sábado, 19 de agosto de 2023
O silêncio do Rio de Janeiro diante de crianças assassinadas
Quando vi a foto de crianças chorando no velório de Thiago, 13, morto pela polícia, pensei em como pais de escolas particulares construtivistas da zona sul pegariam seus filhos na aula sorridentes e não se sentiriam mal.
Na foto, crianças choram muito, sentidas, com dor. Elas estão fazendo o que nenhuma criança deveria ter que fazer: enterrando um amigo, o adolescente Thiago Menezes Flausino, de 13 anos, morto durante operação policial na Cidade de Deus. Thiago foi morto enquanto andava na garupa da moto de um amigo. Segundo testemunhas, os tiros teriam sido disparados pela polícia.
Assim que ele foi baleado, a PM carioca postou nas redes sociais que um "jovem armado teria sido ferido em confronto". Imagens de câmeras de segurança e testemunhas mostraram que não foi nada disso. A informação foi apagada das redes.
Thiago era um garoto inocente, que gostava de jogar futebol. E, claro, mesmo se ele fosse envolvido com crime (o que repito, não era o caso) ele não poderia ser morto. Não existe pena de morte no Brasil. E muito menos a execução sumária, sem julgamentos, é prevista pela constituição.
Foi triste saber que Thiago foi morto dessa maneira, ver a dor dos seus pais e dos seus amigos. Mas nem deu tempo de secar as lágrimas.
No último sábado, Eloá da Silva dos Santos, de cinco anos, brincava de pular na cama na casa em que morava com os pais, na Ilha do Governador, Zona Oeste do Rio, quando foi atingida por uma bala no peito. Segundo moradores, os tiros teriam sido disparados por policiais. Ela chegou a ser socorrida, mas morreu no hospital. Na mesma operação, o adolescente Wendell Eduardo, que estava na garupa de uma moto, também foi morto após levar um tiro. É triste, revoltante e desolador.
Segundo um levantamento do Instituto Fogo Cruzado, a cada quatro dias, uma criança ou adolescente é baleado no Rio de Janeiro. Uma estatística de guerra. A nível de comparação, segundo números da organização Save the Children, três crianças/adolescentes ficam feridos ou são mortos por dia durante a guerra da Ucrânia. É terrível.
A diferença é que a Ucrânia é um país em guerra oficial, com milhões de refugiados pelo mundo. Já no caso do Rio de Janeiro, a guerra não é oficial e é muitas vezes ignorada. Nas favelas, moradores fazem manifestações contra a morte de suas crianças e a violência policial, mas a vida segue normal do outro lado do túnel, na Zona Sul do Rio de Janeiro, onde ficam aqueles cenários bonitos das novelas de Manoel Carlos.
Escrevo de Berlim, mas como sou carioca, não preciso estar lá para saber que a vida segue normal na minha cidade natal. Quando vi a foto das crianças chorando no velório de Thiago, pensei como pais de escolas particulares construtivistas da zona sul carioca (aquelas que têm mensalidade mais de R$ 4 mil) pegariam seus filhos na escola sorridentes e não se sentiriam mal. Como passar um fim de semana feliz com sua criança pequena sabendo que Eloá foi morta dentro de casa?
Não estou falando, claro, que nenhum branco de classe média sofra com esse horror. Mas sou carioca e conheço bem a capacidade de "abstração" doentia de meus compatriotas.
Ano passado, eu estava sentada do lado de fora em um café Humaitá (bairro de classe média da Zona Sul do Rio de Janeiro) quando ouvi barulho de tiros (sim, nós, cariocas, sabemos distinguir o que é barulho de bala). Levantei assustada e travei um diálogo bem carioca com as garçonetes: "isso é tiro, né? ". "É sim e parece ser perto". Eu e a garçonete entramos dentro do café e nos escondemos no fundo. Enquanto isso, para meu choque, todos os outros clientes continuaram do lado de fora, tranquilos, sentados tomando seus cafés caros, como se nada tivesse acontecendo. Juro.
Há dois anos, estava sentada na rua em uma mesa do mesmo café quando um menino tocou meu ombro e falou outra frase triste muito comum no Rio de Janeiro: "tia, me ajuda". Ele nem conseguiu completar a frase. Em poucos segundos, vi um segurança forte o afastando de mim pelos braços. Logo, ele passou a desferir tapas à luz do dia no menino (sim, era uma criança). Comecei a gritar para que ele parasse. Mais uma vez ninguém fez nada. Gritei sozinha. A rua onde fica esse café, preciso enfatizar, é frequentada principalmente por muitos brancos de classe média alta e progressistas. Não estou falando de um ambiente bolsonarista onde as pessoas bradam alto que "bandido bom é bandido morto".
Claro que ignorar a tragédia é também uma maneira de sobrevivência. Quando passo uma longa temporada no Rio, logo estou "ignorando" a miséria e ficando menos chocada com as crianças dormindo na rua. Com o tempo, todo mundo naturaliza um pouco o horror, inclusive para continuar vivendo. Mas tudo tem limite. Só neste ano, segundo o Instituto Fogo Cruzado, até o mês de julho, pelo menos 14 crianças e 26 adolescentes teriam sido baleados no Rio de Janeiro. Desses, cinco crianças e 11 adolescentes morreram. Thiago e Eloá se juntam a essas horríveis estatísticas. Ano passado, no mesmo período, quatro crianças foram baleadas. Ou seja, o horror cresce exponencialmente.
Não é possível que essas balas não furem a bolha. Como disse o Emicida na ocasião da morte do Thiago: "isso não é um país. Nunca foi um país. É uma máquina de moer pobre".
Na foto, crianças choram muito, sentidas, com dor. Elas estão fazendo o que nenhuma criança deveria ter que fazer: enterrando um amigo, o adolescente Thiago Menezes Flausino, de 13 anos, morto durante operação policial na Cidade de Deus. Thiago foi morto enquanto andava na garupa da moto de um amigo. Segundo testemunhas, os tiros teriam sido disparados pela polícia.
Assim que ele foi baleado, a PM carioca postou nas redes sociais que um "jovem armado teria sido ferido em confronto". Imagens de câmeras de segurança e testemunhas mostraram que não foi nada disso. A informação foi apagada das redes.
Thiago era um garoto inocente, que gostava de jogar futebol. E, claro, mesmo se ele fosse envolvido com crime (o que repito, não era o caso) ele não poderia ser morto. Não existe pena de morte no Brasil. E muito menos a execução sumária, sem julgamentos, é prevista pela constituição.
Foi triste saber que Thiago foi morto dessa maneira, ver a dor dos seus pais e dos seus amigos. Mas nem deu tempo de secar as lágrimas.
No último sábado, Eloá da Silva dos Santos, de cinco anos, brincava de pular na cama na casa em que morava com os pais, na Ilha do Governador, Zona Oeste do Rio, quando foi atingida por uma bala no peito. Segundo moradores, os tiros teriam sido disparados por policiais. Ela chegou a ser socorrida, mas morreu no hospital. Na mesma operação, o adolescente Wendell Eduardo, que estava na garupa de uma moto, também foi morto após levar um tiro. É triste, revoltante e desolador.
Segundo um levantamento do Instituto Fogo Cruzado, a cada quatro dias, uma criança ou adolescente é baleado no Rio de Janeiro. Uma estatística de guerra. A nível de comparação, segundo números da organização Save the Children, três crianças/adolescentes ficam feridos ou são mortos por dia durante a guerra da Ucrânia. É terrível.
A diferença é que a Ucrânia é um país em guerra oficial, com milhões de refugiados pelo mundo. Já no caso do Rio de Janeiro, a guerra não é oficial e é muitas vezes ignorada. Nas favelas, moradores fazem manifestações contra a morte de suas crianças e a violência policial, mas a vida segue normal do outro lado do túnel, na Zona Sul do Rio de Janeiro, onde ficam aqueles cenários bonitos das novelas de Manoel Carlos.
Escrevo de Berlim, mas como sou carioca, não preciso estar lá para saber que a vida segue normal na minha cidade natal. Quando vi a foto das crianças chorando no velório de Thiago, pensei como pais de escolas particulares construtivistas da zona sul carioca (aquelas que têm mensalidade mais de R$ 4 mil) pegariam seus filhos na escola sorridentes e não se sentiriam mal. Como passar um fim de semana feliz com sua criança pequena sabendo que Eloá foi morta dentro de casa?
Não estou falando, claro, que nenhum branco de classe média sofra com esse horror. Mas sou carioca e conheço bem a capacidade de "abstração" doentia de meus compatriotas.
Ano passado, eu estava sentada do lado de fora em um café Humaitá (bairro de classe média da Zona Sul do Rio de Janeiro) quando ouvi barulho de tiros (sim, nós, cariocas, sabemos distinguir o que é barulho de bala). Levantei assustada e travei um diálogo bem carioca com as garçonetes: "isso é tiro, né? ". "É sim e parece ser perto". Eu e a garçonete entramos dentro do café e nos escondemos no fundo. Enquanto isso, para meu choque, todos os outros clientes continuaram do lado de fora, tranquilos, sentados tomando seus cafés caros, como se nada tivesse acontecendo. Juro.
Há dois anos, estava sentada na rua em uma mesa do mesmo café quando um menino tocou meu ombro e falou outra frase triste muito comum no Rio de Janeiro: "tia, me ajuda". Ele nem conseguiu completar a frase. Em poucos segundos, vi um segurança forte o afastando de mim pelos braços. Logo, ele passou a desferir tapas à luz do dia no menino (sim, era uma criança). Comecei a gritar para que ele parasse. Mais uma vez ninguém fez nada. Gritei sozinha. A rua onde fica esse café, preciso enfatizar, é frequentada principalmente por muitos brancos de classe média alta e progressistas. Não estou falando de um ambiente bolsonarista onde as pessoas bradam alto que "bandido bom é bandido morto".
Claro que ignorar a tragédia é também uma maneira de sobrevivência. Quando passo uma longa temporada no Rio, logo estou "ignorando" a miséria e ficando menos chocada com as crianças dormindo na rua. Com o tempo, todo mundo naturaliza um pouco o horror, inclusive para continuar vivendo. Mas tudo tem limite. Só neste ano, segundo o Instituto Fogo Cruzado, até o mês de julho, pelo menos 14 crianças e 26 adolescentes teriam sido baleados no Rio de Janeiro. Desses, cinco crianças e 11 adolescentes morreram. Thiago e Eloá se juntam a essas horríveis estatísticas. Ano passado, no mesmo período, quatro crianças foram baleadas. Ou seja, o horror cresce exponencialmente.
Não é possível que essas balas não furem a bolha. Como disse o Emicida na ocasião da morte do Thiago: "isso não é um país. Nunca foi um país. É uma máquina de moer pobre".
Ladrões sem casaca
A canoa de Jair Bolsonaro virou, e foi ele quem deixou ela virar, conforme atestam os fatos e agora dois de seus comparsas na trajetória de ilicitudes que fatalmente o levarão à prisão. Mauro Cid e Walter Delgatti resolveram dar com a língua nos dentes a fim de atenuar os danos às respectivas peles.
Quando começa assim, o efeito dominó é inevitável. Outras confissões apontando o ex-presidente como mandante dos crimes contra a saúde pública, o Estado de Direito, o sistema eleitoral e a reputações alheias virão.
Os dias de liberdade de Bolsonaro estão contados. A ele resta a esperança de que seja visto como vítima de perseguição e, lá na frente, possa dar a volta por cima. Mira-se no exemplo de Luiz Inácio da Silva sem, no entanto, levar em conta as abissais diferenças entre as figuras e as circunstâncias de um e de outro.
O hoje presidente da República, depois de ter passado 580 dias preso, jamais produziu as provas que o antecessor fabricou contra si. Lula foi acusado de ter sido favorecido por um intrincado e até sofisticado esquema de corrupção envolvendo empresários amigos e políticos aliados. Safou-se em função de procedimentos indevidos, mudanças de regras e de entendimentos na Justiça.
Já Bolsonaro protagonizou projeto mequetrefe de apropriação indevida do poder, cuja execução foi entregue a operadores igualmente chinfrins.
Um presidente que abre as portas do Palácio, do Ministério da Defesa e do próprio partido a um estelionatário pago por uma deputada amalucada, e ainda manda o ajudante de ordens vender presentes de Estado para embolsar um dinheiro, não dá margem a qualquer dúvida razoável sobre sua culpabilidade, fechando o caminho de eventuais brechas legais.
Jair Bolsonaro subestimou a República, fez pouco do Brasil, desdenhou da solidez das instituições, menosprezou instâncias de controle e investigação. Por isso se vê na iminência de pagar pelas pragas que rogou ao país.
Quando começa assim, o efeito dominó é inevitável. Outras confissões apontando o ex-presidente como mandante dos crimes contra a saúde pública, o Estado de Direito, o sistema eleitoral e a reputações alheias virão.
Os dias de liberdade de Bolsonaro estão contados. A ele resta a esperança de que seja visto como vítima de perseguição e, lá na frente, possa dar a volta por cima. Mira-se no exemplo de Luiz Inácio da Silva sem, no entanto, levar em conta as abissais diferenças entre as figuras e as circunstâncias de um e de outro.
O hoje presidente da República, depois de ter passado 580 dias preso, jamais produziu as provas que o antecessor fabricou contra si. Lula foi acusado de ter sido favorecido por um intrincado e até sofisticado esquema de corrupção envolvendo empresários amigos e políticos aliados. Safou-se em função de procedimentos indevidos, mudanças de regras e de entendimentos na Justiça.
Já Bolsonaro protagonizou projeto mequetrefe de apropriação indevida do poder, cuja execução foi entregue a operadores igualmente chinfrins.
Um presidente que abre as portas do Palácio, do Ministério da Defesa e do próprio partido a um estelionatário pago por uma deputada amalucada, e ainda manda o ajudante de ordens vender presentes de Estado para embolsar um dinheiro, não dá margem a qualquer dúvida razoável sobre sua culpabilidade, fechando o caminho de eventuais brechas legais.
Jair Bolsonaro subestimou a República, fez pouco do Brasil, desdenhou da solidez das instituições, menosprezou instâncias de controle e investigação. Por isso se vê na iminência de pagar pelas pragas que rogou ao país.
Jair Bolsonaro é sintoma (mais um) do que se passa no Brasil
Jair Bolsonaro deve ter a prisão preventiva decretada pelo ministro Alexandre de Moraes, a sua Nêmesis, se o tenente-coronel Mauro Cid confessar mesmo que vendeu relógios de luxo recebidos como presentes oficiais e repassou o dinheiro em espécie resultante da venda ao ex-presidente, tudo a mando do próprio Jair Bolsonaro.
Avoluma-se também a história do hacker contratado para fraudar urna eletrônica e assumir a autoria de um suposto grampo do telefone de Alexandre de Moraes, cuja veracidade precisa ser verificada, uma vez que o personagem em questão é conhecido estelionatário. De qualquer forma, Jair Bolsonaro admitiu ter conversado com o sujeito, o que já é um desvio do comportamento que se espera de um presidente, algo que não o ajudará nos demais processos.
O enredo burlesco, chulé, é um final vagabundo para quem teve um início vagabundo — e que não soube aproveitar a chance de limpar e honrar a sua biografia no exercício da Presidência da República, por “limitações cognitivas e baixa civilidade”. O diagnóstico feito pelo ministro Luís Roberto Barroso, no início de 2022, ao comentar os reiterados ataques de Jair Bolsonaro ao sistema eleitoral, resume perfeitamente o personagem.
Mesmo que não seja preso agora ou que não seja preso nunca, Jair Bolsonaro será visto como um ladrãozinho de joias, outro diminutivo a abrilhantar o currículo do chupista de rachadinhas. O fato deveria provocar uma reflexão que ultrapassasse as delinquências do ex-inquilino do Planalto.
Desde o restabelecimento das eleições diretas para presidente da República, sete políticos ocuparam o cargo: Fernando Collor de Mello, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Lula, Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro. Desses sete, dois foram saídos durante o mandato por fazer lambanças, quatro enfrentaram processos por roubalheira e dois desses quatro chegaram a ver o sol nascer quadrado (até agora). Esquerda, direita, centro: há encrencados de todos os espectros. Não é relativização, é constatação.
O que isso significa? A resposta mais comum em Brasília e alhures é que o presidencialismo de coalizão é a ocasião que faz o ladrão e, por isso, o semipresidencialismo ou o parlamentarismo seriam a solução.
Duvido, basta ver o que ocorre também nos demais poderes. O cerne da questão está longe de ser o tipo de regime político ou o formato da votação, se distrital ou não, mas a qualidade do homem público brasileiro. Ela é tão ruim, em termos de honestidade, cultura, visão de mundo e capacidade de administração, que se fosse medíocre já seria motor de grande desenvolvimento. Qualquer que seja o regime político, a baixa qualidade do homem público brasileiro será determinante. Esquece-se de que as instituições, os regimes, são abstrações comandadas por indivíduos concretos.
A qualidade dos homens públicos brasileiros nunca foi grande coisa, mas vem piorando bastante. Jair Bolsonaro é mais um sintoma do que se passa no país. Por que a qualidade só piora? Porque a política no seu sentido amplo, o que inclui gente sem mandato eletivo, virou o lugar do rebotalho, ao que parece definitivamente. Como chegamos a esse ponto? É a reflexão que precisaria ser feita, mas não será. Até porque uma resposta possível seria bastante desencorajadora, embora talvez nos fizesse um pouco mais conscientes de traços irredutíveis do caráter nacional.
Avoluma-se também a história do hacker contratado para fraudar urna eletrônica e assumir a autoria de um suposto grampo do telefone de Alexandre de Moraes, cuja veracidade precisa ser verificada, uma vez que o personagem em questão é conhecido estelionatário. De qualquer forma, Jair Bolsonaro admitiu ter conversado com o sujeito, o que já é um desvio do comportamento que se espera de um presidente, algo que não o ajudará nos demais processos.
O enredo burlesco, chulé, é um final vagabundo para quem teve um início vagabundo — e que não soube aproveitar a chance de limpar e honrar a sua biografia no exercício da Presidência da República, por “limitações cognitivas e baixa civilidade”. O diagnóstico feito pelo ministro Luís Roberto Barroso, no início de 2022, ao comentar os reiterados ataques de Jair Bolsonaro ao sistema eleitoral, resume perfeitamente o personagem.
Mesmo que não seja preso agora ou que não seja preso nunca, Jair Bolsonaro será visto como um ladrãozinho de joias, outro diminutivo a abrilhantar o currículo do chupista de rachadinhas. O fato deveria provocar uma reflexão que ultrapassasse as delinquências do ex-inquilino do Planalto.
Desde o restabelecimento das eleições diretas para presidente da República, sete políticos ocuparam o cargo: Fernando Collor de Mello, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Lula, Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro. Desses sete, dois foram saídos durante o mandato por fazer lambanças, quatro enfrentaram processos por roubalheira e dois desses quatro chegaram a ver o sol nascer quadrado (até agora). Esquerda, direita, centro: há encrencados de todos os espectros. Não é relativização, é constatação.
O que isso significa? A resposta mais comum em Brasília e alhures é que o presidencialismo de coalizão é a ocasião que faz o ladrão e, por isso, o semipresidencialismo ou o parlamentarismo seriam a solução.
Duvido, basta ver o que ocorre também nos demais poderes. O cerne da questão está longe de ser o tipo de regime político ou o formato da votação, se distrital ou não, mas a qualidade do homem público brasileiro. Ela é tão ruim, em termos de honestidade, cultura, visão de mundo e capacidade de administração, que se fosse medíocre já seria motor de grande desenvolvimento. Qualquer que seja o regime político, a baixa qualidade do homem público brasileiro será determinante. Esquece-se de que as instituições, os regimes, são abstrações comandadas por indivíduos concretos.
A qualidade dos homens públicos brasileiros nunca foi grande coisa, mas vem piorando bastante. Jair Bolsonaro é mais um sintoma do que se passa no país. Por que a qualidade só piora? Porque a política no seu sentido amplo, o que inclui gente sem mandato eletivo, virou o lugar do rebotalho, ao que parece definitivamente. Como chegamos a esse ponto? É a reflexão que precisaria ser feita, mas não será. Até porque uma resposta possível seria bastante desencorajadora, embora talvez nos fizesse um pouco mais conscientes de traços irredutíveis do caráter nacional.
Assinar:
Postagens (Atom)