quinta-feira, 26 de setembro de 2024
Fanatismo à solta
O que vivemos não é um choque de civilizações, é um choque entre os fanáticos e o resto de nósAmós Oz
Ambição de bombeiros
O presidente Lula denunciou nas Nações Unidas a falta de ambição dos líderes mundiais. Na verdade, eles têm ambição limitada a apagar incêndios imediatos dentro de seus respectivos países. Não estão prontos para grandes problemas da humanidade e do planeta, nem para construir o futuro no longo prazo. A política ficou mundial, mas a democracia continua nacional e imediatista. A civilização ficou planetária, mas o interesse do eleitor continua imediatista e vinculado ao seu país, elegendo governantes com ambição de bombeiro para seus problemas e não estadistas para a humanidade.
As Nações Unidas se reúnem como se o mundo ainda fosse a soma dos países sem o entendimento atual de cada país ser a soma do mundo. A humanidade precisa de governantes com ambição para formular e construir um novo tipo de progresso, mas o eleitor se mantém em busca de bombeiros locais.
Bombeiros estão entre as mais nobres profissões. São absolutamente necessários, mas insuficientes: não constroem, nem tomam as medidas para impedir repetição de erros incendiários. Os governos não se justificam, limitam seu papel a controlar incêndios, sem construir futuro melhor para a humanidade.
Nessas últimas semanas, o governo brasileiro tem passado a ideia de bombeiro, limitando suas ações a apagar incêndios que não conseguiu evitar. As reuniões que faz são no sentido de mostrar ativismo para barrar a imensa onda de fogo que destrói nossas florestas, não para definir políticas que protejam as matas no futuro, ainda menos para utilizá-las como fonte de riqueza sustentável.
O Ministério do Meio Ambiente parece ter sucumbido ao espírito bombeiro, esquecendo seus sonhos de desenvolvimento sustentável. Todo esforço limitado à tentativa de parar os incêndios. Como se o ministério só existisse agora para isso e ninguém tivesse alternativa para depois que o fogo for controlado. O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, que deveria aproveitar a janela mundial de oportunidade para formular o ambicioso plano de metas da era digital e ecológica, parece assistir ao trabalho dos bombeiros enquanto outros acirram o fogo.
Na mesma semana em que denuncia a falta de ambição de seus colegas, o presidente Lula comemorou o aumento da produção de petróleo e acena para autorizar a exploração de novos poços no litoral próximo à Amazônia. De olho nos votos locais na próxima eleição, senadores que antes defendiam a liderança do Brasil para um mundo com desenvolvimento sustentável, agora indicam que a exploração de combustível fóssil na Amazônia é necessária para aumentar a renda local, mesmo sabendo que essa riqueza não fica localmente e que suas consequências se espalham pelo planeta, trazendo de volta os efeitos das mudanças climáticas que acirram os incêndios. Além de não construir o futuro, estamos agindo como bombeiros piromaníacos: provocando o fogo que dizemos combater. Com elevado custo econômico para não perder votos e por falta de proposta alternativa.
O governo parece se comportar como bombeiro no presente e incendiário para o futuro. Não apenas no que se refere à crise ambiental e aos incêndios nas florestas. Na área de educação, mitiga a desigualdade nas escolas de base, com cotas e bolsas, mas sem agir para construir um robusto sistema nacional de educação de base com qualidade e equidade. Tenta reduzir o incêndio da penúria com aumento do programa Bolsa Família, mas sem uma estratégia de médio e longo prazo para eliminar a persistência da pobreza, nem para tirar o Brasil da armadilha que amarra nossa produtividade e a renda média, nem para distribuir com justiça a renda gerada. No social, o governo se comporta como bombeiro, sem uma estratégia construtora de longo prazo. O mesmo pode-se dizer da economia, tratada para apagar os incêndios do dia, inflação, deficit público, taxa de juros, mas sem formulação de longo prazo.
Olhando para o passado recente, temos um governo que pelo menos joga água para apagar incêndios, mas não dá sinais de ter uma bússola apontando para o futuro, nem quais as ferramentas necessárias para construí-lo. É possível que o governo bombeiro tenha êxito contra o fogo nas florestas antes mesmo de as chuvas chegarem, e seus ministros comemorem como vitória deles, mas, como disse o Lula na ONU, sem ambição para apresentar medidas estruturais. Sem ambição até mesmo para quem propõe ir além da ambição de bombeiro: apagar fogo. Felizmente, os bombeiros ficarão de prontidão: mas Lula tem razão, é preciso mais ambição, inclusive dele.
As Nações Unidas se reúnem como se o mundo ainda fosse a soma dos países sem o entendimento atual de cada país ser a soma do mundo. A humanidade precisa de governantes com ambição para formular e construir um novo tipo de progresso, mas o eleitor se mantém em busca de bombeiros locais.
Bombeiros estão entre as mais nobres profissões. São absolutamente necessários, mas insuficientes: não constroem, nem tomam as medidas para impedir repetição de erros incendiários. Os governos não se justificam, limitam seu papel a controlar incêndios, sem construir futuro melhor para a humanidade.
Nessas últimas semanas, o governo brasileiro tem passado a ideia de bombeiro, limitando suas ações a apagar incêndios que não conseguiu evitar. As reuniões que faz são no sentido de mostrar ativismo para barrar a imensa onda de fogo que destrói nossas florestas, não para definir políticas que protejam as matas no futuro, ainda menos para utilizá-las como fonte de riqueza sustentável.
O Ministério do Meio Ambiente parece ter sucumbido ao espírito bombeiro, esquecendo seus sonhos de desenvolvimento sustentável. Todo esforço limitado à tentativa de parar os incêndios. Como se o ministério só existisse agora para isso e ninguém tivesse alternativa para depois que o fogo for controlado. O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, que deveria aproveitar a janela mundial de oportunidade para formular o ambicioso plano de metas da era digital e ecológica, parece assistir ao trabalho dos bombeiros enquanto outros acirram o fogo.
Na mesma semana em que denuncia a falta de ambição de seus colegas, o presidente Lula comemorou o aumento da produção de petróleo e acena para autorizar a exploração de novos poços no litoral próximo à Amazônia. De olho nos votos locais na próxima eleição, senadores que antes defendiam a liderança do Brasil para um mundo com desenvolvimento sustentável, agora indicam que a exploração de combustível fóssil na Amazônia é necessária para aumentar a renda local, mesmo sabendo que essa riqueza não fica localmente e que suas consequências se espalham pelo planeta, trazendo de volta os efeitos das mudanças climáticas que acirram os incêndios. Além de não construir o futuro, estamos agindo como bombeiros piromaníacos: provocando o fogo que dizemos combater. Com elevado custo econômico para não perder votos e por falta de proposta alternativa.
O governo parece se comportar como bombeiro no presente e incendiário para o futuro. Não apenas no que se refere à crise ambiental e aos incêndios nas florestas. Na área de educação, mitiga a desigualdade nas escolas de base, com cotas e bolsas, mas sem agir para construir um robusto sistema nacional de educação de base com qualidade e equidade. Tenta reduzir o incêndio da penúria com aumento do programa Bolsa Família, mas sem uma estratégia de médio e longo prazo para eliminar a persistência da pobreza, nem para tirar o Brasil da armadilha que amarra nossa produtividade e a renda média, nem para distribuir com justiça a renda gerada. No social, o governo se comporta como bombeiro, sem uma estratégia construtora de longo prazo. O mesmo pode-se dizer da economia, tratada para apagar os incêndios do dia, inflação, deficit público, taxa de juros, mas sem formulação de longo prazo.
Olhando para o passado recente, temos um governo que pelo menos joga água para apagar incêndios, mas não dá sinais de ter uma bússola apontando para o futuro, nem quais as ferramentas necessárias para construí-lo. É possível que o governo bombeiro tenha êxito contra o fogo nas florestas antes mesmo de as chuvas chegarem, e seus ministros comemorem como vitória deles, mas, como disse o Lula na ONU, sem ambição para apresentar medidas estruturais. Sem ambição até mesmo para quem propõe ir além da ambição de bombeiro: apagar fogo. Felizmente, os bombeiros ficarão de prontidão: mas Lula tem razão, é preciso mais ambição, inclusive dele.
Em estado de guerra
“O direito de defesa transformou-se no direito de vingança, que impede um acordo para a liberação de reféns e adia o cessar-fogo.” A frase, referência ao conflito do Oriente Médio, é do discurso de Lula, na abertura da Assembleia Geral da ONU, organismo que apontou como esvaziado e sem voz ativa. Incapaz de mediar conflitos. Neste começo do século 21, a ONU é isso. Infelizmente.
O mundo enfrenta o maior número de conflitos desde a Segunda Guerra Mundial, com 56 guerras ativas, em 2024, e 92 países envolvidos, ameaçando a segurança mundial. Os dados são do Global Peace Index (GPI) ou Índice Global da Paz, divulgados anualmente pelo Institute for Economics and Peace.
Em 2023, foram 162 mil mortes. Um recorde nos últimos 30 anos, segundo o relatório. Os conflitos na Ucrânia e em Gaza foram responsáveis por quase três quartos dessas fatalidades. Apenas no início de 2024, 47 mil mortes relacionadas a guerras foram registradas.
O relatório do GPI conclui que muitas das condições que precedem grandes conflitos mundiais estão mais elevadas do que em qualquer momento desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Como não temer?
Nesta semana, um único ataque de Israel ao Líbano resultou em 492 mortos, 1.645 feridos, milhares de desalojados. Não há o que justifique.
Os representantes do Estado de Israel não aplaudiram nada do discurso de Lula. Como cegos, os defensores do atual Estado violento, que é o do Israel, costumam simplificar, apontando como antissemitas toda e qualquer crítica às violências cometidas em Gaza e, agora, no Líbano. Triste jogo de cena.
No mundo, o impacto econômico da violência tem sido devastador. Em 2023, o custo das guerras alcançou US$ 19,1 trilhões (R$ 106 trilhões). O que significa perda global de US$ 2.380 (R$ 13.200) por pessoa ou 20% nas perdas de PIB. Já os gastos com pacificação representaram 0,6% do total investido em forças militares. Quem quer mesmo acabar com as Guerras?
É preciso falar de paz. É preciso mudar a ONU. Dar-lhe mais voz ativa. Todo mundo sabe. Todo mundo vê. Poucos falam. Lula tem falado.
Os dados da GPI cobrem 99,7% de toda a população mundial, e classificam como “estado de paz”, nos países, em cinco níveis: muito alto, alto, médio, baixo e muito baixo.
O Brasil ocupa a 131ª posição no ranking mundial da violência, classificado como “baixo estado de paz”. Na verdade, vivemos em estado de guerrilhas internas.
Ainda assim, em 2024, subimos da 132ª para a 131ª posição entre 163 países incluídos no ranking global de violência. Regionalmente, o Brasil ocupou uma das últimas posições do índice de paz da América Latina. Estamos à frente apenas de México (136º), Venezuela e Colômbia (ambas em 140º). Tá feia a coisa.
Na América do Sul, o Brasil está na nona posição em ranking liderado pela Argentina. De doer.
Nem tudo está perdido. Há oásis de paz mundo afora. Islândia, Irlanda, Áustria, Nova Zelândia e Singapura são os cinco países menos violentos do mundo, seguidos de Suíça, Portugal, Dinamarca, Eslovênia e Malásia. Ainda há para onde escapar.
O mundo enfrenta o maior número de conflitos desde a Segunda Guerra Mundial, com 56 guerras ativas, em 2024, e 92 países envolvidos, ameaçando a segurança mundial. Os dados são do Global Peace Index (GPI) ou Índice Global da Paz, divulgados anualmente pelo Institute for Economics and Peace.
Em 2023, foram 162 mil mortes. Um recorde nos últimos 30 anos, segundo o relatório. Os conflitos na Ucrânia e em Gaza foram responsáveis por quase três quartos dessas fatalidades. Apenas no início de 2024, 47 mil mortes relacionadas a guerras foram registradas.
O relatório do GPI conclui que muitas das condições que precedem grandes conflitos mundiais estão mais elevadas do que em qualquer momento desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Como não temer?
Nesta semana, um único ataque de Israel ao Líbano resultou em 492 mortos, 1.645 feridos, milhares de desalojados. Não há o que justifique.
Os representantes do Estado de Israel não aplaudiram nada do discurso de Lula. Como cegos, os defensores do atual Estado violento, que é o do Israel, costumam simplificar, apontando como antissemitas toda e qualquer crítica às violências cometidas em Gaza e, agora, no Líbano. Triste jogo de cena.
No mundo, o impacto econômico da violência tem sido devastador. Em 2023, o custo das guerras alcançou US$ 19,1 trilhões (R$ 106 trilhões). O que significa perda global de US$ 2.380 (R$ 13.200) por pessoa ou 20% nas perdas de PIB. Já os gastos com pacificação representaram 0,6% do total investido em forças militares. Quem quer mesmo acabar com as Guerras?
É preciso falar de paz. É preciso mudar a ONU. Dar-lhe mais voz ativa. Todo mundo sabe. Todo mundo vê. Poucos falam. Lula tem falado.
Os dados da GPI cobrem 99,7% de toda a população mundial, e classificam como “estado de paz”, nos países, em cinco níveis: muito alto, alto, médio, baixo e muito baixo.
O Brasil ocupa a 131ª posição no ranking mundial da violência, classificado como “baixo estado de paz”. Na verdade, vivemos em estado de guerrilhas internas.
Ainda assim, em 2024, subimos da 132ª para a 131ª posição entre 163 países incluídos no ranking global de violência. Regionalmente, o Brasil ocupou uma das últimas posições do índice de paz da América Latina. Estamos à frente apenas de México (136º), Venezuela e Colômbia (ambas em 140º). Tá feia a coisa.
Na América do Sul, o Brasil está na nona posição em ranking liderado pela Argentina. De doer.
Nem tudo está perdido. Há oásis de paz mundo afora. Islândia, Irlanda, Áustria, Nova Zelândia e Singapura são os cinco países menos violentos do mundo, seguidos de Suíça, Portugal, Dinamarca, Eslovênia e Malásia. Ainda há para onde escapar.
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