quarta-feira, 26 de setembro de 2018

O dinheiro dá asas!

No Supremo, você tem gabinete distribuindo senha para soltar corrupto. Sem qualquer forma de direito e numa espécie de ação entre amigos
Luís Roberto Barroso, ministro do STF

Brasil falha em proteger suas crianças e adolescentes

Apesar de uma legislação infanto-juvenil avançada, metade das crianças e adolescentes brasileiros (49,7%) não tem acesso a pelo menos um dos seguintes direitos fundamentais: educação, informação, proteção contra o trabalho infantil, moradia, água e saneamento. Além disso, mais de 34% de meninas e meninos de até 17 anos vivem em casas com renda per capita insuficiente para comprar uma cesta básica, ou menos de R$ 350.

O cruzamento desses dados – que fazem parte do relatório do Unicef Pobreza na infância e na adolescência, divulgado em agosto – revela que, no Brasil, a pobreza na infância e na adolescência é complexa e tem múltiplas dimensões, que vão além do dinheiro e da legislação.

"O Brasil tem uma das legislações mais avançadas do mundo para proteger crianças e adolescentes, mas também é um dos países onde crianças e adolescentes estão mais desprotegidos", afirma o coordenador da Comissão da Infância e do Juventude do Condepe (Conselho Estadual de Direitos Humanos de São Paulo), Ariel de Castro Alves.

Ele se refere ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Aprovado em 1990, o ECA é referência mundial como legislação de proteção à criança e ao adolescente e foi formulado a partir da Constituição Federal de 1988, uma das primeiras a contemplar a proteção integral e os direitos e garantias fundamentais da criança e do adolescente.

"A legislação brasileira é excelente, uma das mais modernas do mundo, mas não é cumprida. Começamos pelo descumprimento da própria Constituição, já que crianças e adolescentes, na prática, jamais foram prioridade no Brasil", diz a presidente da Comissão de Direitos da Criança e do Adolescente da OAB, Silvana do Monte Moreira.

De acordo com o Unicef, mais de 18 milhões de meninas e meninos vivem na pobreza. Entre os direitos fundamentais, o acesso ao saneamento é o direito mais descumprido e afeta mais de 13,3 milhões de crianças e adolescentes, seguido pela educação (8,8 milhões), água (7,6 milhões), informação (6,8 milhões), moradia (5,9 milhões) e proteção contra o trabalho infantil (2,5 milhões). Quase 14 mil crianças e adolescentes não têm acesso a nenhum dos seis direitos.

Um relatório de 2017, também do Unicef, mostrou que o Brasil é, entre os países onde não há conflito armado, o quinto em assassinato de crianças e adolescentes, atrás apenas de Venezuela, Colômbia, El Salvador e Honduras. A Fundação Abrinq afirma que o número de mortes violentas de pessoas menores de 19 anos passou de 5 mil, em 1990, para 10,9 mil, em 2015.


Antes do ECA, a criança fora da escola, explorada no trabalho infantil ou vítima de violência, entre outros exemplos de violação de direitos, não era considerada um "sujeito de direito". "Com a promulgação do estatuto, quem passou a estar em situação irregular foi a família, o Estado e toda a sociedade, que não garantiram proteção integral às crianças e aos adolescentes", diz Alves.

O ECA prevê que todo município tenha os seguintes programas especializados para crianças e adolescentes: atendimento de famílias e fortalecimento de vínculos; enfrentamento ao abuso e exploração; erradicação do trabalho infantil; atendimento de drogadição; atendimento às vítimas de maus-tratos e violência; convivência familiar e comunitária, incluindo programas de apoio sociofamiliar e acolhimento institucional; medidas socioeducativas e programas de oportunidades e inclusão, visando o preparo dos jovens para o mercado de trabalho.

Só que essa não é realidade na maioria das cidades. Parte do problema pode ser explicada pela política de cortes orçamentários em políticas públicas e programas sociais, que enfraqueceu principalmente órgãos de formulação e monitoramento da população infanto-juvenil, como o Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), o PPCAAM (Programa de Proteção de Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte) e o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI). "Esses cortes e a falta de atenção ao ECA têm ampliado as desigualdades sociais e gerado mais pobreza para as crianças, adolescentes e seus familiares", analisa Alves.

Moreira também ressalta a incapacidade do Estado em atender demandas protetivas do público infanto-juvenil. "As varas da infância acumulam competências com outras áreas, como criminal em algumas comarcas, do idoso em outras, além de não terem equipes técnicas para atender os casos que lá chegam. E, quando têm, os técnicos são insuficientes", comenta.

O desrespeito aos direitos básicos gera, junto com a pobreza, um outro problema: a criminalidade infanto-juvenil. De acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça, o Brasil tem 189 mil adolescentes cumprindo medidas socioeducativas. Em 2015 eram 96 mil. O aumento no número de menores infratores fomenta discussões sobre a redução da maioridade penal, hoje em 18 anos, e coloca em evidência o ECA, que é atacado por aqueles que defendem a diminuição da maioridade para 16 anos.

Para os especialistas, a redução da maioridade penal é uma medida simplista para um problema complexo. "Essa proposta, que ganha força em períodos pré-eleitorais, é demagógica e ilusória", afirma Alves. "O principal argumento contra é que cuidado e prevenção, através de políticas sociais, custa muito menos que repressão: cada aluno na rede pública custa, em média, R$ 2 mil por ano, enquanto que um interno na Fundação Casa de São Paulo custa cerca de R$ 10 mil por mês", argumenta o coordenador, citando dados do Condepe.

A redução da maioridade penal também lançaria mais cedo o menor infrator dentro de um sistema que, na prática, é de formação de criminosos. "Teríamos criminosos ‘profissionalizados' nas cadeias mais cedo, dentro de um sistema prisional falido, que é dominado pelo crime organizado e pela corrupção e que nunca resolveu o problema da violência, pois a reincidência, conforme dados da CPI do Sistema Carcerário, é de 70%", afirma Alves.

O atual encarceramento dos jovens infratores na Fundação Casa também não é a solução. "A Fundação Casa de São Paulo tem apresentado reincidência de 20%, e esse percentual não leva em conta os jovens que completam 18 anos e vão para as cadeias pela prática de novos crimes", informa Alves.

"De socioeducativas, as unidades voltadas aos jovens infratores nada têm. São apenas espaços amontoados de adolescentes jogados em locais imundos, insalubres e em número superior à capacidade", afirma Moreira. "É cômodo para o Estado tender a medidas retrógradas, como a redução da maioridade penal ou o aumento do tempo de internação do adolescente infrator, pois é mais fácil punir que prevenir, prender que educar."

"Temos que incluir socialmente e garantir oportunidades à juventude. Se o adolescente procura escola, trabalho e profissionalização, mas não encontra vaga, ele vai para o crime. O crime só inclui quando o Estado exclui", diz Alves.

Deutsche Welle

Pensamento do Dia


'Pinochmann'

Não posso ainda afirmar que Marcio Pochmann seja o pior economista do Brasil, mais por excesso de competição do que por falta de esforço, mas garanto que ganha fácil o título de mais desonesto.

Não me entendam mal. Não se trata aqui de usar a velha falácia "ad hominem", qual seja, tentar desmerecer o argumento pelas falhas de seu autor, mas sim apontar as falhas do autor pelas carências, no caso gritante, de seus argumentos.

A questão no fundo é simples. Pochmann afirmou que um imposto de 1% sobre grandes fortunas eliminaria o déficit previsto para 2019, R$ 139 bilhões, conforme o Orçamento para o ano que vem.
Isto requereria que grandes fortunas montassem a R$ 13,9 trilhões; todavia, segundo os dados da Receita Federal, o conjunto total de bens e direitos declarados pelos pouco mais de 27 milhões de contribuintes que preencheram o formulário do Imposto de Renda atingia R$ 8 trilhões.

Posto de outra forma, nem tributando todos os declarantes de IR a proposta de Pochmann chegaria perto de resolver o enorme desequilíbrio fiscal do país.

Confrontado à simples aritmética, Pochmann pôs em prática um enorme arsenal de desonestidade, sem jamais enfrentar a questão.

Começa atribuindo a desordem fiscal ao atual governo. Em que pesem decisões equivocadas, como levar adiante a proposta de reajuste do funcionalismo gestada no governo Rousseff, não é preciso mais do que saber contar para perceber a falsidade do argumento.

Quando Dilma assumiu o superávit do governo federal era (a preços de hoje) de R$ 126 bilhões; quando saiu o déficit superava R$ 170 bilhões, deterioração da ordem de R$ 300 bilhões. Primeira mentira.

A segunda é mais sutil, mas não menos desonesta. Pochmann faz malabarismos para mostrar que a dívida do governo não subiu no período Dilma, utilizando-se para tanto do conceito de dívida líquida, que deduz da dívida total as reservas internacionais de posse do BC.

Ocorre que, quando o dólar se encarece as reservas se apreciam, fenômeno que reduz a dívida líquida. Todavia, isto não reflete de forma alguma o desempenho fiscal do país, apenas a valorização do dólar.
A medida correta de endividamento fiscal é a dívida bruta, que saltou de 52% para 67% do PIB no período Dilma (e, em julho deste ano, atingiu 77% do PIB).

Em outras palavras, o avanço do endividamento do governo foi muito maior com Dilma, fato escamoteado por Pochmann. Segunda mentira.

De passagem, Pochmann menciona que o desemprego subiu de 8,4% para 11,7%, sem se dignar a esclarecer a qual período se refere.

Já eu noto que o desemprego (ajustado à sazonalidade) era pouco inferior a 8% quando Dilma assumiu, 11% quando foi impedida e hoje se encontra na casa de 12% (depois de bater em 13% no início de 2017), ou seja, o grande salto ocorreu precisamente no governo Rousseff. Terceira mentira.
Pochmann conclui seu artigo agora afirmando que, além da taxação de grandes fortunas, seriam necessárias também a reformulação do imposto sobre heranças e taxação de dividendos para fechar as contas.

Não admite que errou e também não mostra de onde tirou a estimativa do "potencial arrecadatório" equivalente a 1,5% do PIB. Quarta mentira (e um tanto a mais de mistificação).
Quando afirmarem que o pragmatismo há de prevalecer caso Fernando Haddad se eleja presidente, lembrem-se que Pinochmann, o economista mais desonesto do país, é também o coordenador de seu programa econômico.

Ode aos calhordas

Os calhordas são casados com damas gordas
Que às vezes se entregam à benemerência:
As damas dos calhordas chamam-se calhôrdas
E cumprem seu dever com eficiência.

Os filhos dos calhordas vivem muito bem
E fazem tolices que são perdoadas.
Quanto aos calhordas pessoalmente porém
Não fazem tolices - nunca fazem nada.


Quando um calhorda se dirige a mim
Sinto no seu olho certa complacência.
Ela acha que o pobre e o remediado
Devem procurar viver com decência.
Os calhordas às vezes ficam resfriados
E essa notícia logo sai nos jornais:
'O Sr. Calhorda acha-se acamado
E as lamentações da Pátria são gerais.'

Os calhordas não morrem - não morrem jamais.
Reservam o bronze para futuros bustos
Que outros calhordas de nova geração
Hão de inaugurar em meio de arbustos.

O calhorda diz: 'Eu pessoalmente
Acho que as coisas não vão indo bem
Pois há muita gente má e despeitada
Que não está contente com aquilo que tem.'

Os calhordas recebem muitos telegramas
E manifestações de alegres escolares
Que por este meio vão se acalhordando
E amanhã serão calhordas exemplares.

Os calhordas sorriem ao Banco e ao Poder
E são recebidos pelas Embaixadas.
Gostam muito de missas de ação de graças
E às sextas-feiras comem peixadas.

Rubem Braga

Nome e foto de Lula são usados na campanha para enganar o eleitor

Aliados de Lula no PT e demais partidos afrontam a Justiça Eleitoral, que proibiu o uso do nome e imagem do ex-presidente e presidiário Lula na campanha. Santinhos, cartazes e propaganda no rádio e na TV reproduzem a mentira de que Lula é o candidato, com objetivo de associar seu nome a aliados onde grande parte do eleitorado lulista, desinformado, não sabe que a sua candidatura foi impugnada em razão de sua condenação à prisão por corrupção e lavagem de dinheiro.

Cartazes em Pernambuco mostram Lula “candidato a presidente” ao lado de Paulo Câmara, que tenta a reeleição para o governo.

Em Alagoas, 300 mil “santinhos” associam a inexistente “candidatura” de Lula a candidatos oportunistas, que tentam pegar carona no lulismo.

Em estados como Mato Grosso do Sul há um derrame de milhares de “santinhos” ilegais de Lula nas ruas e em caixas de correio.

Pra frente Brasil


A polaridade como problema

Para um olhar distanciado – se isso é possível quando vivemos a primeira lei de Murphy segundo a qual “se algo pode dar errado, dará” – um dos fatos mais notáveis dessa eleição é a polaridade lida como uma indesejável “polarização”. Como prenúncio de crise e violência. Como o lado negativo da concorrência eleitoral inevitável no “Estado Democrático de Direito”.


Competição sem a qual não haveria senso de realismo e de renovação como algo central da democracia tal como a conhecemos nos seus dilemas, riscos e qualidades. A menos que se pense em novas regras para o regime democrático – e tais formulações têm surgido tanto nos seus feitios fascistas quanto nos liberais (no sentido preciso de articular de modo franco e possível individualismo, liberdade e igualdade) – toda derradeira fase de um processo eleitoral ou de substituição de atores em papéis exclusivos, só pode terminar num dualismo. Numa oposição final que, diferentemente dos sistemas fechados nos quais os governantes são substituídos por assassinatos incestuosos como ocorria na Roma Antiga, é um belo exemplo disso e os nossos “golpes de Estado” são assassinatos políticos nos quais uma polaridade tida como irreversível é resolvida pela eliminação do adversário. Todos conhecemos esse caso que, como uma compulsão, teima em retornar. Nele, a discordância transforma-se em hierarquia pela submissão ou eliminação do outro.

A pergunta de fundo, portanto, é como ter Política (com “p” maiúsculo) sem polaridades? Sobretudo quando sabemos que as democracias se fundam na paradoxal adversidade destinada a resolver os clamores da maioria pelo voto dessa mesma maioria. Nelas, nada é perfeito, exceto o Ditador ou a Nomenclatura que está acima da lei e na raiz da manutenção de privilégios garantidos e irremovíveis.

O que parece revelado ao cronista de outro planeta não é o risco expresso na batida oposição entre “direta e esquerda” ou em outros dualismos, mas é a sua interpretação restritiva. A busca do “centro”, como se o centro não fosse, uma vez criado, engendrar outros dualismos, não funciona. O cuidado é garantir a competição dentro dos limites das leis e do bom senso.

Reconhecer isso não é dizer que o enredo e os atores sejam ideais. Longe disso. Mas onde existiriam artistas e enredos perfeitos?

Onde se faz história controlando, como advertia Marx, todas as circunstâncias? Se um voto por cidadão é criticável, sabemos bem o quanto é perverso o voto apenas por um partido ou segmento.

Um observador distanciado sugere que as polaridades são indigestas em sociedades e sistemas fundados na lógica aristocrática do mais ou menos, do maior e do menor, passando – como a nossa – pela multiplicidade de intermediários, os quais permitem o jeitinho e o apêndice jurídico. Enfim, tudo isso que tem permitido mudar não mudando e crescer sem distribuir.

No Brasil ainda dominado pela “turma do deixa disso”, como dizia o Millôr, passamos pela prova do um ou outro e, a menos que se tenha plena consciência de que democracia é uma responsabilidade de governantes ou governados, a eleição será sempre um perigo.

Até que se compreenda que uma eleição não dá de presente um país a qualquer um. E que ela nomeia por tempo determinado quem representa a nossa honra, a nossa honestidade e o nosso bem-estar.

Pior do que a polarização política é a social que consolida no limite da decência ricos e pobres, governantes impunes por legislações obsoletas; e dominantes e dominados. Privilegiados e gente comum. Esses que, dentro do feitio paradoxal da democracia, têm – graças às polarizações – o poder de escolher.

Reforma de meia tigela

No Brasil, privilégio é uma vantagem que os outros usufruem. Nos casos pessoais, são sempre direitos adquiridos
Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas

A morte do amadurecimento

Um amigo de meu filho, de 35 anos, me contou que numa reunião com professores e pais, na escola de seu filho de sete anos (escola esta frequentada por ele, assim como pelos meus filhos até o vestibular), um pai cobrou que na nota fosse levado em conta o conteúdo “dentro das possibilidades do seu filho”. Há uma recusa ao amadurecimento no ar.

Na mesma escola, anos atrás, numa reunião dessas, ouvi uma mãe cobrar da escola que “heroínas femininas fossem usadas em sala de aula para que as meninas fossem empoderadas”, e, da mesma mãe, “que a escola deveria dar mais atenção à África do que à história romana, grega, hebraica e mesopotâmica”. 

Pensei como deveria ser um saco, para uma professora, depois de um dia inteiro de aulas, ter que aturar pais metendo o bedelho no que não entendem e, literalmente, enchendo o saco.

Sim, o mundo está bem chato. O sapiens está saturado de ruídos. Espécie pré-histórica, evoluída num cenário do alto do Paleolítico, em meio à preponderância do silêncio, agora, com iPhones na mão, assola o mundo com opiniões. Falam muito da destruição do ambiente; temo que o sapiens se destrua falando demais.

Exemplos dessa pedagogia contra o amadurecimento já estão na universidade. E logo estarão nas empresas. Pais e psicólogos atacarão o RH das empresas com ameaças de processos jurídicos, como já ensaiam nas escolas e universidades, porque essas empresas não estarão levando em conta a “economia da autoestima” de seus filhos estagiários. 

Exagero? Não exagero. O mundo marcha a passos largos para o retardamento mental como uma opção pedagógica. Frase insensível à vulnerabilidade das pessoas?

Há um culto da vulnerabilidade por aí. Pais e profissionais cada vez mais fazem pressão para que as instituições de ensino relativizem normas de avaliação em nome de ficar “dentro das possibilidades” de seus filhos.

Entre as várias hipóteses possíveis, julgo que a raiva reprimida de ter que perder tempo, dinheiro e saúde cuidando dos filhos faz com que muitos pais exagerem nas provas de “amor e cuidado” com eles, exigindo que o resto do mundo os ame, como eles mesmos não são capazes.

Exagero? Talvez um pouco, mas não muito. Lanço mão de uma tática argumentativa chamada hipérbole (quando você exagera num argumento para defender uma hipótese que está aquém da afirmação exagerada), por causa do desespero que dá ver os pais destruírem a vida dos filhos fazendo deles zumbis adictos de formas institucionais de distribuição de autoestima. 

Fala-se muito de educação, mas ela já foi para o saco há muito tempo. A fúria de fazer o mundo melhor nos destruirá a todos. O esvaziamento dos vínculos familiares pressiona o Estado e as escolas para cumprir o papel de pais narcisistas e de saco cheio. Aliás, todo mundo está de saco cheio, o Sapiens não se aguenta mais. Uma espécie pré-histórica perdida na redes.

Entre 1990 e 2010, o termo “estudantes vulneráveis” passou de 55 referências para 1.136. De 2015 a 2016 houve 1.407 referências ao mesmo termo. A fonte é LexisNexis Database. Quem a cita é o sociólogo Frank Furedi, no seu mais novo livro, “What’s Happened To The University? A Sociological Exploration of its Infantilisation” (o que aconteceu com a universidade? Uma exploração sociológica de sua infantilização, ed. Routledge, 214 págs.), sem tradução no Brasil. Proponho a leitura para pais, professores e pesquisadores do assunto.
A conclusão do autor, que se dedica a esse campo, no mínimo, desde 2004, quando publicou seu “Therapy Culture” (cultura da terapia), também sem tradução no Brasil, é que ao optarmos por uma narrativa da vulnerabilidade, optamos por estudantes infantis. 

Numa linguagem exagerada, estamos criando uma sociedade de inseguros afetivos e cognitivos. Os idiotas da tecnologia acham que porque existem crianças de três anos que mexem em iPads, elas são mais inteligentes. Numa espécie de lamarckismo para idiotas, pensam que, como os pais usam muito iPads, os filhos nascem sabendo mexer neles.

Furedi devia ser leitura obrigatória para quem pede para a escola levar em conta, na avaliação, as possibilidades do filho. E o pior é que esse pai se acha o máximo. Um dos efeitos colaterais da maior escolaridade é que a pessoa fica menos cuidadosa em assuntos que não domina. Fiéis às bobagens fragmentadas que leem, enviesadas por modinhas do Face, esses pais jogam o amadurecimento dos filhos no lixo.

Luiz Felipe Pondé