdendo credibilidade e, por consequência, autoridade para exercer o papel de mediadora da crise. Os excessos a fragilizaram, e corrigir-se está ficando cada dia mais árduo.

Diário de um brasileiro

O brasileiro convive bem com o escândalo moral.
Os ladrões infestam os salões de luxo,
os Bancos estouram, os banqueiros
são cumprimentados com reverência,
o Presidente do Congresso chama o senador
de bandido, sim senhor, vossa excelência.

O Presidente diz pela televisão
que “é preciso acabar com a roubalheira
nos dinheiros públicos”.
As pessoas das cidades grandes
vivem amedrontadas, qualquer
transeunte pode ser um assaltante.
As meninas cheiram cola. Depois
vão dar o que têm de mais precioso
ao preço de um soco na cara desdentada.

O brasileiro convive com o escândalo
como se fosse o seu pão de cada dia,
com uma indiferença letal.

Como se dormir na casa com um rinoceronte,
mas rinoceronte mesmo,
fosse a coisa mais natural do mundo,
chegando a cheirar a camélias.

O povo, um dia.
Do povo vai depender
a vida que vai viver,
quando um dia merecer.
Vai doer, vai aprender.
 Thiago de Mello

Demagogia generalizada

Quando Marx afirmou que a história da humanidade é a história da luta de classes, repetia a ideia maluca de Rousseau, formulada quase 100 anos antes, de que o homem era naturalmente bom, mas se corrompeu pela instituição da sociedade e da propriedade privada. Desde então, a doutrina marxista ganhou ares axiomáticos e praticamente todo formador de opinião concorda com ela. Esse pensamento é reproduzido não só na academia, mas também na cultura: literatura, cinema, novelas, programas de tevê.

Dias atrás, assistindo a um famoso programa dominical, fui surpreendido por um quadro interessante. Quatro artistas – desses que fazem novelas – convidaram quatro crianças beneficiadas por um projeto social da emissora em parceria com a Unesco para terem contato com a profissão que desejam seguir. Foi lindo ver o olhar daquelas crianças, vislumbrando a possibilidade de fazer aquilo com que sonham. Uma delas, com 7 anos e um desejo impetuoso de ser médica, vibrou ao presenciar a realização de um ultrassom. Possibilitar esse contato muitas vezes é decisivo para um indivíduo. Mostrar aonde seu esforço pode levá-lo é um exercício de motivação incomparável. Parabéns aos envolvidos.

Porém, na semana seguinte, o programa convidou quatro crianças de condição social elevada para visitar projetos sociais. E o maniqueísmo ideológico estava formado.

O problema não foi a ação em si, mas o discurso implícito. Da boca dos artistas, essas crianças foram convidadas a “viver uma experiência nova”. Uma delas ouviu: “eu tenho certeza de que esse lugar vai mudar a sua vida”. E a outra disseram que teria contato com crianças que, como ela (?), “sonham com um futuro melhor”. Pensei: que mundo é esse onde crianças ricas não sabem mais o que são crianças pobres? Na minha infância isso era a coisa mais normal do mundo. Tive amigos ricos e amigos favelados.

Antes da falência do ensino público – bingo! – e do isolamento dos ricos por causa da violência – bingo! –, era comum ricos e pobres estudarem e brincarem juntos. Fato é que, apesar de as crianças de condições sociais muito díspares estarem cada vez mais separadas hoje, essa não é a realidade absoluta. Qualquer família que melhora um pouco sua renda coloca os filhos em escolas particulares, onde eles têm contato com crianças mais ricas (e com melhor ensino, claro). Eu mesmo, que sou negro, professor de escola pública e no programa fui curiosamente representado pelas crianças assistidas pelo projeto social, tenho filho em escola particular. E grande parte da população está dentro dessa média que o discurso ignora. Por que reforçá-lo, então?

Em seu livro 'Os intelectuais e a sociedade', o economista americano Thomas Sowell lembra-nos de que, em geral, os formadores de opinião favorecem-se de “crenças abstratas que são comuns entre os intelectuais, os quais podem ter pouco ou nenhum conhecimento de primeira mão sobre os indivíduos, as organizações ou as circunstâncias concretas envolvidas”. E que, “além do mais, tais atitudes não são somente disseminadas para muito além das fileiras da intelligentsia, mas se tornam base de políticas, leis e decisões judiciais”. Bingo! Esse discurso favorece a própria intelligentsia e o governo, que dele se aproveita para criar seus programas sociais que, apesar de não resolverem os problemas, lhe geram o bom e velho capital eleitoral.

Paulo Cruz

Ninguém confia mais no governo Dilma Rousseff

Nas mesas de bar, nas filas de supermercados, nos consultórios médicos, na Esplanada dos Ministérios, em todos os lugares a que se vá, a sensação é uma só: ninguém confia mais no governo Dilma Rousseff. Mesmo os petistas mais aguerridos admitem que a atual administração criou um clima tão ruim que não se sabe se o país conseguirá suportar, por mais três anos, conviver com um cadáver insepulto.

A desconfiança não nasceu por acaso ou por implicância gratuita com a presidente. Ela é fruto exclusivo de um governo marcado pela incompetência e pela arrogância.

Dilma e vários de seus ministros desrespeitaram regras básicas da economia, plantaram e colheram inflação, destruíram as contas públicas, minaram a credibilidade do Banco Central, cederam a lobbies poderosos e, pior, detonaram uma crise política que paralisou o Brasil. Tudo, é claro, regado à corrupção que destruiu a Petrobras e foi desvendada pela Operação Lava-Jato.

Já em 2014, com Dilma candidata à reeleição, a desconfiança começava a fincar raízes no país. As empresas, mais conscientes dos problemas criados pelo governo, pisaram no freio e suspenderam os investimentos. Passaram a temer que o país mergulhasse em uma profunda recessão e fábricas que haviam sido ampliadas se tornassem um sorvedouro de dinheiro, devido à queda nas vendas. Estavam mais do que certas.

Do lado dos consumidores, porém, a sensação de bem-estar construída nos anos anteriores impedia que muitos percebessem que o governo estava levando o país para o atoleiro. A renda ainda cresceu forte em 2014, as negociações salariais garantiram bom reforço nos contracheques e o desemprego era apenas uma ameaça.

Muita dessa falsa visão de que tudo estava indo bem foi estimulada pelo Palácio do Planalto por meio de incentivos ao consumo que quebraram o Tesouro Nacional. Foi em cima desse quadro ilusório, que Dilma fez o diabo para se reeleger.

Quando 2015 chegou, o desastre estava consumado. A população se deu conta de que havia sido vítima de um estelionato eleitoral. Mas já era tarde. Restou aos consumidores a fatura da enganação: aumentos superiores a 50% na conta de luz, reajustes dos combustíveis, inflação de quase 10%, renda corroída, juros abusivos e desemprego nas alturas — somente nos primeiros sete meses deste ano, pelo menos 500 mil empregos com carteira assinada foram fechados.

Diante desse quadro, reconhece o economista Sílvio Campos Neto, da Consultoria Tendências, não há como se falar em retomada da confiança, que está nos níveis mais baixos da história, tanto entre as empresas quanto entre os consumidores. Não neste ano, nem em 2016. “A sociedade está muito pessimista. Sabe que a recessão na qual o país está mergulhado será pesada, com consequências ruins, como o aumento do desemprego”, explica.

Na avaliação dele, ainda que o nível da atividade volte a melhorar em meados do ano que vem, levará tempo para que o mercado de trabalho se recupere. “Com um índice de desocupação elevado, mesmo que a inflação caia um pouco, é difícil ver a população mais otimista. As pessoas não conseguem ficar felizes quando o bolso não vai bem”, acrescenta.

As bombas maiores: divórcio entre as urnas e as ruas

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As pessoas têm a tendência de ver apenas as bombas mais próximas e ignorar aquelas escondidas, que ameaçam o futuro. As bombas do momento são a corrupção, que joga estilhaços de vergonha sobre todos os políticos (especialmente dos partidos no governo), e o descrédito de um governo que errou na economia, faltou com a verdade na campanha e descumpriu promessas. Apesar disso, o governo vê apenas as bombas imediatistas que ameaçam o equilíbrio fiscal.

A crise política, econômica e moral que atravessamos parece impedir a percepção das bombas que ameaçam o futuro mais distante. Ficamos presos às bombas da corrupção, da inflação, do descrédito da presidente e dos políticos em geral, não vemos as outras bombas.

A dívida dos Estados e dos municípios, já em fase de explosão, mesmo assim ainda é relegada. A explosão de gastos públicos, face às limitações da já imensa carga fiscal, destroçará as contas públicas. Nossos entes federados estão atravessando a linha que separa dificuldades fiscais conjunturais da falência estrutural, com suas consequências sobre os serviços públicos e os salários dos servidores. A Previdência explodirá em algum momento não muito distante, trazendo sacrifícios devastadores sobre a população mais velha do país e penalizando os jovens.

A pobreza – sobretudo depois de ter sido escondida pelo marketing governamental dos últimos anos, afirmando que ela teria sido transformada em classe média porque, endividando-se, consegue comprar alguns equipamentos domésticos – está explodindo na miséria da falta de educação, saúde, segurança, mobilidade. A violência urbana é uma bomba que explode como uma guerra civil de proporções gigantescas, matando quase 60 mil brasileiros por ano.

Nossa má educação e o consequente atraso na ciência e na tecnologia, que nos deixam cada dia mais atrasados em relação ao resto do mundo, são a bomba que impedirá nosso ingresso no mundo do conhecimento que caracteriza a economia e a sociedade.

O endividamento das famílias pode explodir, inviabilizando nosso sistema financeiro aparentemente sólido e sacrificando a vida de nossa população. A incapacidade de gestão que caracteriza o Estado brasileiro dos últimos anos ameaça o crescimento de nossa economia e o bom funcionamento de nossa sociedade. A baixa poupança de nossas famílias, empresas e governo é uma bomba que impede os investimentos necessários à construção de uma infraestrutura eficiente, ao crescimento da economia e ao aumento da produtividade de nossa indústria. O desemprego é uma bomba trágica de grandes proporções. A bomba do consumo de drogas corrói famílias e anula o potencial de dezenas de milhares de jovens.

Mas a maior das bombas é a despolitização do debate entre grupos políticos sem visão nem propostas, presos às pequenas bombas do presente, sem a percepção das grandes em andamento: o divórcio entre as urnas e as ruas, entre os políticos e o povo, está explodindo no colo da democracia.