Sem dúvida, perde a economia brasileira. Mas com a força da opinião pública mais exigente e indignada, poderia ressurgir um reforço dos poderes independentes do Estado
O
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, finalmente enviou a misteriosa e temida lista maldita dos políticos que deverão ser investigados pelas acusações que pesam sobre eles no maior escândalo de corrupção da história democrática do país: o chamado petrolão.
A caixa de Pandora será aberta pelo ministro do Supremo Tribunal Federal, Teori Zavascki. Dois nomes da lista, entretanto, escaparam já na noite desta segunda-feira, dois pesos pesados: o presidente do Senado, Renan Calheiros, até esta segunda fiel escudeiro do ex-presidente Lula e da presidenta Dilma Rousseff, e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, ambos do maior partido aliado do Governo, o PMDB, que foi o fiel da balança em todos os Governos do período democrático e ambos recém-escolhidos pelo Congresso.
Hoje os brasileiros já colocam em segundo lugar de suas prioridades, depois da saúde, o tema da corrupção política. Agora, a vida de corruptos e corruptores será mais difícil
No resto da lista figurarão outros nomes de destaque da política brasileira. Juntos formam essa espécie de maldição gestada no rico e apetitoso ventre da Petrobras, a maior e mais prestigiada empresa brasileira, orgulho nacional e internacional, hoje vendida a preço de liquidação.
A pergunta que muitos se fazem, entre chocados e indignados, é quem ganha e quem perde nesse carrossel de corrupção político-empresarial que conseguiu deixar em frangalhos a melhor joia industrial do país.
Sem dúvida, perde a Petrobras, mas também toda a economia do país, já que a petroleira responde por um bom quinhão do PIB nacional. Perde credibilidade a classe política, começando pelo partido do governo, o PT, sob cuja responsabilidade a empresa esteve nos últimos 12 anos, quando foi sistematicamente saqueada. Perdem credibilidade vários partidos aliados do governo que participaram ativamente do banquete e, possivelmente, até algum partido da oposição.
Enquanto não se conhece oficialmente a lista dos desonestos que podem acabar na cadeia, já não resta dúvida de que, enfim, como um feliz paradoxo, quem ganha é a democracia brasileira em que o poder e a independência tanto da Procuradoria-Geral da República, como da Polícia Federal, junto com a tenaz atuação do jovem juiz Sérgio Moro, foram capazes de revelar o tumor encravado nas vísceras da Petrobras, que era uma empresa modelo de tecnologia avançada e acabou invadida e violada pelo poder político em conivência com importantes empresas nacionais.
Cabe agora ao Supremo Tribunal Federal atuar com a mesma independência, seriedade e coragem. E por último ou, talvez, antes de tudo, pelo menos boa parte do mérito de poder chegar até aqui na investigação corajosa e independente se deve à maior conscientização revelada ultimamente pela sociedade brasileira, que, ao longo de todo o tempo de investigação, vigiou e estimulou a justiça e a polícia para que os culpados fossem descobertos, sem se deter nem mesmo diante de políticos ilustres.
Hoje, pela primeira vez, os brasileiros já colocam em segundo lugar de suas prioridades, depois da saúde, o tema da corrupção política. Os governantes sabem e têm medo disso e, de agora em diante, a vida de corruptos e corruptores será mais difícil.
Assim, no momento mais crucial da crise política e econômica que sacode o país, com a força da opinião pública cada dia mais exigente e indignada, poderia ressurgir depois do escândalo uma maior estima e um reforço dos poderes independentes do Estado. Poderá ser uma vacina que impeça o país de cair mais fundo nas tentações populistas de querer domar os poderes independentes do Estado, cujas consequências são cada vez mais evidentes em países onde esses poderes, junto com a liberdade de expressão, estão sendo pisoteados.
Enfim, um a zero para o Brasil, que está sendo capaz de defender e reforçar os valores de sua democracia, às vezes ferida, mas que luta para continuar viva.
Juan Arias
Dilmas, Obiangs, Maduros e Kirchners podem delirar no seu mundo fantástico. Mas vai chegar para eles o dia do vamos ver, do acabou a brincadeira, a Quarta-Feira de Cinzas do delírio autoritário. Nesse dia as pessoas, creio, terão alguma complacência conosco que passamos todo esse tempo dizendo que dois e dois são quatro. Constrangidos com a obviedade do nosso discurso, seguimos o nosso caminho lembrando que a opressão da Guiné Equatorial é a história escondida no Sambódromo, que o esquema de corrupção na Petrobras se tornou sistemático e vertical no governo petista
Fernando Gabeira
Para cada lado que Dilma se volte, encontra um adversário, até um inimigo. Raras vezes um governante enfrentou situação assim. Faltando quase quatro anos para o fim de seu mandato, a pergunta é se vai aguentar, se vai mudar ou se vai sair.
Madame comprou briga com os presidentes da Câmara e do Senado. Renan Calheiros e Eduardo Cunha dispõem de meios para tornar a vida e a administração dela um inferno. Importa menos se a recíproca for verdadeira, mas a verdade é que os comandantes do Congresso estão em guerra aberta e declarada contra Dilma. Da devolução da medida provisória da desoneração das folhas de pagamento à ausência num jantar no Alvorada e à recusa de atender telefonema da presidente, Renan demonstra uma intransigência óbvia quando declara aos jornalistas estar farto da desconsideração do Planalto para com o Senado. Cunha já deixou clara a disposição de rejeitar projetos do governo. O grave é que ambos contam com o apoio maciço das respectivas bancadas, com gente até do PT.
Quanto aos partidos, os da oposição deitam e rolam sem qualquer aceno de entendimento com Dilma, mas salta aos olhos que ela perdeu o PMDB e penduricalhos de sua base na votação de qualquer iniciativa do ajuste econômico. Nesse particular, não conta com o PT inteiro e só por milagre deixará de ser derrotada.
O empresariado rejeita até mesmo as medidas que poderiam favorecê-lo. Imagine-se a reação diante da extinção da desoneração das folhas de pagamento e do anunciado imposto sobre grandes fortunas. Paulo Skaf acaba de pôr a Fiesp em armas e as empreiteiras, se não receberem alguns bilhões do BNDES, ampliarão denuncias premiadas e poderão envolver mais companheiros e até seus mentores.
As centrais sindicais, inclusive a CUT, levantaram-se contra a redução de direitos trabalhistas proposta dias atrás, já ocuparam e mais ocuparão os pátios das indústrias para defender o salário desemprego e as pensões das viúvas. Se convocados para apoiar o governo, não aparecerão.
Dos estudantes nem haverá que falar. O desemprego os atinge na moleira e a manifestação prevista para o dia 15 em todo o país não deixará ninguém mentir. Será essencialmente um protesto contra Dilma. A previsão é de milhões de pessoas na rua, nas capitais e principais cidades.
O Procurador Geral da República não quer conversa com a presidente desde que se negou a antecipar-lhe a lista de envolvidos no escândalo da Petrobras. O conceito de persona non grata vale para os dois lados.
No Supremo Tribunal Federal, aumenta o número de ministros que não poupam Dilma por deixar de indicar, desde julho do ano passado, o sucessor de Joaquim Barbosa. Ela vem sendo acusada de desídia e de manobras pouco éticas para permanecer desfalcada uma das Turmas da corte. Se espera contar com os ministros que nomeou, fica a hipótese cada vez mais remota.
Mesmo no seu quintal, a chefe do governo não parece à vontade. Ministros se engalfinham, assim como ministros saltam de banda, deixando claro não se conformarem com as recentes mudanças na estratégia oficial, que era e não é mais de beneficiar os trabalhadores e os pobres. A última paulada nos assalariados menos favorecidos foi o corte no subsídio de luz para cinco milhões de famílias. Nem o vice-presidente Michel Temer pode concordar com tamanha maldade. Se comparecer a conciliábulos palacianos, será para ficar calado.
Falta referir outro personagem, dentro da casa da Dilma, que ao contrário de suas aparições públicas, mais a vem censurando nas últimas semanas: o Lula. Nem é preciso demonstrar o desgaste de um afastamento que, faz pouco, tornou-se ostensivo.
Em suma, a presidente encontra-se cada vez mais sozinha. Se a poeira não baixar, ninguém garante que mantenha o poder até 2018. Está abandonada por todos. Ou terá sido ela que os abandonou?
A presidente Dilma Rousseff nunca se entusiasmou com a criação de novos assentamentos rurais para a reforma agrária. Adotou sempre a ideia de que é mais produtivo melhorar os assentamentos já existentes. O Movimento dos Sem Terra (MST) e outras organizações reagiram inicialmente e acusaram a presidente de abandonar a bandeira da reforma agrária. Com o tempo, porém, se alinharam à nova política. Hoje a luta pela terra não está mais no centro das suas preocupações.
Essa mudança de foco é o tema do artigo “Sem-terra: da centralidade da luta pela terra à luta por políticas públicas”, assinado pelo professor e pesquisador João Fabrini e publicado na mais recente edição do Boletim Dataluta – publicação mensal do Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária (NERA), vinculado à Unesp. De acordo com as observações do especialista, os movimentos ”passaram priorizar a luta por políticas públicas, diferente do que ocorria no passado em que as ocupações de terra possuíam centralidade”.
As políticas públicas pelas quais esses movimentos lutam, segundo o autor, visam “dotar o meio rural de condições adequadas de educação, moradia, energia elétrica, internet, comunicação, crédito, agroindústria, inserção da produção camponesa no circuito comercial”.
Em outras palavras, passaram a fazer aquilo que o governo quer. Ou, como diz o autor, a ação deles “coaduna com o projeto atual do governo federal”.
Na prática, o MST concentra esforços para fazer acordos com o objetivo de estender aos assentamentos programas sociais já existentes. Entre eles podem ser citados Programa Luz Para Todos, Programa Nacional de Habitação Rural, Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
O que teria levado os movimentos a redefinirem sua estratégia? O autor aponta fatores conjunturais e estruturais. Menciona, por exemplo, o avanço do capitalismo nas regiões rurais e a diminuição das áreas improdutivas que poderiam ser destinadas à reforma agrária.
Diz ele: “O capital interessou-se pela agricultura com o aumento de ganho de produtividade, pois a produção na terra estaria dando mais ‘lucro’ do que a especulação, minando o rentismo que sempre caracterizou o espaço agrário brasileiro. A elevação dos preços dos produtos de exportação fez os latifundiários dedicarem ou entregarem suas terras à produção, diminuindo a oferta de terras improdutivas que poderiam ser destinadas à reforma agrária.”
Ele também considera a mudança na política do governo, atribuindo-a a dois fatores: “Esse recuo está relacionado ao fato do governo não entender a realização da reforma agrária e a pequena agricultura como parte do projeto de desenvolvimento do Brasil, bem como à atuação política dos setores ruralistas fortemente representados no Congresso Nacional. A aliança pragmática do governo com o setor ruralista para garantir governabilidade da nação colocou um conjunto de obstáculos para as desapropriações.”
Na visão do autor, sem desapropriações os sem terra não se sentem animados a ocupar propriedades rurais.
O autor cita que “enquanto no período de governo Lula e FHC foram desapropriados 48 milhões de hectares e 21 milhões de hectares, respectivamente, no governo Dilma, foram desapropriados apenas 2,3 milhões de hectares”. Em 2013 ocorreram apenas 10 desapropriações de terras para reforma agrária.
Hoje os protestos promovidos pelo MST estão voltados para órgãos do governo, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e sedes de ministérios.
Estranhem o que não for estranho.
Tomem por inexplicável o habitual.
Sintam-se perplexos ante o cotidiano.
Tratem de achar um remédio para o abuso.
Mas não se esqueçam
de que o abuso é sempre a regra.
Bertolt Brecht
As manchetes informando que, segundo assessores do Planalto (grife-se), os presidentes Renan Calheiros, do Senado, e Eduardo Cunha, da Câmara, estariam no listão de Rodrigo Janot, revelam mais uma "brincadeirinha" na Republiqueta do Brasil. Enfim os mortais cidadãos sabem que tudo no governo petista não passa de jogo de cena.
Só foram "revelados" os dois que se tornaram as pedras no caminho cambaleante da doutora Dilma. Divulgar que estão lá seus nomes já foi o suficiente para mandar recado e desabonar os dois, que disseram não terem sido avisados.
Desvendado com as manchetes, o escandaloso (para não dizer cretino) encontro do procurador Rodrigo Janot com o ministro Cardosão como um passa cá o listão. Aquele que foi apelidado de arrombamento de casa do procurador, num condomínio de alto luxo, com muradas e seguranças, vigilância eletrônica, era mais uma brincadeira. Roubo de um controle de portão de garagem e o cronometrado arrombamento de 8 minutos, só débil mental engole.
Era preciso dar uma desculpa mesmo cretina para o encontro no qual seriam repassados os nomes do bando do Petrolão antes do ministro Teori Zavascki, que agora fica com cara de tacho. A maior autoridade jurídica do país recebe um Top Secret que não é segredo sequer entre a faxina no Planalto. Vão usar e abusar de Teori, juiz que já soltou por duas vezes Renato Duque, indicado pelo PT, das garras do Petrolão.
A grande "revelação" em que Cunha e Renan estão listados é joguinho político para enfraquecer, mais uma vez, a operação Lava-Jato e de quebra o Legislativo que se mostrar contrário. A tropa de choque do Planalto só sabe jogar pra quebrar, vai partir para pintar o diabo.
Se outros nomes estão no Top Secret nem tão secreto, porque não anunciaram, por exemplo, indiciados do PT e do PP? Preferiram os tais assessores planaltinos revelar apenas justamente os chefes do Legislativo para que, inibidos, baixem a cabeça para os desmandos que Dilma ainda pretende implementar na salvação do país, quer dizer, da própria cabeça e da de Lula.
Com o quebra-pau entre Executivo e Legislativo, a piada aqui muito reveladora foi daquele petista que com toda a gravidade se disse contra a quebra de sigilo dos políticos indiciados na Lava-Jato. Mas não foi o próprio PT de sua maior instância, o Planalto, quem já soltou dois nomes? Para bom entendedor, vê-se ainda mais clara a jogada.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva entrou em campo para tentar resolver uma crise do governo que ganhou proporções imensas. O motivo do enorme tamanho é simples: o imobilismo da presidente Dilma Rousseff. Ela não conseguiu, até o momento, conversar com seus pares e apontar um caminho.
Presa entre as correntes do PT, partido que lhe abriga, mas nunca foi o dela, Dilma parece também estar perdida do ponto de vista administrativo. As denúncias de corrupção na Petrobras estão sendo tratadas como intrigas da oposição. É assim que o PT quer que elas sejam tratadas. Dilma pode até discordar desse posicionamento, mas não tem força política para fazer diferente. Ou, em outra hipótese, talvez não saiba o que fazer de diferente.
A saída, apresentada até aqui, de dizer que vai investigar e punir porque não concorda com o “malfeito” não convence mais ninguém. Mesmo porque, até este momento, ninguém sabe de um só resultado das investigações internas da empresa. O governo parou no caso Petrobras e vê, como se estivesse de longe, a inflação e o desemprego aumentarem. São dois lados da vida cotidiana muito importantes para a população. Quando o bolso não anda bem nada anda bem na vida do cidadão. E não há como o cidadão separar a sua dificuldade individual, provocada por uma conjuntura nacional, dos escândalos e denúncias que aparecem na mídia a todo momento.
Resultado dessa situação: a corrupção é motivo da indignação que cresce na mesma medida em que o dinheiro para o supermercado fica mais curto. E não é possível responsabilizar o cidadão por nada disso. Afinal de contas, o brasileiro fez tudo o que estava a seu alcance. Quando pediram para ele ir às compras e confiar na economia do país, ele foi. Quando disseram para ele, ainda no governo Lula, que as denúncias de corrupção (no caso do mensalão) eram algo pontual, ele acreditou e reelegeu o presidente petista.
Em outras palavras, o brasileiro quer é que alguém se responsabilize por tudo que está sendo denunciado e, mais do que isso, que apresente uma solução. Não é mais possível manter o jogo de empurra e fingir que está tudo bem.
Quando Lula entra no processo de gestão da crise na condição de ex-presidente e principal liderança do PT, ele também está permitindo que lideranças de outros partidos façam o mesmo. Seria um bom momento para deixar a polarização de lado e PT, PSDB e todas as outras siglas sentarem na busca de uma solução eficiente. Para isso, é preciso admitir que a corrupção é endêmica e já contaminou a todos. Na condição de doentes, os partidos precisam agora da cura. Será assim, ou cada uma das legendas vai sucumbir gradual e lentamente, como já acontece com o PT. A hora é de responsabilidade.
Carla Kreefft