segunda-feira, 31 de março de 2014

Sexta-feira inesquecível

Tropas de Juiz de Fora rumo ao Rio em 1964

Havia silêncio naquela manhã. Um silêncio armado que ficou marcado no adolescente como um estado de guerra. Ouvia-se no rádio a marcha das tropas, acompanhava-se a tomada da cidade. Um dia de trabalho quase de luto, um feriado imposto pela movimentação militar, a incerteza em todos os rostos. Maior ainda para quem estava começando uma nova vida estudantil, que vivenciaria as inesquecíveis aulas de ordem unida, as de Organização Social e Política Brasileira, e as do silêncio sobre política.
O telefone preto de discos ficara praticamente mudo. As comunicações eram difíceis, às vezes quase impossíveis. Dia de ouvidos atentos a toda informação, aos boatos, ao disse me disse. Se falava muito, bem baixinho para não levantar suspeitas e trazer os tacões para seu lado. O silêncio triste de inconscientemente saber que o mundo mudara, os dias não mais seriam por bom tempo os mesmos de alegria e liberdade. Aqueles 50 anos em cinco ficaram lá atrás, a vassourinha não varreu nada, o ano era de agitação das massas, das reformas, que nunca viriam como se desejava. Havia mais marcha (orquestrada) clamando liberdade, família, Deus para entusiasmar um povo que sentia incerteza. Só poderia dar no que deu, sentava na sala o jovem sem o uniforme, de ouvido no rádio. Naquele dia só se viveria pela informação. O mundo parou no país.
Havia tristeza, mudez e muito espanto no ar. As forças Aliadas levavam alegria às cidades libertadas do nazismo, mas essas tropas de agora não recebiam flores nem traziam esperança de liberdade. Eram vistas sem um gesto que gostariam de libertação. Entravam mudas e recebiam o silêncio do medo. O adolescente sentiu ainda mais que mudara seu mundo com as imagens pela televisão, inesquecível ver o general Mourão Filho seguindo em direção ao Rio.
O país nunca mais foi o mesmo depois daquela Redentora, instaurada no dia seguinte (1º de abril). Foi um outro Brasil que surgiu. Menos pobre, mas avacalhado, mentiroso já de nascença, hipócrita, cretino, que só poderia resultar na mediocridade atual. 

Profecia

“Meu humor não podia ser pior (...). Eu tirara a nação de um abismo e a empurrava a outro” 
General Olímpio Mourão Filho (1900/1972), comandou as tropas da IV Região Militar, sediadas em Juiz de Fora, para invadir o Rio de Janeiro no dia 31 de março de 1964

A lição do presidente

O presidente uruguaio José Mujica (78 anos), como sempre, dá uma lição a muito governante que se acha o grade estadista. Em sua casa simples, na periferia de Montevidéu recebe,de calça arregaçada, os jornalistas (todos de paletó) Fernando Mitre, Ricardo Boechat e Fábio Pannunzio para uma entrevista do Canal Livre, com a mesma simplicidade com que governa o país. Será que algum outro governante consiga se dar o luxo de tamanha sinceridade de vida? Nem pensar mesmo para os chacais que se dizem governo de vilazinhas por aí. Veja a entrevista editada em quatro partes.

Um pouco do pensamento de "Dom Pepe"

"As repúblicas vieram como uma negação à monarquia divina ao feudalismo. Vieram para confirmar que os homens são basicamente iguais".

"Os governos, pela pressão da sociedade, se desviaram e tendem a viver e a criar uma aparelhagem que os rodeia parecida ao modo de viver dos setores mais acomodados e não à maioria da população a que devem representar".

"Sou contra os que gostam muito da riqueza que vem com a política. (...) Na política gostamos da sorte dos demais, a vida da polis"