O deputado Eduardo Bolsonaro revelou-se um brasileiro do tipo que Nelson Rodrigues chamaria de "Narciso às avess", capaz de cuspir na própria imagem sem se dar conta de que "a tragédia nacional é que não temos um mínimo de autoestima". Para ele, o Brasil faz muito bem em liberar a catraca para a entrada de americanos sem exigir nada em troca do governo dos Estados Unidos.
A novidade vai compor o lote de acordos que Jair Bolsonaro celebrará em sua visita aos Estados Unidos. Segundo o raciocínio do filho "Zero Dois" do presidente da República, o Brasil não está em condições de fazer exigências aos americanos, pois a violência urbana afugenta os turistas do seu território. "O Brasil só tem a ganhar com essa medida. A gente está, na verdade, se aproveitando e pegando os dólares dos americanos para gerar emprego no turismo".
O argumento é tolo e desanimador. O deputado flerta com a tolice ao supor que a liberação do visto de entrada atenuará o medo do turista de encostar seus dólares na violência das cidades brasileiras. Eduardo Bolsonaro desanima porque suas premissas desmistificam o discurso do pai, que trombeteou na campanha presidencial a promessa de restaurar a segurança pública. Faria isso armando o brasileiro até os dentes. Os americanos sabem como termina essa mágica.
É justo, muito justo, justíssimo que o governo americano exija que os brasileiros que pretendam viajar aos Estados Unidos compareçam aos seus consulados para entregar uma papelada, preencher um formulário e passar por entrevistas pessoais. O país é deles. E vai para lá quem quer. Por uma questão de reciprocidade, o governo de Bolsonaro deveria submeter os americanos interessados em visitar o Brasil às mesmas exigências.
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Admita-se que Bolsonaro queira fazer uma gentileza ao seu guru Donald Trump. Nessa hipótese, o presidente poderia chegar a um meio-termo. Americanos que solicitassem visto de entrada no Brasil seriam informados sobre as condições que seu governo impõe aos brasileiros. Quem topasse assinar um requerimento pedindo para não receber tratamento semelhante, seria dispensado do visto. Os que se recusassem a assinar o pedido receberiam tratamento igualitário.
O diabo é que a dinastia Bolsonaro, encantada com o lema de Trump —"America First"— decidiu adotar um slogan compatível: "Brazil Second". O deputado Eduardo Bolsonaro chega mesmo a potencializar o discurso da Casa Branca contra a invasão dos bárbaros. "É só a gente fazer a seguinte pergunta: se for permitida a entrada nos EUA sem a necessidade de visto, quantos brasileiros vocês acham que entrarão e vão passar a morar ilegalmente. Agora vamos inverter a pergunta: quantos americanos vocês acham que vão entrar no Brasil e morar ilegalmente?"
O Brasil e os brasileiros, como se vê, são muito impopulares entre os Bolsonaro. Em vez de propor ao Congresso reformas econômicas, o governo do capitão talvez devesse lutar pela aprovação de uma nova Constituição. Poderia adotar o projeto de Constituição simplificada que o historiador Capistrano de Abreu sugeriu para o Brasil. Teria apenas dois artigos:
Artigo 1º: Todo brasileiro deve ter vergonha na cara.
Artigo 2º: Revogam-se as disposições em contrário.
No ano de 2001, quando o inquilino da Casa Branca era George Bush e o Planalto era ocupado por Fernando Henrique Cardoso, a República Federativa do Brasil passou pelo constrangimento de ser informada que seu ministro das Relações Exteriores, Celso Lafer, tivera de tirar os sapatos ao ser submetido a duas revistas em viagens aos Estados Unidos. Não se imaginou que, decorridos 18 anos, uma comitiva presidencial brasileira cruzaria a alfândega americana de joelhos. Sob Bolsonaro, o Brasil se oferece aos americanos como uma espécie de casa da sogra. Sem direito a reciprocidade.